30/11/16

A dualidade da moral

Um dos ditadores mais controversos do nosso tempo e também dos mais anacrónicos na sua visão do mundo, faleceu a semana passada (25-11).
Como diz José Manuel Fernandes, (Observador27/11/2016), "Um ditador é um ditador. Ponto final, parágrafo".  Fidel Castro, ao fim de 57 anos de ditadura e de maldades sobre o seu povo, com factos concretos confirmados, devia ser assim considerado.
No entanto, mais uma vez, temos assistido a um ritual de exaltação do culto da personalidade, inclusive vindo de países democráticos, que mostram que os ditadores da chamada esquerda têm um tratamento diferente, uma reverência especial.

A conquista do poder, e a permanência nele por longos anos, feita através da violência, da repressão, da falta de liberdade e de liberdade de expressão, é diferente consoante se trate da visão política de quem a faz…
Por isso, podemos perguntar: O que faz desculpar os ditadores de uma área política  e não os de outra? 
A diferença é, desde logo, ideológica, isto é, haverá ditadores de esquerda ? A ditadura do proletariado não é defendida exactamente para impor pela violência uma determinada visão da sociedade?  E isso é politicamente  e  moralmente aceitável? Um assassinato  não é sempre um assassinato seja em nome da esquerda ou da direita ?  O que faz, então, que perante dados objectivos concretos um ditador criminoso possa ser considerado um herói, romântico ou não, desculpabilizando-lhe os crimes cometidos?

Antes de mais, a cegueira ideológica e o autoconvencimento de que o líder está a cumprir um alto desígnio que lhe foi outorgado pela história. A negação do comportamento criminoso é a defesa que torna sustentável a violência.
Em nome de que ideologia é então aceitável assassinar? Ou será que os  fins justificam os meios? Mas mesmo que os fins fossem moralmente desejáveis um assassinato nunca podia ser justificado.
Depois, o conformismo que resulta da pressão do grupo partidário, que vende cara a dissidência e a não adesão à “revolução”…
Mas o conformismo não explica tudo. As experiências psicológicas mostram a força do conformismo ao grupo. Mas também sabemos que há pessoas para quem a empatia com outro ser humano exerce uma força ainda maior  para que o possa ver com direitos inalienáveis, como o direito à vida.
Estamos perante uma situação de dualidade da moral. (Albert Szent-Györgyi, O macaco louco, p. 37-43
A vida e a morte de ditadores da chamada esquerda, também mostram bem a existência de dois códigos de moral. Um individual, outro público. É por isso que o ditador pode ser descrito como uma pessoas afável, conversadora…
No crime violento, na violência doméstica vemos a mesma situação: a pessoa tem um duplo registo da sua vida:  Bom rapaz na vida social, um monstro dentro de casa.
“Este duplo código de moral é geralmente aceite, sendo aplicado pelos governos em assuntos de polí­tica externa... (p. 41)
Provavelmente, é este duplo código de moral que provoca a mudança de rumo de muitos políticos de destaque que iniciam os seus esforços polí­ticos com o desejo de melhorar a sorte dos seus semelhantes. Depois de chegarem ao topo, tendem a trocar o seu código individual pelo colectivo; começam a servir ideias abstractas, que pouca relação têm com o bem-estar do seu povo, e fazem a guerra. A linha divisória entre a glória e o poder de uma nação e os dos seus dirigentes não é ní­tida. O sofrimento humano colectivo também se torna facilmente uma abstração." (p.42)
Mas, “a dificuldade é que a ciência moderna aboliu o tempo e a distância como factores separadores de nações; no nosso  encolhido mundo de hoje só há  espaço para um grupo: a família  do homem.” (p.41)
Por isso, só há espaço para uma moralidade e esta é a esperança de um mundo sem ditadores.

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