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30/01/25

Pais heróis


Da capa de A criança e a família, de Françoise Dolto, Pergaminho
 

Nos tempos actuais decidir ter filhos (1) é também escolher um percurso de vida difícil. Mas o que é interessante nessa escolha é que mesmo sabendo que esse caminho tem momentos difíceis, há gente que arrisca ser pai e ser mãe. 

Estes pais sabem como vão ser os seus dias, todos os dias. Mesmo sem livro de instruções, muitos pais sabem que o desenvolvimento passa por fases mais calmas ou mais agitadas mas sempre complexas.

Não há dias de trabalho  e dias de descanso, que os filhos não querem saber se é uma coisa ou outra. Também não há fins de semana com escapadinhas românticas mas  carregados de actividades desportivas e artísticas...

Todos os dias começam muito cedo e por isso é necessário acordar muito cedo e obrigam a impressionante azáfama de toda a família para cumprir todas as tarefas matinais.

 

As tarefas para hoje começaram ontem ou até na semana passada.  Ontem à noite já foi preciso dar o banho, fazer os TPC, quando há, e há muitas vezes, preparar a mochila com os materiais necessários . 

De manhã, fazer a higiene, pequeno almoço, preparar o lanche, verificar a pasta, vestir ,"correr" para apanhar o autocarro, ou esperar pela carrinha do colégio,  esperar... sempre esperar...  

Um beijo e um adeus  e de imediato começam as preocupações: será que vai tudo correr bem na escola ?

À tarde, depois do trabalho, o dia ainda está para durar. Explicações, actividades: futebol, natação, música, ...

Quando chegam ao fim do dia, o corpo já só pede um pouco de descanso mas sabem que o não vão ter, pelo contrário, pode começar aí a parte mais difícil do dia: a noite...

 

Depois de nascer um filho, nada fica igual. O planeamento da vida e da vida profissional é feito em função dos filhos, da escola e ou do colégio que frequentam, os horários são feitos a partir do horário escolar, as férias são marcadas em função das férias escolares, tudo tem que  se fazer em função do calendário e horário escolar.   

Com um filho, já é difícil, Com mais filhos mais difícil se torna. A dificuldade é sempre crescente porque vão ter turmas diferentes e por vezes escolas diferentes.

Pede-se aos pais toda a disponibilidade, todo o tempo, compreensão, calma e  bom senso... 

 

O actual ME tem vindo a manifestar preocupação em harmonizar a vida das famílias com a vida escolar. Nesse sentido foi definido um calendário escolar plurianual até  2027-28. (2)

Também permite que os estabelecimentos de ensino funcionem por semestres (3) em vez dos tradicionais períodos ou trimestres. E já há escolas a funcionar neste regime.

É de saudar qualquer medida para tentar melhorar a vida das famílias. 

No entanto, quando os pais têm filhos nos dois regimes, por trimestres e por semestres,  pode resultar uma dificuldade acrescida  na gestão da vida familiar...

Em meu entender, no caso do calendário escolar, a generalização e  uniformização do funcionamento por semestres,  tornava mais fácil a vida dos pais.

 

 

Até para a semana.

 


Rádio Castelo Branco



_________________________


(1) A Fundação F. Manuel dos Santos que tem vindo a analisar a natalidade em Portugal refere alguns dados preocupantes:

- “Em seis décadas, o número de nascimentos em Portugal caiu para menos de metade. 

- No início dos anos de sessenta, havia mais de 200 mil nascimentos por ano no país. Atualmente, esse número é inferior a 86 mil...

- Em 1982, o número médio de filhos por mulher caiu abaixo de 2,1, considerado o limite da substituição de gerações. Na década seguinte, em 1994, esse indicador ficou, pela primeira vez, abaixo de 1,5 filhos por mulher, valor que é considerado crítico para a sustentabilidade de qualquer população, inviabilizando uma recuperação das gerações no futuro se tal nível se mantiver durante um longo período.

- mães e pais têm filhos cada vez mais tarde. as mulheres têm, em média, o primeiro filho aos 31 anos”

 

As motivações para não ter filhos devem-se a:

- Os custos financeiros associados às crianças são a causa mais importante, apontada por cerca de 67% das pessoas. 

- a dificuldade em conseguir um emprego. Esta causa é mais relevante para os homens (59%) do que para as mulheres (48%).

- não querer ter a responsabilidade de ter filhos e o facto de sobrar menos tempo para outras coisas importantes na vida. 

