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19/08/25

Florescer


Peggy Lee -  É só isso ? (Is that all there is?)


"Is that all there is?", música interpretada por Peggy Lee, descreve alguns eventos da vida, positivos e negativos: um incêndio presenciado na infância, o encantamento do circo e a experiência sem sucesso de um relacionamento amoroso. Seja qual for a situação, resulta sempre insatisfação e desilusão, algo está  sempre em falta. Que mais tem a vida para oferecer? Na festa e na desgraça, é só isso ? Na alegria e na tristeza, é só isso?
O tema é glosado de diferentes maneiras, como em "Estou além" (António Variações): “Esta insatisfação / Não consigo compreender / Sempre esta sensação / Que estou a perder”. Ou, mesmo quando "o homem do leme" enfrenta o destino com coragem para ultrapassar as dificuldades, "a vida é sempre a perder" (Xutos e Pontapés - "O homem do leme").

A "síndroma Peggy Lee" parece abranger muita gente para quem tudo é insatisfatório. De facto, em tempos de tédio, insatisfação permanente e vitimização imperiosa, não há mais nada para viver? Perante guerras tão miseráveis quanto cínicas não é caso para perguntar: a guerra é só isso? 
Ou mesmo quando em tempos mais pacíficos, a nossa luta interior, não nos deixa sossegados, a vida é só isso?

Os mais novos parece serem mais afectados por esta condição: como refere Pedro  Strecht.
"- Podia explicar o que quer dizer com a descrição da sensação: "estou mal, porque estou bem"? 
- Porque estar bem, para muitos pais e filhos, parece ser sempre insuficiente. Quando nos esquecemos que, em várias ocasiões, "menos é mais", somos facilmente levados a um padrão de constante sensação de falha ou falta porque, mesmo que já se tenha "tudo", parece sempre que "nada" chega. (Entrevista a Vanda Marques, "Pedro Strecht: Nunca existiram tantas crianças e adolescentes a sentirem-se sós", Sábado, 13 de Julho)

Temos alguns momentos, breves ou persistentes, de melancolia, passamos por momentos de tristeza e apatia que podem ser uma reação emocional normal a perdas, decepções ou situações difíceis da vida. A melancolia persistente por longos períodos é como a depressão e possui os mesmos sintomas: a pessoa não se interessa por nada ao seu redor, nenhum acontecimento traz prazer ou alegria e a vida deixa de ter interesse.

Também existe relação com o luto. "Contudo, a melancolia contém algo mais que o luto normal. Na melancolia, a relação com o objeto não é simples; ela é complicada pelo conflito devido a uma ambivalência. Esta ou é constitucional, isto é, um elemento de toda relação amorosa formada por esse ego particular, ou provém precisamente daquelas experiências que envolveram a ameaça da perda do objeto. Por esse motivo, as causas excitantes da melancolia têm uma amplitude muito maior do que as do luto, que é, na maioria das vezes, ocasionado por uma perda real do objeto, por sua morte. Na melancolia, em consequência, travam-se inúmeras lutas isoladas em torno do objeto, nas quais o ódio e o amor se digladiam; um procura separar a libido do objeto, o outro, defender essa posição da libido contra o assédio." ( Freud, Luto e melancolia)

Também, em Psicologia, falamos de alexitimia (palavra de origem grega: a-falta de, sem; lexis-palavra; thymus-emoção ou ânimo), utilizada pela primeira vez por Peter Sifneos, em 1967. A alexitimia é um construto que "designa a falta de palavras para descrever as emoções. Afetivamente conduz a uma grande dificuldade em reconhecer, descrever e discriminar sentimentos e emoções. Cognitivamente, há um estilo de pensamento muito particular, virado para o concreto e para o exterior e relacionalmente, há relações úteis, pragmáticas e superficiais. Existe uma incapacidade em perceber o outro com uma individualidade própria, os seus sentimentos, havendo portanto uma reduzida empatia e compreensão." (S. Pereira, Alexitimia, ITAD)

"Is That All There Is?" coloca a questão fundamental sobre o que é a vida e como podemos responder.
Os paraísos artificiais que invariavelmente levam ao meio do nada ou, definitivamente, a  lado nenhum, podem parecer que é por aí que encontramos resposta para a insatisfação e infelicidade mas, como neste caso, depressa se percebe "que tinha parado de ter qualquer esperança, sonhos ou objectivos. Chamei isso de meu momento Peggy Lee".  Então a droga é só isso?

Assim sendo, "Eu sei o que devem estar dizendo a si mesmos: Se é assim que ela se sente, por que ela simplesmente não acaba com tudo?
- Ah, não, não eu, eu não estou pronta para essa decepção final. Porque eu sei tão bem quanto estou aqui falando com você que quando esse momento final chegar e eu estiver dando meu último suspiro, estarei dizendo a mim mesma:
É só isso, é só isso?
Se é só isso, meus amigos, então continuemos dançando.
Vamos beber  e divertir-nos.
Se é só isso."

Não é só isso. Não pode  ser só isso: viver por viver. Podemos sempre superar as dificuldades, superar o trauma. Podemos, sempre, ser resilientes e prosperar, se quisermos. Podemos fazer o caminho da psicoterapia, o caminho do florescimento,  o caminho da espiritualidade e, se é pessoa de alguma fé, o caminho da ressurreição.

