29/02/24

Meditar à minha maneira




Cada um de nós pode encontrar a sua maneira de meditar. Às vezes a solução está debaixo dos nossos olhos e nem sempre nos apercebemos de que essa é uma forma de meditação excelente para nós.

Por esta altura da Quaresma acontecem actividades várias um pouco por todo o País  que outra coisa não são que formas de meditação profunda. 

Na nossa cultura, o tempo pede essa reflexão sobre nós próprios, requer a concentração na vida efémera, no sofrimento que nos atormenta mas, por mais atroz que possa ser, também se oferece como forma de superação.

Este é o tempo, quando pensamos nesta vida, que nos traz momentos de felicidade mas que nos alerta para todo o background que marca a nossa existência, a começar pelo sofrimento psíquico, medo, tristeza, stress,  irritações e injustiças...

 

Então é possível procurar momentos de serenidade,  paz,  segurança, o conforto comigo próprio, que se não for felicidade não deixa de ser um estado verdadeiramente tranquilo em que "nada me perturba, nada me espanta" (Sta Teresa D' Ávila), nada interfere na minha vida .  

Os benefícios da meditação são verificáveis na medida em que as pessoas que a praticam são mais felizes e vivem mais satisfeitas do que a média. E isto é muito importante para a sua saúde:

- Reduz as perturbações  mentais como a ansiedade, a depressão e a irritabilidade

- Melhora as relações interpessoais

- Ajuda no impacto que podem ter doenças graves na nossa vida como a dor crónica... etc.

 

É necessário desfazer alguns mitos:

- A meditação não é uma religião embora muitas pessoas que a praticam possam ser  religiosas

- Podemos meditar em qualquer lado e em qualquer posição. Para praticar, não é necessário sentar-se numa posição especial ou respirar de maneira específica.

- E, muito importante, “a meditação não é  aceitar o inaceitável. É ver o mundo com maior clareza permitindo-lhe agir de forma mais sábia e fundamentada e mudar aquilo que precisa de ser mudado.”(Williams, M. e Penman, D. - Mindfulness - Atenção plena, Lua de papel, p.16)

 

A “Ladainha” e o “Terço cantado” são manifestações de meditação que se realizam em S. Miguel d’ Acha e que são levadas a efeito todas as 5.as e 6.as feiras da Quaresma. *

Rezar e meditar não são a mesma coisa mas têm uma ligação muito forte, podendo até ser assimiladas uma à outra.

Podemos dar a esta forma de meditar a designação de Meditação  guiada ou Meditação cantada. O mantra “Rogai por nós” ou a repetição do "Pai nosso", p.ex., levam-nos, como refere John Main, para “um modo de oração profunda que nos encaminhará para a experiência da união, longe das distracções superficiais e da autocomiseração.“

 

“O fundamental é exercitar a focalização da mente num ponto, num objeto, pensamento ou atividade em particular, visando alcançar um estado de clareza mental e emocional.“  (Meditação cristã: como surgiu e como praticar)

Como tal, também o fundamento da meditação cristã é contemplar diferentes aspectos da vida de um Ser exemplar que se oferece como modelo para a nossa vida. 

Esta possibilidade está à disposição de quem quiser meditar durante 30 minutos às 5.as feiras e durante uma 1H30 às 6.as feiras durante o tempo da Quaresma.

 

 

Até para a semana.

 

 



Rádio Castelo Branco 

23/02/24

Eleições, internet e mentiras


A mentira parece estar na ordem do dia. Daí a necessidade de polígrafos e de programas de fact-checking, em que "caiu" a comunicação social que após uma qualquer informação, vem imediatamente repor a sua verdade à sua audiência... 
Ninguém confia em ninguém. E o que é mais estranho ainda, é que nem sequer podemos confiar em nós porque mentimos a nós próprios e é sempre mais difícil aceitar a verdade quando nos envolve a nós ou a pessoas da nossa família.
Gostamos até de ser enganados pelos mágicos que nos deixam estupefactos quando tiram o coelho da cartola.

