29/10/08

A creche é tão boa como uma mãe ?

É preferível que um bebé fique em casa com a mãe, nos primeiros 2 anos de vida, em vez de ir para uma creche logo aos 5/6 meses ?
Não é preferível para o desenvolvimento físico, psicológico, social, psicomotor, etc. que o bebé permaneça com um dos pais em casa durante esse período da vida ?
É possível que a creche seja como uma boa mãe para a criança e que a substitua cabalmente ?
Mais do que encontrar uma resposta única, consideramos que o passo mais importante é que a situação escolhida crie conforto a todos: pais e criança. Isto é, que a resposta encontrada seja a mais propícia ao desenvolvimento da criança.
A maioria das crianças dos centros urbanos entra para as creches aos 6 meses de idade aproximadamente, por não terem outra alternativa.
Esta solução permite aos pais continuar na sua carreira profissional, principalmente à mãe.
Muitos pensam mesmo que é a resposta desejável por permitir essa vida profissional.
No entanto, é desejável que a criança possa ficar com a mãe (ou o pai) em casa.
Claro que partimos do princípio de que é fundamental que existam estímulos que promovam o seu desenvolvimento.
Ficar em casa, brincando sozinha e com pouca interacção não é uma boa solução.
Jerome Kagan, em Harvard, investigou o desenvolvimento de crianças cujos pais optaram pela creche em relação a um grupo de crianças que optaram por ficar exclusivamente em casa, procurando saber se havia problemas para o desenvolvimento de um dos grupos em relação ao outro ou, dito de outra forma, se as crianças do grupo da creche não se ressentiam da ausência da mãe.
O resultado dessa investigação veio demonstrar que é possível que a creche dê respostas adequadas desde que o número de técnicos que trabalham com as crianças seja adequado. Isto é, seja em número suficiente, tenha experiência e esteja habilitado técnica e profissionalmente.
Assim, cada empregada era responsável por 3 bebés até aos 15 meses de idade ou responsável por 5 bebés dos 15 meses aos dois anos de idade.
Assim, podemos concluir que não é o simples aumento do número de creches, aumentado o número de vagas que vem resolver o problema.
É preciso que essas respostas sejam de qualidade.
Ora nós sabemos que nem sempre isso acontece.
E por outro lado, não é o facto de haver uma cobertura total que significa que estamos perante uma sociedade desenvolvida e os bebés estão a ser bem tratados.
Diria mesmo que temos que conjugar vários factores para se poder fazer essa avaliação.
Em primeiro lugar, a possibilidade de os pais poderem optar entre a colocação do filho na creche ou poderem ficar com o filho em casa.
Depois, quer num caso quer no outro poderem continuar a ter emprego e a desenvolverem a sua carreira profissional sem ficarem prejudicados pelo facto de serem mães e pais e ficarem com os filhos em casa.
Assim, uma sociedade será tanto mais desenvolvida quanto mais os pais tiverem a possibilidade de poderem optar por ficarem com os filhos em casa mas sem perderem o direito ao emprego e à carreira.
Não basta criar mais creches. É necessário alargar o período de licença de maternidade da mãe para que possamos falar de promoção, protecção e desenvolvimento da criança, num país desenvolvido.

25/10/08

As tácticas dos novos poderes

Vivemos na era da informação e do conhecimento. No entanto, não damos a importância devida aos mecanismos que estão envolvidos nesse processo.
Nos tempos que correm de insegurança, instabilidade, de desconfiança… não será demais percebermos que a informação pode ser manipulada quer na origem, no emissor, no destinatário ou na mensagem.
Também assistimos a grandes campanhas de propaganda política para vender uma imagem que interessa vender.
Não vale a pena fazer grandes juízos sobre se há poderes melhores e piores.
Temos tendência a justificar atitudes e comportamentos das pessoas que são do mesmo partido, a justificar, desvalorizar e mesmo a anular os comportamentos comprometedores do ponto vista moral, dos dirigentes e militantes do mesmo partido.
A comunicação social está alinhada com as campanhas dos partidos políticos de modo mal disfarçada ou de forma completamente empenhada. Basta conferir com o que se passa nos EEUU na actual campanha, onde os mais importantes órgãos de comunicação social apoiam um ou outro candidato.