A falta de um propósito para a vida parece fundamentar esta falta de interesse pela vida. logoterapia (Victor Frankl), diz-nos que a vida tem um sentido e, se assim é,  pode se ser o começo da psicoterapia/cura.
M. Seligman criou o modelo de florescimento constituído pelos seguintes elementos: emoção positiva, envolvimento, relações,  significado, realização pessoal (PERMA).
Florescer permite uma cultura de cuidado, do próprio e do outro, fazendo o mundo mais bonito por dentro, e, ao  cuidar da natureza, fazendo o mundo mais bonito por fora. A beleza vem da escolha: podemos escolher entre a "vida vazia" ou "a vida plena". Como diz Epicteto, "Não és o teu corpo nem o teu penteado, mas sim a tua capacidade de escolher bem. Se as tuas escolhas forem belas, então serás belo". (Ryan Holiday e Stephen Hanselman, Estoico todos os dias, p. 110)
"A vida vale a pena ser vivida", mesmo contra "os pensamentos catastróficos automáticos" (Seligman, p. 65) e "Todos podemos dizer sim a mais bem-estar" (p. 257). 
Florescer é, afinal, encontrar o bem-estar na vida, como é definido por Seligman. E isso está a acontecer em muitos países. Nuns mais do que noutros. Felicia Huppert e Timothy So, da Universidade de Cambridge, definiram e avaliaram o florescimento em  23 países da União Europeia (2009). A Dinamarca liderava o ranking com 33% da população florescendo. E Portugal estava em penúltimo lugar com  cerca de 7%. (pp. 41-43 e 254-257) 

No início de Agosto, mês de férias, e, portanto, mês de sair da azáfama quotidiana de procura incessante das riquezas - vaidade - a primeira leitura, na liturgia de domingo, apresenta um texto lindíssimo do Eclesiastes: vaidade das vaidades tudo é vaidade. 
Salomão (Eclesiastes), suposto autor, desiludido e amargurado depois de uma vida de glórias e prazeres, constata a inutilidade de todos os esforços do homem e conclui que tudo na vida é “vaidade” ou “ilusão”.
Então, onde procurar o bem-estar? Se tudo é vaidade, tem de ser noutro lugar para que tudo faça sentido.

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As referências são de M. Seligman, A vida que floresce, estrelapolar/Leya, 2011.

26/06/25

Olá, solidão!





À medida que vou envelhecendo tenho mais necessidade de estar acompanhado, compreendo melhor a necessidade de estar com os outros e fico ansioso quando sinto que estou só, mesmo que isso signifique apenas isolamento social e não solidão não desejada.
De facto, estar rodeado de gente não resolve os sentimentos de solidão. Como o contrário, viver sozinho não é sempre sinónimo de sentir solidão. 
Refiro-me à solidão que faz mal à saúde.

Segundo V. Murthy, referido por Isabel Sánchez, a solidão “alastra como uma epidemia”, uma "epidemia oculta”, como foi referido no Reino Unido que criou o Ministério da solidão. (1)
Isabel Sánchez em A Cultura do Cuidado refere que “A solidão é um problema de saúde pública. E não é por acaso que foi integrada pelos governos de alguns países nas respectivas agendas de trabalho (2); a solidão está na origem e é um agente promotor das grandes epidemias do mundo atual, desde o alcoolismo e a dependência de drogas até à violência, à depressão e à ansiedade”.
“Mas a solidão não afeta apenas a saúde; afeta igualmente, o comportamento das crianças na escola, o nosso rendimento no trabalho, bem como o sentimento de divisão e polarização que domina sociedade.” (p. 134)
“... O que está presente no fundo da nossa solidão é o desejo inato de nos relacionarmos com os outros, porque o ser humano é uma criatura social...” (p.135)

Sabemos bem a importância da relação social para o desenvolvimento da criança; conhecemos as experiências de carência de contacto, carência de afeto e vinculação em que certas crianças ficaram e quanto isso perturbou o seu desenvolvimento.
Sabemos da importância que a necessidade do outro tem no grupo de adolescentes; enquanto adultos a importância do outro no trabalho ou, quando na velhice, precisamos de alguém que nos ajude em tarefas essenciais das actividades da vida diária que nós já não somos capazes de fazer.

A solidão “é um dos males do nosso tempo, uma pandemia do presente, que provoca mais mortos que a poluição ambiental, a obesidade e o alcoolismo... o isolamento afeta a qualidade do sono e faz aumentar os sintomas depressivos e os níveis matinais de cortisol que é a hormona do stress”... (Facundo Manes, referido por I. Sánchez, p.135)

Também em Portugal vivemos esta realidade. Um estudo com mais de 1200 pessoas entre os 50 e os 101 anos, concluiu que: 
- as mulheres (20,4%) sofrem mais de solidão do que os homens (7,3%).
- as pessoas com menor escolaridade apresentam mais solidão (25,8%).
- o sentimento de solidão aumenta com a idade: 9,9% dos 50-64 anos; 26,8% com 85 anos ou mais.
- é mais frequente nas pessoas viúvas (30,6%) e nas pessoas solteiras (15,8%) do que em pessoas casadas (9,2%).

