21/02/18

Contra o espírito do tempo 2


Marco Aurélio foi imperador romano durante 19 anos. O império  era marcado por guerras na parte oriental contra os partas, e na fronteira norte, contra os germanos.  Foi considerado o último dos cinco bons imperadores, é lembrado como um governante bem-sucedido e culto, dedicou-se à filosofia, especialmente ao estoicismo, e escreveu uma obra, Meditações.
O estoicismo é um movimento filosófico que surgiu na Grécia Antiga por Zenão, no início do século III a.C.. Valoriza o conhecimento e a razão  e desvaloriza os sentimentos externos e as emoções. É uma filosofia mas também um modo de vida e mais do que o individuo diz interessa como se comporta.

O que está em questão são os problemas psicológicos de cada pessoa sujeita ao stress e ansiedade, aos estilos de vida que sempre resultam da interacção entre os homens e dos homens com a natureza e o universo. Era assim há dois mil anos na cultura greco-romana como é assim, actualmente, em todas as culturas. Ultimamente, por aqui me perco porque é o melhor sítio para me encontrar, aprendendo todos os dias, meditando com os sábios, procurando obter a serenidade que é a busca mais conforme à natureza e à razão. 

Meditações, de Marco Aurélio, onde  encontro mais semelhanças do que diferenças com as tão na moda meditações de atenção plena (mindfulness), é de uma actualidade fascinante. Mostra que a cultura greco-romana tem muito mais a ensinar do que aquilo que ensinam nas escolas. Provavelmente, a filosofia e a importância dos pensadores que hoje nos fazem meditar sobre a nossa verdadeira natureza e sobre o que  é importante na nossa vida seria um bom contributo terapêutico contra as perturbações de ansiedade.
Epicteto, Marco Aurélio, Epicuro, os estóicos ou os epicuristas, por caminhos diferentes, contra o prazer ou pela sua busca, têm muito a ensinar sobre a felicidade,  sobre a forma de melhorarmos o nosso modo de vida e procurarmos uma sociedade de bem-estar.
O primeiro livro de Meditações podia ser considerado o livro da gratidão. Aí, M. A. agradece aos seus familiares, aos seus mestres e aos deuses tudo o que aprendeu, a sua personalidade, a virtude,  a inteligência, os modelos que teve.  Inicia assim o primeiro ponto: “Aprendi com o meu avô o carácter e a retidão.”
A Razão governa “a natureza (que) é flexível e dócil”. “És dotado de razão?  «Sou.» Então porque não usá-la? Não é tudo o que desejas? Que a razão faça o seu papel?”
O homem faz parte da natureza, o homem vive na presença da morte, que é desfazer-se nos elementos que o compõem, e, por isso, o que é a fama ? O que é o elogio? O que é belo não é sempre belo, sem precisar  de elogio?
Porque será que as pessoas acumulam bens desnecessários? Nos dias em que vivemos, podíamos perguntar: porque se generalizou a corrupção que quase sempre envolve milhões, se, afinal, “somente o necessário” é aquilo que interessa ao homem?  “A maior parte das coisas que dizemos e fazemos não são necessárias. Se conseguires eliminá-las terás mais tempo e tranquilidade. Pergunta-te a cada momento: «Isto é realmente necessário?» (p. 43)

14/02/18

Contra o espírito do tempo

Somente o necessário. O extraordinário é demais. Ou como diz o Eclesiastes (1,2): "Mαταιότης ματαιοτήτων, τα πάντα ματαιότης". "Vaidade das vaidades , tudo é vaidade".