O poder funciona assim, deita mão a todos os instrumentos que estão ao seu alcance e nunca como hoje a informação e o conhecimento tiveram tanta importância para o poder.
Daí que não seja de estranhar que a manipulação se faça sobretudo no campo da informação e da detenção do conhecimento.

É por isso que o debate da educação passa pela questão do conhecimento e da informação.
A formação da personalidade das crianças e dos jovens passa pela família, pela escola e certamente pelos media. Depois toda a nossa vida é influenciada pelos media. E… Por isso parece que o assunto da informação merece uma especial atenção.
Alvin Toffler, em Os novos poderes, (1991, orig. de 1990), para além de ter alertado para a possibilidade de uma crise financeira como a que estamos a viver, alerta-nos também para a manipulação da informação quer no emissor e no destinatário quer na mensagem.
É sobre técnicas e tácticas de manipulação da mensagem que quero referir em particular:
A táctica de omissão
Não jogar com o baralho todo, deixar enormes lacunas, retirar factos relevantes da informação...
A táctica das generalidades
Os pormenores são atenuados através de abstracções ligeiras: tal politico é corrupto mas são todos somos assim não é ?
A táctica do timing
Os discursos dos políticos são apresentados no último momento para não se poderem fazer grandes alterações. Veja-se o tempo para discussão publica…
A táctica do drible
Distribuir a informação a conta gotas tipo telenovela com mil episódios
A táctica do tsunami
Inundar o sujeito de informação a ponto de o submergir e não ser capaz de encontrar os factos essenciais.
A táctica da nebulosa
Lança-se uma grande quantidade de boatos nebulosos…. Do género: eu sei que você sabe que eu sei…
A táctica do volta para trás
Por exemplo espalhar uma história falsa em qualquer lado, no estrangeiro, que depois virá a ser tomada como verdadeira no local que interessa
A táctica da grande mentira
A pequena mentira dificilmente é acreditada. Hoje é necessário mentir … mas em grande.
A táctica da inversão
Virar simplesmente uma mensagem do avesso.
Algumas destas tácticas são de antologia, mas continuamos distraidamente a acreditar na mensagem de quem controla a informação…