- dificuldade de conciliar a vida familiar com a vida profissional (mais referida no caso de pessoas que já têm filhos, e por isso já experienciaram essas dificuldades, e não pretendem ter mais) e aos problemas e complicações associados à educação das crianças.
- No caso específico de quem já é pai ou mãe, o facto de considerarem ter já o número de filhos que pretendem, aparece como o segundo motivo referido para não se alargar a família, logo após os custos financeiros. É isso mesmo que respondem três quartos dos inquiridos.

(2)  Despacho 8368/2024, de 6 de Julho, do  MECI Fernando Alexandre. 

(3) Uma medida que, há várias décadas, já era proposta pelo Prof. Manuel Viegas de Abreu. 




28/11/24

Resiliência


A palavra resiliência tem vindo a ser usada com grande frequência e em diversos contextos. Encontrou adeptos no domínio social, comportamental e cognitivo, e em psiquiatria, psicologia clínica e psicopatologia. Também a sociologia e a etologia usam este conceito... (M. Anaut, p. 50) 
Até serviu para dar título a um programa comunitário para “Recuperar Portugal” na pós-pandemia: o conhecido PRR - Plano de Recuperação e Resiliência.
E a Estée Lauder tem um creme para a pele com as características: Hidratação, anti-envelhecimento, iluminador, nutrição, protecção contra influências externas, de nome Resilience multi-effect.
Na física, a palavra resiliência corresponde às propriedades de resistência de um material, ou seja, a sua capacidade de retornar ao estado original, após sofrer diferentes pressões. 
Para a psicologia uma pessoa será resiliente quando é capaz de voltar ao seu estado habitual após passar por uma experiência difícil ou traumática.

Deve-se à psicóloga americana Emmy Werner, o principal papel no início do estudo da resiliência como resultado “de um equilíbrio evolutivo entre o confronto com elementos nefastos ou stressantes do meio, a vulnerabilidade e os factores de protecção do sujeito, internos (temperamento, capacidades cognitivas, autoestima... ) e externos (fontes não oficiais de apoio, tais como a família alargada, o bairro e os recursos comunitários)”. (p. 48-49)

A resiliência é um assunto que me tem interessado particularmente dadas as interacções que tem com os Bons Tratos 
De facto, um eixo da pesquisa sobre a resiliência tem vindo a estudar os bons tratos. 
Os bons tratos (que não significam apenas a ausência de maus tratos) são um processo e não um estado e pode ser comparado ao conceito de qualidade de vida, compreendendo elementos objectiváveis e aspectos subjectiváveis
Trata-se de um processo federador, de que faria parte a resiliência, o empowerment, sentimento de coerência e coping e pode aplicar-se a lares com bons tratos. (Detraux (2002) citado por Anaut, p. 79)

A resiliência tem sido estudada como:
- uma capacidade, traço de personalidade, resultado de um funcionamento
- equilíbrio entre factores de risco e factores de protecção
- processo adaptativo dinâmico
- não perene, pois trata-se de um processo
- a curto prazo (resposta ao traumatismo) e longo prazo
- estrutural (tem a ver com a atitude face à adversidade, quotidiana..) e conjuntural que resulta do confronto com o traumatismo externo, maciço e único 
- processo psíquico: processo em que os organizadores psíquicos se mobilizam para ajudarem no tratamento traumático...

Haverá um perfil resiliente?
De acordo com Cyrulnyk (referido por Anaut) um indivíduo resiliente teria uma estrutura composta pelas seguintes características:
- QI elevado
- Autonomia e eficácia nas relações com o meio
- Percepção do seu próprio valor
- Boa capacidade de adaptação relacional e de empatia
- Capaz de prever e planificar
- Sentido de humor

Segundo Rutter (citado por Anaut), há três características principais nas pessoas que desenvolvem um comportamento de resiliência perante as condições psicossociais desfavoráveis:
- A consciência da sua autoestima (ou autovalorização e do sentimento de Si)
- A consciência da sua eficácia
- Um repertório de formas de resolução de problemas sociais. 
A autoestima compreende uma disposição mental que prepara o indivíduo para reagir segundo as expectativas de êxito.
A autoeficácia leva o indivíduo a ter a convicção de que tem as capacidades necessárias para ter êxito numa determinada tarefa.

Então quem se sente capaz, válido, importante, tem amor de si, visão de si e confiança em si, e tem apoio nas suas experiências familiares e sociais positivas... é porque é resiliente.



Até para a semana.


 

 

 Rádio Castelo Branco 

 

 



21/11/24

Prevenir – mapas de risco e códigos de conduta


A prevenção da violência sexual e dos abusos sexuais na família e nas instituições passa também pela elaboração de Mapas de Risco e de Códigos de Conduta e Boas Práticas.
O que são então Mapas de risco e Códigos de Conduta e Boas Práticas? O Manual de Prevenção da Violência Sexual contra Crianças e Adultos Vulneráveis no contexto da Igreja Católica em Portugal e o KIT VITA são excelentes auxiliares para levar à compreensão e à prática da prevenção.

