29/09/10

Integração de crianças sobredotadas na escola - experiências inovadoras

1. A minha experiência de trabalho com alunos sobredotados mostra que a sua integração no ensino regular é possível e tem resultados positivos para a própria criança e para os outros alunos.

2. É necessário que sejam adoptadas medidas que tenham em conta as especificidades destas crianças porque, como se sabe, o bem-estar psicológico de um aluno com características de sobredotação depende, fortemente, da organização dos ambientes e oportunidades socioeducativas que lhes forem proporcionadas.

3. A intervenção na turma deve ter também o objectivo de proporcionar esse ambiente favorável à sua evolução, porque como refere M. Pereira “… para cederem à fonte de pressão dos pares, poderão vir a funcionar em “falso-self”, no sentido da normalização e de se sentirem mais aceites”. (1)

4. É também fundamental o trabalho a realizar em colaboração com o conselho de turma, designadamente com o Director de Turma:
- Deve estar altamente motivado para trabalhar com alunos com estas características dentro da turma
- Com vontade de aprender, sendo o ponto de partida conhecer o tema da sobredotação (formação em exercício).
- Disponibilidade para a mudança de metodologias, se necessário. Devem ser reformuladas algumas das formas de funcionamento. Por exemplo, é necessário compreender que o elogio tem que ser usado adequadamente, sob pena de acontecer o efeito Pigmaleão negativo. Isso significa que pode ser contraproducente a associação do elogio a justificações do tipo “é o mais novo”, “é sobredotado”, “sabe de certeza”…
- Elaborar as adaptações curriculares sobretudo a nível da diferenciação pedagógica, tomadas no sentido de favorecer não só estes alunos mas também todos os alunos da turma.

5. Manter a motivação face aos conteúdos curriculares. Segundo M. Pereira (2006), "são vários os factores de risco que se colocam a esta população. Por funcionarem dentro de um esquema cognitivo diferente do habitual, marcado pelo pensamento divergente e tratamento não sequencial da informação, facilmente “chocam” com o ensino dito tradicional. Correm o risco de mais facilmente se deprimirem e de se isolarem socialmente, dados os interesses atípicos e as preocupações esotéricas que por vezes apresentam”. (2)

6. Devem ser desenvolvidas áreas ou actividades de grupo em que pode ser importante a participação do aluno sobredotado:
- Área de Projecto, onde é possível evoluir e desenvolver maior socialização, interacção grupal e capacidade de liderança.
- Participação em actividades de enriquecimento.

7. A intervenção, deve ter ainda em conta o suporte emocional para lidar com o sucesso e a preparação para lidar com o fracasso.

8. Como experiência inovadora, em que se faz caminho caminhando é importante haver um modelo de referência como, por exemplo, o modelo de enriquecimento curricular (SEM) (3) que dá relevo a:
- currículo regular
- grupos de enriquecimento
- enriquecimento da aprendizagem e ensino.

9. Há vantagens para a própria escola resultantes da integração dos alunos sobredotados devido à motivação individual e à dinâmica que se pode gerar dentro da própria turma e na escola.

10. É necessário encontrar atitudes por parte da escola que possam transmitir confiança à família de que a escola é competente para apoiar estas crianças.

11. O relacionamento com a família deve ser constante aferindo sistematicamente o desenvolvimento do aluno sobredotado, a sua evolução em termos cognitivos e enquanto ser humano, mesmo quando há necessidade de fazer alguns ajustamentos entre o pensamento da família e da escola.

12. A intervenção é também importante para o sistema educativo. Este tipo de intervenção não deve ser desprezado face à intervenção tradicional, isto é, a intervenção em que, periodicamente, grupos de crianças sobredotadas se reúnem. É mesmo, em nosso entender, uma alternativa a esse tipo de programas.

13. Podem ainda ser extraídas algumas consequências a nível da legislação do sistema educativo. Já está prevista a entrada precoce no sistema educativo e a legislação permite também a aceleração. É necessário que seja possível também a dupla aceleração quando se tornasse necessária como acontece nos casos verdadeiramente excepcionais.


