27/01/12

Não há crise planetária nenhuma

Aqui, para os que insistem em que a crise é por causa dos outros. Neste caso, "o inferno somos nós". Punset vem dizer que há muito que desaprender mas os que nos levaram à crise continuam em negação, a não  admitir  que, lejos de darse una crisis universal o internacional, lo que se dan son crisis específicas de países determinados, como el nuestro, Italia, Portugal o Irlanda.
Punset, brilhante e honesto.

25/01/12

Reformados e (quase de certeza) mal pagos

Se calhar valia a pena aproveitar esta oportunidade para analisar aquilo que (também estava subjacente)  disse o sr. Presidente da República. Um  deslize infeliz pode promover o debate positivo à volta do assunto.
Todos sabemos que há reformas e reformas. Algumas delas, ao fim de 40 anos de trabalho e face aos descontos que se fizeram são, efectivamente, baixas. Mas mesmo ao lado de nós há pessoas que, por terem um estatuto diferente, descontado para outros sistemas, descontado em tempo diverso, ou sei lá o quê, têm uma reforma diferente.
Percebe-se facilmente que a questão das reformas é uma trapalhada.
Sobre este assunto e nos últimos tempos, nada está seguro e as regras mudam com grande rapidez. Hoje posso pensar que a minha reforma vai ser uma e amanhã, afinal, é outra. As contas não são fáceis de fazer, apesar dos simuladores. As pessoas fazem descontos e pensam que vão ter uma determinada forma de cálculo da sua reforma e, no fim, acabam por ter outra.
Faz-se um contrato que se pensa que é para cumprir, efectuando os descontos para se ter uma determinada reforma que afinal não é para cumprir e, normalmente, acaba por ser revisto pelo governo porque... ou não há sustentabilidade ou outra coisa qualquer.
Mas o cidadão não pode deixar de cumprir, de pagar as suas prestações sob pena de ser penalizado. Não pode mudar as regras. Não tem liberdade de escolha. Não acontece o mesmo ao estado que muda as regras conforme entende.
Não se trata de direitos adquiridos mas de um contrato com o estado segurador que não cumpre.
Na realidade, o que se passa com as pensões de reforma é extraordinário.
O professor Medina Carreira refere, com frequência, que as pensões dos nossos filhos serão metade do que são actualmente.
Mas então como é isso possível ? Estamos a falar de um sistema que está dependente, ou devia estar, do regime geral da Segurança Social e não do OGE.
Dizem que é preciso trabalhar mais tempo e aumentar a idade de reforma e muda-se a lei. Mas com que objectivo? Para ter uma reforma inferior à actual?
Entretanto vivemos nesta ansiedade: é melhor reformar-me hoje ou amanhã ? Não será que se me reformo mais a tarde as condições são piores ?
Fala-se nos  70 anos de idade para se ter direito à reforma. Para quê ? Alguém garante que vou ter uma  reforma melhor ?
Pode dizer-se  que o problema não é apenas nosso. Como vai então a Europa reformar as reformas ?
É por isso urgente o debate sobre a reforma das reformas ou do sistema de pensões dentro da união europeia.
Este é um problema sério que passa ao lado da cortina de fumo das reformas do sr. Presidente.

Por isso, é necessário responder a estas questões:
Por que é que não se reforma o sistema para que as reformas não sejam, daqui a vinte anos, metade do que são actualmente ?
Por que não se discute o plafonamento das pensões ?
Por que há uma discrepância tão grande, por exemplo, nas pensões de um funcionário do Banco de Portugal e de um professor universitário ?
O que é isso de reformas douradas ? Em que serviços ? Ao fim de quantos anos ? Para quem ?
Por que não há apenas uma pensão do estado para cada cidadão, fazendo-se a acumulação dos vários descontos efectuados nos vários locais onde se trabalhou? Por que é que nuns casos se acumula e noutros não ?
O que é isso de reformas vitalícias ?
O que é isso de deputados se reformarem ao fim de alguns anos de descontos ?
O que é isso de regimes especiais?

Em Outubro de 1974, o Programa de acção do Ministério dos Assuntos Sociais, redigido por M. de Lourdes Pintasilgo previa a uniformização dos regimes de previdência aplicáveis aos trabalhadores das actividades privadas e aos funcionários do Estado.
Onde estamos? Qual uniformização? Há vários estadozinhos dentro do estado… Cada instituição sua pensão!
Era bom que pelo menos nesta questão houvesse mais equidade, menos burocracia, mais liberdade de escolha, mais estabilidade, mesmo que sejam levadas em conta as dificuldades do país.

21/01/12

Eles

Algumas constatações, aqui no Barómetro da qualidade da democracia.


Quase 48 por cento dos inquiridos acreditam que a democracia “funciona pior ou muito pior do que há cinco anos”, enquanto 70,4 por cento considera que a sua qualidade de vida global foi significativamente afectada pela crise económica.