Um mapa de risco é um instrumento que permite identificar os riscos específicos da atividade de cada organização e propor as estratégias preventivas a implementar. É uma representação qualitativa dos riscos apresentados num dado ambiente ou contexto de interacção e deve ser objecto de avaliação contínua. 
Para a estimativa do risco podem utilizam-se parâmetros como a Probabilidade de ocorrência; e o Impacto do dano. 
Se, por exemplo, pela probabilidade de ocorrência e impacto do dano, o risco é alto ou muito alto, a actividade não deve iniciar-se até que seja reduzido o risco. Se não for possível reduzir o risco, a actividade deve ser suspensa.

Os Códigos de Conduta e Boas Práticas integram um conjunto de normas específicas relativas à protecção e cuidado de crianças/adultos vulneráveis. Apresentam, de forma clara, os valores, atitudes e comportamentos a adoptar no contacto interpessoal, bem como aqueles que devem ser evitados ou proibidos, e dizem respeito a áreas tão diversas como a linguagem, os comportamentos, o contacto individual, a supervisão, a privacidade em diferentes contextos, a gravação e captação de imagens, as atuações em situações de maus-tratos, a gestão de informação confidencial, entre outras. 

Se tivermos como analogia o semáforo podemos pensar que há comportamentos e atitudes que são proibidos (vermelho), outros são comportamentos a evitar, o amarelo, e outros que devem ser promovidos (verde).

Há muitos destes comportamentos e atitudes que sempre fizeram parte da nossa prática de pais e educadores, mas, provavelmente, haverá outros que nos fazem pensar nos riscos possíveis.

 

Quando falamos de bons tratos e resiliência pensamos em comportamentos e atitudes a promover como condição para que não só os riscos sejam reduzidos ao mínimo mas também dar instrumentos cognitivos, emocionais e sociais que permitam reagir adequadamente quando encontrarmos esses riscos  no nosso caminho.

O que está na origem dos comportamentos perturbados não é apenas a presença de maus tratos (vermelho) mas também a ausência de bons tratos. Não podemos continuar a olhar para a prevenção e para a protecção apenas quando na interacção pais-filhos existem marcas físicas evidentes de que alguma coisa falta ou se degradou. 

É necessário ter em conta não apenas a vulnerabilidade aos factores de risco  mas também os bons tratos e a resiliência (verde). A vulnerabilidade compreende a predisposição ou susceptibilidade para que surja um resultado negativo durante o desenvolvimento. A resiliência é a predisposição individual para resistir às consequências negativas das situações de risco e a criança e jovem desenvolver-se, mesmo assim, adequadamente. 


Os mapas de risco e os códigos de conduta contribuem para a criação de ambientes mais seguros e protetores. 

 


Até para a semana.




Rádio Castelo Branco




25/10/24

O auricular invisível


O auricular de que falou o Sr. Primeiro-ministro só tem relevo para a comunicação que pretendia fazer se entendermos que de facto há um auricular invisível que  formatou e aculturou algumas pessoas da comunicação social, com carteira ou sem ela, jornalistas, comentadores ou comentadores-jornalistas e vice-versa. 

1984 (George Orwell) parece estar a acontecer agora, com grande parte do mundo a viver em estado de guerra sem fim à vista. Grande Irmão, fabricado pela Polícia do Pensamento é omnipresente e o Ministério da Verdade, faz a sua propaganda, perseguindo os cidadãos que se atrevem a defender o indivíduo e o pensamento independente.

Quando querem ser imparciais, jornalistas e cidadãos, precisam de capacidade crítica para poderem perceber quando se trata de manipulação do Ministério da Verdade. Para dificultar, há a 'novafala' que tem o seu próprio vocabulário. (1)

Por exemplo, o que é ser activista? Chama-se activista a  alguém de esquerda  que até pode ser violento, fazer manifestações violentas, fazer parar o trânsito, praticar vandalismo, estragando objectos culturais e destruindo bens públicos muitas vezes da própria comunidade de pertença. Já se for de direita é apelidado de extremista.

Os piores ditadores da história são legitimados como Líderes: O Líder Cubano, o Líder Sírio (2) ... Se forem de direita não passam de ditadores de extrema-direita.