(1) Pereira, M. (2006). Educação e desenvolvimento de alunos sobredotados: Factores de risco e de protecção. In Revista Portuguesa de Pedagogia. Ano 39, n.º 2. Coimbra: Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação.
(2) Pereira, M. - idem 
(3) O modelo de enriquecimento curricular de Jospeh S. Renzulli e Denise de S. Fleith.

27/09/10

Sobredotação - "Mentes que brilham"



O filme "Mentes que brilham" mostra algumas características das crianças sobredotadas e coloca diversas questões sobre o assunto.

1.Questões referentes à sinalização e identificação
Como fazer a sinalização ? “Nesta escola o que importa são os resultados dos testes” ?
Alguns sinais podem indicar-nos que estamos perante uma criança com características excepcionais:
- Fazer perguntas e mais perguntas.
- A insónia: estratégias para a enfrentar.
- Ser diferente: Festa de anos “Não quero festa de anos” vs “Todas as crianças querem", da mãe.
- Habilidades especiais: tocar piano.
- Van Gogh “as vezes acordo dentro dos quadros dele”.

2. A educação familiar destas crianças e os problemas que se colocam no aconselhamento à família
- A responsabilidade da mãe: não expor o filho, normal vs negar o potencial. Mas por outro lado diz “Você e eu sabemos que ele é o melhor...
- Ausência de cooperação entre a mãe e a professora e até competição pela criança: a mãe, Dede, ameaça a professora de que “a mata se alguma coisa acontece ao filho”.
- O encontro com um amigo mais velho e a necessidade de fazer outras experiências, outros ritmos: De Mozart ... ao jazz, a educação informal ... fazer outras coisas ...normais.
Os amigos normais mais velhos e a dificuldade de adaptação: ser amigo não quer dizer que esteja sempre contigo a qualquer hora.
- Gostos e desejos que são semelhantes aos de outras crianças e adolescentes: Macrobiótica vs coca-cola.
Dificuldade de autonomia. A professora, ela própria, finalmente, fazia experiências de culinária.

3. A questão do ensino geral vs ensino especial
- A não compreensão da escola regular para as crianças excepcionais. O desapontamento da professora do ensino regular e dos outros alunos face às respostas da criança.
A escola com tantos sinais não foi capaz de identificar esta situação.
A desadequação das actividades para estes alunos: A estimulação tem de se fazer na Universidade ? Procura-se a adaptação ao nível intelectual. Não se poderia fazer essa estimulação num meio mais ajustado ?
- Em outros contextos há uma desintegração psico-social enorme.
- A importância de ter também ensino individualizado.

4. A questão dos processos cognitivos envolvidos ou subjacentes aos comportamentos de excelência
- Todo o filme parece chamar a atenção para a necessidade de compreensão integrada dos processos cognitivos, envolvendo a emoção e a acção (comportamentos).
- O processo de assimilação mais rápido do que nas outras crianças e origina desadaptação na turma regular.
- Produção divergente de respostas: não ser compreendido pela professora nem pelos outros alunos que se espantam ou se riem.
- Criatividade
- Capacidade para colocar perguntas: “porque fala como se fosse um livro ? Porque não vem ninguém cá a casa ?”, “Porque não tem filhos ?”
- Embora também a nível dos conteúdos, das actividades, a confusão física quântica educação física e o abandono da sala pela maioria dos alunos. Envolve processos mais reflexivos do que activos.

5. Desenvolvimento sócio-afectivo
- Como acontece a qualquer criança, a separação da mãe provoca medo.
Encontra estratégias criativas para enfrentar e afastar o medo, as sombras na parede.
- Quando a ausência se faz sentir mais profundamente: “A minha mãe morreu”.
- Parentificação (é o homem da casa): Fazer o currículo, “Eu faço as contas”, “Quem vai regar as plantas”...

