29/04/10

TPC e explicações: sucesso a quanto obrigas

      
Os trabalhos de casa (TPC) e as explicações presentes no quotidiano dos alunos e suas famílias, são um tema controverso, mas de que raramente se fala.
Uma multiplicidade de actividades extra-curriculares, não lectivas, como os TPC, as explicações, as actividades de enriquecimento curricular (AEC’s), o estudo acompanhado, o trabalho na sala de estudo, o apoio pedagógico acrescido, as aulas de esclarecimento de dúvidas, as tutorias…fazem parte do trabalho de muitos alunos.
O estudo acompanhado, supostamente, deveria acabar com algumas dessas actividades ou pelo menos deveria equacionar e articular com as outras actividades do aluno. (1)
Como sabemos não só não acabaram como até foram reforçadas e diversificadas.
Acontece mesmo que as explicações são necessárias para quem quer aceder a notas que permitam entrar em determinados cursos universitários. O que quer dizer que as explicações são para os alunos com melhores resultados, o que quer dizer também que lhes cabe uma parte do sucesso pessoal e do sucesso das escolas que esses alunos frequentam.
Em relação aos TPC há várias posições: os que são contra e até os que acham que violam os direitos da criança. Temos até quem peça um dia de greve aos trabalhos de casa, principalmente contra o formato XXL dos trabalhos de casa. (2)
Há países que proibiram os TPC, como a Bélgica, Finlândia, Dinamarca, Luxemburgo, França, Grécia, alguns estados alemães…
Mas não se pense que os pais contestam essa situação: na Bélgica 80% dos pais estavam de acordo com os trabalhos de casa que os professores passavam. (3)
A favor ou contra, penso que os pais são suficientemente autónomos e esclarecidos para saberem o que devem fazer.
Em meu entender, se não podemos prescindir dos TPC, então deveria haver alguma organização e regulação.
Há professores que dão grande importância aos trabalhos de casa e que de alguma forma contam para a avaliação, na medida em que para esses professores, eles são a demonstração do interesse do aluno mesmo que não se trate de uma situação formal da avaliação.
Por outro lado, qual é o tempo limite: 30 minutos, uma hora ? Se é fácil definir no 1º ciclo, como se faz isso no 2º, 3º ciclo e secundário, uma vez que os professores não coordenam entre eles esse assunto ?
Mas os TPC não são suficientes para o sucesso.
E é A. Benavente que escreve: “mesmo nas famílias que tendem a rejeitar os TPC se opta frequentemente por um reforço através de explicações, prática que se apresenta como um sinal claro da dificuldade que a escola revela na explanação dos processos cognitivos e na organização metódica de itinerários individuais de pesquisa e resolução de problemas”.
As novas áreas curriculares do meu ponto de vista, não vieram resolver ou colmatar estas situações. Por isso, as explicações estão cada vez mais organizadas e franchizadas.
É caso para dizer: sucesso a quanto obrigas.

(1) Veja-se o que escrevia Ana Benavente a esse propósito: Aprender a estudar na escola, Público, de 8 de Novembro de 2000.
(2) Eduardo Sá, Noticias Magazine, 14 de Novembro de 2004. A polémica vem muitas vezes de fora da escola e é levantada, designadamente, por psicólogos e pediatras, às vezes de forma provocatória como penso que são algumas intervenções de Eduardo Sá e de Mário Cordeiro, mas, por isso mesmo, merecem ser discutidas e analisadas.
(3) Souta, L., Os (in)controversos TêPêCês, A página da Educação, Internet.
       

25/04/10

Arqueologia ideológica

     
Aguiar-Branco, com um discurso bem a propósito do que se passa na nossa sociedade, incomodou os do "nós por cá todos bem ", mexeram-se nas cadeiras, riram-se com alguns sorrisos lorpas, fizeram gestos...
pois é ...
Rosa Luxemburgo não interessa nada...
Mas como diz o Sr. Presidente da República "para onde é que estão a conduzir o país?"
Todos tão contentes com o 25 de Abril, aqueles cujos familiares faziam parte do poder antes dessa data, estão todos recuperados ... para o poder. São sempre os mesmos.
Cavaco Silva é uma excepção a esta regra. Por isso, não lhe perdoam ter tido a ousadia de ter vindo do povo e ter chegado a Presidente da República.
Vamos dar ao povo o que é do povo: o 25 de Abril.