Contamos mentiras o tempo todo. Um estudo de 2002 realizado pelo psicólogo Robert Feldman, descobriu que 60% das pessoas mentiram pelo menos uma vez durante uma conversa de 10 minutos, contando em média duas a três mentiras. 

A tendência para mentir está profundamente enraizada na nossa história evolutiva, como acontece com outros primatas.

As crianças adquirem esse comportamento de prever o pensamento da outra pessoa entre as idades de dois e cinco anos, e isso é visto como um marco no desenvolvimento cognitivo (teoria da mente).

 

Muitas mentiras são triviais e cordiais. As mentiras do quotidiano ou pelo menos as falsidades fazem parte da conversa consumatória que todos usamos e das quais não vem grande mal ao mundo por causa disso, desde mentiras gentis (“estás mais magra!” ou “estás com óptimo aspecto!" ou  "tens um cabelo bonito”) a algumas mentiras que fazem parte das nossas rotinas e na sua maioria são de autoprotecção e inconsequentes (“estou a caminho”, “estou quase a chegar”, “havia um acidente  na estrada”)...

 

Mas há mentiras  sinistras, como acusar falsamente alguém de um crime ou mentir aos investidores, que podem ter consequências devastadoras. 

Acontece também, por exemplo, com a mentira manipuladora na violência doméstica (gaslight)

 Acontece com golpistas e trafulhas da Internet: com o “Olá mãe, olá pai “ ou que vasculham as contas dos outros ou os roubos de identidade...
A mentira às vezes envolve um currículo inteiro em que se inventam factos que nunca aconteceram ou que não aconteceram com aquela pessoa.

Outras vezes é a omissão de dados e factos nos documentos que se apresentam nas instâncias que controlam e regulam o funcionamento dos políticos nas democracias.


Num tempo como este de eleições nas democracias (1) podemos estar cientes de que circulam (propaganda) todo o tipo de mentiras.
A começar nas promessas enganosas que praticamente todos os candidatos fazem.
E de desmentidos. Aquilo que não era possível fazer antes, passa miraculosamente a fazer parte das obras realizáveis. Não importa onde se vai buscar o dinheiro. A “finite pie” parece ser infinita e tudo é realizável ou passa a ser. Quanto maiores as promessas maior a entropia das explicações.

Mas... o ser humano reage fortemente à desonestidade. A desonestidade coloca o cérebro em estado de alerta intensificado, e esse stress aumenta com a magnitude da mentira. (2)
Por isso, a prazo, a mentira nunca compensa....


Até para a semana.
 

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(1) Já que nas ditaduras  a mentira é a verdade.


(2) Mentir provoca alterações psicofisiológicas: na respiração, nos batimentos cardíacos, começar a suar, a boca fica seca e a voz pode alterar. Alguns desses efeitos são registados no clássico teste do detector de mentiras (polígrafo, máquina da verdade). Ainda assim, pode haver quem minta ao detector de mentiras.





Rádio Castelo Branco





09/02/24

Educação – o maior tesouro


Pais e educadores, às vezes, sentimo-nos perdidos com tanta informação sobre a educação das crianças e sobre a melhor educação tendo em vista o seu futuro.
Choque do Futuro, um livro de Alvin Toffler, já com mais de 50 anos alertava para o desconforto que poderíamos sentir em virtude da evolução tecnológica e social que estava a acontecer e que se acentuava cada vez mais e também dos desafios daí resultantes que se verificavam em todos os campos da actividade humana. 
Na verdade, nem tudo o que se diz "progresso" é positivo, e, na verdade nem tudo é possível ser previsto havendo sempre a possibilidade de aparecerem cisnes negros na nossa vida. (N. Nicholas Taleb)
Alvin Toffler alertava: “O analfabeto do século XXI não será aquele que não consegue ler e escrever, mas aquele que não consegue aprender, desaprender e reaprender.” (1)
No meio de tanta informação, a tarefa de educar na sala de aula e na escola parece que não evoluiu assim tanto. 

