27/01/10

A arte de viver com os outros



Na última semana fomos, finalmente, postos perante uma situação social, organizacional e política nova: a negociação.
Aquilo que parecia impensável há algum tempo, de repente torna-se realidade.A negociação pode acontecer e até pode dar resultados sem ninguém perder a face. Sem ninguém deixar de ser o que é, sem ninguém ceder no essencial do seu projecto.
Uma palavra que praticamente tinha deixado de fazer parte do dicionário, de repente voltou, independentemente de se saber se vai haver resultados. O que importa, neste momento, é que há uma metodologia diferente. O método da negociação é o caminho a seguir porque a negociação é a regra de base das relações humanas.
ei que algumas pessoas não gostam da palavra principalmente quando estão em jogo as relações familiares como por exemplo as relações entre pais e filhos.
Mas a realidade é que quando duas ou mais pessoas vivem sob o mesmo tecto entram em desacordo diariamente. O conflito faz parte da vida de todos os dias.
Por isso é necessário negociar. Mas negociar não é deixarmos de ter a nossa posição. Negociação não é cedência.
Mas fazer do outro o alvo de todos os males não parece razoável. Nem o outro é tão mau que não se possa negociar com ele nem nós temos toda a verdade de forma tão absoluta que não se possa melhorar ou corrigir a nossa posição.
Na legislatura anterior foi o que aconteceu: Alcochete jamais acabou por ser Alcochete é que é. Na arte de negociar tem que se saber dar tempo ao tempo. Não se vai negociar quando se está num estado emotivo muito forte.
Entre as opções “o inferno são os outros” ou “o inferno somos nós” podemos encontrar uma plataforma de resolução do conflito que é a arte de viver com os outros.
A negociação respeita a todas as situações da vida e também àquelas que se passam no seio da família. Entre pais e filhos, entre adultos e crianças, entre professores e alunos, os conflitos devem ser também resolvidos pela negociação. A negociação requer uma tomada de perspectiva social de interdependência autónoma dado que a total independência é tão infrutífera quanto a total dependência (Selman).
Há portanto limites para a negociação. Tudo pode ser objecto de negociação mas nem tudo é negociável. A violência doméstica, a violência sobre as crianças, a violência sobre a liberdade, não é certamente negociável.
Mas a grande maioria dos problemas são negociáveis. Se o seu filho não quer comer a sopa o que faz? Se a sua filha de 7 anos recusa comer legumes vai castigá-la para mudar o seu comportamento? e são muitas vezes estes problemas tão simples que nos aborrecem fortemente no nosso dia a dia.
Assistimos nos últimos tempos, no plano social, a uma atitude obstinada de não querer negociar nada. É estranho hoje em dia porque sabemos que a resolução dos conflitos passa pela negociação.Ainda bem que se entendeu que negociar faz parte da nossa vida.
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(Ghazal, Michel (2004), “Un art de vivre avec les autres”, in Psychologies, nº 229, Avril, pp.58-59
Rondeau, Alain (1990), «La gestion des conflits dans les organisations», in Chanlat, J.-F., L’individu dans l’organisation, Les dimensions oubliées, Éditions ESKA, pp. 507-527.
Kindler, H.(1991), A gestão construtiva dos desacordos, Monitor )

21/01/10

Quem se preocupa ?


Não resisto a colocar aqui a informação do STE sobre a alteração ao estatuto do Pessoal Dirigente da Administração Pública.
É a inacreditável gestão de recursos humanos! Como se passou na Educação, há alguém que não gosta mesmo da Função Pública.

20/01/10

As nossas crises: “o inédito viável”



