25/05/23

Os novos poderes




Interrogo-me sobre o espectáculo “deplorável” a que assistimos por estes dias na ordem nacional e internacional. 

Abalados por estes acontecimentos procuramos compreender o que se  está a passar e o que fazer perante situações, que quer queiramos ou não, têm implicação na nossa vida, mesmo não vendo televisão, não ligando ao que se passa nas redes sociais ou ignorando os vizinhos do lado... 

Na realidade, os novos poderes instalaram-se nas sociedades e são responsáveis pela criação deste ambiente transmitindo-nos sentimentos de desconfiança, de insegurança e de que algo está errado neste caminho que termina nas comissões parlamentares de inquérito ou no  poder judicial.

 

Alvin Toffler, em Os novos poderes, em 1991 (original 1990)  já enunciava a Era de Transformação Radical do Poder, no início do séc. XXI: “Apesar do mau odor inerente à própria ideia de poder, consequência dos maus usos que lhe têm sido dados, o poder em si não é nem bom nem mau. É um aspeto inevitável de todas as relações humanas e influencia tudo, das nossas relações sexuais aos empregos que temos, aos carros que conduzimos, à televisão que vemos, às esperanças que acalentamos. Num  grau maior do que muitos imaginamos nós somos produtos do poder.” (pág. 15)


Esta mudança resultante, também, da fragmentação do poder, traduz-se na luta travada entre as várias “capelinhas”, os "cubículos" (Toffler), os gabinetes do poder, que às vezes estão onde menos se espera.  

Estão, por exemplo, no Ministério das infraestruturas, onde, a nível macro e micro,  se trava uma luta fundamental entre várias facções do poder político e burocrático. 

Não deixa de ser curioso que o documento mais importante sobre a reestruturação da TAP se encontra no computador portátil de um assessor.  

O poder encontra-se exactamente neste cubículo onde, desde o ministro aos funcionários se entra e se sai quando isso interessa ao jogo estratégico de “quem é que manda nisto?”.


Por outro lado, no sistema de comunicação, o controle da informação e comunicação, através da manipulação da mensagem que vai da mentira, à falta de memória e à “reconstrução da verdade”, é um instrumento fundamental na manipulação dos espíritos e na detenção do poder (1), contra as várias comissões de inquérito ou os vários processos judiciais que todos os dias são instaurados procurando repor racionalidade nesse sistema mas que enredados no mesmo modelo, acabam, por vezes, de deixar de exercer a sua função principal que é fazer justiça.

                                                                       

O poder reparte-se por uma infinidade de "cubículos", como os lobbies, grupos de pressão política e social, económica e ideológica que tentam minar a estrutura do poder: As redes sociais que exercem censura e bloqueiam a participação, os grupos nacionalistas, os grupos verdes, animalistas, ou os ecologistas da vandalização, as agendas da ideologia de género ...

Esta é a realidade dos novos poderes aos quais não nos devemos habituar mas de que é necessário compreender a dinâmica intrusiva na nossa vida e, sendo excessiva, combatê-la.                                                                                               

 

Até para a semana. 



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(1) Por vezes ainda sou surpreendido com algumas análises: A mentira na política.


                                      

Rádio Castelo Branco


                                                                                                         

18/05/23

"A vida apenas, sem mistificação" (3)


Fernando Namora, Deuses e demónios da medicina


Em 12 de Maio de 2023, a Assembleia da República confirmou a lei da eutanásia. 
Com lei ou sem ela, continuo a tentar compreender o que move algumas pessoas nesta campanha radical.
Há um espaço ideológico onde se cruzam os defensores mais dogmáticos das questões fracturantes mas neste caso da eutanásia não há um alinhamento à esquerda e à direita. Os socialistas votaram com os liberais a favor, os comunistas do PCP votaram contra. (1)

Estes arautos do progresso usam a metodologia da persistência que muitas vezes se aproxima do fanatismo. Insistem no assunto tantas vezes quantas as necessárias para obterem o que pretendem. 
Como sabemos quando se consegue uma maioria no parlamento, pode-se aprovar a lei que se quiser, seja pouco ou muito importante como esta: uma questão de vida ou de morte. Por isso esta lei devia ultrapassar a conjuntura.

Contam também com a tibieza dos indiferentes ou que não têm posição. Enquanto no PS não há qualquer dúvida nem qualquer rebuço na aprovação da morte medicamente assistida, no PSD há todas as posições: a favor, contra ou outra coisa que é o referendo. Rui Rio era a favor, Montenegro não sabemos mas defende o referendo. 
Para Pedro Passos Coelho, a Eutanásia é uma decisão (demasiado) radical.
É sempre bom saber que haverá quem não se conforma nem desiste de, no futuro próximo, pôr em cima da mesa a reversão da decisão que o parlamento tomou.

Por outro lado, há uma questão de constitucionalidade. O problema não está apenas na constitucionalidade deste ou daquele artigo. É uma questão de fundo: a inviolabilidade da vida que esta lei não respeita. É, por isso, uma violação da constituição, como defende Jorge Miranda.