O livro da selva - Bare necessities  - O necessário - Mogli e Balu

Pais com autoridade


As famílias ao longo das várias gerações confrontam-se sempre com o problema da  educação dos filhos 1, procurando conseguir uma  vida psicologicamente equilibrada num contexto de  bem-estar.
A questão é particularmente importante quando as crianças são desobedientes e  indisciplinadas e, ao contrário de pensar que a autoridade é um dom da natureza, um talento particular, e que não há nada a fazer, o  pedagogo ucraniano Anton Makarenko 2  defende que  a autoridade pode ser organizada em cada família. 3 O problema é que os pais organizam esta autoridade em bases erradas.
Podemos resumir alguns desses tipos errados de  autoridade:
A autoridade opressiva, é a espécie de autoridade mais terrível . O pai manifesta toda a sua cólera por qualquer coisa, mesmo sem importância, anula o papel da mãe, leva as crianças a afastarem-se, fomenta a mentira infantil, a cobardia e a crueldade.
 A autoridade distante  mantém as criança à distância e interage o menos possível, as ordens são transmitidas pela mãe que funciona como intermediária.
A autoridade vaidosa ou arrogante, os pais consideram-se as pessoas mais importantes da sociedade  e transmitem aos filhos esta ideia arrogante.
autoridade pedante.  Uma ordem transforma-se em lei.  As crianças não podem perceber que o papá se enganou e que não tem firmeza. Mesmo que esteja errado mantém o que disse….
autoridade racional. Neste caso os pais enchem a vida da criança de sermões, de conversas edificantes e discursos enjoativos…
autoridade afectuosa é uma forma de autoridade muito difundida  mas  errada e perigosa. As palavras de ternura, os beijos, as carícias, os testemunhos de afecto chovem literalmente sobre a criança. Esta autoridade  pode fazer egoístas, hipócritas e mentirosos. E muitas vezes as primeiras vítimas deste egoísmo são os pais.
A autoridade afável. Neste caso a obediência depende das  concessões, doçura, bondade dos pais. O pai e a mãe são o anjo bom. Uns pais de ouro. Temem toda a espécie de conflito, preferem a paz do lar, prontos a qualquer sacrifício desde que tudo vá bem. Nesta família as crianças começam muito cedo a mandar nos pais.
A autoridade amigável. Para os pais os filhos são os seus  amigos. Claro que os pais são amigos dos filhos  mas devem continuar a manter  a autoridade educativa. Se esta amizade for  levada ao extremo, são as crianças que  começam a educar os pais.
A autoridade corrupta é a forma mais imoral de autoridade, aquela onde a obediência se compra pura e simplesmente com prendas e promessas...
Esta atitude não se pode confundir com as formas de encorajamento, prémios por realizarem uma actividade realmente difícil, para recompensar bons estudos mas não quando se trata de cumprirem o seu dever como no trabalho escolar, p.ex.
Em geral, a educação será errada quando os pais não se preocupam em adquirir qualquer espécie de autoridade... Um dia punem o filho por um aspecto sem importância, no dia seguinte fazem-lhe uma declaração amorosa, a seguir punem de novo...
Também é errado o pai optar por um tipo de autoridade e a mãe por outro. Os filhos neste caso aprendem a ser diplomatas e a andar com rodeios entre o pai e a mãe.
Também acontece que há  pais que não têm qualquer atenção aos filhos e apenas pensam na sua tranquilidade.
Para Makarenko a verdadeira autoridade dos pais numa família deve basear-se, em primeiro lugar, na sua condição de cidadania, de pai e de ajuda e, em segundo lugar, na responsabilidade porque respondem pelos filhos face à sociedade e, por outro lado, essa responsabilidade é também exigida aos filhos.
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1 Pais com autoridade. Baumrind definiu vários estilos parentais.
2 Anton Makarenko, Oeuvres en trois volumes, Le livre des parents - Articles sur l'éducation - III, Ed. du Progrès, Moscou (“O livro dos pais - Artigos sobre a educação”). No artigo "Sobre autoridade dos pais" (p. 369-378) descreve vários tipos de autoridade parental e coloca a questão sobre a verdadeira autoridade dos pais e como se organiza.
3 Após a chamada revolução de Outubro, na Rússia, Makarenko refere "família soviética". O que é interessante é que a educação dos filhos e o bem-estar da família é idêntico em qualquer parte do mundo e tem extraordinária actualidade.