6. O papel dos fazedores ou fabricantes de prodígios
Protecção: O papel fundamental do professor: “Ninguém troçará de ti, eu não deixo”.
Estimulação e motivação.
Mas será necessário realizar “A odisseia da mente”, o “concurso para génios”, meninos prodígio” ou até a “feira do excepcional” ?
“Sem a Jane eu seria mais um palhaço”, refere o colega.

23/09/10

...pessoas perdidas

A floresta naquela manhã era todo um enredar de carreiros e de pensamentos de pessoas perdidas.
O rei Clodoveu pensava: «Oh, cidade inalcançável ! Tu ensinaste-me a andar pelas tuas ruas direitas e luminosas: e para que me serviu ? Agora tenho de abrir caminho por carreiros serpenteantes e complicados, e perdi-me...».

Italo calvino, Um mistério no labirinto.

19/09/10

Fechar escolas: a falácia da socialização

Contra as certezas da justificação do fecho de escolas de pequena dimensão com o argumento da socialização, aqui estão muitas interrogações de Rui Trindade: "Fechar as escolas rurais: A socialização como argumento" (a página da educação).
Não provam a existência de problemas de socialização, inclusivé, nos casos de ensino doméstico nos Estados Unidos, como já aqui referimos.
...
"A socialização de uma criança é um processo mais vasto e complexo, depende, sobretudo, da qualidade das interacções com o meio físico, social e simbólico que a rodeia, depende da vivência que estabelece com outras crianças, mas também com os adultos e dos espaços de referência onde esses encontros acontecem. Um encontro que lhes permita construir-se como pessoa, um encontro que não se programa, já que depende das vicissitudes da vida e das necessidades da mesma."
 ...
 "Só a aceitação tácita de que a solução de retirar as crianças das suas aldeias é sempre a melhor solução é que poderá explicar o silêncio ensurdecedor que se faz sentir sobre esta problemática. É tempo de questionarmos tal atitude e de promover o debate, conferindo visibilidade às dimensões mais relevantes dos projectos que se encontram em desenvolvimento, sejam aqueles que ocorrem em Melgaço ou Alfândega da Fé sejam os outros, de carácter diferente, que acontecem, por exemplo, na escola da Ouguela, lá no Alto Alentejo."

Entrada na escola – alunos sobredotados

Em relação às crianças sobredotadas põe-se o problema da entrada na escola antes de terem completado a idade prevista para esse efeito. Para elas também se colocam problemas particulares de integração.
A criança sobredotada é aquela que possui aptidões superiores que ultrapassam nitidamente a média das capacidades das crianças da sua idade, apresenta traços de personalidade excepcionais (Ajuriaguerra) e determinadas características do ponto de vista das aprendizagens escolares: ler antes de serem escolarizadas, superiores em matérias abstractas e conteúdo verbal, superioridade no cálculo. Preferem actividades abstractas, amigos mais velhos, etc.

São sobredotados "os alunos cujo potencial intelectual está em nível superior, tanto no raciocínio produtivo como no crítico, de modo que se possa imaginar que serão futuros solucionadores de problemas, os inovadores e os críticos da cultura, se lhes forem proporcionadas experiências educacionais adequadas" (Lucito)
Este raciocínio produtivo pode ser divergente (fluência, flexibilidade, singularidade, elaboração, detalhes) e convergente. É importante que os pais tenham atenção ao desenvolvimento da criança, e observem até que ponto ele é diferente do de outras crianças da sua idade: a escolha dos amigos, os jogos, os interesses, a comunicação, a criatividade (pensamento divergente ).