Mas há a realidade. O fim da vida deve ser tratado com as condições cientiíficas e humanas de que podemos dispor actualmente. Podemos escolher outras perspectivas ou respostas para esta situação como: a ortotanásia, o testamento vital, os cuidados paliativos.
Há mais de dez anos, em 2012, foi aprovado a Lei (Lei n.º 25/2012, de 16 de julho), que regula as diretivas antecipadas de vontade (DAV), designadamente sob a forma de testamento vital, como é referido no artº 2º. (2)
Se bem entendo, o que está previsto no testamento vital corresponde àquilo que é englobado na definição de ortotanásia. Como se diz num documento do Parlamento, “Ortotanásia” é definida, de forma simples, como “morte natural, sem sofrimento” ou, de forma mais completa, como “postura clínica que procura evitar que os doentes terminais, sem perspetiva de cura ou melhoras sensíveis, sejam submetidos a procedimentos terapêuticos inúteis ou desproporcionados que apenas prolonguem artificialmente a sua agonia, privilegiando, em alternativa, a prestação de cuidados paliativos e a promoção do bem-estar do enfermo durante o processo de morte cuja evolução deverá decorrer de modo natural”

Perante a existência de respostas racionais, culturais, humanas... não havia necessidade de insistir nesta radicalização. Como diz o Papa Francisco "foi aprovada uma lei para matar". E, por isso ,“sei que não vou por aí”. 


Até para a semana.


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(1) A deputada socialista Isabel Moreira considera que aprovar a eutanásia também é cumprir Abril. Esta religião de Abril, como refere Helena Matos, neste caso nem sequer conta com o PCP, certamente um dos seus paladinos.

(2) Em 2012, foi aprovada a Lei n.º 25/2012, de 16 de julho, que regula as diretivas antecipadas de vontade (DAV), designadamente sob a forma de testamento vital, e a nomeação de procurador de cuidados de saúde e cria o Registo Nacional do Testamento Vital (RENTEV).  
No artº 2º refere algumas das directivas antecipadas de vontade (DAV):
"Podem constar do documento de diretivas antecipadas de vontade as disposições que expressem a vontade clara e inequívoca do outorgante, nomeadamente:
a) Não ser submetido a tratamento de suporte artificial das funções vitais;
b) Não ser submetido a tratamento fútil, inútil ou desproporcionado no seu quadro clínico e de acordo com as boas práticas profissionais, nomeadamente no que concerne às medidas de suporte básico de vida e às medidas de alimentação e hidratação artificiais que apenas visem retardar o processo natural de morte;
c) Receber os cuidados paliativos adequados ao respeito pelo seu direito a uma intervenção global no sofrimento determinado por doença grave ou irreversível, em fase avançada, incluindo uma terapêutica sintomática apropriada;
d) Não ser submetido a tratamentos que se encontrem em fase experimental;
e) Autorizar ou recusar a participação em programas de investigação científica ou ensaios clínicos."


A Portaria n.º 96/2014, de 5 de maio, que Regulamenta a organização e funcionamento do Registo Nacional do Testamento Vital (RENTEV) que contempla diversas situações em que a pessoa pode decidir.




Rádio Castelo Branco


15/05/23

Aprender a envelhecer.



Envelhecer é algo natural e inevitável, o destino de todos nós. Mas para o geneticista David Sinclair não é bem assim. Defende que é possível retardar o envelhecimento com alguns hábitos simples para que tenhamos vidas cada vez mais longas e saudáveis.
Seja como for, a gente envelhece quer queira quer não. E como não estamos preparados para isso, se calhar, o melhor é apender a envelhecer. (1)
Diz-se que as crianças não nascem com livro de instruções. É também o caso da velhice que não chega com livro de instruções. Tenho aprendido com a própria experiência e já estabeleci algumas regras para meu uso pessoal.

1. Reduzir a velocidade em tudo: andar mais devagar, comer mais devagar, preferir tudo o que se faça devagar.
Não é nada fácil mudar o hábito de muitos anos a fazer as coisas à pressa para começar a fazê-las devagar.
Alguns provérbios fazem agora mais sentido: “depressa e bem não há ninguém” e “devagar se vai ao longe”, ou “um dia de cada vez”...

2. Não ser rezingão, não dizer mal de tudo, não ser queixinhas acerca de tudo o que acontece no mundo à minha volta. 

3. Não ser um peso para ninguém. Não deixar que façam nada por mim, excepto quando de todo não conseguir. 

4. Manter a actividade física e mental. Um hobby pode ajudar. 

5. Não querer ser um velho arrogante e presunçoso mas humilde. Não querer falar em último lugar e não querer ter razão e tirar as conclusões, nem pedir mais 30 segundos para concluir, porque isso não releva nada, não interessa nada e a conversa ou o debate não ganha nada com isso.

6. Ter cuidado com a ideia que anda por aí de que uma pessoa idosa já pode dizer tudo o que lhe vem à cabeça porque normalmente isso é visto como falta de responsabilidade.

7. Não dizer no meu tempo é que era bom, ou “os bons velhos tempos”. É uma frase enganadora uma vez que estes ainda são os meus tempos.