12/02/18

"A nova gramática do fascismo"

"Saiu discretamente na sexta-feira passada (Lei n.º 4/2018, de 9 de Fevereiro), sob a designação de "regime jurídico da avaliação de impacto de género de actos normativos", e entra em vigor a 1 de Abril...  A "avaliação", prévia ou sucessiva, destina-se a que os actos normativos do Estado (Central, Regional, do Governo e do Parlamento) "ponderem", antes de serem produzidos (e "entre outros" aspectos), "a incidência do projecto de acto normativo nas realidades individuais de homens e mulheres, nomeadamente quanto à sua consistência com uma relação mais equitativa entre ambos ou à diminuição dos estereótipos de género que levam à manutenção de papéis sociais tradicionais negativos".

11/02/18

Taxas e taxinhas: TMPC (3)

"Perante um governo de esquerda ou de direita, é frequente a complacência e elevado o grau de impunidade à esquerda ou à direita. Câmara ou governo de esquerda: a esquerda perdoa-lhes tudo. Câmara ou governo de direita: a direita perdoa.
No entanto, parece que a impunidade da esquerda é maior. Parece e é. Na verdade, a esquerda tem mais o hábito de protestar do que a direita. A direita acha que o poder, o nome e a fortuna tudo resolvem, enquanto a esquerda acha que é o protesto, a manifestação e a greve que decidem. Por isso se sente mais o silêncio da esquerda do que o da direita. Também ajuda o ambiente na comunicação social que é predominantemente de esquerda, o que confirma o aparente grau de impunidade de que esta goza.
A taxa de protecção civil decretada pela Câmara de Lisboa é um belo exemplo. Poucos protestaram quando foi criada. À esquerda, quase ninguém. A Câmara era de esquerda. Era um imposto. Aumentam as receitas do Estado (da Câmara). Ainda por cima, tem uma aparente utilidade social. A taxa, aprovada pela Câmara em 2015, foi cobrada durante três anos. Rendeu milhões de euros. O acórdão do Tribunal Constitucional (848-2017 de 13 de Dezembro de 2017) considerou-a inconstitucional. A pequena história desta taxa e deste acórdão merece atenção e é uma boa história moral..."

10/02/18

Doutor Jivago - B. Pasternak

Tema de Lara do filme Doutor Jivago (1965) - Música de Maurice Jarre
Doutor Jivago - Boris Pasternak (10/2/1890-31/5/1960)

"Em 1958, Boris Pasternak publicou seu mais conhecido trabalho no mundo ocidental: o romance Doutor Jivago. O livro não pôde ser publicado na então União Soviética, devido às críticas feitas ao regime comunista na obra. Os originais do livro foram contrabandeados fora da Cortina de Ferro e editados na Itália, tornando-se rapidamente em um verdadeiro best-seller, fazendo de Pasternak ganhador do Nobel de Literatura.
Entretanto, pelo fato de ser um livro proibido pelo governo de Moscou, Pasternak foi impedido de receber o Nobel e acabou sendo obrigado a devolver a honraria. A proibição da publicação de Doutor Jivago dentro da União Soviética vigorou até 1989, quando a política de abertura de Mikhail Gorbachev, então líder da URSS, liberou a publicação da obra. Somente neste ano, os russos puderam conhecer a saga de Jivago.
Em 1965, Doutor Jivago ganhou uma adaptação para o cinema..." (wikipedia)

08/02/18

"A arte descobre a criança"


















Mondrian - O Moinho Vermelho (1911)                                                              M. - 7 anos


A criança revela-se...