Estas são algumas ideias gerais sobre o assunto. Na realidade, é necessário saber se estamos ou não perante uma criança sobredotada ou com precocidade excepcional.
Se for esse o caso, a criança poderá e deverá entrar mais cedo na escola ou poderá beneficiar de um processo de aceleração da escolaridade dado que a lei o permite e é benéfico para a criança.
Os pais e encarregados de educação devem informar-se na escola sobre o que fazer nestas situações.
O que deverá acontecer, nestas circunstâncias, é que as crianças sejam avaliadas pelo Serviço de Psicologia e Orientação (SPO) que normalmente têm um psicólogo com competência técnica e formal para fazer avaliação nesta área.
É aliás a forma de o fazer.
Há um protocolo de avaliação das características consideradas necessárias para se equacionar a entrada precoce na escola ou a aceleração da escolaridade.
Um dos problemas, porém, é que no sistema educativo as coisas não se passam bem assim e estas situações são deixadas mais ou menos ao destino porque o despiste sistemático das crianças com estas características não se faz. Para isso era necessário que houvesse uma verdadeira rede de SPO o que, como sabemos, está longe de acontecer.

As sinalizações pouco têm a ver com sobredotação e estas crianças chegam à consulta por motivos bem diferentes: trazem queixas de problemas de comportamento, de atenção, às vezes de leitura e escrita, de situações de luto, pela dificuldade que os pais na sua educação, pelas perguntas fora do vulgar que fazem num contexto de adultos… e que são “apanhadas”, por acaso, no âmbito de uma avaliação psicológica.

Surgem também falsas sinalizações. Principalmente quando as crianças nascem nos primeiros dias do mês de Janeiro e não podem iniciar a escolaridade por não terem completado seis anos de idade no ano anterior. Obviamente que por muito que isso custe aos pais, não poderá ser alterada essa situação quando a avaliação não satisfaz os critérios estabelecidos.

Há por vezes professores atentos que descobrem algum sinal especial na criança: na visita ao museu é o aluno que faz as perguntas mais interessantes, tem particular interesse pela leitura, fica à noite muito tempo a ler a ponto de os pais terem que se zangar, interessa-se por questões científicas, etc.
Nesse caso convém informar o SPO de forma a poder avaliar essas características e, nesse caso, poder ser feito um programa de intervenção, se for caso disso, ou, pelo menos, haver uma mudança na atitude dos professores relativamente à compreensão do aluno.

14/09/10

Entrada na escola - alunos com deficiência

A entrada na escola é um direito de todas as crianças que atingem a idade necessária para nela ingressarem. No entanto, há crianças que para além do direito à integração, requerem que se tenha em conta as suas características. É o que se passa com as crianças excepcionais: as crianças sobredotadas, as crianças com dificuldades de aprendizagem e as crianças portadoras de deficiências.

Em relação às crianças portadoras de deficiências (auditiva, visual, mental, motora, paralisia cerebral, etc.) é importante o despiste precoce e uma intervenção igualmente precoce se for caso disso.
Na idade de jardim de infância (3-5 anos), a melhor solução é a integração no jardim de infância da sua zona de residência. Quando chega à idade escolar a integração na escola regular é a melhor resposta educativa, tendo em conta as características da criança e o seu perfil de funcionalidade.

No entanto, dado que a criança pode manifestar atraso de desenvolvimento global, poderá ser aconselhável a permanência durante mais um ano no jardim de infância. Para isso é necessário organizar o processo de adiamento e a aceitação por parte do jardim de infância da permanência da criança. Poderá acontecer que a criança não possa permanecer mais tempo no jardim de infância, dada a sua idade cronológica. Então coloca-se aos pais o complexo problema da opção por uma escola de referência, isto é, uma escola especializada para atendimento de crianças portadoras de determinado tipo de deficiência, ou por uma  unidade especializada em determinadas deficiências, ou em último caso, verdadeiramente excepcional, quando se trata de alunos com deficiência profunda em instituições com recursos para o atendimento mais ajustado.

A regra é a integração na escola regular. Mas a decisão dos pais deverá ter sempre em conta o melhor atendimento educativo para os seus filhos. Aos pais pertence a decisão para a qual deve contribuir também a informação dos docentes e dos técnicos de educação.