As férias que estão a chegar são uma excelente oportunidade para novos contactos sociais ou para renovar contactos sociais que, eventualmente, estavam perdidos, desde logo dentro da nossa família, com os nossos filhos ou com amigos que não víamos há muito tempo. É um tempo em que podemos refazer relações sociais que nos devolvam a alegria de viver. 


Desejo a todos umas boas férias.



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(1) Marta Rebelo, "Precisamos de um Ministério da Solidão?" Visão, 10.03.2021 ;  "Há países que já têm um Ministério da Solidão. E Portugal?" Agência Lusa , CM.

(2) No nosso país foi aprovado o Plano Nacional de envelhecimento activo (Resolução do Conselho de Ministros nº 14/2024, de 12-1 )




Rádio Castelo Branco






20/06/25

“Mal-estar na civilização”


Ouvimos dizer que o mundo está polarizado. Mais do que isso: o mundo está em guerra e assistimos a atrocidades inimagináveis.
Este século começou mal, com um ataque violento aos Estados Unidos em que foram derrubadas as torres gémeas com cerca de 3000 pessoas mortas (2.977, além dos 19 sequestradores dos aviões). O 11 de Setembro é considerado o ataque com o maior número de mortos da história. Além disso, foi uma tragédia que mudou, em vários aspectos, os rumos do mundo.
Depois veio a pandemia cujos resultados, como estamos agora a constatar, não deixaram tudo bem, antes pelo contrário.
Vivemos, pelas paredes-meias da comunicação social, com a guerra da Ucrânia-Rússia, Israel-Gaza-Irão.

Vivemos “o mesmo mal-estar de que Freud nos falava no início do século XX, no texto O mal-estar na civilização, “em que apresenta uma visão pessimista da relação entre o eu e o outro. É uma visão decorrente de uma leitura que centra a reflexão em torno do conceito de narcisismo; ou seja, tomando como ponto de partida os apelos e desejos narcísicos do eu, o outro aparecerá como um obstáculo. (1) 

O ambiente está, de facto, polarizado e irrespirável. A saúde mental foi afectada de forma particularmente sensível.
Claro que as pessoas são afectadas de forma diferente. Há pessoas que são mais afectados do que outras. Ou seja, em que as vulnerabilidades pessoais são mais relevantes do que as potencialidades.

Deste desequilíbrio surge, então, a doença mental.
"Se definirmos a doença mental como uma perda de controle sobre a mente poucos de nós podem garantir estar livres de algum tipo de mal-estar."
“Quando ficamos doentes perdemos o controle sobre os nossos melhores pensamentos e sentimentos. Uma mente que não está bem não consegue aplicar um filtro à informação que chega à consciência; já não consegue ordenar e sequenciar o seu conteúdo. E a partir daqui, sucede-se uma panóplia de cenários dolorosos:
- A nossa consciência é continuamente invadida por ideias despropositadas, como vozes inclementes que ecoam sem parar...
- Somos incapazes de nos reconciliarmos com quem somos.Todas as coisas más que alguma vez dissemos ou fizemos reverberam e ferem nossa auto-estima...
- Não conseguimos moderar a nossa tristeza. Não conseguimos ultrapassar a ideia de que não fomos realmente amados, que fizemos da nossa vida adulta uma bagunça que desapontamos todas as pessoas que alguma vez tenham tido um pingo de esperança em nós...
- Todos os compartimentos da nossa mente estão escancarados. Os pensamentos mais estranhos, mais extremos, correm descontrolados pela nossa consciência. Começamos a temer que possamos gritar obscenidades em público...
- Nos casos mais graves perdemos o poder para distinguir a realidade exterior do nosso mundo interior...
- Á noite... ficamos indefesos perante as nossas piores preocupações... (2)

Mas a vida é assim. A verdadeira saúde mental, diz-nos Alain de Botton, envolve uma aceitação honesta de que, mesmo nas vidas mais competentes e significativas, haverá sempre algum grau de sofrimento e dificuldades...


Até para a semana.


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(2) Alain de Botton, Uma viagem terapêutica, D. Quixote, p. 16-19.




Rádio Castelo Branco




29/05/25

Vitórias e derrotas


No futebol como na política, no (nosso) clube ou no (nosso) partido, tem que se conseguir a vitória a todo o custo e a derrota não pode existir. 
Em todos os jogos da nossa vida, no jogo familiar, sindical, interpessoal, transformamos cada vitória ou derrota num assunto tão fundamental que reagimos com emoção de forma desproporcionada, ou arranjamos maneiras de enviesar e alterar a realidade do fracasso.

Porque é tao dificil assumir a derrota? Já nos habituámos a ver, nas noites eleitorais, transformar derrotas em vitórias. Há quem nunca perca e seja incapaz de ver a realidade. Assistimos muitas vezes a episódios de quem não sabe perder e até tem mau perder. 
E o que é mais espantoso: porque não se sabe ganhar? Por que é que nas vitórias tem que haver vingança e manifestações violentas ?

Experiências positivas e negativas, vitórias e derrotas afetam o cérebro de maneiras diferentes.  (Veja o que acontece no cérebro na vitória e na derrota)
Na vitória, o cérebro liberta substâncias químicas, principalmente dopamina, que é frequentemente associada ao prazer e à recompensa. Cria uma sensação de euforia e satisfação, que incentiva a repetir comportamentos que levam ao sucesso. 

