21/06/18

Kodály - A música como parte da vida

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Zoltán Kodály - Dances from Galanta

Zoltán Kodály (Kodály Zoltán, pronunciado [ˈkodaːj ˈzoltaːn]), 16/12/1882 - 6/3/1967, foi um compositor, etnomusicólogo, pedagogo, linguista e filósofo húngaro. Conhecido internacionalmente como o criador do Método Kodály.
Zoltán Kodály passou a maior parte de sua infância na cidade de Galánta e compôs as Danças de Galánta,
para orquestra (1933), com base na música folclórica desta região. (Wikipedia)

O consolo da filosofia - o sofrimento

64. Quando estiveres em sofrimento:
Cuida para que não te envergonhe, nem denigra o teu espírito - para que não te impeça de agir de maneira racional e altruísta.
E na maioria dos casos, o que disse Epicuro deve ajudar-te: «A dor nunca é insuportável ou infinita, desde que te lembres das suas limitações e não a tornes maior que o pensamento.»
E também não esqueças de que a dor muitas vezes vem disfarçada  - em tonturas, febres, perda de apetite. Quando fores incomodado por coisas como estas, lembra-te: «Eu não cedo a nenhuma dor.»

68. Vive a vida em paz, imune às compulsões. Deixa que elas te gritem à vontade. Deixa os animais selvagens dilacerarem a frágil pele que te envolve. Nada disto te impede de manteres a tua mente calma - a  avaliar com verdade o que te rodeia - e estares preparado para fazer bom uso do que quer que aconteça. Para que o Juízo possa olhar o acontecimento nos olhos e dizer: «Isto é o que tu realmente és, independentemente do que possas parecer ser.» E a Adaptabilidade diz: « Tu és mesmo aquilo que eu procurava.» Porque, para mim, o presente é uma oportunidade para empregar a virtude da Razão - a virtude da civilidade -, ou seja, a arte que os homens partilham com os deuses. Porque ambos tratam tudo o que acontece como natural; nada de novo nem difícil, mas como familiar e fácil de lidar.

69. Perfeição de carácter: viver cada dia como se fosse o último, sem frenesim, nem apatia, nem fingimentos.

 Marco Aurélio, Meditações,  Livro 7, Cultura Editora, A companhia dos livros, p.93-94.

28. A dor pode afetar o corpo -  e neste caso, é o corpo que deve lidar com ela - ou afetar a alma. Mas a alma pode recusar-se a ser afetada, conservando a sua serenidade e tranquilidade. Todos os nossos impulsos, decisões, desejos e versões residem no nosso interior. Nenhum mal pode atingi-los.

Marco Aurélio, Meditações,  Livro 8, Cultura Editora, A companhia dos livros, p.103.

20/06/18

Benefícios da relação avós-netos



Na semana passada, falámos do importante papel que os avós desempenham na vida dos netos e destes na vida dos avós. Afirmámos que esta interacção tem enormes vantagens para a saúde e qualidade de vida dos avós. Assim é, de facto. Provam-no vários estudos que têm vindo a ser realizados.

Assim, verificou-se que os avós que ajudaram a cuidar dos netos viveram cerca de três anos a mais do que os outros avós. Os autores do estudo acreditam que isto ocorre porque cuidar dos netos dá aos avós um sentido e ajuda-os a manterem-se fisicamente e psicologicamente activos.
Contudo, os autores do estudo alertam para o seguinte: “Ajudar os pais em um nível moderado tem um efeito positivo na saúde dos avós. Contudo, estudos anteriores mostraram que um envolvimento mais intenso dos avós nos cuidados com os netos pode causar stress ter um efeito negativo na saúde física e mental dos avós”.(1)