Podemos entender a integração como a entrada das crianças com necessidades especiais na escola regular, como uma série de apoios facultados às crianças e aos jovens que lhes permitam suprir algumas das suas dificuldades, como um conjunto de recursos comunitários à disposição de todas as pessoas com dificuldades.

A integração escolar, no entanto, não é apenas, como alguns podem pensar, integrar a criança na sala de aula.

                                   "A integração nunca é 'um caminho'!
                                    A integração não é nem uma consequência nem um resultado produzido.
                                    A integração não é nem uma coisa que se ganhe nem algo que nos seja distribuído.
                                    A integração é a nossa maneira de ouvir os outros.
                                    A integração é uma acção recíproca, mútua, permanente".
                                                           Han Fortman

Dito de outro modo,  integração é adaptação à vida. A ESCOLA é um espaço privilegiado de educar, de ensinar e de aprender, de errar e de acertar, de alegrias e de ansiedades, de construir amizades…

No entanto, o aspecto mais importante será entender a integração como um processo de desenvolvimento pessoal.
A integração nunca está feita. Durante a vida de qualquer pessoa ela terá de fazer-se todos os dias e diz respeito a todas as pessoas mesmo àquelas que aparentemente não têm dificuldades sensoriais, mentais, sociais, etc. Ela envolve não apenas a escola, os pais ou a escola especial... mas todos os elementos da comunidade.

08/09/10

Bola e avaliação de desempenho

Ora aí está um exercício interessante. Avaliemos o desempenho da selecção de futebol. Os resultados foram muito maus. O desempenho dos jogadores merece um insuficiente. Cada jogador vai ser colocado numa quota qualquer, mas a maioria deles em insuficiente.
E os gestores? O desempenho dos jogadores não dependeu também do desempenho dos gestores? Que avaliação de desempenho para os "patrões" da bola ?
É por isso que a avaliação de desempenho não serve para nada. É por isso que as quotas são injustas. É por isso que gerir o desempenho é muito diferente de avaliar o desempenho de uma parte da empresa ou organização, mesmo que seja a empresa selecção de futebol.

06/09/10

Verdade, comportamentos e atitudes coerentes

O Presidente da República, Cavaco Silva alertou este domingo, em Tarouca (Viseu), para os números do desemprego em Portugal, considerando que é «fundamental falar a verdade aos portugueses».
O Chefe de Estado entende que a boa informação é uma ferramenta essencial para quem, nos dias de hoje, quer trabalhar e não consegue arranjar emprego.
«O maior drama que atinge o nosso país é o desemprego. Cerca de 600 mil portugueses fazem diligências para encontrar emprego e não conseguem. Cada um de nós pode imaginar a angústia destas famílias, o desespero que se pode apoderar de algumas, a carência alimentar que pode atingir alguns desses portugueses, a incerteza com que olham o futuro», declarou.
Por isso, afirmou Cavaco Silva, «é fundamental falar verdade aos portugueses, porque falando verdade eles têm comportamentos que são consistentes com os objectivos que queremos alcançar. Tendo uma boa informação, cada um comporta-se e tem uma atitude coerente». (TSF)

Verdade: "a que estado temos chegado"