O processo de aprendizagem nalguns casos continua baseado na coerção, no medo, na obrigação fazendo com que formemos jovens que possuem desconfiança e desprazer com o ato de estudar. E aqui e ali surgem alguns (maus) exemplos...

Jacques Delors, recentemente falecido (27-12-2023), foi Presidente da Comissão Europeia entre 1985 e 1995.
Quero recordá-lo aqui, pelo mérito de ter presidido à Comissão que produziu o relatório sob a forma de livro: Educação - Um tesouro a descobrir. (2)
O título do Relatório é uma referência à fábula de Esopo (ou La Fontaine): O Lavrador e seus filhos, que nos mostra que o trabalho de preparar o terreno, semear e plantar é o verdadeiro tesouro que mais tarde vamos descobrir.
A educação para Jacques Delors baseia-se em em quatro pilares: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser (Capítulo 4).
• Aprender a conhecer, combinando cultura geral, ampla, com a possibilidade de estudar, em profundidade, alguns assuntos.
• Aprender a fazer, adquirir uma qualificação profissional, sendo apto a enfrentar numerosas situações e a trabalhar em equipe. 
• Aprender a conviver, desenvolvendo a compreensão do outro e a percep­ção das interdependências – projetos comuns, gerir conflitos – no respeito pelos valores do pluralismo, da compreensão mútua e da paz.
• Aprender a ser, para desenvolver, o melhor possível, a personalidade e estar em condições de agir com uma capacidade cada vez maior de auto­nomia, discernimento e responsabilidade pessoal. Com essa finalidade,a educação deve levar em consideração todas as potencialidades de cada indivíduo: memória, raciocínio, sentido estético, capacidades físicas, aptidão para comunicar­.

O conceito de educação ao longo da vida é a chave que abre as portas do século XXI (Capítulo 5);  ele elimina a distinção tradicional entre educação formal inicial e educação permanente. Além disso, converge em direção a outro conceito, proposto com frequência: o da “sociedade educativa” ("The Learning Society") na qual tudo pode ser uma oportunidade para aprender e desenvolver os talentos. (3)
Nesta perspectiva, a educação permanente é concebida como atualização, reciclagem e conversão, além da promoção profissional, dos adultos.  
Deve  abrir as possibilidades da educação a todos, com vários objetivos: oferecer uma segunda ou terceira oportunidade; dar resposta à sede de conhe­cimento, de beleza ou de superação de si mesmo; ou, ainda, aprimorar e ampliar as formações estritamente associadas às exigências da vida profissional, incluindo as formações práticas.

Em suma, para Jacques Delors, a educação ao longo da vida, é aprender a aprender, é tirar proveito de todas as oportunidades oferecidas por essa “sociedade educativa”.


Até para a semana


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(1)  A frase é de Herbert Gerjuoy. Reflexão para ler e criticar sobre o que é aprender, desaprender e reaprender
(2) A Conferência Geral da UNESCO, em novembro de 1991, convidou o Diretor Geral “a convocar uma Comissão Internacional para refletir sobre a educação e a aprendizagem no século XXI”. Assim, Federico Mayor solicitou a Jacques Delors para assumir a presidência dessa Comissão, que reuniu outras 14 personalidades de todas as regiões do mundo, oriundas de diversos horizontes culturais e profissionais. A Comissão Internacional sobre a Educação para o Século XXI foi criada oficialmente no início de 1993.
(3) "A formação ao longo da vida, como categoria enquadradora de uma nova forma de conceber as relações entre a educação, a escola e a sociedade, (sublinhado meu) se, por um lado, radica em necessidades pragmáticas das sociedades a que urge responder mais adequadamente, por outro implica a reconceptualização do papel da instituição escolar e, consequentemente, o reexame das grandes metas de educação escolar no mundo atual."  Maria do Céu Roldão, "A educação básica numa perspetiva de formação ao longo da vida",  Inovação - Educação e Formação ao longo da vida, Vol. 9, nº 3, 1996, p. 211.