Rendimento escolar

Os resultados dos exames nacionais, vulgarmente conhecidos como "ranking das escolas" (Sol, b,i. nº151, 3/2/2018), relativos a 2017, foram recentemente publicados. São um instrumento de trabalho (1) de que o sector de educação dispõe para melhorar a qualidade de ensino. Assim, devia servir para todas as análises que se pretendesse fazer sobre o rendimento escolar. Mas em vez disso, a sua publicação (2) continua a ser objecto de controvérsia,  talvez porque continua a haver quem prefere esconder os resultados por motivos ideológicos, não quer ver a realidade nem se interessa com a liberdade dos cidadãos para poderem fazer as escolhas educativas dos filhos.
A escola é o futuro e tudo o que possamos saber acerca dela, positivo e negativo, é preferível a vivermos numa nebulosa de indiferenciação e irresponsabilidade.
A avaliação escolar, em todos os níveis, é um dos critérios de qualidade das escolas, que, como em qualquer organização, deve fazer parte da sua gestão. (3) Por isso, a discussão entre escola estatais (3) e privadas, em relação a este assunto, é completamente inútil. O ranking deveria existir mesmo que todas as escola fossem estatais ou todas fossem privadas, com contratos de associação, ipss ou cooperativas.

A situação actual, relativamente aos  resultados dos exames nacionais, tem vindo a mostrar, entre outras reflexões, o seguinte:
- As escolas privadas obtêm melhores resultados do que as escolas estatais.
- As escolas estatais melhoraram os resultados em relação ao passado - menos escolas com médias negativas nos exames.  Esta é uma situação de assinalar porque os rankings têm esta função: fazer com que a partir de uma situação desfavorável seja possível efectuar melhorias nos processos de ensino-aprendizagem que se traduzam em melhorias nos resultados.
- Algumas escolas estatais que sofreram intervenções de requalificação das suas instalações obtiveram melhores resultados.
 - O abandono escolar dos alunos do ensino profissional está a aumentar.
- Há um factor que tende a ser ignorado e que não sabemos qual o peso que pode desempenhar nos resultados dos exames: o factor "explicações", uma autêntica instituição educativa que os pais pagam em duplicado (pelos impostos e pelas  mensalidades).
- Numa classificação haverá sempre primeiro e último. O problema é a divergência dos  resultados negativos em relação à média e este podia ser o principal objectivo das melhorias a introduzir: conseguir resultados positivos
- Contribuição para a regulação do sistema educativo relativamente ao ingresso no ensino superior. A divergência entre resultados internos e externos mostram bem a possibilidade de inflacionar as notas internas e a distorção e injustiça relativamente ao acesso ao ensino superior.  Os resultados externos são uma boa maneira de avaliar as escolas quando as divergências são muito grandes e sistemáticas.
- A classificação no ranking não significa que não haja bons alunos do ponto de vista do rendimento académico em escolas do final do ranking e maus alunos em escolas bem colocadas. Os resultados conhecidos podem levar a melhorias que venham a beneficiar, em especial,  os alunos com mais dificuldades. (4)
- Os resultados nos exames em forma de ranking de escolas, só faz sentido se estivermos a falar da classificação das escolas resultante dos exames nacionais. Há outras dimensões educativas das escolas: o ensino tecnológico e profissional, os projectos de currículos alternativos, as modalidades de apoio a alunos com deficiências, as escolas profissionais de artes, de música, etc..
- A auto-estima de pertencer a uma escola com bons resultados, a uma turma com bons resultados, ou a uma escola que faz progressos é ela própria garantia de que os alunos se sentem mais confiantes. Não há nada melhor para o sucesso do que o próprio sucesso. Ganhar é sempre estimulante mas, por outro lado, perder não deixa de ser desafiante.
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(1) Os resultados não são uma fotografia do que são e do que se passa nas escolas. O sistema de ensino é muito mais rico e interessante do que as estatísticas, quaisquer que elas sejam. Isto não justifica que o sr. ministro da educação desvalorize os rankings, aliás, o sr. ministro desvaloriza as avaliações e os os exames, tal como o 1º ministro (“tal como um raio x não cura um doente também um exame não faz a aprendizagem dos alunos”). Mas o que será que ele valoriza, do que é que o sr. ministro é "adepto" na educação? Podia ao menos reconhecer que há todo um trabalho anterior, inclusive a introdução de exames, que tem tido como consequência a melhoria dos resultados escolares em provas nacionais ou internacionais (PISA, TIMSS), onde os rankings também existem.
(2) Sempre defendi a transparência e a divulgação pública de avaliações, rankings, classificação dos resultados dos exames, com os nomes das respectivas escolas (escola pública explicações privadas, resultados escolares e cultura, a difícil tarefa de organizar turmas, motivação de sucesso o melhor prémio ).
 A sua divulgação pública por parte do ministério da educação só pecou por tardia e, passados dezassete anos sobre o início desta prática, em 2001, é anacrónico e sem sentido, discutir se devem ou não ser publicados rankings dos resultados dos exames. Devia desde sempre ser publicamente acessível para que todos os interventores da educação tivessem conhecimento da  situação relativa de cada estabelecimento de ensino de forma a poderem ser estabelecidos planos e projectos de melhoria, de forma a que os pais pudessem saber qual a escola onde deviam colocar os seus filhos, os contribuintes pudessem saber como é aplicado o dinheiro dos seus impostos, ou, no caso dos privados, também o pagamento das suas mensalidades.
(3) Pública não é nem mais nem menos do que estatal. Todas as escolas são públicas, apenas diferem na gestão: o estado e ou uma entidade privada ou do sector social. O contributo para educação das futuras gerações deve-se, por isso, à concorrência destes sectores e à convergência para os mesmos objectivos: formar cidadãos responsáveis, participativos, cumpridores dos deveres de cidadania, com elevados princípios éticos e morais.
(4) Participei, como representante dos SPO, com professores e representantes dos pais, em muitas dezenas de conselhos pedagógicos. Muitas destas  reuniões, chatas e compridas, dedicadas à avaliação, eram, no entanto, fundamentais para se  poder progredir em relação aos resultados dos alunos e à qualidade da educação. Havia real preocupação com os níveis positivos e  negativos obtidos pelos alunos, queríamos saber as causas de isso estar a acontecer, ficávamos orgulhosos quando os resultados eram, comparativamente, melhores do que noutras  escolas ou do que a média nacional.