Para alguns países os direitos humanos são uma miragem. Nesta matéria, um retrocesso assinalável está a acontecer em todo o mundo. Mas é  neste mundo que o jornalismo se movimenta e por isso não é fácil ter liberdade de pensamento e de expressão. (3)

Não é o nosso caso. Como vivemos em democracia  podemos questionar as medidas do governo (estas ou outras)podemos ter opiniões diferentes e discutir os assuntos que dizem respeito à vida das pessoas: 

 

- Se os velhos socialistas colectivistas, os novos canceladores wokistas, ou os progressistas muito avançados querem impor a dita disciplina de cidadania que é posta em questão por muitos pais e encarregados de educação, anulando princípios constitucionais que definem que “os pais têm o direito e o dever de educação dos filhos” (Artº 27º), então é necessário afirmar aqueles princípios e procurar uma solução que não ponha em causa a responsabilidade da família, tornando a frequência daqueles conteúdos opcional, ou integrando-os na disciplina de História ou de Ciências ou, simplesmente, procurar-se uma plataforma de entendimento suficiente para que não haja objecções por parte dos pais. 

 

- Também se pode buscar consenso para a questão da imigração. Ninguém  concorda, certamente, com políticas de portas escancaradas, sem qualquer controlo, afirmando  que não estão associadas a insegurança e dizendo que as estatísticas sobre segurança não são preocupantes.

Esquecem-se que o medo que as pessoas sentem não vem nas estatísticas nem nos jornais. O medo sente-se na rua onde moram, na zona onde habitam, quando saem à noite ou quando vão ao parque infantil com os filhos... (4)

 


Até para a semana.

 

 

 

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(1) "Guiões da linguagem" dita neutra e dita inclusiva."

 (2) Comentário  de um leitor (lucklucky a 19.10.2024)  a um post de Henrique Pereira dos Santos, "Eu?", no Blog Corta-fitas  sobre a confiança dos americanos na comunicação social,  onde se encontra  algum deste vocabulário.

(3)  "O aumento da polarização está associado à crise da democracia, e à emergência de autocracias e anocracias, em vários países. Segundo o Democracy Report 2023, do V-Dem Institute, entre 2012 e 2022 a percentagem da população mundial que vive em países autocráticos passou de 46% para 72%. Pela primeira vez, em mais de duas décadas, as autocracias são dominantes. Atualmente, só 13% da população mundial vive em democracias liberais enquanto 28% vive em regimes em que não há eleições multipartidárias, não há liberdade de expressão nem de associação e as eleições são manipuladas. A democratização da sociedade só está a acontecer em 14 países, onde vivem 2% da população mundial. Este valor é o mais baixo dos últimos 50 anos."  (Luís Caeiro, Nós e os outros. A sociedade polarizadaCatólica - Lisbon,  Setembro 26, 2023.

(4) E não me refiro apenas à percepção de insegurança.




Rádio Castelo Branco


02/06/24

Activas, proactivas, hiperactivas


A grande maioria das crianças são activas e nascem com competências motoras, cognitivas e emocionais que lhes permitem um desenvolvimento saudável. Esta é a constatação de psicólogos, educadores e pais na relação com as crianças. E sabemos que cada criança procura responder à interação com os adultos e com o meio, explorando tudo o que está à sua volta, primeiro o seu corpo e o da mãe e a pouco e pouco vai explorando tudo o que consegue tocar.

Todos os pais têm experiência do que acontece quando os filhos começam a andar e o que acontece às tomada eléctricas, às gavetas das mesas, às tralhas da casa de banho, em que a curiosidade e a proactividade fazem parte dos comportamentos da criança... enquanto está acordada.
Essa actividade e proactividade são fundamentais para o desenvolvimento da criança. Aliás sabemos que quando estão muito sossegadas é porque se passa alguma coisa.
Segundo Bion há três emoções fundamentais: Amor, ódio e epistemofilia. A criança, e os adultos, querem conhecer o que se passa no ambiente à sua volta.

Acontece que em confronto com as exigências da sociedade, em especial da escola, muitas crianças têm dificuldade em controlar alguns comportamentos motores e não estão facilmente adaptadas às condições e ao currículo que é suposto elas terem na escola. (1)
Acontece até que alguns comportamentos ultrapassam os limites das relações saudáveis com os colegas e com os professores.
Conhecemos casos de violência que não era suposto existirem na escola actual que se supõe ser mais evoluída do que a escola do passado.

De facto, nem sempre assim foi, e, antes, a autoridade e o poder do professor faziam com que as crianças fossem mais controladas. Claro que muito deste controle era um controlo exterior.
Com a "escola para todos", começaram a aparecer mais casos de comportamentos disruptivos.
Alguns podem configurar doenças, embora seja discutível como se chega a alguns diagnósticos como no caso das perturbações psicológicas. (2)
Bem sei que temos critérios para classificação dessas doenças referidos pelo Manual de diagnóstico e estatística de perturbações mentais – DSM - que já vai na 5ª edição. 

