02/10/12

A equidade do "ensino vocacional" e a cultura


Contracapa de Mágoas da escola, de Daniel Pennac


O ministério da educação vai criar este ano lectivo, “no âmbito da oferta formativa de cursos vocacionais no ensino básico, uma experiência-piloto de oferta destes cursos, no ano lectivo de 2012 -2013 e regulamenta os termos e as condições para o seu funcionamento (Portaria 292-A/2012, de 26 de Setembro).
Esta experiência-piloto destina-se a alunos com mais de 13 anos, e que tenham tenham duas retenções no mesmo ciclo ou três retenções em ciclos distintos.
A experiência-piloto ora regulamentada pode ser alargada a partir do ano lectivo de 2013 -2014 a outros agrupamentos de escolas ou escolas por despacho do Ministro da Educação e Ciência”
De facto, já não era sem tempo. A realidade do terreno vinha impondo respostas que a teoria dos gabinetes, mesmo que internacionais, não querem ver.
 A OCDE define alguns critérios para a equidade da educação: Um deles refere que se deve “limitar a orientação precoce para vias diferenciadas ou para turmas de nível e evitar a selecção com base nos resultados de aprendizagem”.
São coisas diferentes. Quanto à  orientação precoce para vias diferenciadas  tem que se entender o que significa  orientação precoce para medidas diferenciadas? É a orientação no final do 4º ano , do 6º ou do do 9º ano de escolaridade?
Não será falta de equidade deixar os alunos ao insucesso ? Esta tem sido a prática que tem levado a que muitos alunos acabem por deixar a escola precocemente.
Infelizmente também aqui a ideologia tem contaminado  o debate e a busca de soluções para estes alunos.
É fácil  arranjar um rótulo de "pedagogia classista"  para medidas como esta agora tomada e deixar os alunos  repetirem anos de insucesso.
Este tem sido aliás um dos problemas mais graves com que nos deparamos depois de ter terminado o ensino das escolas profissionais.
Tem sido à conta de ideologias ditas de esquerda  ou ditas de direita que a falta de equidade tem existido.  É lamentável que seja sempre a distinção baseada no económico que esteja subjacente a estas opiniões e decisões.
O que sei é que o insucesso, hoje, e sublinho hoje, é transversal, como acontece, aliás, com as NEE. A lotaria genética não faz essa distinção económica e a influência do meio pode ser importante mas, certamente, hoje, ninguém pensa que um professor faz distinções dessas nas suas aulas.
Ou será que os professores também usam essa ideologia classista e são perversos a ponto de quererem “marcar” assim as classes sociais, enviando os alunos para cursos técnico-profissionais?  Não será até o contrário ? Muitos professores que conheço, independenteente da sua ideologia, fazem tudo o que podem para que os seus alunos tenham sucesso.
Mas também aqui não se passa nada de novo: é sempre a questão dos "memes" a inquinar tudo o que é a "nossa" cultura e a "vossa" cultura.
Há cultura. Se uma cultura é contra os princípios fundamentais do ser humano então a cultura tem que ser  mudada. Seja de esquerda seja de direita, religiosa ou laica...
A cultura da equidade é permitir aos alunos que sigam as suas escolhas. Propor a possibilidade de orientação, como faz este ministério da educação, para alunos com mais de 13 anos com insucesso, parece-me um contributo para promover a equidade.
A forma de o fazer não é forçosamente através de escolas diferentes. O futuro da equidade da educação pode passar  por oferecer dentro da mesma escola currículos diferenciados aos alunos e oferecer a possibilidade de escolha aos alunos que o desejem.
É muito difícil para um educador ver um aluno desmotivar-se da escola  e começar um caminho de insucesso académico. E o problema maior é que às vezes não é só académico é o começo do insucesso para a vida.
E se esse aluno quiser optar por um currículo com  disciplinas  diferentes não deverá poder ter essa opção? Que equidade há no prolongamento dessa mágoa de ir a uma  escola que já nada lhe diz ?

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