27/05/21

Java para o fim-de-semana

 

ZAZ e Aznavour - Java bleue

(Letra - Géo Koger and Noël Renard, música -Vincent Scotto)
Canção escrita em 1938. Foi inicialmente interpretado por Fréhel, em 1939.


Madeleine Peyroux - La Javanaise (Gainsbourg)



Khatia Buniatishvili - La Javanaise  (Gainsbourg)



História de javanaise 


Java é uma dança desenvolvida na França no início do século XX. A origem de seu nome é incerta, mas provavelmente evoluiu da valsa. Apresentada principalmente no bal-musette (baile popular) francês entre 1910 e 1960, a dança foi amplamente concebida devido à demanda popular por um novo tipo de valsa. Em particular, um que fosse mais fácil, rápido, mais sensual e não exigiria um salão de dança tão grande quanto os normalmente usados ​​para valsas. Java assume a forma de uma valsa rápida, com os dançarinos dançando muito próximos uns dos outros, dando pequenos passos para avançar. Os homens frequentemente colocam ambas as mãos nas nádegas de seus parceiros enquanto dançam. Naturalmente, isso fez com que alguns dos salões de dança bal-musette mais respeitáveis ​​proibissem o java.(Wikipédia)


O ranking das escolas à espera do Super-homem




Na semana passada, foi publicada pelo Ministéro da Educação, a lista de classificação das escolas, ou ranking das escolas, baseada nos resultados dos exames dos alunos do ensino secundário.
Esta classificação tem um valor relativo mas não deixa de ser o retrato, mesmo que imperfeito, do que se passa na educação. Serve ou devia servir como bússola e como aviso para se pensar o rumo da educação nas escolas e no país.
É fundamental para o diagnóstico mas também para o prognóstico educativo. É um instrumento de trabalho importante para o planeamento educativo, para a elaboração de planos de melhoria, para procurar soluções, para aprender com os melhores.
Em vez disso, tem gerado a contestação dos que não gostam de avaliações, e preferem desconhecer a realidade, os "negacionistas" do ranking das escolas.
Como os resultados colocam as escolas privadas nas primeiras posições da lista, de forma consistente ao longo de vinte anos, justificam esta situação pela baixa origem sócio-económica dos alunos que frequentam as escolas estatais e origem elevada os alunos das escolas privadas.
Mas estes resultados não são a mera constatação daquilo que todos já sabem e que não querem ver: a indisciplina, violência, que reina em muitas escolas estatais?

O documentário Waiting for Superman (à espera do Super-Homem), do realizador Davis Guggenheim (que a tvi passou há alguns dias), é um bom ponto de partida para ajudar a compreensão do ranking dos exames do ensino secundário.
O documentário trata da luta dos alunos e das suas famílias por uma boa escola para os filhos, das dificuldades que é entrar numa dessas escolas e da esperança que a lotaria das vagas pode trazer quando se é sorteado para entrar numa charter school, escola com contrato com o estado. 
Os números do ranking tal como os números do documentário significam pessoas com nomes e com famílias. As famílias do Anthony, Francisco, Bianca, Daisy e Emily.
São pessoas concretas, crianças e pais, trabalhadores, às vezes com problemas de emprego, que têm dificuldade em dar aos seus filhos a educação que desejam, ou seja, colocá-los numa escola um pouco melhor. São pais que valorizam a educação e que sentem que a educação dos filhos é mais importante do que tudo o resto das suas vidas.
Por isso, o importante é tirá-los de escolas que são fábricas de desistentes, como em Pittsburg, onde os alunos, empurradas pelo sistema, andam na escola mas sem qualquer interesse na vida
Como se diz no documentário, bairros fracassados dependem do fracasso na escola e o fracasso na escola leva ao insucesso na vida. 

O futuro dos cidadãos e dos países joga-se na sala de aula. Como não se investe na educação, teremos no futuro os custos sociais e económicos de muitas famílias, problemas sociais, problemas com a policia e justiça, problemas dentro das próprias famílias. *
É sintomático deste insucesso que o governo actual tenha fechado 24 colégios num ano e a quase eliminação dos contratos de associação. 
Não, o super-homem não nos vem salvar.