Existe também uma desconfiança em relação à elite política. “A percepção que os portugueses têm é que os políticos tratam mais dos seus interesses pessoais do que do interesse comum”.
São, assim, cada vez mais os portugueses que consideram ineficaz a luta contra a corrupção por parte do governo. Em 2007 eram 64 por cento, em 2010, a percentagem aumentou para 75.
“Entre as instituições democráticas, aquela que os portugueses consideram mais próximas do interesse da população é a da Presidência da República” (21,7 por cento), merecendo por isso mais confiança. As autarquias vêm em último lugar, com apenas 2,75 por cento de portugueses a considerarem que os autarcas são os agentes que melhor dão voz às suas preocupações.

19/01/12

Eles


“Eles” é o termo usado pelos cidadãos para se distinguirem do poder ou das pessoas que ocupam o poder e normalmente o usam e o abusam.
"Eles" é o termo usado pelos poetas e cantores como José Afonso que cantava "eles comem tudo…"
"Eles" são eventualmente a burguesia de outros tempos e os que não se consideram assim mas que estão nos mesmos lugares com designações mais subtis para mostrarem a sua distinção: gestor de topo, alta administração.
"Eles" são os que se acham sempre diferentes dos outros para melhor porque têm, e se não têm merecem ter, aquele estatuto quer levem as empresas ao sucesso quer as levem à falência.
"Eles"  têm a dupla moral, colectiva e a individual, desde que os interesses pessoais se mantenham , a crise que seja paga por todos, com "equidade".
"Eles" estabelece a clivagem cada vez mais profunda entre o poder e o povo.
Fomos ouvindo falar, durante muitos anos, destes macroprocessos e microprocessos (P.Pereira). Macroprocessos que conhecemos pela comunicação social e alguns microprocessos que se passam na nossa vida laboral e de que nem sequer já nos admiramos.
Desta vez, dado o estado de necessidade do país e, pelo que disse P. Passos Coelho, seria desejável e aconselhável que fosse diferente.
A insensibilidade leva-os a justificar como coisa normal o que acontece. Justificam as escolhas, os perfis, os salários, os prémios, como se se pudesse justificar com trabalho dependente prémios de milhões de euros.
A alternativa não está no populismo. Os populistas aproveitam para fazer greves, manifestações, indignações e revoluções. É simples perda de tempo trocar uns pelos outros porque  são sempre "eles". Não muda nada. Estão em qualquer quadrante político da esquerda à direita conforme muda o poder.
A elevação do debate anda à volta de saber quem fez/faz mais nomeações: mais dois aqui menos quatro acolá. E, apenas um exemplo, queixam-se...
Quantas mais explicações mais ficamos convencidos do contrário do que dizem. Algumas explicações acabam até por ser perturbadoras como a nomeação baseada no critério das caras mais conhecidas.
O problema é outro. É a rede da burocracia . Claro que são sempre os mesmos desde há trinta anos. 
Como se faz um gestor de topo ?
Não é pois surpreendente verificar que os membros desse gabinetes têm características sociais sempre superiores às dos outros funcionários.
Tornam-se assim capazes de vigiar de muito perto o funcionamento dos principais órgãos administrativos colocados sob a direcção do ministro e quando necessário substituí-los na preparação e no pôr em prática das principais decisões. (Jaques Sallois e Michel Cretin, "O papel social dos altos funcionários", in Poulantzas, N. - A crise do estado, pag. 195)
A partir de certo ponto cria-se uma cristalização quase impossível de ser dissolvida, tanto mais que o corpo oligárquico enamorado do poder escolhe os seus membros com cuidado cada vez maior. (V. Cunha Rego, "Os burocratas", Os dias de amanhã, pag 41) 
Como já referia Alain (1868-1951),
esse é um dos defeitos de qualquer organização política. Com efeito uma organização política tem um carácter forçosamente oligárquico na democracia e a propensão dos seus dirigentes para ultrapassar os seus poderes.
E conclui que os cidadãos devem obedecer ao Estado mas sem o respeitar e sem ter admiração pelos seus dirigentes.
É nesse ponto que me encontro.
Como para António Gedeão, "eles" são os mesmos que não sabem nem sonham que o sonho comanda a vida.

