Controvérsia

PÚBLICO

OPINIÃO

De um “conservador” para um ignorante

Tiago Brandão Rodrigues chamou-me conservador. É altura de lhe dizer que é ignorante.

1. O ministro da Educação afirmou que a sua política é “progressista” e que quem a critica “apresenta uma visão conservadora do país”. Crítico que sou da política em análise, Tiago Brandão Rodrigues chamou-me conservador. É altura de lhe dizer que é ignorante.
Porque só um ignorante da complexidade do insucesso julga que o combate com fornadas de formação para os professores. Estou a referir-me às indizíveis acções que acabaram de ter lugar em Évora, Leiria e Braga. Em golpe de mão, onde a surpresa e a rapidez da convocatória nem permitiram a muitos saber ao que iam, arregimentaram-se professores para ouvirem em dois dias (no primeiro, das 09.30 à meia-noite), fechados num hotel, as mais finas tretas de um “eduquês” que agora será reproduzido “em cascata”, primeiro para directores, coordenadores de directores de turma e coordenadores de 1º ciclo (numa imposta maratona até Junho) e, posteriormente, para todos os professores. Aos que preferiam ver-me como o patinho sentado da história que o ministro mandou contar às escolas, e se apressarão a decretar o exagero do meu sarcasmo, deixo um naco da prosa que extraí dos respectivos documentos de apoio:
Se as organizações fossem vistas como jardins, os líderes não poderíam mandar que crescessem. Teríam que enfrentar as impredictibilidades, os fatores ambientais, trabalho em equipa e fatores de risco que normalmente se caracterizam quando se pensa em desenvolver algo. Os líderes só podem promover o desenvolvimento ao ‘reorganizar as condições e as estruturas’... Para os jardins, estas condições são o sol, humidade, solo, nutrientes e temperatura; para as escolas são o tempo, espaço, materiais, incentivos, formação, colegialidade, respeito, confiança e recursos humanos
(Os erros ortográficos, mesmo o do verbo ter, estão no documento consultado).
Se os leitores quiserem mais, acedam à indigência dos PowerPoint usados. Encontrarão, por exemplo, um slide piroso com um gatinho amarelo frente a um espelho, que lhe devolve a imagem de um leão de farta juba. Ao lado, a mensagem profética que vai resolver o insucesso:
Os professores com altas expectativas dos seus alunos transmitem essa atitude (intencionalmente ou não) e em geral estes estudantes obtêm melhores resultados do que os dos professores cujas expectativas são baixas”.
Preparem-se, professores, para mais trabalho, em ambiente de piolheira palavrosa, a somar às aulas e aos cargos, às provas que foram extintas mas podem ser feitas ao mesmo tempo das outras que, sendo facultativas, começam por ser obrigatórias. Preparem-se, ainda, que a cena está programada para os próximos três anos lectivos. E, sobretudo, preparem-se, mais uma vez, para serem os maus da fita, responsabilizados, no fim, pelo insucesso do combate ao insucesso.
Ignorante por permitir que do ministério que tutela saia um normativo tão repugnante como o despacho 1-H/2016, segundo o qual as turmas que integrem alunos com necessidades educativas especiais só poderão ter a dimensão reduzida que a lei prevê se esses alunos estiverem, pelo menos, 60% do tempo em contacto com os colegas. Quer isto dizer que quanto mais graves e profundas forem as deficiências dos alunos (porque é essa gravidade que dita a separação deles do grupo “normal”, em determinadas ocasiões) maior será a dimensão da turma, quando integrados. Dizer depois, como o ministério disse, que esta enormidade tem como “único objectivo induzir mais inclusão”, é de um primarismo sádico, intolerável. Bem pior que as “salutares bofetadas” do outro!
2. Sem surpresa (a questão estava no programa eleitoral do PS e está no programa do Governo), o presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses anunciou que a “municipalização” da Educação avançará em 2018. Ainda sem surpresa é que se avance sem que se conheça qualquer avaliação das experiências em curso e sem que se analisem criteriosamente os maus resultados das alheias (descritos por mim em artigo do PÚBLICO, de 11/2/15). Com efeito, a estratégia é abocanhar, de qualquer jeito, as verbas comunitárias possíveis, ampliando as iniciativas de outsourcing educativo, tão ao gosto dos que dizem uma coisa e fazem o oposto. Surpresa é o olímpico silêncio de Mário Nogueira sobre o tema. Em tempos de Nuno Crato e face a dezena e meia de experiências-piloto, a luta foi vigorosa (11 providências cautelares accionadas nos tribunais, 50 mil professores inquiridos, com 43 mil a manifestarem-se contra, e toda uma incansável intervenção pública denunciadora dos malefícios da “municipalização”. Agora, que a intenção parece ser generalizar a todas as autarquias e a todo o sistema de ensino, o ruído deste silêncio é difícil de acomodar.
Já não se trata de antagonismos no que toca a soluções e processos. Trata-se de suportar um ministro tecnicamente incompetente e politicamente irresponsável. Com o silêncio dos cúmplices.
Professor do ensino superior (s.castilho@netcabo.pt)




Valter Lemos e o papel dos sindicatos - O compromisso histórico, Reconquista




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Artur Portela e ensino vocacional - É a natureza das coisas, estúpido!