8. Saber retirar-se a tempo de responsabilidades que ficam mais bem entregues a pessoas com mais capacidades e deixar de querer ser, de uma vez por todas, um workaholic

9. Saber vestir-se: se calhar não "vestir à velho" mas também não querer ser o que não se é: um jovem de 20 anos.

10. Não dar saída aos mitos relacionados com a velhice, como por exemplo: Solidão e depressão são normais na velhice; os velhos não aprendem coisas novas...

11. Na velhice, como ao longo da vida, em relação às pessoas com quem vivemos, não dizer “tu nunca...” ou de outra forma não dizer “tu sempre...” , porque isso torna a comunicação difícil. 

12. Ter presente que a memória vai falhando com o envelhecimento. Vamos tendo experiência do que é perder lentamente a memória. Nada de anormal. começamos a esquecer-nos dos nomes de algumas pessoas, depois de muitas pessoas, a seguir, de acontecimentos temporais...

13. Finalmente, ser fanático apenas por uma coisa: a família afectiva.


Até para a semana.


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(1) Este é também o sentido do livro de Manuel Pinto Coelho, Chegar novo a velho.


Rádio Castelo Branco


10/05/23

#25AbrilMemóriaEEsquecimento

  

  

 Daqui



Está em curso uma campanha sobre o 25 de Abril ou melhor sobre o tempo antes do 25 de Abril com o intuito de dizer e mostrar aos jovens aquilo que não se podia fazer.
É uma campanha aberta à participação dos frequentadores das redes socais onde se lhes pede para escreverem uma coisa que não podiam fazer antes de 25 Abril: #NãoPodias vai dizer aos jovens o que há 50 anos estavam proibidos de fazer.
Esta campanha é um teste à memória das pessoas e como tal envolve circunstâncias e contextos de que as pessoas poderão não se recordar exactamente. 
Na pergunta “onde é que você estava no 25 de Abril” temos este problema: a memória e o esquecimento de um acontecimento em que muita coisa se diluiu no tempo e no espaço. E também o problema das falsas memórias que foram implantadas nas pessoas através das campanhas de propaganda que aconteceram na escola e nos media...
Na actual campanha não se devem descartar estes problemas. E, além disso, mais uma vez, a manipulação dos espíritos é prioritariamente dirigida à juventude. Contam sempre com a generosidade da juventude para participar em causas que podem ser importantes para a liberdade e democracia mas que se transformam em boomerang, rapidamente, quando acompanhadas de mentiras facilmente desmontadas. Veja-se o que se passa com outra campanha: a do clima...

Jaime Nogueira Pinto (Observador) desmontou algumas inverdades desta campanha e desta anedota propagandística paga com o dinheiro dos nosso impostos - e aqui deixa de ter graça. Mas há algumas destas inverdades que até são divertidas. Exemplos:
#NãoPodias esperar pela namorada ao sair das aulas...
Vivia então algum do meu tempo em Castelo Branco, onde, religiosamente, se esperava a namorada, ou o namorado, à porta do liceu, situado naquela avenida lindíssima, a avenida Nuno Álvares e por ali andávamos e namorávamos até decidirmos ir ao It’s, Cine-teatro, Rosel, Belar... passear no passeio verde ou ir até ao Jardim do Paço...
#NãoPodias ter as pernas à mostra nas praias
Pois... muito antes do 25 de Abril já se usavam biquínis nas praias portuguesas. 
#NãoPodias namorar na rua
Como? Na minha geração não se fazia outra coisa na rua, na faculdade, nos cafés, onde calhava...
E por aí vai...
#SimPodias. Como qualquer pessoa desta geração poderá confirmar. 

Há que escolher: pode-se mentir aos jovens (1) como se quiser mas o respeito por eles exige que se seja mais parcimonioso naquilo que se oferece à juventude.
O 25 de Abril foi e continua a ser uma data importante para a liberdade, liberdade de imprensa, de expressão, etc... e não necessita disto.
Mesmo que a liberdade de pensamento seja o pensamento simplista de hoje, resumido à repetição de #qualquer coisa, é preferível à falta dela. 
Mesmo que hoje haja outras formas de censura como o cancelamento, como o politicamente correcto, como o não poder falar nem escrever o que se quer nas redes sociais ou fora delas... pela liberdade do 25 de Abril devemos ser mais exigentes.


Até para a semana.


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05/05/23

Ramiro Marques (1955-2023)

 


"Quando os valores da escola coincidem com os valores das famílias, quando não há rupturas culturais, a aprendizagem ocorre com mais facilidade."

"Podemos considerar quatro tipos de obstáculos (à criação de bons programas de envolvimento dos pais): a tradição de separação entre escola e as famílias, a tradição de culpar os pais pelas dificuldades dos filhos, as condições demográficas e os constrangimentos estruturais." Ramiro Marques 

Continua a ser necessária a mudança em relação a estas circunstâncias das escolas, sem a qual - esta mudança - nada de novo a acontecerá.



Página de Ramiro Marques

A escola cultural