Por outro lado, numa derrota, o cérebro liberta dopamina em níveis muito menores. Em vez disso, outras áreas do cérebro, como a amígdala, que está associada às emoções e ao processamento do medo, tornam-se mais activas. Isso pode levar a sentimentos de frustração, tristeza ou, até mesmo, raiva.

A maneira como a mente interpreta uma derrota pode influenciar a resposta do cérebro. "Pessoas que vêem a derrota como uma oportunidade para aprender tendem a recuperar mais rapidamente e a serem mais resilientes. Isso sugere que a mentalidade desempenha um papel crucial na forma como o cérebro processa falhas e sucessos".

Na experiência de M. Seligman sobre o fracasso aprendido sabemos que podemos ser ainda mais prejudicados, a ponto de nos deprimirmos: nunca ganho, tudo corre sempre mal, perdido por cem perdido por mil...

Psychologies
Por outro lado, sabemos que cada fracasso pode ser um progresso para o sucesso. Mais do que lamentar-nos dos fracassos, é preciso celebrá-los como etapas cruciais do nosso percurso. Cada fracasso é uma lição, cada decepção é uma oportunidade de crescimento. Devemos aceitar os desafios, porque eles são o que nos torna mais fortes e nos impulsiona. Por isso, não devemos ficar presos em pensamentos negativos. Cada dia oferece uma nova chance de nos reinventarmos e construir um futuro mais positivo.

Eduardo Sá em "As derrotas das vitórias", refere: “O que custa numa noite de eleições é que muitos dos que concorrem nunca percam. Mesmo quando perdem. Na verdade, desistem de se confiar às suas derrotas e de crescer com elas. E demonstram, nesse momento, que se desencontraram da humildade de reconhecer a dor.”

Para concluir, podemos dizer que é derrotado quem não sabe perder mas é igualmente derrotado quem não sabe ganhar mesmo que a evidência seja menos óbvia.


Até para a semana.





Rádio Castelo Branco





02/04/25

Histórico e ressentimento


Tudo o que fazemos, dizemos ou sentimos fica guardado na memória. E logo que isso acontece começa a haver história. 
Porém, sabemos que não há memória sem esquecimento como também sabemos que a memória nos engana e aquilo que pensamos ser um facto vivenciado por nós em determinadas circunstâncias objectivas, pode não ser bem assim. 

Seja como for, há um conjunto de memórias onde ficam guardados acontecimentos da nossa vida que constituem o "histórico" dessa mesma vida, a memória autobiográfica.
Esse histórico é fundamental para nos situarmos no mundo e faz parte da experiência que temos do comportamento de ir juntando acontecimentos, factos, pequenas e grandes coisas que vão ganhando ou perdendo importância e quando vistas no contexto podem ser amplificadas ou simplificadas... até nos dar jeito. 

O histórico tem um lado positivo quando ele nos serve para vermos a realidade tal como ela é, os factos e como aconteceram, e tem um lado negativo quando nos serve para justificarmos o nosso ressentimento. *
O que vem depois é o efeito gota de água que faz transbordar o copo. E infelizmente, há sempre uma gota de água que vem a calhar, quando nos dá jeito, para podermos justificar o nosso comportamento. 
Quando achamos uma oportunidade lá vamos nós buscar o histórico, o nosso ressentimento: no dia tantos fizeste-me isto, fizeste aquilo...
E sai todo um relatório de “deve e haver” em relação à nossa vida e à relação com quem naquele momento é fonte da nossa frustração e objecto da nossa raiva.

Esta interligação está muitas vezes na origem do ressentimento que existe entre pessoas, num casal, na família, no trabalho, nas instituições sociais e políticas.
Hoje o ressentimento está presente em muitas situações e visões da sociedade.
Há cada vez mais indivíduos ressentidas: vitimizados, ofendidos, magoados, ressabiados e melindrados...

Nós não somos computadores e não podemos apagar o nosso  histórico como fazemos ao nosso hardware. A nossa memória apaga alguns acontecimentos mas outros ficam presentes, ou são alterados fazendo com que demos interpretações dos factos que não correspondem à realidade.
Podemos passar por esses eventos e nunca mais pensar neles. Mas podemos também desenvolver o ressentimento. 

“O ressentimento pode fazer mal às nossas relações e ocasionar um conjunto de emoções negativas.” (Louise Leboyer, "Ces comportements cultivent votre ressentiment envers les autres au quotidien", Psychologies, 24 março 2025 )
“As pessoas guardam muito os seus ressentimentos porque se baseiam no profundo sentimento de terem sido injustiçadas.
Além do impacto nos nossos relacionamentos, o ressentimento causa mais danos à pessoa que o sente do que à pessoa a quem é dirigido. 
É por isso que é melhor tentar evitar cair neste ciclo negativo.“
Podemos evitar (Susanne Wolf) alguns comportamentos envolvidos na comunicação que podem ser fonte de ressentimento.
Por isso, uma comunicação saudável é uma boa prevenção: Estabelecer limites claros; evitar a manipulação ou relações interesseiras; ser coerente entre palavras e actos, valores e crenças; saber escutar... 



Até para a semana. 