Jornal do Fundão, 6 Set 2012, 

É a natureza das coisas, estúpido!*

O SR.MINISTRO da Educação lançou as bases da condenação ao ensino profissional de todos os alunos que chumbarem no básico.
Independentemente do facto de não o ter feito de forma deliberada. Nem terminante.
Qualquer assessor lhe dirá, porém, que, do ponto de vista de imagem, de apreensão pública, de sensibilidade de opinião pública, pais, alunos, professores, televisões, jornais, rádios, net, é o que acaba de fazer.
Não que não haja qualidade, dignidade e honra no ensino profissional. Não que o país não precise desse ensino e desses alunos. Mas que é assim que o sr. ministro da Educação deixa que as coisas sejam apresentadas. Em termos de ameaça velada. E de implícita pedagogia classista. Não é por acaso que a memória empresarial mais dilatada, aquela que não dizia “margem sul”, que dizia, directamente, “CUF”, ainda hoje evoca, a propósito, o para ela tempo de ouro das escolas industriais e comerciais.
Somos todos livres, pais e escolas. E até, essencialmente, alunos. E estamos todos a evoluir, os alunos a uma velocidade talvez maior. E mais festiva. Não temos de esperar, dentro de um frasco, que nos trasfeguem. Ou, como canta Manu Chao, El presente es siempre diferente!
Isto de as dificuldades de aprendizagem, o desaproveitamento escolar, os chumbos constituírem uma tempestade a encher, um furacão a passar do grau 1 para o grau 2 e do grau 2 para o grau 3, tudo isto a crescer e a enegrecer perante os alunos e as famílias, é insuportável.
Os alunos e os pais têm de ter - independentemente da seriedade do trabalho escolar, dos resultados justos, das classificações verdadeiras, dos não-facilitismos - sempre abertos todos os caminhos de decisão. Não apenas o caminho das pedras. Todos os caminhos. De outra forma, estamos a shrinkar cabeças. A converter as salas de aulas em caixas de sapatos. A transformar as classificações em cadastros, daqueles antigos. A indignificar o papel dos professores. A indignificar o papel das escolas.
Dir-se-á que se trata de um projecto-piloto. Dir-se-á depois que tudo é reversível.
Porque - e aqui entra-se numa floresta apertada, num jardim de muitos enganos prováveis, de muitos recuos e de muitos comunicados - parece que cada escola escolhe as 3 profissões que os alunos deverão aprender durante os 3 anos do 3º Ciclo. Porque as áreas fundamentais parece que são a agricultura e a indústria. Porque parece que tudo ou quase tudo envolve um acordo com o tecido empresarial da zona da escola. Porque parece que há um equilíbrio entre, por um lado o Português, a Matemática e o Inglês, e por outro 3 ofícios práticos, que podem ser o de cozinheiro, o de talhante, o de mecânico, o de electricista, o de canalizador e o de produtor agrícola. Porque parece que há equipas de acompanhamento e orientação permanentemente a zelar. Porque no final de cada ciclo (9º ou 12.º) parece que os alunos podem mudar para a via regular de ensino (desde que façam as provas ou exames requeridos). Dir-se-á, insistir-se-á, que tudo é reversível.
Responde-se que, nestes termos, e essencialmente, nada é reversível, nada é totalmente reversível porque o mal está feito. Não todo, mas muito. A confusão está instalada. A ameaça está desenhada. O medo está inoculado. A partir daqui, é sempre a andar, para trás!
Somos todos, pais, escolas, alunos, livres. O sr. ministro da Educação não é, porém, livre de não ser inteligente e minimamente sensível. Devendo acrescentar-se que o sr. ministro também é ministro da Ciência. O que aumenta, e não pouco, como ele sabe, na matéria, a sua responsabilidade. E isto, se o Prof. Nuno Crato perceber bem, é uma palavra de consideração por ele.
Sinceramente preferia que o Prof. Nuno Crato não tivesse de ir, nos tempos mais próximos, fazer uma viagem a Timor.
* Em memória da frase feita “É a Economia, estúpido!”
Artur Portela

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Daniel Sampaio, Crónica - porque sim, Público



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