A perturbação de hiperactividade com défice de atenção (PHDA) afecta cerca de 5% a 15% das crianças
Na Carolina do Norte foram diagnosticados 14% dos rapazes enquanto na Califórnia os casos ficaram nos 7%. (C. Gonzalez, Crescer Juntos, p.144)
Entretanto, muitos especialistas acreditam que a perturbação de hiperactividade é sobrediagnosticada, em grande parte porque os critérios são aplicados de forma imprecisa. 
Ora acontece que muitos destes critérios são avaliados em questionários, como a Escala de Conners, e respondidos por pais e por professores, o que revela um elevado grau de subjectividade nas respostas que são dadas.

Também não é de espantar que a idade da criança seja um factor a considerar. Quanto mais nova a criança mais instabilidade apresenta, ou seja, quanto mais maturação neurológica menos hiperactividade.

Ora se concordarmos que se trata de uma doença, só em casos verdadeiramente excepcionais devia haver medicação. (3) 
Há muito a fazer antes disso: Se as crianças tiverem mais actividade começarão a apresentar menos hiperactividade.

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(1) "... há crianças muito calmas e há crianças muitíssimo irrequietas, difíceis de controlar. Alguns estudos sugerem que uma em cada dez crianças é muito difícil de educar, por irrequietude, mas apenas uma em trinta virá, no futuro, a apresentar hiperactividade." («Crianças pré escolares "supra activas"» Centro Distrital de Desenvolvimento da Criança, Hospital Amato Lusitano)

(2) Sobre «O conceito de "doença" (C. González, Crescer Juntos, p. 145 a p. 151). «O campo da psiquiatria é particularmente propenso ao surgimento de doenças »; «... a hiperactividade é precisamente uma das doenças "inventadas" (ou pelo menos enormemente exageradas)...»

(3) Há opiniões que consideram que a medicação é a primeira opção (idem, p.154). Porém, desde há  muito, se defende o contrário.  Eduardo Sá: "As crianças excessivamente medicadas estão em perigo e deviam ser protegidas pelas comissões (de proteção de crianças e jovens) tal como as outras". (Jornal do Fundão, 12-6-2008)


22/05/24

Educar é crescer juntos (2)


 

Correndo o risco de parecer paternalista, Crescer juntos é um livro de Carlos Gonzalez que recomendo a todos os educadores e, em particular, aos pais e professores. 

"Crescer juntos” é uma forma  saudável de educar, adequada ao desenvolvimento das crianças e dos alunos mas também dos pais e de  instituições como a escola.  “Crescer juntos” significa que os pais estão implicados no processo educativo dos filhos assim como a escola e as instituições da sociedade.

Saber como exercer a parentalidade ou qual é a melhor forma de exercer a autoridade     ou de como as teorias psicológicas podem ser usadas na educação dos filhos, tendo em conta o desenvolvimento resultante do crescimento e maturação, faz parte de uma forma natural de educar que não exclui a intervenção do adulto na aprendizagem de ambos.


Mas as grandes questões que se colocam aos pais sobre a educação dos filhos passam por questionar diagnósticos como a perturbação de hiperactividade com défice de atenção (PHDA) ou outras formas desajustadas de classificar ou rotular as crianças como “crianças índigo” ou “crianças orquídea”...

Há métodos educativos discutíveis em relação à alimentação, ao sono, à aplicação de castigos. O que é um castigo? O que é a “cadeira de pensar”? O que é ensinar pelas consequências ? Quando se deve medicar uma criança?


Por estas razões, e muitas outras que não referimos aqui, a presença dos pais na escola, individualmente, ou através das Associações de Pais, é cada vez mais importante. E ao contrário da desconfiança mútua que pode, por vezes, existir, deve haver maior colaboração e cooperação. Pais e professores trabalham para o mesmo objectivo: o desenvolvimento integral dos filhos e educandos. 

Os pais têm uma palavra a dizer sobre o currículo: disciplinas, programas, manuais, actividades e projectos, avaliação...

Estive dos dois lados, como psicólogo (SPO) e professor e também como pai e representante da Associação de Pais da escola dos meus filhos e foi o que procurei fazer. Nessa altura como agora, a palavra de ordem deve ser: "sempre ao lado dos pais, sempre ao lado dos professores, para estar sempre ao lado dos alunos”.


Não faz sentido o que se vê/lê nas redes sociais: a divisão entre pais que educam e  professores que ensinam, ou seja, os meninos devem vir educados de casa e a escola poderá então fazer o seu papel de instrução.  