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* "O ressentimento descreve uma reação emocional negativa quando se é maltratado. Não existe uma causa única para o ressentimento, mas a maioria dos casos envolve uma sensação subjacente de ser maltratado ou injustiçado por outra pessoa. Experimentar frustração e decepção é uma parte normal da vida. Quando os sentimentos se tornam muito opressores, podem levar ao ressentimento. Quando isso acontece, a confiança e o amor nos relacionamentos são quebrados e às vezes nunca reparados."  (Signs of Resentment - Web MD)




Rádio Castelo Branco










21/03/25

Por que os idosos não querem ir para um lar ?



Com algumas excepções, é o que acontece. Esta é, pelo menos, a minha experiência. A resposta dos idosos quando questionados sobre o local para onde gostariam de ir quando forem velhos é quase invariavelmente :"para um lar não".

Um conjunto de razões pode motivar tal decisão.

- Não querem perder o resto de independência e autonomia que ainda têm e não querem controlo externo para o que fazem: refeições, tempos livres, para fazer seja o que for...
- Não querem perder os vínculos afectivos que ainda existem e que de algum modo se irão perder com a entrada num lar.
- Não querem ser indiferenciados no meio de outros, com igual ou pior situação do que a deles, tornando o ambiente pesado, triste, deprimente, 
- Não querem pensar nas várias violências que são cometidas contra os idosos, que vão da infantilização, aos raspanetes por coisas sem importância, pela dificuldade em memorizar aquilo que esquecem rapidamente, por coisas que já não conseguem fazer...
- Não querem estar sujeitos a técnicos e auxiliares que não têm qualquer vocação e respeito para com os idosos.
- Não querem ser votados ao abandono principalmente pelos familiares que os despejam nos lares e deixam de os visitar.
- Não querem que lhes aconteça como a familiares, amigos e conhecidos que faleceram pouco tempo depois de terem entrado para o lar.
- Não querem perder algumas referências espaciais e afectivas importantes, como perder os amigos, as pessoas próximas e perder as rotinas que eram feitas em determinados espaços e contextos afectivos.
- Não querem pensar que o fim está próximo e “atirar a toalha ao chão”, ou seja, pensar que já se é demasiado velho.

Ora tudo isto é o contrário do que deve ser feito. Se o SNC tem plasticidade (neuroplasticidade), tem que se procurar o que faz sentido para cada um de nós.
Se me sentir acompanhado, querido pelos outros, tiver amigos... tudo isso vai influenciar e regular o sistema nervoso e manter-me mais saudável.
Estes sentimentos, como o afecto e a amizade, são fundamentais, reduzem os medos e afastam a solidão...

Não quero ter uma ideia estereotipada dos lares, generalizando sobre o que se conhece. E o que se conhece não é bom.
Claro que há excepções . Claro que há lares melhores que outros.
Claro que há técnicos competentes em todos as estruturas, sejam IPSS ou Privados, com preços acessíveis ou preços impossíveis...

Manuel Lemos, da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), em 2023, defendia “um novo paradigma, assente no apoio domiciliário”, e reconhecia “que são necessárias mais estruturas para idosos, face à longevidade, mas também outro tipo de oferta.” ( "Lares para idosos têm de evoluir e mudar de padrão" Lusa, DN31-5-2023)
Hoje o nível de escolaridade é superior, muitos idosos já são capazes de utilizar meios digitais, têm interesses diferentes...
Para Manuel Lemos, "mesmo nos lares que existem hoje, temos de encontrar uma nova forma de cuidar dos idosos”...



Até para a semana.


Rádio Castelo Branco



17/03/25

O bom da partida é o regresso


Cipriano de Rore - Ancor che col partire


Ancor che col partire

Io mi sento morire
Partir vorrei ogn' hor, ogni momento:
Tant' il piacer ch'io sento
De la vita ch'acquisto nel ritorno:
Et cosi mill' e mille volt' il giorno
Partir da voi vorrei:
Tanto son dolci gli ritorni miei







22/01/25

Percepção e Realidade


Daqui



A percepção é uma “conduta psicológica complexa através da qual um individuo organiza as suas sensações e toma conhecimento do Real.” (Dicionário Temático Larousse – Psicologia, Círculo de Leitores, p. 198)

Podemos referir alguns aspectos fundamentais da percepção:

- A percepção é a única forma que nos permite conhecer a realidade. Sem percepção viajávamos sem referências pelo nosso mundo exterior e interior.

- É necessário haver integração sensorial (Teoria da integração sensorial de Jean Ayres) que é a capacidade do sistema nervoso central para receber, processar e interpretar informações sensoriais provenientes dos diferentes sentidos: visão, audição, tacto, olfato, paladar, propriocepção (perceção do corpo no espaço) e o sistema vestibular (equilíbrio e movimento)... para criar uma imagem coerente e organizada do mundo e do próprio.

- A percepção é subjectiva. "Estes são os meus olhos, isto é o que eu vejo e é assim que eu penso." A minha percepção não é a de toda a gente. Cada pessoa tem a sua percepção. A percepção da realidade não é uma reprodução exacta do mundo exterior, mas uma construção subjectiva dessa realidade baseada nas nossas experiências e interpretações individuais.

