09/11/16

Humanização e empatia *


A semana passada descrevemos alguns estudos psicológicos sobre  comportamentos anti-sociais e cruéis.
Não podemos deixar de referir os trabalhos de Hanna e António Damásio sobre este assunto.

Nos casos de adolescentes  estudados por Hanna  Damásio  em que houve lesões cerebrais na infância, “ao contrário do que acontece com os doentes em que a lesão aparece na idade adulta, estes doentes  têm frequentemente, problemas com as autoridades, são presos por roubos e por outros casos de delinquência. O perfil neuropsicológico é basicamente idêntico ao dos doentes em que a lesão começa na idade adulta (os testes psicológicos são normais) mas  as emoções são anormais"... A diferença aparece nos testes que medem o comportamento social, (juízo moral ), "o que se passa com os indivíduos que tiveram uma lesão durante a infância nunca ultrapassa o nível pré-convencional (compreendem apenas a punição e obediência, interesses, nível de crianças com menos de 9 anos) e são portanto claramente anormais."(p.28)
Para Hanna Damásio “uma lesão cerebral, colocada em certos sectores, leva em adultos até então normais, à ruptura do comportamento social normal. Essas mesmas lesões, mas adquiridas na infância, impedem o desenvolvimento de comportamentos sociais normais, nunca existem. Tanto nos adultos, como nas crianças, o problema parece dever-se a um defeito de processos emocionais.” (p.28)
Por exemplo, “…os sistemas podem funcionar mal devido a defeitos de desenvolvimento… de causa genética, ou serem devidos a um ambiente afectivo deficitário. O ambiente afectivo deficitário, pode tomar várias formas, desde o abandono da criança, à violência física ou cultural, e a deficiências nutritivas.”(p 28)
Para António Damásio, as emoções são vistas num quadro complexo de regulação da vida, com muitos níveis, que começa com a regulação de  nível metabólico com reflexos básicos e respostas imunitárias . A vida , de um modo geral, é regulada primeiro por formas inteiramente automáticas mas que são de facto transmitidas pelo genoma e depois por formas que podem ser deliberadas.
Outros níveis são:  Comportamentos de dor e prazer,  Pulsões e motivações,  Emoções.
No topo das emoções estão as emoções sociais.
"Para além das emoções básicas tais como o medo ou a zanga, a tristeza ou alegria existem emoções sociais p. ex. a simpatia e a compaixão", Damásio fala de “estimulo emocionalmente competente” (EEC)  para desencadear essas emoções.  "No caso da simpatia e compaixão o EEC é  o sofrimento do outro individuo. O sentimento que se lhe segue  é o que tem como consequência o conforto e o re-equilíbrio do outro ou do grupo. (p. 34)
Para António Damásio aquilo que chamamos comportamento ético e aquilo que  é, de facto, o foco do debate de hoje, em relação ao Bem e ao Mal, é não só o resultado da riqueza que o genoma nos dá mas sim, também, o resultado da enorme capacidade  de termos sentimentos em relação às emoções.” (p. 36)
“É esta descoberta (que é a de que  de que outro individuo pode também sofrer)  que nos leva à verdadeira empatia aquilo que nos leva a pensar não só no nosso sofrimento e na nossa própria alegria mas também no sofrimento e na alegria do outro e dos outros e, gradualmente, alargar esse reconhecimento não só ao nosso grupo estrito, o próprio e o grupo familiar mas também a um grupo muito mais alargado que no seu ideal, atinge a humanidade inteira.” (p. 37)

Então os dados da investigação chamam a atenção para a forma como encaramos alguns comportamentos anti-sociais e cruéis mas também para a melhor forma de compreendermos as nossas emoções e expressarmos sentimentos resultantes. Ou seja sobre a melhor forma de nos comportarmos e educarmos as crianças.
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* O Suplemento Especial do Boletim OA (Ordem dos Advogados), nº 29, é dedicado à conferência  "O cérebro entre o bem e o mal" (28-10-2003). Dos artigos destaco as comunicações de Hanna Damásio: “O cérebro e as alterações do comportamento social” e António Damásio: “A neurobiologia da Ética: sob o signo de Espinosa”.

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