11/01/12

Elites e grupos de pressão

O debate que acontece na sociedade portuguesa sobre este assunto é muito interessante. No fundo, está em discussão e análise tudo o que tem a ver com o poder, com as elites e as contra-elites, com os movimentos sociais, os grupos de pressão e os lóbis, os sindicatos e todo o tipo de grupos sociais.
O que se passa com o caso pingo doce, a maçonaria, a justiça e a ordem dos advogados, os sindicatos e todos os grupos reivindicativos das elites no poder ou das contra-elites que o criticam… são assuntos que se inscrevem neste contexto dos grupos de pressão.
Verificamos que muitas vezes simplificamos o que acontece com processos de vitimização ou de culpabilização dos que atacam o poder do governo ou das empresas e somos levados a aderir a uns ou a outros tendo em conta os que têm razão ou não têm, os que são mais ou menos patriotas.
Verifica-se que a análise tem passado pelo processo auto-avaliativo de quem se considere elite e dos que são contra-elite.
Estamos no jogo dos movimentos sociais enquanto grupos de pressão e quer se queira quer não o seu objectivo é reivindicar junto do poder a satisfação dos seus interesses.
O jogo social contém todas estas variáveis. O timing é o que o quarto poder quiser e será necessário sondar por que isso acontece. O Expresso, o Público, etc.  levantam estas questões porque também eles estão dentro deste contexto mas é decisivo para a liberdade de expressão que o façam.
As notícias e análises que vêm agora à luz do dia têm a ver com toda a movimentação que os media estão a sofrer e as relações da comunicação social, os serviços secretos, os interesses instalados ou a instalar e as mudanças que se pretende fazer.
Os lóbis ou grupos de pressão estão muito activos e reconhecê-lo é muito importante.
Joga-se o poder das elites. Das elites tradicionais, tecnocráticas, da propriedade, carismáticas, ideológicas e simbólicas. (Guy Rocher)
As elites tecnocráticas representadas no poder por pessoas mais ou menos independentes, as elites da propriedade representadas pelos detentores das empresas industriais, financeiras, da comunicação social, do pingo doce à prisa, ongoing…
As elites simbólicas, da cultura, das artes, do futebol ao “parva que sou” dos Deolinda.
Depois ouve-se a opinião das elites políticas, do clero, das forças armadas, de quem se considera carismático, normalmente ex-qualquer coisa,  e que, geralmente, fazem parte das elites tradicionais.
A sociedade moderna tem esta característica de proliferação das elites e dos grupos de pressão.
No fim deste debate, acredito que ganhará a transparência e a tolerância na vida social e política. 
A democracia deve sair reforçada na medida em que o nosso voto nas próximas eleições poderá ser mais consciente e objectivo naqueles que conhecemos melhor.

05/01/12

Santos da casa (também) fazem milagres




O ano que terminou, 2011, foi o ano europeu do voluntariado mas a atitude voluntária nunca acaba.
O voluntariado supõe o apoio a pessoas em dificuldade que são assistidas através de uma presença humana, de uma relação positiva, do contributo de bens e serviços que ajudam as pessoas, muito para além dos apoios oficiais que o Estado pode proporcionar. O voluntariado exerce-se no jogo dos afectos que estimula a relação, mas caracteriza-se pela competência no que se dá. (Victor Feytor Pinto)
O voluntário é o individuo que de forma livre, desinteressada e responsável se compromete, de acordo com as suas aptidões próprias e no seu tempo livre, a realizar acções de voluntariado no âmbito de uma organização promotora. A qualidade do voluntário não pode, de qualquer forma, decorrer de relação de trabalho subordinado ou autónomo ou de qualquer relação de conteúdo patrimonial com a organização promotora, sem prejuízo de regimes especiais constantes da Lei. (Lei 71/98)
O voluntariado e o voluntário estão aqui bem definidos. No entanto, também os vejo de outra maneira: como voluntariado de proximidade e autónomo. E mais, enquanto atitude de ajuda às pessoas com necessidade de apoio e ou como ajuda para uma vida comunitária de qualidade.
Temos a tendência para olhar para o voluntariado como uma tarefa que se concretiza longe em termos geográficos ou longe em termos sociais, isto é, fazer qualquer coisa pelos mais desfavorecidos social e economicamente  ou fragilizados do ponto de vista afectivo.
No entanto, bem perto de nós há quem precise de ser apoiado e por isso é tão importante o voluntariado de proximidade e autónomo.
Há estruturas da comunidade importantes para o seu funcionamento e em que, normalmente, poucas pessoas estão dispostas a colaborar.
Exemplos não faltam.
Fazer parte da administração do condomínio, interessando-se pelos cuidados que são necessários para que as pessoas, as famílias possam viver melhor nas casas que habitam.
Ter iniciativa individual para integrar estruturas da comunidade ou criar núcleos autónomos para a ajuda alimentar, ajuda com roupa para as crianças (enxoval do bebé) …
Apoiar actividades para jovens (escutismo, actividades de tempos livres, lares).
Integrar a comissão de protecção de crianças e jovens (CPCJ) enquanto membro da comissão alargada (principalmente) da nossa cidade.
Fazer parte de uma associação de pais ou ser representante dos pais na turma.
Os pais estão sempre à espera que outros assumam estas tarefas e inventam todas as desculpas, o trabalho, a falta de tempo, falta de jeito, para não estarem onde é necessário "defender" os filhos.
Fazer parte de uma associação de apoio a idosos porque os nossos idosos precisam de nós, às vezes são os nossos pais ou nossos familiares…
Ajudar as crianças que são da nossa própria família. Os avós podem ficar com os netos durante algum tempo, podendo os pais realizar tarefas importantes e necessárias.
Tantas actividades da nossa vida quotidiana onde é possível fazer a diferença para uma vida com mais qualidade. Tão fácil e tão difícil.
A tendência é ajudar quem está longe e não vemos nem pensamos que podemos ser voluntários mesmo ao pé da porta, ajudar os nossos vizinhos, os nossos familiares tão necessitados como os outros que estão longe.
Podemos começar por aqui.
Porque santos de casa, ao contrário do que diz o ditado, também fazem milagres.