- A percepção da realidade é influenciada por diversos factores, como experiências passadas, crenças, valores, cultura e emoções.
Tendo em conta estas características, concluímos que a percepção pode enganar-nos e levar-nos a cometer erros de análise e de avaliação. E, além disso, estes erros podem ser perigosos para o próprio e para os outros.
De facto, tudo isto acontece porque “o problema dos humanos é que eles vêem o universo mais com as suas ideias do que com os olhos” (Boris Cyrulnik), ou seja, entre os humanos, ver a realidade significa lê-la de uma determinada maneira. Essa leitura passa por vários mecanismos complexos de processamento das informações... (Jean-François Dortier, "La perception, une lecture du monde", Sciences Humaines)

- Tendo em conta estas características da percepção, podemos concluir: A percepção que eu tenho da realidade pode enganar-me e levar-me a ver a realidade de forma errónea. 

Toda a polémica acerca da insegurança e do medo relacionados com o que se passa em determinadas zonas duma cidade, como o Martim Moniz, deve levar em conta o nosso condicionamento e subjectividade. 
Mesmo os que consideram que lêem melhor a realidade porque sabem ler melhor a sociedade e as estatísticas, como os comentadores dos media, seguem as suas percepções que dependem das preferências politico-partidárias com que simpatizam ou têm afinidade, as suas crenças e visão do mundo...
A realidade não muda pelo facto de haver mais ou menos pessoas que pensam que estão do lado das boas percepções da realidade. 

Não há uma percepção mas percepções. A leitura da realidade está sujeita a erros perceptivos por parte de toda a gente: por aqueles que defendem a polícia e por aqueles que são contra o “modus operandi” da polícia, ou, simplesmente, contra a polícia e contra o poder incumbente. 
E este enviesamento perceptivo é o maior erro de quem se recusa a ver, ouvir e achar que não se passa nada. 
Não era Fanhais que cantava os versos de Sophia “Vemos, ouvimos e lemos não podemos ignorar” ? 


Até para a semana.



Rádio Castelo Branco




15/01/25

Ideias que curam


Factors-that-Impact-Health



Procuramos a felicidade. Tudo o que fazemos na nossa vida  são meios para atingir a felicidade e o bem-estar.

No entanto, a experiência da tristeza e de outras emoções negativas fazem parte desta procura. Ela é mais marcante  em datas e momentos especiais em que  tudo o que acontece merece uma maior valorização: as festas, as datas  comemorativas, os dias de aniversário são acompanhados de tristeza, exactamente porque neles nos recordamos dos ausentes. (Reacções de aniversário) 

Há momentos, como o Natal, tempo de amor e de paz, em que essas memórias são particularmente dolorosas, como as expectativas não concretizadas de uma reunião familiar, como foi o caso este ano, devido às guerras, à falta de saúde, à gripe e outros vírus, à solidão da velhice e tantas ausências que nos fazem sentir ainda mais  a fragilidade do nosso bem-estar.


Para além dos comprimidos e xaropes prescritos para contrariar  a maldita gripe, se houver vontade, que falta muito quando estamos doentes, podemos encontrar lenitivo na prática que ajuda a superar pensamentos, sentimentos e emoções negativas e desajustadas. 

 

O filósofo William B. Irvine (referido por Marianna Pogosyan, "5 Ancient Ideas That Can Help You Flourish Today", Psychology Today ) recorda-nos algumas “ideias antigas” que podem ajudar o nosso bem-estar.

 

1. Visualização negativa de gratidão.

Face ao sofrimento, por mais sombrio que possa parecer, podemos usar a “visualização negativa para despertar um profundo apreço pela vida”, como faziam os filósofos estóicos. 

Afinal, há tantas pessoas em situações piores do que as nossas que, só por isso, já vale a pena estarmos felizes.


2. Enquadramento para reduzir emoções negativas.

Como nas molduras das pinturas ou fotografias, “as molduras psicológicas que pomos à volta dos acontecimentos da vida podem influenciar as nossas reações emocionais .” Ou seja, o sofrimento devido a algo externo não se deve “ à coisa em si, mas à avaliação que fazemos dela; e isso podemos terminar a qualquer momento.” Podemos experimentar diferentes molduras para vermos perspectivas diferentes, podemos até reagir com humor...  


3. A meditação da “última vez”.

Haverá sempre uma última vez para tudo o que fazemos. Pode ser apenas um momento de recordar como fomos felizes ou pensar que a felicidade está a acontecer agora e aproveitar o tempo para amarmos ainda mais quem merece o nosso amor. E, afinal, ainda podemos ir além do que estava previsto (última vez+1). 

4. Conhecer tudo para cultivar o prazer. 

Podemos tornar-nos conhecedores de arte, música, natureza, culinária... Porque ao sermos conhecedores do mundo em que vivemos, podemos aproveitar plenamente as nossas vidas e perceber que vivemos num “jardim prazeroso”. 


5. Meditação antes de dormir.

 Na hora de dormir podemos avaliar os nossos comportamentos e atitudes durante o dia para termos mais autoconsciência: se fui gentil, fui curioso, fiquei chateado por algo insignificante,  se fui capaz de manter a calma face aos contratempos, ou se experimentei alegria e prazer.


Em resumo, perante as adversidades e contrariedades da vida, falhas de expectativas e mudanças de planos, temos várias prescrições de terapias, a nível da saúde e também a nível psico-social, que nos podem ajudar a remover essas pedras indesejadas do nosso caminho de bem-estar.

