28/07/23

Os sonhos dos jovens



 

Acontece por estes dias a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), não só em Lisboa mas por todo o país mesmo nas aldeias mais recônditas. 

Conforme refere a Organização da Jornada, a “Jornada Mundial da Juventude (JMJ) é um encontro dos jovens de todo o mundo com o Papa. É, simultaneamente, uma peregrinação, uma festa da juventude, uma expressão da Igreja universal e um momento forte de evangelização do mundo juvenil. Apresenta-se como um convite a uma geração determinada em construir um mundo mais justo e solidário. Com uma identidade claramente católica, é aberta a todos, quer estejam mais próximos ou mais distantes da Igreja.”


Há 37 anos (1986) realizou-se a primeira JMJ. Os adultos de hoje foram os jovens dessa Jornada. Entretanto, aconteceram grandes mudanças principalmente a nível da comunicação. Para o pior e para o melhor. Será que motivação idêntica caracteriza os jovens dessa altura e os de hoje? O que é ser jovem em 2023? O que mudou e se mantem nos sonhos dos jovens? 

Como nesse tempo, os jovens estão perante opções de vida fundamentais, hoje ainda mais difíceis de tomar do que antes. As armadilhas em que tropeçam são muitas e oscilam entre as falinhas mansas de que a felicidade está ao virar da esquina e as profecias climáticas, culpando tudo e todos e negando-lhes o futuro, entre o facilitismo na educação em que deixa de haver exame a matemática num curso de ciências e a ideologia de género dizendo-lhes que eles podem ser aquilo que quiserem, e a incultura woke que lhes proíbe as suas raízes culturais e pratica o cancelamento, a higienização, a censura, a proibição de livros e o proselitismo.


Não sabemos muito bem o que é a juventude e o que são os jovens. A “juventude” é segundo a ONU uma categoria fluida e mutável. Ser jovem pode variar muito em todo o mundo. O critério etário não é preciso, se "jovens" são pessoas entre 15 e 24 anos, por outro lado também define criança até aos 18 anos. Por vezes considera-se a juventude até aos 29/30 anos... 

Segundo a ONU os jovens manifestam a imaginação, a criatividade e a energia que são vitais para o desenvolvimento contínuo das sociedades. 


Seja como for, aquilo que continua a ser importante, antes e agora, é que os jovens sejam capazes de atingir estádios de desenvolvimento cognitivo e moral (estádio das operações formais e estádio pós-convencional) que lhes permitam ter capacidade para determinar o certo e o errado, com base em parâmetros sociais democraticamente pré-estabelecidos, compreender que as leis são como contratos sociais e não imposições rígidas e imutáveis feitas seja por quem for, políticos, influencers, gurus, wokistas, e ainda ter a capacidade de resistir à arregimentação e às investidas do proselitismo.

Se a JMJ contribuir para o desenvolvimento da autonomia dos jovens de forma a permitir que emocional e racionalmente se tornem pessoas dirigidas por princípios éticos universais, a JMJ terá valido a pena. Os sonhos dos jovens serão realizados se esta sólida formação moral estiver nos seus objectivos.

 

 



20/07/23

A contribuição audiovisual (CAV) e as galinhas


taxas de licenciamento de televisão em vários países. A avidez de qualquer Estado por impostos e aumento de impostos, taxas e taxinhas, é bem conhecida de todos os contribuintes e não pode ser ignorada pelo orçamento. Habituaram-se a taxar tudo o que mexe, como diz a cantiga dos Beatles "Taxman". O taxman é muito competente mesmo para aqueles serviços  que pouco ou nada têm a ver com o estado como é o caso das auto-estradas, das empresa municipais de água e saneamento, de estacionamento, de gestão de parques piscinas, da cultura...

Em Portugal, a contribuição para o audiovisual é paga através da EDP. E isso torna-a diferente da taxa existente anterior a 1992 uma vez que o pagamento ficou dependente de ter electricidade "em casa". Na realidade, afinal, não é so em casa. Como se sabe a taxa surge discriminada na factura da electricidade e custa € 2,85 (€ 3,02, com IVA), por mês, ou o dobro se recebe a conta de dois em dois meses. Por ano, são 36,24 euros.
Há isenção só para consumos muito reduzidos. Os consumidores com um consumo anual de energia até 400 kWh estão isentos de contribuição audiovisual.

Porque será que a taxa de televisão (CAV) passou a ser paga desta forma, ou seja, através da factura de electricidade? Só há uma razão: fazer com que não haja evasão da taxa de licenciamento de TV.
O mesmo se pode perguntar em relação à falta de pagamento das taxas de autoestrada: porque têm as finanças de se meter no assunto e não o serviço de contencioso da respectiva empresa?