Em algum momento, pode haver maior intervenção dos professores no currículo escolar mas os pais não podem ser descartados. O currículo envolve tudo o que faz parte da educação e instrução do aluno.

A família tem papel fundamental na educação dos filhos mas nem sempre as crianças têm um lar, uma família, e, por diversas razões, as crianças são entregues a instituições. 

Também há crianças que nem sempre têm uma família mentalmente saudável. Quem as deve educar? Com certeza,  ambas as instituições. 


A escola às vezes tem que ensinar as competências mais básicas da educação: a higiene, as refeições,  o reforço alimentar, saber ser e estar, resolver conflitos com os colegas e adultos... 

Para estas crianças a escola é o primeiro e último recurso. E a escola devia ter orgulho em fazer esse papel. Mesmo quando os recursos são insuficientes e a escola não faz mais porque humanamente não pode.



Até para a semana.






 Rádio Castelo Branco 

17/05/24

Educar é crescer juntos


Neste mundo tão complexo que é o nosso, o papel dos pais na educação dos filhos é cada vez mais importante. É por isso necessário que os pais estejam atentos a tudo o que tem implicações na vida dos seus filhos.

As consequências da pandemia devido ao isolamento social  manifestam-se não só a nível das aprendizagens como a nível emocional. Podemos já dizer que “não ficou tudo bem”  e que “nada vai ser como dantes”.

Muitas mudanças porém já se faziam sentir e a peste emocional (W. Reich) existe no coração dos homens mesmo sem pandemia. O que mudou no interior da família, o que mudou na parentalidade?

Carlos Gonzalez em Crescer juntos - Da infância à adolescência com carinho e respeito,  fala-nos sobre os pais que crescem com o crescimento dos filhos.

É um livro pré-pandemia que começa por perguntar: “Quem são os pais de hoje?" E a resposta é: “Não sabemos”.

Mas sabemos que  houve mudanças na sociedade,  com implicações na educação dos filhos. CG refere algumas dessas mudanças: mais dúvidas, culpa, solidão, idade, número de filhos, stress, divórcio, TV. (p. 11-42)

Vejamos algumas dessas implicações.

Há mais dúvidas. As mães antes tinham mais certezas e o conhecimento sobre a educação dos filhos era feito directamente. A realidade é que hoje em dia as mães procuram respostas em livros e revistas ou junto de peritos, pediatras, enfermeiros psicólogos e educadores...


Parece que muitas mães se sentem culpadas pela forma como educam os filhos e há sempre gente disposta a questionar porque é que a mãe faz de uma determinada maneira e não faz de outra...

Ora nós sabemos que não há apenas uma, mas  muitas formas diferentes,  igualmente válidas, de educar uma criança.

 

Hoje em dia os pais também estão mais sós do que antigamente, em que era habitual  a convivência com os tios, primos,  avós, etc. Os avós sempre colaboraram na educação dos seus netos mas era uma colaboração “em paralelo” em que se partilhava o trabalho, responsabilidade e a mesa da família, havia sempre algum adulto em casa ...  agora trata-se de uma colaboração “em série”, a criança passa da casa dos pais, para casa dos avós, para a escola... muitas vezes sem comunicação.

 

Antigamente não havia televisão. A minha geração viu todo o desenvolvimento que os meios de comunicação social tiveram nos últimos 70 anos.

A televisão não deve ter um papel preponderante dentro da família. Infelizmente parece ter lugar destacado em muitas famílias.

 

Quanto ao uso do telemóvel sabemos a luta que as famílias e as  escolas têm que travar para o uso racional deste aparelho. Começamos agora a ter a noção dos prejuízos que um aparelho feito para a comunicação e relação provoca no isolamento social e das consequências do mau uso que os adolescentes lhe dão.

 

Por isso faz sentido que estejamos atentos, porque sabemos que há outros “educadores externos” à família e, havendo maior diversidade de perspectivas educativas, o papel dos pais ganha mais relevo na educação. 

 

 

 

Até pra semana.



 

 

Rádio Castelo Branco






08/05/24

A ideologia de género

 


A ideologia de género está subjacente à irracionalidade que tem vindo a atingir a vida das pessoas que, de uma forma perturbadora, são afectadas no seu pensamento, na tolerância e respeito que também lhes são devidos. É elementar que haja liberdade para pensar aquilo que são os pontos de vista baseados na ciência e na racionalidade. E que sejam respeitados também os direitos dos pais na educação dos filhos.


Ainda a onda da irracionalidade da ideologia de género não tinha chegado ao ponto em que está na Assembleia da República, já Miriam Grossman psiquiatra de crianças, jovens e adultos, em 2009, tinha começado a alertar os pais para o que estava a ser ensinado na escola sobre educação sexual, no livro: “Você está a ensinar ao meu filho o quê?”