Até para a semana.

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* Como se constatou com o programa Head Start.







20/05/21

Fringe benefits




Os fringe benefits (benefícios sociais, acção social complementar ou benefícios adicionais) (1) são um subsistema de apoio social das organizações que visa complementar necessidades permanentes ou de emergência ou, ainda, uma  regalia dos seus trabalhadores.

São muitas vezes uma maneira de complementar, em espécie ou com subsídios, os salários dos trabalhadores (remuneração indirecta). (2)

Têm como objectivos fundamentais:

- esbater as diferenças salariais dos trabalhadores, na medida em que todos têm acesso aos serviços e prestações sociais concedidas.

- motivar para o trabalho  e  manter a motivação na organização.

- contribuir para a estabilidade familiar dado que os apoios se verificam em relação a pessoas mais frágeis, crianças, idosos, famílias com carência económica.

- proteger as franjas menos remuneradas e mais carenciadas dos profissionais da organização.

- diferenciar e prestigiar a organização e servir de atractividade no recrutamento de pessoal e manter a  continuidade dos trabalhadores na  empresa.

- contribuir para o bem-estar dos trabalhadores através de actividades culturais,  desportivas, de férias e lazer...


Os benefícios sociais existem em praticamente todas as empresas e organizações (3), privadas ou estatais, como instrumento da gestão para melhorar o desempenho e a motivação e dessa forma aumentar a produtividade.

O estado   é a maior organização empresarial do país. Como tal criou serviços de acção social complementar para os trabalhadores nos vários ministérios governamentais.

Os actuais serviços sociais da administração pública (SSAP) são o resultado da fusão de vários de serviços sociais de vários ministérios, como os serviços sociais da presidência do conselho de ministros, do ministério da saúde, da educação ....  

 

Também nas empresas privadas foram criados benefícios sociais como seguros de saúde, actividades de animação sócio-cultural e desportiva como os CCD (Centros de cultura e desporto), para além de serviços públicos de acção social complementar como o Inatel, as pousadas de juventude ...  

Muitos destes serviços sociais são também responsáveis pela assistência na saúde como os SAMS dos bancários ou os serviços sociais da CGD, das forças armadas, forças de segurança, de muitas empresas...

 

A responsável do governo para a Modernização do Estado e da Administração Pública, Alexandra Leitão, foi pouco sensata ao querer criar uma residência para alunos do ensino superior, em Lisboa.  Certamente a ministra podia fazê-lo, se se entendesse que este apoio correspondia a uma necessidade dos beneficiários. E corresponde. Porém não teve em conta o timing, a situação real das necessidades de todas as famílias portuguesas com  alunos que têm de se deslocar para estudarem na universidade, numa área em que há imensas carências de residências para estudantes. Por outro lado, nesta área há alternativas para esta necessidade como o subsídio de estudos.

Claro que por tudo isto, a governante foi contestada e nem se esperava outra coisa. Pena é que a contestação seja aproveitada para atacar os chamados privilégios dos funcionários  públicos...

 

Apesar do que disse sobre a necessidade e importância dos  benefícios sociais, que os justificam, são, de facto, um privilégio. Mas é da sua natureza  serem um privilégio.

Assim, há que ser claro. Ou eles existem nas organizações como contributo para a melhoria da qualidade de vida dos seus trabalhadores e com vantagens para as organizações ou, então, imponham limites ao seu âmbito de actuação ou, finalmente, acabem com eles mas assumam essa responsabilidade pelas consequências daí resultantes. *

 

Até para a semana.

 

 

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(1) Idalberto Chiavenato, Administração de recursos humanos, vol. 3, Ed. Atlas, 1985, cap. 2 - Planos de benefícios sociais, pags 100-112.


(2) Normalmente estes serviços são sustentados com verbas do orçamento do estado mas também são comparticipados  pelos beneficiários. Aliás nenhum serviço deve ser gratuito  (I. Chiavenato, pag. 110).