01/02/18

Educação parental

As famílias, qualquer que seja a sua estrutura, têm dificuldade nas interacções entre os seus diversos elementos, sendo particularmente evidente, a dificuldade que sentem na educação dos filhos.
O problema da educação dos filhos sempre levantou interrogações. As crianças sempre foram mais vítimas dos comportamentos dos adultos e das vicissitudes históricas em que nem sequer eram reconhecidas as necessidades próprias da infância.
A "educação" das crianças passou por vários modos (L. Demause) ao longo do tempo,  desde o modo infanticida,  ao modo abandonante …  até à actualidade, em que o modo é o de ajudar a criança, ou seja, o fim absoluto da humilhação para controlar a criança e ajudar os pais a ajudar a criança a atingir os seus objectivos mais do que socializá-la ao gosto do adulto.

O quadro legal em que vivemos* é muito diferente de outros momentos históricos. Felizmente, hoje, podemos falar dos direitos da criança. As crianças obtiveram direitos à medida que a sociedade também evoluiu no sentido do reconhecimento dos direitos humanos. Porém, o quadro actual dos direitos da criança inscritos na “Declaração dos direitos da criança” e na “Convenção sobre os direitos da criança”, está longe de ser respeitado. Pelo contrário, os abusos estão por todos os lados e atingem muitas famílias, sendo, aliás, dentro das famílias  que verificamos muitos dos abusos em que as crianças são as principais vítimas. O que quer dizer que nem sempre os pais são  a melhor protecção para as crianças nem para decidirem em seu nome.