22/04/10

Os avós e a autoridade parental

           
Nas famílias, as tarefas da educação são partilhadas, muitas vezes, com os avós. Dependendo das circunstâncias em que vive cada família, os avós têm mais ou menos intervenção na educação das crianças.
Uma questão controversa é se os avós educam ou deseducam.
Em primeiro lugar, deve dizer-se que falar dos avós em geral é falar de avós nenhuns e, portanto, é, provavelmente, estarmos a errar na análise que fizermos.
O mesmo se diga quando falamos dos avós de hoje. Quem são os avós de hoje ? Quem são os avós de ontem ? Estamos a referir-nos a uma entidade abstracta em relação à qual não há consensos nem estudos que nos orientem em relação a tendências seguras sobre o assunto.
Não existem "os avós de hoje". Existem os avós do João, da Maria, do Pedro...
Quando se diz que os avós mimam em excesso temos que saber de que avós concretos estamos a falar. Há avós que o fazem e outros que não. Mimar em excesso poderá ser um problema como qualquer outro excesso educativo.
Diz-se, genericamente, que as crianças de hoje são príncipes, ditadores, etc… e associa-se muitas vezes essa educação aos avós que deixam a criança fazer tudo o que quer.
Esta ideia é muito parcial e parcelar.
Os grandes e os pequenos ditadores são outros… que não as crianças !
Já encontrei crianças com dificuldade de obedecer aos adultos, educadas pelos avós como crianças bem educadas em que os avós têm um papel fundamental na sua educação.
O problema da falta de apreensão dos limites vem tanto dos pais como dos avós.
O que acontece é que há avós que tentam recompensar de forma desajustada a ausência dos pais ou têm comportamentos intrusivos na presença dos pais, chegando, muitas vezes, ao ponto da sua desautorização, como acontece nas contradições educativas do pai e da mãe. A criança não compreende esta situação: a quem obedecer ?
A realidade de hoje é que educar é uma tarefa mais complexa do que nas gerações anteriores. E por isso tanto os avós como os pais enfrentam dificuldades semelhantes na educação das crianças: a violência do mundo moderno, o consumismo, os problemas do ensino…
O stress é um problema comum, por motivos diferentes, para os pais e para os avós. Os pais com falta de tempo, o desemprego, as dificuldades económicas, entre outras.
Os avós enfrentam outras dificuldades como problemas de saúde, preocupações com os filhos, às vezes vários filhos, e, portanto, vários netos, etc. Tudo isso pode gerar uma situação de stress que prejudica o modo como os avós conseguem lidar com as crianças.
A minha convicção é a de que os avós não são os educadores laxistas que não impõem limites às crianças nem os educadores idílicos que podem prescindir do papel educativo dos pais.
Os avós, quando integrados na perspectiva educativa peculiar de cada família, são o passado da linha intergeracional que nos projecta, enquanto genes e enquanto cultura, no futuro.
              

15/04/10

O pai social – o nascimento da autoridade


A autoridade dos pais nasce das interacções que se estabelecem entre a mãe e o filho e do papel que o pai vai marcando nessa relação, ao longo do desenvolvimento.
A verdadeira autoridade dos pais numa família vem dessa relação que é apreendida pelos filhos, isto é, do modelo que os pais representam para os filhos.
Sabemos, desde há muito tempo, que “as crianças precisam mais de modelos do que de críticas” (Joubert, 1842, referido por Bettelheim, B.)  De facto, “a melhor e provavelmente a única maneira de nos tornarmos uma pessoa disciplinada é imitarmos alguém cujo exemplo admiramos”. (1)
A nossa experiência tem-nos também ensinado que para alguns jovens não há modelos dentro das famílias que eles possam seguir. É muito interessante verificarmos isso, no trabalho com os alunos do 9º ano, quando perguntamos “quem admira, se tem um modelo para a vida futura ou quem admira quando for mais crescido”.
Aparece algumas vezes a resposta da "admiração pelos pais" mas, geralmente, os adolescentes não têm qualquer referência neste campo.
Quando as crianças vão crescendo interessam-se sempre por saber onde os pais trabalham, qual a sua profissão. Devem saber do que vivem e o que lhes interessa. Quando os filhos não perguntam devem ser os pais a iniciar esse diálogo.
Encontramos na nossa experiência crianças que pouco sabem dos pais e poucas são as referências a seu respeito.
O trabalho parental deve consistir, assim, em dois aspectos fundamentais:
Apresentar-se como modelo às crianças interessando-se pela sua vida: saber os seus interesses, os seus gostos, os seus amigos, os seus jogos e com quem joga, o que lê e os seus programas preferidos e como assimila isso tudo, qual a sua atitude e comportamento face à escola e aos professores, quais são as suas dificuldades.
E isto faz-se sem interrogatórios e sem espionagem, do tipo bisbilhotar o diário, ler a correspondência e outras formas de intrusão…
É necessário o diálogo entre os elementos da família. Neste diálogo pode surgir a necessidade de ajuda para saber como se comportar. Quando esta ajuda não é pedida pelos filhos, é necessário ir ao seu encontro.
Às vezes os filhos apenas estão à espera de uma opinião, fazer um jogo com o pai ou a mãe ou até à espera de uma ordem.
Em segundo lugar, a ajuda não deve substituir a acção da criança: É necessário que a criança às vezes resolva os seus problemas sozinha e se habitue a ultrapassar as dificuldades.
A criança deve saber que será sempre apoiada, principalmente nas dificuldades que a ultrapassam, ao mesmo tempo que se exige que assuma as suas responsabilidades.
A autoridade do professor na escola será então vista pela criança de outra forma, com autonomia mas com confiança.
Quando a criança entra para a escola, os dados da personalidade da criança não estão definitivamente lançados, mas muito trabalho, bem ou mal feito, já faz parte da sua vida.
Se este trabalho foi bem feito, então não é necessário falar de bullying, nem de sexting, nem de outras formas de falta de autoridade parental... porque a falta de autoridade da escola, do professor, é falta de autoridade parental.
Fica a pergunta: se fosse perguntado ao seu filho “quem admira?”, acha que ele ia responder: admiro o meu pai ou admiro a minha mãe ?