(3) Os benefícios sociais têm história recente (I. Chiavenato, pag. 101) mas as organizações desde sempre tiveram este assistencialismo que dependia da vontade dos empresários: habitação económica, creches para os filhos dos trabalhadores, transporte para as fábricas... Basta ver os extraordinários exemplos de Alfredo da Silva ou de Rui Nabeiro. Em entrevista recente, Rui Nabeiro disse que gostava de ver o sorriso dos trabalhadores e, por isso, os apoiava na saúde (odontologia). Obviamente que este paternalismo assistencialista ou este Plano de Benefícios socais da Delta cafés significa também benefícios para a empresa. 

* Nota - Tenho uma visão muito positiva dos fringe benefits. Fui e sou beneficiário de alguns serviços sociais. Trabalhei como técnico superior (psicólogo) nos Serviços Sociais da Presidência do Conselho de Ministros (SSPCM) de 1987 a 1991. 









15/05/21

A nova censura

Estátua da liberdade - Paris



A liberdade de expressão é um assunto extremamente sensível que deve ser tratado com todo o cuidado.
“No dia 8 de Maio de 2021, foi promulgada (1) pelo Presidente da República aCarta de Direitos Humanos na Era Digital que estabelece um novo Direito: a “protecção contra a desinformação”. Trata-se de uma proposta do PS e do PAN. (2)
Quando se trata de controlar a informação, a tentação do poder é grande e agora foi encontrado um pretexto, a internet, a informação via internet.

Na semana em que um secretário de estado (3) classifica o programa da RTP1, 6ª às nove, como “estrume”, justifica-se ainda mais a preocupação. 
O poder tem sempre a tentação de calar as vozes discordantes. Para a húbris o poder é mais forte quando controla a comunicação social. 

Uma das mais importantes “conquistas” do 25 de Abril foi a liberdade e a liberdade de expressão sem a qual não existe aquela. O direito à informação livre é uma visão positiva do funcionamento social mas o que esta legislação vem trazer é uma visão negativa, restritiva, sem critérios... Misturar isto com direitos humanos é, realmente, a primeira desinformação.

O diploma tem aspectos positivos (4) mas outros são perigosos para a democracia como o conceito de desinformação e a forma de a controlar.
Por desinformação entendem “toda a narrativa comprovadamente falsa ou enganadora criada, apresentada e divulgada para obter vantagens económicas ou para enganar deliberadamente o público, e que seja suscetível de causar um prejuízo público, nomeadamente ameaça aos processos políticos democráticos, aos processos de elaboração de políticas públicas e a bens públicos.”
Estas narrativas falsas são, entre outras, referentes à “saúde, meio ambiente ou segurança”. Ou seja, a todas as narrativas.

E quem vai controlar estas narrativas é a ERC, Entidade reguladora para a comunicação social, porque “Todos têm o direito de apresentar e ver apreciadas pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social queixas contra as entidades que pratiquem os atos previstos no presente artigo... “ (nº 5, artº 6)
Além disso, “O Estado apoia a criação de estruturas de verificação de factos por órgãos de comunicação social devidamente registados e incentiva a atribuição de selos de qualidade por entidades fidedignas dotadas do estatuto de utilidade pública.” (nº 6, artº 6º)
Já tínhamos a comunicação social de referência e agora passará a haver “estruturas de verificação de factos por órgãos de comunicação social”, com selo de qualidade! 

Como se conjuga isto com a constituição? Não se conjuga porque a Constituição da República Portuguesa garante nos artigos 37º e 38º a Liberdade de Expressão e de Imprensa, não podendo ser limitados por “qualquer tipo ou forma de censura” e assegurando a “liberdade e a independência dos órgãos de comunicação social perante o poder político”.

Em conclusão: eu não quero este direito, obrigado! Chega-me a Constituição para definir o que é liberdade de expressão e os Tribunais para julgarem e decidirem quem comete infracções contra ela. 



Até para a semana.