A visão de que as crianças são uns pequenos ditadores deixa muito por explicar mas pode levar a que muitas pessoas achem que “de pequenino é que se torce o pepino”,  adágio que não deixa de estar certo, excepto quando signifique que é com castigos corporais que se educam as crianças.
Não podemos confundir punições com castigos corporais (maus-tratos físicos)  e humilhação (maus- tratos psicológicos). Não podemos pensar que  um programa de contingências de reforço é o único método  de modificação do comportamento. Ou que é aplicável de forma rápida e simples. Além disso, deve haver sempre referência aos estádios de desenvolvimento da criança.  Ou seja, não generalizar comportamentos registados e seleccionados nos programas televisivos aos comportamentos de algumas crianças como se  correspondessem  a uma tipologia comportamental. Há algumas crianças que têm comportamentos daquele tipo mas na maioria das vezes têm significados diferentes  e elas são as vítimas.

É fácil constatar que os pais de crianças com problemas comportamentais não têm ajudas, não sabem como resolver esses problemas, fazem o que pensam que é melhor para a educação dos filhos, mesmo que isso implique a sua exposição pública num programa de televisão, num reality show. Mas este é outro problema que deve ter resposta da escola, das artes, da saúde, do desporto, dos tempos livres...
Os pais devem esperar dos filhos, em determinadas idades, comportamentos desajustados que, no entanto, fazem parte do desenvolvimento e que não são mais do que crises normais do desenvolvimento. E, vistas bem as coisas, que drama há em ter dificuldades com uma criança às refeições ou ao deitar, comparadas com o mundo dos adultos - conflitos mesquinhos, todo o tipo de violência, corrupção ao mais alto nível... – que é bem mais medonho do que este mundo da infância que está a aprender a regular-se e a ser sociável, a aprender seguir alguns modelos adultos e a recusar, necessariamente, outros.

A Ordem dos Psicólogos Portugueses (OPP) elaborou um Parecer  sobre “o Impacto  da Exposição das Crianças e Jovens em Programas com Formato de Reality Show”,  isto é, sobre as consequências negativas a nível da criança e a nível da audiência e do público em geral,  que podem advir da exposição mediática das crianças em virtude da sua participação neste tipo de programas.
A nível da criança, as consequências têm a ver com  a falta de consentimento informado, a violação da privacidade, a exploração de uma imagem negativa da criança, o sofrimento psicológico e a interferência na relação com os outros.
As repercussões negativas na audiência e no público em geral são, por exemplo, a imitação dos comportamentos disruptivos;  a ideia, falsa, de que os problemas apresentados são resolvidos com soluções imediatas, rápidas e simples; a exposição da vida das famílias pode degradar a sua imagem…

Os riscos deste tipo de programas são mais do que suficientes para que não se tenha a veleidade de pensar que supernanny é um programa de informação e ou educação sem contra-indicações. 

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* Convenção sobre os direitos da criança (Adoptada pela Assembleia Geral nas Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990; Lei 147/99, de 1 de Setembro (Lei de protecção de crianças e jovens em perigo)

Bom e Mau Juiz

 


"No Painel inferior e principal assentam as figuras do Bom e Mau Juiz, acompanhadas por figuras comuns de um julgamento civil. O Bom Juiz segura a vara reta da justiça com dignidade e expressão solene, em oposição ao Mau Juiz com duplo rosto e a vara da justiça quebrada.
As figuras que encimam as cadeiras do Bom e do Mau Juiz são a Misericórdia no juiz íntegro e a perversão expressa na cabeça de um demónio no Juiz corrupto.​​"

Em 2018, "A Operação Lex investiga suspeitas de corrupção/recebimento indevido de vantagem, branqueamento de capitais, tráfico de influências e fraude fiscal". Nada de novo, pelo menos desde o séc. XV.