16/07/14

Gratidão




Ontem, foi o primeiro dia em que, efectivamente, não fui trabalhar. Todos os dias são dias de estarmos gratos. Mas este foi um dia especial de estar grato a todos aqueles que passaram pela minha vida profissional e a quem devo agradecer todo o bem que me fizeram. Foram pessoas extraordinárias. 
Para Antístenes, "a gratidão é a memória do coração." Há, no meu, um espaço para cada uma delas.

10/07/14

Mudança


"Mudar a nossa relação com os outros: impedir que ideologias gastas separem os homens uns dos outros; assegurar os níveis de rigor técnico e de solidariedade humana que são imperativos; garantir que em cada circunstância a nossa vida possa identificar o próximo. E assim:
- converter a política e a organização social em harmonização da convivência e do diálogo;
- denunciar a relação de forças como perversão da procura do próximo;
- estimular a participação no exercício de qualquer tipo de poder não para controlar pessoas ou acontecimentos mas para realizar objectivos."

Maria de Lourdes Pintasilgo, Dimensões da mudança, 1985

09/07/14

Para lembrar...

Terra


José Delgado Domingos, ex-professor catedrático do Instituto Superior Técnico (IST) e figura de referência na área do ambiente. Faleceu aos 79 anos.
O pensamento de Delgado Domingos interessa pelas suas posições relativas à crise energética mas também pelas suas posições corajosas contra o messianismo.
Desde logo contra o messianismo climático. Em artigo de opinião recente alertava exactamente as  proclamações que relacionam as alterações climáticas e as emissões de CO2.
Tem havido toda a espécie de grupos de interesses ligados a esta questão que “que atacam os que põem em causa as suas conclusões ou a pertinência das suas medidas, como sendo anticiência ao serviço das petrolíferas, das multinacionais do carvão, ou de interesses obscuros."

Põe em causa a cumplicidade entre os yes men e os governos: "Em nome de riscos incertos no futuro, fugiu-se aos problemas conhecidos e bem documentados do presente. Questões prementes quanto à sustentabilidade de recursos finitos, de justiça social e de alterações climáticas locais foram ignoradas ou subalternizadas, esbanjando recursos escassos que poderiam ter sido utilizados para os minimizar."

Tem uma visão dos desastres climáticos diferente do mainstream: os furacões Katrina ou Sandy… ou os "que resultam de ondas de calor e de frio têm pouco ou nada que ver com emissões de CO2, mas sim com a criminosa imprevidência que a ganância ou a ignorância provocam.
Invocar tais desastres como efeito de emissões de CO2, apenas serve para impedir a clara identificação e responsabilização dos verdadeiros responsáveis."

Critica a teoria de Keynes, que alguns agora voltam a achar que é a solução para a economia. Tal filosofia é, porém, o cerne ... que conduziu a esta situação.

E há alternativas “se quisermos ir à raiz dos problemas”.

Mas não queremos dar-nos a esse trabalho e é por isso que os fundamentalismos surgem em sítios onde pouco esperamos e as guerras não deixam de fazer parte dos noticiários.
É espantoso como, por cá, voltou o messianismo. E aceita-se isto como um fatalismo Temos um salvador. Um homem que tem estofo de ganhador e capaz de resolver os "nossos" problemas. É preciso que fique à frente dos nossos destinos. Como se as alternativas tivessem acabado. 
Como se não houvesse coligações, acordos governamentais noutros países que funcionam... Para os salvadores messiânicos tudo depende de um homem desde que ganhe por uma maioria absoluta.
E já se sente o cheiro, à distância, da despesa que aí vem. Para já, é só pedir: sai um ministério da cultura ali para os 600 cultos do país. Sai uma regionalização ali para os bons burocratas que não a esqueceram.
O serviço nacional de saúde deixará de ter problemas e o estado social dará a todos aquilo que eles necessitam.
Mas … há sempre um mas. A democracia está mais crescida graças ao contributo de pessoas como Delgado Domingos.

Por isso, muitos de nós não fazem parte deste contexto messiânico. Não! Al Gore não sou eu e tu! Mas é verdade que há verdades inconvenientes.

07/07/14

Para lembrar...