O partido Iniciativa Liberal elaborou o Projeto de Lei n.o 285/ XV/ 1.a - proposta de eliminação desta contribuição audio visual (CAV) para baixar a factura da electricidade.
A proposta da IL de eliminação da contribuição audiovisual (CAV) pode fazer sentido  pelo  motivo  invocado pela IL (baixa da factura de electricidade) mas também por outros motivos: 
a) Se calhar já não faz sentido haver televisões e rádios generalistas estatais e devia pertencer a um sistema estatal apenas aquilo que respeita a arquivos e documentação (rtp memória), um canal cultural (como a rtp2/antena 2) ou um canal tipo parlamento... tudo o que não acrescente ao privado nada de substancial é porque deve ser privado. Ou então pago pelo Estado ou pela publicidade. Mas, ah e tal... não há mercado para tantos canais, não há publicidade que torne a empresa sustentável ... Ah bom! isso então é outra coisa e, portanto, devem ser as nossas "contribuições" a pagar? Ok, tudo bem mas então fiquem com esse ónus...
b) Há pessoas que não têm tv e também não ouvem rádio porque não querem porque não gostam, porque não lhes interessa. Muitas pessoas subscreveram serviços de comunicações multimedia (meo, nos...) muitas outras pessoas também pagam Internet e, além disso, pagam canais de televisão por assinatura e serviços de streaming (Netflix...) e vêem apenas a informação que elas próprias seleccionam de forma activa.
Assim, a grande maioria das pessoas já paga o fornecedor de tv e internet e ainda tem que pagar a tv estatal já que os outros canais vivem com as suas próprias receitas.
c) Além disso, há pessoas que não é só "em casa" que têm electricidade. Há pessoas que além da casa têm uma garagem, uma horta...  e têm que pagar taxa de cada um dos contadores eléctricos. Na horta pode ser suprimida mas é necessário ter um projecto agrícola!
d) "Em suma, parece não ser defensável que a CAV seja de facto uma taxa, da mesma forma que me parece improcedente que sobre um imposto incida outro imposto, ou seja, a CAV é, na verdade, pela sua concepção, tal como hoje a conhecemos, um imposto em que não se adivinha ser passível de lhe acrescer um outro, como seja o IVA." (Sérgio Guerreiro, Observador, 16-2-2023) 

Se a proposta da IL não vingar, como era acertado que acontecesse, então o pagamento da taxa/imposto devia ser alterado. Em vez de se pagar por contador eléctrico podia ser, por exemplo, por agregado familiar, com eliminação do IVA.
O descaso desta situação leva-me até a pensar em instalar uma televisão no galinheiro da horta onde vivem as criaturas que podem aproveitar com a excelente programação e aborrecer-se menos com a vida.







06/07/23

Construir boas memórias




A nossa mente vai construindo, ao longo do tempo, memórias boas e más ou, se quisermos, positivas e negativas, da nossa vida. Há memórias que se mantêm durante muitos anos. Outras são apagadas e não fica rasto delas. 
Sem dúvida, é de relevar o papel que a memória tem na nossa saúde mental. As memórias recorrentes, involuntárias, intrusivas, perturbadoras fazem parte do quadro de sintomas da perturbação de stress pós-traumático. São memórias de vivências negativas que não nos deixam dormir, que não nos deixam viver a vida de forma activa, criativa, e que pelo seu peso perturbador exigem acompanhamento psicológico.
A emoção tem um papel crucial na construção das nossas memórias. A emoção não é o único factor que afecta a memória e não afecta apenas a memória. Mas face a um estado emocional intenso todo o sistema cognitivo (percepção, atenção, memória, raciocínio, linguagem e tomada de decisão) é afectado.

Ao relevarmos os efeitos negativos, esquecemo-nos da importância que as memórias positivas podem ter na nossa felicidade: como a memória, quando éramos pequenos, da comida feita pela avó, do cheiro das árvores da quinta, dos momentos especiais de convívio com os amigos...
É isso - as boas memórias - que faz juntar as pessoas em encontros periódicos. O encontro anual é um bom exercício de memória, como penso que são todos os encontros em que comemoramos o tempo de vida em comum, encontros de ex-militares, de ex-colegas de liceu....
Por isso, é tão importante (re)lembrar e reviver as boas memórias de tempos e espaços emocionais tão intensos, ao mesmo tempo que reforçamos a recordação dessas memórias.

Uma das boas memórias que todos sentimos passa pela música e pelo muito tempo que permanece connosco... Em Musicofilia (Oliver Sacks) vemos como mesmo quando aparecem doenças como a doença de Alzheimer, permanece a memória da música e somos capazes de a interpretar.
As memórias que mais perduram são as que estão ligadas a uma vivência emocional intensa e a música está relacionada com as emoções.

É também isso que faz juntar "Os Leões de Madina". Madina Mandinga, uma mensagem de paz e amor no meio da guerra, como atesta o Cancioneiro de Madina de que o hino da Companhia é o melhor exemplo: 
Nós somos Primavera 
Gostamos de cantar!
Nos somos juventude 
Nascemos para amar!
Nós queremos Amar
Toda a gente da terra!
Não queremos mais fome 
Não queremos mais guerra!

Boas memórias são a presença dos que se reencontraram em Tarouquela mas também a presença dos ausentes, dos lugares vazios: os que já não se sentam à mesa, os que não resistiram na caminhada, e também os que não se sabe onde estão ou nunca tiveram interesse em participar.
Como tive oportunidade de dizer, este foi um dia muito feliz para mim por ter reencontrado tanta gente boa, mesmo que esquecendo alguns dos seus nomes, que não de momentos inesquecíveis. Fui lá recordar memórias felizes e ver como as emoções tão intensas daquele tempo nos vincularam até aos 49 anos da comemoração. E, acreditem-me, interessam-me apenas essas boas memórias. Sim, o sofrimento, as separações, fizeram parte delas mas o tratamento humano que era regra naquela Companhia, relevam em relação a todos os episódios que cada um de nós tenha na sua memória mesmo que tenham sido apagados na memória dos outros. Foi um dia bonito e feliz e isso é que conta para a vida. 

Como me senti confortável com esta gente com quem partilhei aqueles momentos de 1973/74!  Como foi bom rever todos aqueles companheiros em quem sentíamos apoio e superação no esforço de todos os dias para sobrevivermos à guerra que nos roubava a juventude. 
E agora tantos anos depois, cada dia é mais uma prova de superação das dificuldades que uns vivem mais do que outros mas que também radicam lá no passado.
Como fiquei grato por me terem dado a honra, juntamente com o ex-alferes Baptista, de ter partido e partilhado o bolo de mais este aniversário!