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(1) Lamento que o Presidente Marcelo, por quem tenho todo o respeito como se pode verificar pelos textos deste blog, tenha promulgado esta lei sem qualquer reparo  à perigosidade que contém  para a liberdade de expressão.

(2) Aqui está a votação. Apesar do discurso de J. Cotrim Figueiredo não houve votos contra. 

(3) O Sr. João Galamba. Mas depois do primeiro ministro ter dito que Paulo Rangel, Poiares Maduro, Ricardo Baptista Leite, "lideram uma campanha internacional contra Portugal", de chamar a Rio, que se põe a jeito e por quem não tenho simpatia, "cata-vento" sem pontos cardeais, do Sr. Cabrita ter chamado partido "náufrago" ao CDS, de o primeiro ministro ter apelidado de "repugnante" aos países que chamam de "frugais"... o que se pode esperar?

(4) Aspectos positivos desta lei, por ex., herança digital, direito ao esquecimento, direitos autorais em contexto digital...









05/05/21

Manifestações violentas



As manifestações do 1º de Maio em Bruxelas, Paris e um pouco por todo o lado,  apesar do controle dos respectivos aparelhos político-sindicais dos partidos, acabam quase sempre na maior das confusões entre várias facções  e destas com as forças da ordem ...

Estas manifestações, em regimes democráticos, deviam ter um clima reivindicativo um clima de alegria, paz, confraternização entre todos os trabalhadores ... ao contrário são marcadas pela violência entre manifestantes, contra a propriedade privada mas também a pública, violência contra a polícia ...


Movimentos e grupos sociais velhos ou novos, radicais, mas com ideias feitas, dos velhos anarquistas aos novos grupos de “acção directa”, facciosos das novas formas de violência climática, populistas, patrulheiros da linguagem e dos costumes, dos hábitos alimentares, envolvem-se nesta intervenção violenta. 

Claro que há no meio desta gente pessoas bem intencionadas que se vêem envolvidas nesta gelatina  de ideias feitas, indisciplinada, sem regras, onde vale tudo, que se sente abrangida pela impunidade já que o poder, mesmo democrático, tem receio  de enfrentar estas ideias “taxativas”, como se dizia em Maio de 68: “é proibido proibir”.


José Ortega e Gasset, em 1930, há mais de 90 anos, fez a compreensão deste fenómeno e deu a resposta à questão. Escreve:

 .”.. creio que as inovações políticas dos mais recentes anos não significam outra coisa senão o império político das massas. A velha democracia vivia temperada por uma dose abundante de liberalismo e de entusiasmo pela lei. 

 ... Democracia e Lei, convivência legal, eram sinónimos. Hoje assistimos ao triunfo de uma hiperdemocracia em que a massa actua diretamente sem lei, por meio de pressões materiais, impondo suas aspirações e seus gostos. “

O cap. VIII  da Rebelião das massas * tem justamente o título: "Por que as massas intervêm em tudo, e por que só intervêm violentamente".

É assim porque o “homem médio” tem "ideias" taxativas sobre quanto acontece e deve acontecer no universo. Por isso perdeu o uso da audição. Só se ouve a si próprio e é cego e surdo para a opinião dos outros.

Estas “ideias" taxativas não significam exactamente cultura. Refere Gasset: “O que digo é que não há cultura onde não há normas a que se possa  recorrer. Não há cultura onde não há princípios de legalidade civil a que apelar. “...

“Quando faltam todas essas coisas, não há cultura; há, no sentido mais estrito da palavra, barbárie. E isto é, não tenhamos ilusões, o que começa a haver na Europa sob a progressiva rebelião das massas." (p.136-137)


Donde vem tudo isto?

Gasset refere: “aqueles grupos sindicalistas e realistas franceses por volta de 1900, inventores da maneira e da palavra "ação directa". (p. 139)

Estes grupos de "acção directa", de facto, estão em tudo, são violentes e não se pode questionar as “ideias” do homem-massa seja sobre o que for:  o clima, a história, o racismo, o colonialismo, a escravatura, as políticas, os comportamentos... 


Até para a semana.

 

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 * Há uma edição brasileira em formato digital - A rebelião das massas.