"O messianismo climático colocou na agenda política as alterações climáticas devidas à utilização de combustíveis fósseis e à desflorestação. Criou de caminho um mercado de biliões de euros para algumas empresas, de generosos financiamentos para grupos de investigação e departamentos universitários em risco de desaparecimento, bem como muitas ONGs. Gerou assim uma legião de seguidores e de grupos de interesses, que atacam os que põem em causa as suas conclusões ou a pertinência das suas medidas, como sendo anticiência ao serviço das petrolíferas, das multinacionais do carvão, ou de interesses obscuros.
A credibilidade dos argumentos deixou assim de ser avaliada pelo seu valor intrínseco mas pelos interesses atribuídos ao financiador, esquecendo que os Governos são os maiores financiadores e que a maioria dos cientistas críticos não é financiada por ninguém.
Como resultados concretos, o que ressalta é não ter havido qualquer alteração na trajectória das emissões de CO2 que possa ser atribuída às campanhas desencadeadas e às medidas tomadas. Em nome de riscos incertos no futuro, fugiu-se aos problemas conhecidos e bem documentados do presente. Questões prementes quanto à sustentabilidade de recursos finitos, de justiça social e de alterações climáticas locais foram ignoradas ou subalternizadas, esbanjando recursos escassos que poderiam ter sido utilizados para os minimizar.
Os desastres climáticos locais, de que os furacões Katrina ou Sandy são exemplo, tal como as catastróficas cheias de Lisboa em 1967, das chuvas e deslizamentos de terras na Madeira e no Rio de janeiro, ou as que resultam de ondas de calor e de frio têm pouco ou nada que ver com emissões de CO2, mas sim com a criminosa imprevidência que a ganância ou a ignorância provocam. Invocar tais desastres como efeito de emissões de CO2, apenas serve para impedir a clara identificação e responsabilização dos verdadeiros responsáveis.
O progresso científico na previsão meteorológica permitiu reduzir significativamente o número de mortos em muitos dos conhecidos desastres climáticos, devido a avisos atempados e evacuações planeadas. Todavia, em vez de se investir na melhoria das previsões e avisos meteorológicos investe-se muito, muito mais, na elaboração de simulações de futuros tão distantes que nenhum dos seus autores ainda estará disponível para prestação de contas quando tal futuro chegar..."


"A Economia corrente trata os recursos naturais não renováveis como um rendimento, quando eles são na verdade um capital, um património. Uma empresa que venda o património e considere essa receita
como valor de produção. ..vai à falência. É este o absurdo em que labora a ordem económica vigente, com a diferença que a empresa em questão é a vida sobre a Terra. A falência não significa desemprego, significa
morte!
Em 1930, Keynes escrevia: «Durante pelo menos outros cem anos, devemos proceder face a nós próprios e a todos os outros, como se o justo fosse infame e o infame fosse justo; pois o infame é útil e o justo
não o é...). Avareza, usura, astúcia, devem continuar a ser os nossos deuses, ainda por muito tempo.
O Mundo actual mostra a que conduziu tal filosofia. Tal filosofia é, porém, o cerne mesmo da ordem económica e social vigente e continua a ser o princípio inspirador para a resolução da crise!
Não haverá alternativa a tal atitude, a tal fatalismo, que em nome do Homem estimula no Homem o que ele tem de pior: o egoísmo, a inveja, a crueldade, a competição pela competição? Levou tal atitude à prosperidade universal com que se pretendia justificá-la? Não levou, nem podia levar. Alternativas? Claro que há alternativas, se quisermos ir à raiz dos problemas. Elas decorrem limpidamente do que anteriormente se expôs. Resta saber se temos a coragem para as enfrentar. Quanto mais tardarmos, menos possibilidades restam para os nossos filhos. Se lhes não legarmos mais que a alternativa entre o suicídio e a mudança violenta e radical, eles escolherão esta: o seu próprio instinto biológico de sobrevivência a isso os levará. A menos que a espécie humana tenha perdido o instinto de sobrevivência: nesse caso desaparecerá, pelas suas próprias mãos.
Em Portugal, estamos no período crítico das opções definitivas.
É essa a nossa terrível, mas aliciante responsabilidade histórica. Preocupamo-nos mesmo com nossos irmãos e nossos filhos? Ou, em nome deles, está afinal cada um, egoisticamente, a pensar apenas em si próprio e na sua comodidade imediata ?
Em Maio de 1968, em Paris, alguém escreveu numa parede: «as paredes têm ouvidos e os ouvidos têm paredes». As nossas paredes tiveram ouvidos durante longos anos. Será por isso que muitos querem agora nos ouvidos erguer muros e nos olhos pôr antolhos?" (Inteligência ou subserviência nacional ?, 1978, pag. 87-88).