16/10/08

Todos iguais todos diferentes

Se bem me lembro já houve em Portugal um Ministério para a igualdade. [1]
Isto significa que pela primeira vez neste país, e talvez pela última, existiu um Ministério para a igualdade.
O que acontece é que a democracia devia ser o respeito pelas diferenças.
Esta coisa da igualdade é um retorno fora de prazo de validade à revolução francesa ou a Marx, ou talvez também a Skinner: se proporcionarmos um ambiente idêntico para todos, teremos então possibilidade de atingir a igualdade, quem sabe se às incubadoras de Huxley ou então podermos seguir o caminho da clonagem humana para a pior das suas possibilidades.
E já estão a ver porque é que a diferença é afinal tão importante: porque somos todos diferentes uns dos outros.
Eu sou eu porque sou diferente. Eu não seria eu se fosse igual a ti, se fosse igual a outro.
Era assim uma espécie de fotocópia e a reprodução era sempre igual.
Até a reprodução biológica é diferente porque o indivíduo recebe metade dos cromossomas da célula masculina e metade da célula feminina: então a reprodução é fazer diferente.
E é por sermos diferentes que somos ricos. Porque assim temos muito mais coisas: podemos gostar da música de Mozart, da pintura de Chagal, da poesia concreta de Melo e Castro, da poesia de Camões, e assim por diante.
É por sermos diferentes que podemos ter profissões diferentes e fazer coisas diferentes: pintar quadros diferentes, escrever livros diferentes sobre tantas coisas diferentes.
Quer dizer temos coisas muito diferentes de que podemos gostar e de que podemos beneficiar dado que “se sou diferente de ti, longe de te prejudicar, aumento-te” (Saint-Éxupéry).
Mas há sempre alguém que pensa que somos todos iguais … e é por exemplo o que acontece no mimetismo [2] que é característica daquele indivíduo que é igual aos outros todos, é português com os portugueses, é regionalista com os regionalistas…
Dizem: somos todos iguais mas é necessária uma vanguarda…
O que quer dizer que muitos outros são a retaguarda … Ou seja, é o que se chama a igualdade escondida com o rabo de fora. O que levou depois a dizer que somos todos iguais mas uns são mais iguais do que os outros…[3]
O que acontece, portanto, é que somos todos diferentes.
Mas se o Ministério da igualdade foi uma miragem, e ninguém quererá criar um das diferenças, por que não levarmos a sério a inclusão, a educação inclusiva ?
Tentativas não têm faltado. E cada novo ministro tenta executar as medidas que vão salvar a educação.
Por isso, na educação tem havido um corrupio de reformas à velocidade de substituição dos ministros nos lugares.
No entanto, não deixa de ser interessante ver como as vanguardas se assumem como defensoras das causas fracturantes.
Quando, porque somos diferentes, do que precisamos é de “construtores de pontes”, de lideres consensuais e não de líderes fracturantes.

[1] Ministério para a igualdade no II Governo do Engº Guterres.[2] Alberto Pimenta - “Discurso sobre o filho-da-puta”.[3] Orwell – “O triunfo dos porcos”

08/10/08

O destino da lua

Frequentemente, remetemos para a escola todas as responsabilidades do que está errado na sociedade: o problema da violência e criminalidade, o problema da sexualidade e da prevenção das doenças sexualmente transmissíveis, da educação para a saúde e da aprendizagem de comportamentos saudáveis.
A escola educa para a protecção da natureza e ensina a ter comportamentos que se coadunem com a ecologia, a protecção civil, a prevenir os incêndios, os acidentes de viação e a protecção rodoviária, aprendizagem das regras cívicas, dos valores morais e éticos, da cidadania e da participação política, da educação parental, da resolução do absentismo e do abandono, da formação de segunda oportunidade e até profissional …
Remeter para a escola todas as responsabilidades da sociedade e, principalmente, o resultado dos erros dos homens está na ordem do dia, já que remeter para as famílias, mais rapidamente nos atinge também a nós. A escola está perto mas, simultaneamente, está longe de nós, não é responsabilidade nossa, é dos professores, é dos políticos.
Em última análise, a responsabilidade será da sociedade, das condições sociais objectivas … que estão ainda mais longe.
Claro que, se estivéssemos numa sociedade socialista nada seria assim, continuam a dizer alguns, que só por ingenuidade (?) pensam, actualmente, como Jorge Amado há mais de 50 anos que “sonhou" em Capitães da Areia que isso fosse possível.
Por cá tivemos responsáveis políticos, e cito apenas Ana Benavente, que sonhava com uma escola socialista nos anos 70, de que nos dá conta em A escola na sociedade de Classes.
Porém, se quisermos aprofundar o problema da educação, não nos poderemos ficar por estas certezas ou pelas indefinições de outros, os do relativismo moral e que acham que a escola serve para tudo e é o lugar onde tudo é possível.
Hoje a escola parece ser o sítio, onde os “pequenos tecnocratas da mochila”, como diz Eduardo Sá, vão aprender tudo, durante o dia inteiro.
A escola está ao serviço da sociedade. É um instrumento dessa sociedade. E se a sociedade é democrática podemos ter alguma esperança de que eduque cidadãos para se comportarem democraticamente.
A escola está ao serviço das famílias. Mas não pode substituir os contextos familiares nem tomar decisões que competem à família, e à aprendizagem dos mais importantes afectos da vida das crianças.
A escola está ao serviço do indivíduo. E, por isso, compete-lhe o papel de o desenvolver do ponto de vista humano, dando-lhe todas as oportunidades para que possa realizar-se individualmente como pessoa, integrado numa família e numa sociedade.
Esta tarefa é de sempre. Mesmo que se chegue a um modelo que satisfaça a maioria das pessoas é necessário consolidar esse modelo, alimentá-lo, fazê-lo crescer, como acontece com qualquer organismo, ou qualquer sistema.
Esta tarefa implica estabilidade e mudança, simultanea e paradoxalmente. Estabilidade e mudança são as características do desenvolvimento. As mudanças reais e as pseudo mudanças dos últimos anos não conduziram a uma educação para todos nem a um aumento da qualidade da educação em muito devido aos permanentes sobressaltos dos que quiseram e querem realizar mudanças em cima do joelho, obedecendo a lógicas meramente partidárias e esquecendo-se de que a educação é para todas as crianças qualquer que seja o seu contexto social e o seu contexto temporal.
Poderemos ter uma escola da tecnocracia, com computadores, quadros interactivos, programa skool e internet…
A questão é que não há escolas sem professores…
É por isso que a escola pode bem ser considerada como a instituição que, como diz uma velha canção da minha infância, “tem o destino da lua, a todos encanta e não é de ninguém”.