Esta racionalidade, inserida na contestação à teoria/ideologia  de género é também necessária para que os pais possam argumentar contra frases feitas que são autênticas falsidades.

Contra a expressão “nascer num corpo errado”, Miriam Grossman diz que "nenhuma criança nasce no corpo errado". Para ela, "toda a criança nasce no corpo certo". 

Outra falsidade é dizerem que os outros “só têm que respeitar”. Como?

Jean-François Braunstein em A religião woke dedica um capítulo à ideologia de género: "Uma religião contra a realidade - a teoria de género". 

É uma análise da realidade em confronto com a ilusão.
“Poder-se-ia evidentemente dizer que esta entrada num mundo imaginário não incomoda ninguém, mas, contudo, traz consigo uma série de consequências. “Antes de mais, porque existe um risco, para alguns dos que mergulham nesta ficção, de ficarem presos nela...
Em seguida, porque se está a pedir que cada um de nós, individualmente, e como membros da sociedade participe neste mundo imaginário.
Por fim, ... alguns destes transgéneros são militantes e proselitistas que, não se contentando em eles próprios mudarem de género ou de sexo, se propõem a converter crianças e adolescentes.”

"Esta desrealização do sexo e do corpo, o facto de a aparência física já não contar absolutamente nada para os defensores da teoria de género, manifesta-se em particular em torno da questão dos "pronomes"...A questão do género é assim tão sensível porque conduz, não apenas a uma negação afirmada, descomplexada e conquistadora da realidade, mas também à vontade de que esta ilusão seja partilhada" (p. 85)
Para as crianças, “é uma coação insuportável obrigá-las a ver uma coisa, neste caso um homem, e a dizer que é outra coisa, isto é, uma mulher ou um “não-binário”. Esta obrigação é radicalmente destruidora do testemunho dos sentidos: pressupõe que o real não existe e que existem apenas consciências separadas de qualquer ancoragem física.”
"É isto que não é aceitável impor às nossas crianças e é aqui que a seita dos wokes melhor mostra a sua intenção de destruir o mundo pela raiz." (p. 88)

Outra falsidade que se repete tantas vezes que acaba por ser aprendida e imitada na legislação é "o sexo atribuído à nascença". 
Atribuído à nascença? Nem é atribuído nem é à nascença. “Como se o sexo da criança não pudesse ser determinado antes do nascimento, na ecografia ou mediante uma simples colheita de sangue e um teste genético.” (p. 90)


Até para a semana.

 


 


Rádio Castelo Branco

 






01/02/24

De Watson à Assembleia da República


1. Na sequência da lei n.º 38/2018, de 7 de Agosto, sobre o "Direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa", foi aprovado (1) pela Assembleia da República, o decreto que estabelece medidas a adotar pelas escolas para garantir esse direito.
Segundo esta lei, as escolas devem definir “canais de comunicação e deteção”, identificando um responsável ou responsáveis “a quem pode ser comunicada a situação de crianças e jovens que manifestem uma identidade ou expressão de género que não corresponde ao sexo atribuído à nascença”.
Após ter conhecimento desta situação... a escola deve promover a avaliação da situação, reunir toda a informação relevante para assegurar o apoio e acompanhamento e identificar necessidades organizativas e formas possíveis de atuação, a fim de garantir o bem-estar e o desenvolvimento saudável da criança ou jovem”.  Como a garantia do acesso às casas de banho e balneários...

Podemos questionar: Sexo atribuído à nascença? Definir canais de comunicação e deteção? Identificar um responsável? Garantir tendo presente a sua vontade expressa? 
De que jovens se trata? Em que idades? Qual o papel dos pais/encarregados de educação?
Por quê nas escolas? Por que não em todas as instituições da sociedade?

2. O texto desta lei é uma barbaridade. Mas tudo está dentro da lógica vinda de John Watson e de John Money. (Jean-François Braunstein, A Religião woke, cap. II - Uma religião contra a realidade - A teoria de género, p.71-106, Guerra e Paz),
Sabemos o que pensava Watson da modificação do comportamento quando em 1927, proclamou a sua famosa frase: “Dêem-me um bebé e eu farei dele o que quiser, um ladrão ou um juíz, um pistoleiro ou um médico…”
Esta conhecida afirmação resulta da teoria behaviorista, segundo a qual o meio em que ocorre a aprendizagem é fulcral para o desenvolvimento. Neste sentido, todo o bebé que seja estimulado a fim de ser algo, sê-lo-á, independentemente da sua carga genética. 
É, por isso, que este decreto ser de aplicação apenas na escola, portanto, a crianças pequenas, não deixa de ser perverso... (2)

3. Mas, ainda assim, também sabemos que as pessoas não são ratos e que pensam... 
Foi o que fez o Sr. Presidente da República,  Marcelo Rebelo de Sousa. Vetou o decreto que estabelecia estas medidas a aplicar pelas escolas
Segundo disse: "A aplicação nas escolas das medidas preconizadas no diploma tem necessariamente de ser ajustada às várias situações e, em particular, à idade de crianças e adolescentes"...  " o decreto peca por uma quase total ausência dos pais e encarregados de educação na implementação das medidas previstas."