No site do Hospital dos Lusíadas, em que é tratado este assunto, pode verificar-se que há vários benefícios resultantes da interacção entre avós e netos .
1. Menor risco de depressão para avós e netos
Uma relação próxima entre avós e netos está associada a menor risco de depressão para ambos.
De forma geral, a saúde psicológica de avós e netos é melhor quanto mais apoio emocional recebem uns dos outros; no caso dos avós, é favorecida se esse apoio não impedir que se sintam “funcionalmente independentes” ...
2. Problemas de comportamento atenuados
As crianças que contam com um grande envolvimento dos avós na sua vida têm menos problemas emocionais e comportamentais. O envolvimento dos avós ajuda a atenuar dificuldades de ajustamento em todos os tipos de famílias, mas particularmente quando os netos são adolescentes cujos pais estão divorciados ou separados.
3. Maior agilidade cognitiva
Cuidar dos netos uma vez por semana está associado a um melhor desempenho cognitivo do que não cuidar dos netos ou não ter netos.
Mas atenção… Os investigadores concluíram também que as avós que cuidavam dos netos com mais frequência tinham um desempenho cognitivo pior, possivelmente devido à exigência da função. Em suma, o envolvimento social pode ser positivo, mas há outras variáveis a ter em conta.
4. Sentir-se saudável
Os avós que não cuidam dos netos têm maior probabilidade de dizer que têm pouca saúde do que aqueles que costumam cuidar dos netos, seja de forma intensiva ou não. E o contrário também é verdade: os avós que cuidam dos netos têm maior probabilidade de reportar boa saúde.
Tomar conta dos netos pode ser exigente do ponto de vista físico e emocional, refere o estudo, mas também pode ser recompensador porque permite que avós e netos criem uma relação mais próxima.
5. Aprendizagem mútua
Os avós são um recurso multidimensional para a aprendizagem das crianças. Ao participarem num conjunto alargado de actividades – ler histórias, cozinhar, jardinar, passear no parque – os avós apoiam o desenvolvimento do conhecimento linguístico, cultural e científico das crianças; por sua vez, a interacção com as crianças estimula a aprendizagem dos mais velhos em áreas como as tecnologias da informação e o inglês como segunda língua.
6. Aprendizagem única
Devido às suas características diferenciadoras, a relação que as crianças estabelecem com os avós favorece a aprendizagem, já que cria um contexto que as incentiva a explorar e a correr riscos. Essas características incluem a vulnerabilidade mútua, que cria um maior sentido de igualdade entre adulto e criança, a disponibilidade temporal e a flexibilidade face aos resultados das crianças. Este apoio contínuo e individualizado tenderá a tornar-se mais valioso, numa era em que os pais estão cada vez menos disponíveis e em que o ensino escolar é muito focado em abordagens colectivas.
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(1) Estudo de Envelhecimento de Berlim, em que analisaram a vida de 500 pessoas, entre 70 e 103 anos de idade, que foram acompanhadas durante 19 anos (1990 e 2009). Observaram qual era a diferença na taxa de mortalidade entre os avós que ajudavam a cuidar dos netos, participando da educação deles, e dos avós que não tinham netos ou não conviviam com eles.
(2) Estudo do Instituto do Envelhecimento da Universidade de Boston, com base em dados de famílias dos Estados Unidos da América recolhidos entre 1985 e 2004.
(3) Investigação do Departamento de Política Social e Trabalho Social da Universidade de Oxford que envolveu mais de 1500 crianças do Reino Unido.
(4) Estudo realizado na Universidade de Melbourne (Austrália), que contou com 224 participantes do sexo feminino com uma idade média de 70 anos.
(5) Conclusões do projectos de investigação “Grandparenting in Europe”, baseado em dados de 10 países europeus recolhidos no âmbito de dois grandes estudos.
(6) e (7) Estudo da Universidade de Londres que se focou em crianças dos três aos seis anos de idade a viver na zona este de Londres, umas de famílias com origem no Bangladesh e outras de origem anglo-saxónica.

12/06/18

A relação avós e netos


1. Durante o "decurso da vida" (Charlotte Bühler, A psicologia na vida do nosso tempo (p. 310-312), vão mudando estatutos e papéis que desempenhamos na família e na sociedade. Mais tarde ou mais cedo, seremos avós. Ao adquirirmos este estatuto e desempenharmos este papel, um dos principais objectivos será ajudar os filhos, ajudando os netos. Manter as tradições familiares, passar testemunho das memórias e histórias familiares são também objectivos da interacção de avós e netos.

2.  Na sociedade actual, os avós continuam a ter um papel essencial nesse processo educativo. Certamente que os avós actuais são diferentes dos avós do passado, como os pais actuais são diferentes dos do passado,  e os papéis que desempenham são igualmente diferentes, como é normal que aconteça dadas as mudanças  havidas  na família e sociedade. 
O papel dos avós é hoje ainda mais importante do que no passado, devido às alterações que aconteceram na sociedade e na estrutura da família, como as famílias monoparentais, famílias reconstituídas, e as alterações, algumas difíceis, verificadas na vida familiar: emigração,  prisão,  toxicodependência, incapacidade educativa dos pais ...