(1) Bettelheim, B. (1994), Bons Pais - O sucesso na educação dos filhos, Venda Nova: Bertrand Editora, pag. 177.
     

01/04/10

Ser pai - o nascimento da autoridade


As alterações nas relações familiares vieram mudar substancialmente as funções sociais do pai. Algumas dessas funções sociais passaram para segundo plano.
O papel do pai na cultura e na sociedade modernas de que resultava a autoridade educativa mudaram, assim, na nossa vida.
A ausência do pai na escola e na educação integra estas mudanças sociais e culturais.
Mas apesar de todas as mudanças, ser pai, o papel do pai deve ser realçado. E é este pai que deve estar presente na escola e não será o estado, que assumiu o papel social do pai, a impedir que isso aconteça.
Se temos vindo a dar cada vez maior importância ao papel da mãe e da interacção precoce mãe-filho, e muito bem, não podemos esquecer a relação triangular que com o pai determina o desenvolvimento da criança.
De acordo com Cyrulnik (1), podemos dizer que temos três pais. O desenvolvimento da criança passa por um pai intramaterno, um pai perimaterno e um pai social.
A mãe pode ser vista como um objecto contínuo, que quando está ausente é substituída pelo objecto transaccional que assegura a sua permanência sensorial e simbólica.
Em contrapartida, o pai tem fases mais marcadas: o pai percebido (até aos seis meses), o papá ( quinze - vinte meses) e o pai social (dois - três anos).
O pai intramaterno é o pai biológico. “Este pai intramaterno torna-se sensorial, traduzido pela mãe. O seu odor, voz, carícias, a sua simples presença e o significado que a mãe lhe atribui, modificam as comunicações sensoriais entre a mãe e o filho.
Temos depois o pai perimaterno: o pai - rosto surge a partir do oitavo mês, quando a maturação da criança lhe permite diferenciar a percepção entre dois rostos. Neste momento, nasce o pai percebido enquanto rosto estranho…
“Este período sensível do nascimento do pai cria um momento de vulnerabilidade em que a mãe pode muito bem não atribuir qualquer significado ao pai, pode não o apresentar pela fantasmática dos gestos, pode não o sinalizar, não exprimindo os sorrisos, os olhares, as posturas e as vocalizações que familiarizam a criança com esta nova percepção perimaterna. O pai conhecido acaba de nascer”.
Pelos quinze a vinte meses, quando a criança é capaz de o referir pela linguagem, o pai que passa a ser o «papá». A criança é capaz de perceber um objecto presente que significa o pai ausente e pode indicá-lo à mãe por meio de um conjunto verbal e comportamental que consiste em apontar para o objecto com o indicador, em olhar para a mãe e articular «papá».
O pai passa a ser «o meu papá». O pai acaba de aparecer na linguagem. O pai já não é biológico, passa a ser semântico.
Quando aos dois três anos aparecer o pai social já muito daquilo que é ser pai foi integrado na relação familiar.

(1) Cyrulnik, Boris, (1995), Sob o signo do afecto, Lisboa: Instituto Piaget. Seguimos e condensámos o texto do autor (pag. 141 a 143).