   

02/07/14

A sede de poder




Há pessoas que vivem para obter o poder e uma vez obtido guardam-no a qualquer preço; muitas vezes fazem-no em forma de sucessão mesmo quando se dizem republicanas.
Numa perspectiva psicanalítica há aqueles que aspiram desde crianças a ser dirigentes e os que não tem consciência desta aspiração. 
Desde muito cedo se faz esta distinção. O recém-nascido é naturalmente narcisista e megalómano, sente-se o centro do mundo. Enfrenta a vida pelo choro e gritos que é o meio de se fazer ouvir mas à medida que cresce, vai, sob pressão da realidade, aprender a recalcar estes desejos todos poderosos e aprender a aceitar obedecer.
No entanto, alguns indivíduos não chegam a este princípio da realidade. Não crescem.
Durante a sua educação na infância, encontram o motor da sua corrida ao poder: da relação com a mãe aprendem uma confiança e segurança que engrandece o seu narcisismo e da relação com o pai uma vontade megalomaníaca de provar do que são capazes.
Jean-Pierre Friedman diz que as pessoas do poder apresenta um certo número de pontos comuns durante a infância: uma figura maternal protectora, adorável, uma figura paterna muito distante ou ausente. 
Tornam-se adolescentes e adultos muitas vezes brilhantes que vão canalizar toda a sua inteligência e energia apenas para um objectivo: dominar, ter uma parcela de poder, ou, simplesmente, todo o poder.
Esta sede de poder pode ocupar toda a vida mesmo que seja necessário sacrificar muito para se aproximar ou chegar a este objectivo. É colocar a mão numa espécie de engrenagem na qual o poder age como uma droga: quanto mais se gosta mais se quer.
Até ao ponto de não se poder passar sem ele.
É o caso de políticos que acumulando derrotas e travessias do deserto persistem no seu « poder de sofá » e nunca se reformam. Porque para eles o poder simboliza a longevidade da vida, brilha como um símbolo da eternidade. Acabam por confundir a sua existência com a sua função.
Não vale a pena pensar que isto acontece só aos outros.
Há pessoas que por acaso da vida podem ver-se investidas de poder porque estes desejos arcaicos não desapareceram totalmente. E ninguém está ao abrigo de possíveis derivas que emanam do exercício do poder.
Uma segunda característica dos detentores de poder é que eles identificam o poder com a vida. O poder é um símbolo de eternidade. É isto que querem manter a qualquer preço: não podem aceitar a ideia de morte nem a ideia de que o mundo lhes sobreviva. 
Agem como crianças persuadidos de que o mundo lhes obedece. A visão do poder destas pessoas é antes de tudo uma prova de imaturidade.
No entanto, os candidatos ao poder fazem fila para poderem vir a conquistar o poder. É que a conquista do poder em período eleitoral é uma ocasião extraordinária de viverem o seu narcisismo. Durante alguns meses vai-se falar deles.
Mas apenas têm uma convicção: chegar ao poder. Para ficarem com boa consciência escolhem causas. 
E acabam por se identificar com as causas que escolhem. Certamente escolhem as causas em que acreditam mas à medida que progridem nas suas conquistas do poder, as suas convicções passam para segundo plano. No final, não é a convicção que conta mas a vitória.
Pode haver homens de poder ideais se, por um processo de sublimação, pudessem saciar o seu narcisismo e a sua megalomania para o bem da humanidade. Só que a história mostra que há raras excepções e que o poder leva forçosamente ao desejo de abusar.
Donde a superioridade do regime democrático fundado sobre o desafio de limitar o poder.
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Condensado e adaptado das entrevistas a Jean-Pierre Friedman, realizadas por Anne-Laure Gannac e Laurence Ravier (Psychologies)