 

 

Até para a semana.

 

  



Rádio Castelo Branco






07/12/24

Natal – tempo de afectos


Vivemos mais um tempo de Natal, tempo mágico em que a luz, a árvore, a música e tantos outros símbolos, que estão um pouco por todo o lado, nos apelam para  a renovação e transformação da nossa vida  e nos reconfortam com expectativas de emoções e sentimentos mais conformes às necessidades de equilíbrio e homeostasia na nossa vida.


Os nossos sentimentos estão associados às vivências sociais e à cultura deste tempo: Paz, união, amor, saúde, perdão, gratidão, felicidade, prosperidade, solidariedade e fé, são algumas palavras que usamos para os expressar.

A nossa vida seria impensável sem estes sentimentos. Como refere António Damásio: sem sentimentos “seria impossível classificar quaisquer imagens como belas ou feias, agradáveis ou dolorosas, de bom gosto ou vulgares, espirituais ou terrenas.” Diz ainda A. Damásio que “são os sentimentos que nos guiam, que servem de bússola ao nosso comportamento.” (Entrevista de J-F Marmion a A. Damásio "Les raciones biologiques de la Culture", Le cercle psi, p.67)

A nossa vida tem na base um funcionamento homeostático de cujo mecanismo fazem parte os sentimentos que nos ajudam a compreender a nossa vida social e cultural.

Se a nossa vida for comparada a uma árvore temos na parte inferior a regulação metabólica, os reflexos básicos,  as respostas imunitárias.

Nos ramos maiores, os comportamentos de dor e prazer  e, nos ramos mais finos, as pulsões, motivações e emoções e, finalmente, os sentimentos.

Para A. Damásio, “a homeostasia (esse conceito da biologia definido como um processo de regulação pelo qual um organismo consegue a constância do seu equilíbrio) aplica-se à expressão do nosso sentimento pessoal, e estende-se facilmente à família e à tribo mais próxima. O problema é quando esse estado tem de se alargar a milhares de pessoas.  Aí conseguir o equilíbrio é muito mais difícil. Isso explica por exemplo o recrudescimento dos extremismos na Europa. A única solução, insisto, é educar. Para que o nosso sentimento seja o de aceitar o outro.” (Teresa Campos, Uma aula com António Damásio, Visão, 31.10.2017)


Apenas um pequeno grupo dos sentimentos funcionam negativamente. É, por isso,  chocante  que vivências negativas como é o caso da guerra, da violência, da dor e do sofrimento, em especial daquele que atinge os mais desprotegidos, como as crianças, estejam tão presentes na nossa historia recente. 

Os desequilíbrios não têm fim, e há quem continue  apostado num caminho desequilibrado, em que os sentimentos negativos se vão prolongar nefastamente por  várias gerações, dificultando, não só a nível físico, a reparação das infraestruturas destruídas mas, mais profundamente, a reparação das estruturas mentais como os sentimentos de cada vítima da guerra...


O problema é, então, como ultrapassar os sentimentos negativos: a raiva, a vingança, a desconfiança: quando volta a acontecer, quando surge outro ditador, quando teremos, finalmente, Paz.

Dito de outra maneira, como e quando será reposta a homeostasia, essa capacidade de a vida se manter  e  se desenvolver porque o nosso fito é continuar vivos e pensar no futuro (TC, idem)

Os sentimentos que nos vêm da luz, do brilho, da presença, dos abraços deste tempo são o desejo de felicidade para o Natal e de prosperidade para o próximo Ano!




Até para a semana.




Rádio Castelo Branco

 



 

06/11/24

Idosos cuidadores de idosos


Tem vindo a aumentar o número de pessoas idosas que necessitam de cuidados permanentes ou regulares, muitas vezes prestados pelos próprios familiares. *
Como sabemos, há perdas e ganhos no envelhecimento. A mente vai-se deteriorando ainda que o corpo esteja fisicamente em condições de realizar as actividades da vida diária. Ou então é o corpo que já não possui as condições que a mente ainda lhe exige. Num ou noutro caso, ter consciência dessas dificuldades não é fácil de aceitar.

Não é um problema da actualidade. Séneca, na carta 26 (Cartas a Lucílio), divide a velhice em duas fases: a da velhice propriamente dita e a da decrepitude.
Diz Séneca: “Dizia-te eu, não há muito, que já estava à vista da velhice; agora creio bem já ter deixado a velhice lá para trás de mim! 
À minha idade, ou pelo menos ao meu corpo, já será adequada outra designação, pois "velhice" é o nome que se dá ao período da vida em que o homem está, embora cansado, ainda não gasto de todo. 
Inclui-me, portanto, no número dos decrépitos já prestes a atingir o fim. 
Há, porém, uma coisa que te peço tomes em consideração: é que não sinto na alma as injúrias da idade, conquanto as sinta no corpo. Somente envelheceram os meus vícios, tal como o corpo auxiliar desses vícios. O meu espírito conserva-se vigoroso e mostra-se contente de já pouco ter de se ocupar com o corpo, isto é, já alijou uma grande parte do seu fardo."