3. Essas diferenças sociais e familiares deveriam ter um acompanhamento por parte do sistema social e isso nem sempre acontece(u).
De facto, segundo um estudo de 2014*, “As limitações impostas às prestações sociais pagas aos pais e às mães que ficam em casa a cuidar dos filhos, as poucas oportunidades de trabalhar a tempo parcial e a escassa oferta de estruturas de acolhimento de crianças a preços acessíveis, levam a uma maior dependência das famílias.”
Ao mesmo tempo que os Governos querem manter por mais tempo os mais velhos no mercado, cortam nos apoios e prestações às famílias.  A "ginástica" que os pais têm que fazer para cuidar e educar os filhos  é mais complexa.

4. O apoio dos avós é essencial mas também difícil dado que o cuidado individualizado que é necessário ter é exigente, também para eles. Isto é, cada caso é um caso, e é preciso saber que não há avós em geral mas avós concretos: os avós do João, da Maria, do Francisco...
O apoio dos avós pode assumir aqui muitos significados que vão da ajuda financeira, a ajuda na educação, colmatando as lacunas deixadas pelos sistemas de apoio social. Os avós podem ser alternativa à ama, à creche ou ao "sozinho em casa".

5. Dão-se como adquiridas algumas competências dos avós, embora possa não ser bem assim. Diz-se que a grande vantagem no desempenho deste papel parece ser a disponibilidade. Não sei se alguma vez foi assim, mas muitos avós, depois da reforma, continuam a ter actividades suficientes para lhes ocuparem o tempo, tendo em conta a diversidade da oferta de actividades que existem actualmente. Hoje os avós têm uma  disponibilidade voluntária - é uma opção e uma principal prioridade. O tempo disponível dos avós não cai então do céu só porque  os avós estão reformados.

6. Também se afirma que  há como que uma autoridade natural que não precisa de se impor... e que vem da sua sabedoria, experiência, tranquilidade ou talvez apenas dos seus cabelos bancos, isto é, idade e autoridade seriam coincidentes.  Também não sei se foi ou é assim. Não é fácil lidar com os netos, tão diferentes uns dos outros, mas a responsabilidade é a mesma, o mesmo amor. Com a preocupação de dar uma particular atenção ao desenvolvimento individual.

7. Podem surgir várias dificuldades quando os avós têm este papel:
- A coabitação com o casal e netos pode ser fonte de conflitos;
- A interferência excessiva no papel dos pais e substituir-se a eles;
- A facilidade com que podem cair no laissez-faire: pouco preocupados com a criação de hábitos: na higiene, na  alimentação, na criação de regras, o uso em excesso do reforço positivo, embora muitas vezes se trate apenas de um velho cliché.

8. Também é verdade que a interferência excessiva no papel dos avós, desvalorizando ou desclassificando a sua acção, origina dificuldades nos relacionamentos,  insegurança, sentimento de incompreensão...

9. O problema da terceirização da educação dos filhos pelos avós, por outros familiares, pelas empregadas, é bem real nos tempos que correm. Há crianças que podem passar a semana, os tempos livres, as férias, sem terem contacto com os pais e isso pode tornar-se um problema. Digo pode porque também, nesta situação, cada caso é um caso. Sempre houve crianças que ficaram longe dos pais durante longos períodos, de escolaridade, por ex., devido a emigração ou outro motivo de separação. Provavelmente, o que mudou foi a dimensão do fenómeno.

10. De resto, cuidar dos netos é uma tarefa particularmente gratificante. A forma como nos aceitam, inocentemente,  como nos interpelam, como nos fazem ver a vida com outros olhos e com outra esperança, mesmo quando já temos algumas dificuldades, vale todo o cuidado que lhes dedicamos. Voltar a ser criança, brincar, ver o mundo com os olhos deles  é altamente compensador.
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* Estudo da Fundação Gulbenkian traçou o perfil dos avós em doze países da Europa  - reportagem da TVI24, 2014-09-20, Qual o papel dos avós nos dias de hoje?