... "O Estado da Índia ganhou-se com muita verdade, com muita fidelidade, com muita liberalidade, com muito valor e com muito esforço. Ora vêde se o estado em que está não é pelo contrário destas cousas! Aqui me cai a propósito um dito muito avisado dum rei de Cochim, o qual vendo ir aquele Estado empiorando, disse «que logo êle começara a descair, tanto que de Portugal, deixaram de vir estas três cousas: verdade, espadas largas e portuguêses d'ouro».
Ora quero mostrar a Vossas Mercês como de falta destas cousas nasceram todos os males da Índia. Vamos à primeira, que é verdade: as verdades com que este Estado se ganhou foram viso-reis embarcados, armas vistidas, fazendo guerra aos imigos, acrescentando o património real e enriquecendo o Estado e os vassalos. E se não,  vêde como estêve a Índia no tempo dos que seguiram estas verdades, que foram D. Francisco
d' Almeida, Afonso d' Albuquerque e todos os mais viso-reis e governadores até Jorge Cabral, e ainda quero dizer até D. Constantino; mas depois que se deixou de usar desta verdade, e que ela se perdeu, aconteceu aos viso-reis e governadores aquilo que a Aníbal, que enquanto andou com as armas vistidas polos exércitos dormindo nos campos em um couro de boi, que era a sua cama mimosa, conquistou tôda Espanha e Itália, e ainda fôra senhor de Roma e do mundo todo, se seguira sempre esta verdade; mas, depois que a perdeu e se recolheu às delícias de  Cápua, e despiu as armas, logo tornou a perder quanto em tantos anos tinha ganhado.
Assim os viso-reis e governadores da Índia: enquanto seguiram esta verdade, foi ela próspera e temida; mas, depois que se ela perdeu e que dispiram as armas e se deixaram de embarcar, e se recolheram às delícias da cidade de Goa, e se fizeram veadores da Fazenda e presidentes da Relação, logo a Índia foi de pernas acima, e nós todos nos acovardamos e nos perderam tanto os imigos o respeito que aquilo que nós primeiro faziamos, que era sustentarmo-nos de prêsas suas, o fazem êles agora, que se sustentam de prêsas nossas.(Antologia do Humor Português)

Assim escrevia Diogo do Couto (1542-1616)  no "Soldado prático".
Por escrever com preocupação pela veracidade, teve o reflexo na sua obra, "incómoda para largos sectores das altas hierarquias. Com efeito: a sua Decada 6ª ardeu na tipografia; a 8ª e a 9ª foram-lhe roubadas; a 11ª extraviou-se. Das 9 Décadas que escreveu, só três conseguiram ser integralmente publicadas."(Antologia do Humor Português)

Foi sempre assim. Questões de mera gestão!

01/09/10

Escola de proximidade e de sucesso

A questão do fecho das escolas de pequena dimensão e dos mega-agrupamentos, aqui e não só, passa pelos mesmos argumentos (falsos), para lá da esquerda e da direita.

"Tout doit disparaître
Là au moins, on comprend... et on en frémit : d’un côté on va « bourrer » les classes, de l’autre on va pousser à la roue des regroupements. C’est en milieu rural que les conséquences seront les plus brutales. Car c’est là où se rencontrent les plus petites structures et les classes les moins chargées - autant de « gisements d’efficience » à exploiter sans états d’âme, sans égards pour l’aménagement du territoire, l’intérêt des enfants, l’avis des parents, des élus, des enseignants... Partout où les communautés rurales ont porté leurs efforts sur l’éducation, en créant des regroupements non pas comptables mais pédagogiques, en se battant avec succès pour préserver une école qui soit à la fois de proximité et de qualité (études et chiffres le prouvent) mais aussi un lieu de vie et d’attractivité pour leur territoire, le bulldozer gouvernemental veut faire table rase. Tout doit disparaître.
...
Ecole rurale, école de la réussite
Refrain connu et maintes fois éprouvé : quand on veut tuer son chien, on dit qu’il a la rage. Ainsi - et cela ne date pas de notre entrée en Sarkozie... - ceux qui veulent faire des économies comptables sur le dos de l’école et de l’avenir de nos enfants n’ont-ils de cesse de dénigrer l’école de proximité. Classe unique, classes à niveaux multiples, rôle des enseignants, moyens pédagogiques... rien ne trouve grâce aux yeux de ceux qui semblent penser que plus c’est grand, mieux ça marche. Une posture qui rappelle étrangement celle de ces technocrates qui, au nom de la « rationalisation », ont entrepris depuis des années de démanteler avec acharnement le tissu des hôpitaux de proximité, ceux-là même qui ont permis aux Français de bénéficier de soins parmi les meilleurs au monde en portant au plus près des populations l’hôpital, ses compétences et sa technicité." (Olivier Chartrain)