Rádio Castelo Branco



01/02/24

De Watson à Assembleia da República


1. Na sequência da lei n.º 38/2018, de 7 de Agosto, sobre o "Direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e à proteção das características sexuais de cada pessoa", foi aprovado (1) pela Assembleia da República, o decreto que estabelece medidas a adotar pelas escolas para garantir esse direito.
Segundo esta lei, as escolas devem definir “canais de comunicação e deteção”, identificando um responsável ou responsáveis “a quem pode ser comunicada a situação de crianças e jovens que manifestem uma identidade ou expressão de género que não corresponde ao sexo atribuído à nascença”.
Após ter conhecimento desta situação... a escola deve promover a avaliação da situação, reunir toda a informação relevante para assegurar o apoio e acompanhamento e identificar necessidades organizativas e formas possíveis de atuação, a fim de garantir o bem-estar e o desenvolvimento saudável da criança ou jovem”.  Como a garantia do acesso às casas de banho e balneários...

Podemos questionar: Sexo atribuído à nascença? Definir canais de comunicação e deteção? Identificar um responsável? Garantir tendo presente a sua vontade expressa? 
De que jovens se trata? Em que idades? Qual o papel dos pais/encarregados de educação?
Por quê nas escolas? Por que não em todas as instituições da sociedade?

2. O texto desta lei é uma barbaridade. Mas tudo está dentro da lógica vinda de John Watson e de John Money. (Jean-François Braunstein, A Religião woke, cap. II - Uma religião contra a realidade - A teoria de género, p.71-106, Guerra e Paz),
Sabemos o que pensava Watson da modificação do comportamento quando em 1927, proclamou a sua famosa frase: “Dêem-me um bebé e eu farei dele o que quiser, um ladrão ou um juíz, um pistoleiro ou um médico…”
Esta conhecida afirmação resulta da teoria behaviorista, segundo a qual o meio em que ocorre a aprendizagem é fulcral para o desenvolvimento. Neste sentido, todo o bebé que seja estimulado a fim de ser algo, sê-lo-á, independentemente da sua carga genética. 
É, por isso, que este decreto ser de aplicação apenas na escola, portanto, a crianças pequenas, não deixa de ser perverso... (2)

3. Mas, ainda assim, também sabemos que as pessoas não são ratos e que pensam... 
Foi o que fez o Sr. Presidente da República,  Marcelo Rebelo de Sousa. Vetou o decreto que estabelecia estas medidas a aplicar pelas escolas
Segundo disse: "A aplicação nas escolas das medidas preconizadas no diploma tem necessariamente de ser ajustada às várias situações e, em particular, à idade de crianças e adolescentes"...  " o decreto peca por uma quase total ausência dos pais e encarregados de educação na implementação das medidas previstas."

4. As escolas, juntamente com os pais, sabem lidar com as diferenças, desde há muito tempo... e não precisam destas leis vindas da AR, ou do Ministério da Educação, nem de supostos formadores que as vão ensinar, educar e formatar no sentido que pretendem... que é a desconstrução da estrutura social existente, sujeitando a maioria dos alunos a normas absurdas e que não fazem sentido para ninguém nem para as minorias nem para as maiorias que, pelos vistos, também têm direitos. 

Até para a semana.


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(1) O texto final foi apresentado por PS, BE e PAN, foi aprovado por estas forças políticas juntamente com o Livre, e contou com votos contra do PSD, Chega e IL e a abstenção do PCP.
(2) Sobre a fatídica experiência de John Money ver, por ex., o que tem dito e escrito Miriam Grossman.



Rádio Castelo Branco