02/10/08

Pensamento mágico

Vivemos no sec. XXI. Orientamos a nossa vida pelas descobertas da ciência ou parece que é assim para muitos de nós.
A descoberta do genoma e, em consequência, de muitas doenças veio provar que era de origem biológica, genética, o que antes era de origem desconhecida ou relacional.
Estamos ainda no começo da compreensão do proteoma, isto é, do papel que os aminoácidos, as proteínas desempenham no nosso organismo
Todos os dias sabemos coisas novas sobre o desenvolvimento humano, o comportamento e a personalidade no campo da psicologia.
As descobertas de Freud e Piaget foram sem dúvida surpreendentes para o seu tempo e ainda hoje explicam muito da nossa realidade consciente e inconsciente.
Mas, na nossa vida do dia a dia, muitas dessas descobertas estão muito distantes e temos comportamentos pouco consentâneos com os dados da ciência..
Como sabemos o desenvolvimento do ser humano passa por diversas etapas ou períodos.
Um desses períodos, o do desenvolvimento pré-operatório é muito interessante porque explica o comportamento das crianças dos 2 aos 7 anos mas explica também o comportamentos de muitos adultos.
De facto embora possamos evoluir para as operações formais, mantemos comportamentos de estádios anteriores.
Vejamos alguns exemplos de comportamentos pré operatórios:
Tomar importantes decisões na vida com base nos horóscopos, acreditar no conto do vigário, acreditar que o jogo de futebol me corre bem se fizer algumas rotinas que vão da crendice popular até às rotinas e rituais mais insólitos, acreditar que é possível ler o pensamento dos outros…
No campo da política temos imensos exemplos. O mais recente é acreditar que tudo vai mudar porque "nós queremos" (we can), é acreditar que basta estalar os dedos e …magia…. o problema fica resolvido.
Esta é mesmo uma situação em que os políticos nos querem fazer acreditar.
Mas será que os próprios líderes políticos têm pensamento mágico ?
Vejamos, por exemplo, o caso da educação.
Os resultados foram divulgados. Basta legislar e estamos como na Europa avançada.
Pouco importa se isso significa desemprego, precariedade, desmotivação, perda de dignidade, falta de perspectivas e expectativas, perda de direitos sociais, os tão famosos direitos adquiridos que alguns não querem entender que são direitos sociais, adquiridos ou não.
“Nós podemos”… pensamento mágico, e, já está ... aí temos o admirável mundo novo !