4. As escolas, juntamente com os pais, sabem lidar com as diferenças, desde há muito tempo... e não precisam destas leis vindas da AR, ou do Ministério da Educação, nem de supostos formadores que as vão ensinar, educar e formatar no sentido que pretendem... que é a desconstrução da estrutura social existente, sujeitando a maioria dos alunos a normas absurdas e que não fazem sentido para ninguém nem para as minorias nem para as maiorias que, pelos vistos, também têm direitos. 

Até para a semana.


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(1) O texto final foi apresentado por PS, BE e PAN, foi aprovado por estas forças políticas juntamente com o Livre, e contou com votos contra do PSD, Chega e IL e a abstenção do PCP.
(2) Sobre a fatídica experiência de John Money ver, por ex., o que tem dito e escrito Miriam Grossman.



Rádio Castelo Branco





08/11/23

O que é uma mulher




1. O jornalista Matt Walsh entrevistou pessoas por todo o mundo, para saber o que é uma mulher e o resultado pode ser visto no Youtube, no Documentário crítico sobre o género. O que é ser uma mulher? 

A entrevista também conta com  a opinião de Miriam Grossman, psiquiatra, e Jordan Peterson, psicólogo, que se atêm à realidade e desmontam opiniões e práticas discutíveis... 

Há quem ache que uma mulher é quem se identifica com uma mulher mas não sabe o que é essa pessoa com quem se identifica.

Matt Walsh vai para casa conforme J. Peterson lhe recomenda e pergunta à sua mulher: o que é uma mulher? A resposta: É um humano adulto fêmea.


2. Nunca me interessou o concurso das misses não era agora que isso me ia interessar. Mas não deixa de ser curioso ser  um dos temas de momento.

Miguel Sousa Tavares com José Alberto Carvalho estão a ser trucidados nas redes sociais sobre a posição que tomaram no comentário semanal.

Também  Joana Amaral Dias foi chamada de transfóbica  e até se põe em dúvida a sua formação académica ... 

O que é que está errado no que disse JAD? O que é uma mulher ? O concurso das misses é a  eleição de uma mulher? Ou de alguém que se identifica com uma mulher? Ou as duas coisas? Então digam à gente que é assim.


3. Aprendi na universidade que o ser humano era bio- psico-social, e, fora da universidade, que também era cultural e espiritual. É isto que nos faz como somos, ou dito de outro modo, são os genes e os memes. J. L. Pio Abreu explica isso em quem nos faz como somos

Estes são os factores que moldam a nossa personalidade. Para compreendermos uma pessoa temos que levar em conta todos eles. O que não é fácil.

Negar a biologia não me parece que tenha sentido se nos colocarmos numa posição racional. Cada um pode pensar que é aquilo que entende. Não será por isso que a realidade deixa de ser o que é, nem a genética se altera por grande que seja a minha vontade de ser outra coisa mesmo que seja outra coisa socialmente aceite

O que não é aceitável é que haja vantagens ou desvantagens, visíveis ou invisíveis, à partida,  de alguém, seja em que situação for, para quem disputa um concurso ou um lugar ou um emprego.


4. Leio A Religião Woke, de Jean-François Braunstein, e fico estarrecido. Se o problema teve origem nas universidades ele hoje está por todo o lado. E  isso diz respeito a cada um de nós. Temos o direito de não concordarmos com o wokismo e o dever de dizer não. Nas famílias e nas escolas.


5. O senhor ministro da educação acha que as crianças não são propriedade dos pais e que o estado lhes dá a educação que entender. Está enganado.

Há muito que aprendi com Khalil Gibran que os “Teus filhos não são teus filhos”. Mas se não são propriedade dos pais muito menos  são propriedade do estado. 

E o que também sei é que os filhos são da responsabilidade dos pais, pelo menos até aos 18 anos. E essa capacidade e responsabilidade o sr. ministro da educação não lhes pode tirar.

 

Até para a semana.

 



Rádio Castelo Branco