Colocar o pai ou a mãe num lar pode ser uma decisão extremamente difícil e complicada e gerar conflitos contra a sua vontade, quando rejeita essa opção, de forma ostensiva ou ficando em silêncio... Uma alternativa é, muitas vezes, ficar a cuidar deles  na sua própria casa, mesmo que a nível temporário, mesmo que com apoio de outros familiares.

 

É necessário avaliar se o podemos fazer sozinhos, com apoio dos irmãos ou outros familiares, ou com necessidade de recorrer ao apoio domiciliário disponibilizado por instituições ... 

Com pais muito idosos é natural que os filhos também já sejam idosos e, por isso, é necessário ter em conta que os idosos cuidadores de idosos são duplamente onerados devido às suas fragilidades e por terem de cuidar de outros ainda mais frágeis.


Como encarar esta dupla fragilidade? Que fazer? A gestão desta situação faz-se em vários planos: as interações com os pais, as interacções com os irmãos, com o resto da família, com a sociedade.
E não é fácil cuidar, com as forças que nos restam, de pais muito idosos. Mas, por vezes, mais difícil ainda é lidar com o resto da família, em especial os irmãos.
Sendo uma fase stressante para toda a família, muitas vezes as pessoas revelam facetas desconhecidas, quase sempre por motivos por dinheiro e heranças...
Por estarmos numa das fases mais complexas, tristes e emocionalmente desgastantes da vida, é necessário estarmos preparados para estas situações e protegermos a nossa sanidade mental. (Reviver, "Cuidar de pais idosos: As 15 melhores formas de manter a sanidade mental")

 


Até para a semana.


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* No dia 5 de Novembro comemorou-se o Dia Mundial do Cuidador Informal. Este dia foi instituído com o objectivo de homenagear todas as pessoas que, de forma informal, prestam cuidados básicos a quem não pode cuidar de si próprio.




Rádio Castelo Branco




09/10/24

A comunicação social e os abusos


Perante a crise dos abusos sexuais na Igreja, a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) tem respondido assertivamente ao problema, de várias formas. 

Em Portugal, o estudo desta realidade foi entregue  a uma Comissão Independente que concluiu pela existência dos abusos, ao longo de mais de 70 anos, e pela necessidade de agir em várias áreas, como consta do Relatório final elaborado.

A realidade descrita é suficientemente dolorosa para, tout court, se aceitar as conclusões do Relatório.

No entanto, não questionando essa  verdade, certamente que se podem colocar problemas metodológicos e em consequência questionar  algumas conclusões a que a Comissão Independente chegou. (1)

Perante a necessidade de dar continuidade às sinalizações, verificou-se a impossibilidade de identificar muitos casos por falta de dados, tal como de vir a poder efectuar compensações financeiras, sem ter de obrigar a novo processo ainda que com o risco de revitimização.

 

Na sequência da Carta Apostólica Vos estis lux mundi do Papa Francisco, foram criadas as Comissões Diocesanas para proteção de crianças e jovens e pessoas vulneráveis que respondem localmente pela prevenção e protecção das vítimas de abusos.

 

Foi também criado o Grupo VITA que não só continuou  a atender vítimas, a nível nacional, como se tem empenhado na realização de acções de prevenção primária como formação e elaboração de instrumentos de trabalho pedagógicos para a prevenção.

O Grupo VITA criou ainda uma bolsa de psicólogos e psiquiatras, de  todo o país, que têm atendido as vítimas que necessitam de apoio psicológico. Como Bento XVI referiu, "o importante é, primeiro, olhar pelas vítimas e fazer tudo para as ajudar e acompanhar enquanto saram”.

 

A comunicação social informa, investiga e divulga mas também manipula e é manipulada de acordo com interesses mais ou menos expressos ou mais ou menos ocultos.

Seja como for, na complexidade do mundo global, uma grande parte da  luta pela liberdade e liberdade de expressão passa pelo trabalho dos jornalistas e dos media, que não têm trabalho fácil e estão sujeitos a perseguições arriscando a própria vida. (Committee to Protect Journalists)

Por isso, o papel da Comunicação Social é fundamental na investigação de eventuais casos de violência sexual nas instituições da Igreja mas também da sociedade, famílias, escolas, desporto... Por isso mesmo, deve investigar e informar com imparcialidade. 


Bento XVI, em entrevista a Peter Seewald, Luz do mundo - O Papa, a Igreja e os Sinais dos tempos, disse o seguinte sobre o papel da comunicação social: "Não foi possível deixar de reparar que subjacente a este esclarecimento por parte da imprensa, estavam não só a vontade pura de obter a verdade, mas também uma alegria em comprometer e em desacreditar o mais possível a Igreja. Independentemente disso, tem, porém, de ficar sempre claro que, sendo verdade, devemos estar agradecidos por cada  esclarecimento. A verdade, associada ao amor correctamente entendido, é o valor número um. E, por fim, os meios de comunicação social não teriam podido falar como falaram, se na própria Igreja não houvesse o mal. Só porque o mal estava na Igreja é que os outros puderam utilizá-lo contra ela."




Até para a semana.

 

 

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Felícia Cabrita entrevistou várias personalidades (Euclides Dâmaso, Jónatas Machado, Mário Mendes, José Cardoso da Costa) sobre o assunto - "Já não estamos no tempo da Inquisição", Jornal I, 18-3-2023;