A propósito da passagem dos 80 anos do nascimento de Maria de Lurdes Pintasilgo, revisito “as dimensões da mudança” de que ela tanto falava. Em texto de 1978, muito interessante e cheio de actualidade, fala-nos da crise.
As crises põem a claro as nossas vulnerabilidades ou a nossa forma de reacção aos factores de vulnerabilidade.
Como reagimos nas situações de um desastre ou a circunstâncias traumáticas de vida como, por exemplo, nos casos de perigo de vida ou doença, fome, perdas importantes, solidão, reduzida ou nula capacidade de resolução de problemas .
As reacções às crises podem ser as mais diversas. Veja-se o que acontece nas situações de tremores de terra, tsunamis ou outros desastres.
Como a M. L. Pintasilgo, certamente, as nossas crises e as crises da sociedade sempre nos apanharam de surpresa.
Como ela refere: “Crises em mim própria - quantas situações sem saída a perturbarem a linha sem labirintos que queria seguir.
Crises das pessoas - a perturbarem subitamente a confiança mútua, a abalarem as solidariedades laboriosamente criadas...
Crises das sociedades - a perturbarem a «ordem» estabelecida, a mostrarem a precariedade de todas as coisas... Subitamente, a sensação de suspensão no vazio, de interrogação inquieta. Onde vai desembocar a crise?
Será ela prenúncio de uma situação sem saída a agudizar-se cada vez mais, ou anúncio de uma nova porta que se abre? Será ela o perigo, o confronto último com a inviabilidade de qualquer solução ou a oportunidade para descobrir o «inédito viável», escondido pelas mil artimanhas da rotina instalada? …”
“Crises das relações: … Inesperada a sensação de que já não é o outro que no outro fala e age, que já não somos nós que o outro vê e acolhe, mas um outro de nós que desconhecemos. Continuam a circular palavras e até gestos. Mas as palavras passam a ser objectos em si e não meio de comunicação; fazem o seu caminho entre nós e o outro independentemente de qualquer relação, por isso são ouvidas em outro código; a emissão e a recepção deixaram de ter uma linguagem comum. E os gestos passam a não ser nada, a não conter o que pretendem significar, tornam-se desastrados, partem as pontes, desfazem os laços. Abre-se então a crise da grande solidão.”
"Fácil é reduzir as crises aos epifenómenos políticos em que se traduzem..."
acusando-se os políticos uns aos outros pela responsabilidade da crise, atirando para outros sempre o que se fez de errado e auto-vangloriando-se com a chamada obra feita.
Crise também do projecto social. A crise das instituições é crise de decisão, de organização e de pessoas.
Se as escolas, os hospitais, as empresas não funcionam onde estão as pessoas para as fazerem funcionar ?
Já percebemos que não há, hoje, projecto social. Porque ainda não compreendemos nem o porquê nem o para onde do empenhamento que nos pedem.
E como já fomos surpreendidos várias vezes… a palavra, os gestos passam a não ser nada…
Mas a reconstrução é possível e podemos tornar “o inédito viável”.

13/01/10

Reforma ? É só fazer as contas...


Há uma fase da nossa vida em que somos idosos, estamos na 3ª idade, somos séniores ou velhos, enfim, termos que vamos usando para definirmos a idade mais avançada.
Para Erikson estamos no estádio VIII que chama de adulto tardio ou da maturidade. Começa após a reforma, quando os filhos já saíram de casa e temos mais de 60 anos.
É bom chegar a esta etapa da vida, penso. Significa que se ultrapassaram muitos problemas.
A tarefa principal é, no entanto, conseguir chegar aqui com integridade do EU, com um mínimo de desespero.
Há um distanciamento social em relação ao trabalho e à família e pode-se acreditar que já não se é necessário, porque está tudo feito, e existe um sentimento de inutilidade biológica porque o corpo já não responde como antes mas também de inutilidade social.
A integridade do EU significa que somos capazes de olhar e aceitar os acontecimentos do passado e aceitar a vida tal como se viveu mesmo se tomámos algumas decisões erradas.
É a idade da sabedoria que é uma pessoa sentir-se verdadeiramente grata por viver com simplicidade, ser gentil e generosa e ser capaz de encarar a morte sem medo.
Queremos chegar a esta etapa da sabedoria mas, nestes tempos, estão a acontecer várias indicações de sinal contrário.
A preparação para a reforma praticamente não existe e além do mais é difícil, neste quadro, fazer opções racionais.
Não faz sentido que se diga “é bom ires para a reforma para dares lugar aos novos” e ao mesmo tempo se diga que é importante que os séniores continuem a ser pessoas activas, continuem a trabalhar nos sectores onde têm sabedoria para darem o seu contributo à sociedade.
Também não faz sentido que se diga: ou vais para a reforma agora ou se fores daqui a um, dois anos vais ser prejudicado no valor da reforma.
É o que se passa hoje: as pessoas têm que fazer as contas para saberem qual a melhor altura para se reformarem.
Estes sinais contrários mais uma vez não nos ajudam a definir o que queremos como sociedade. Queremos que os idosos trabalhem mais tempo, isto é, que se mantenham mais tempo como activos ou não?
Se não queremos, estamos a preparar as respostas sociais adequadas, tais como: a preparação para a reforma, os equipamentos sociais, os centros de dia, lares humanizados, cuidados de saúde, parques de manutenção de vida com qualidade, etc. como acontece em países mais evoluídos?
O que estamos a fazer para que as pessoas idosas consigam esta integridade do Eu?
Uma sociedade avançada também se caracteriza pela forma como integra e trata os idosos e não apenas por aqueles projectos que alguns políticos acham que são importantes.
Mas este não é um assunto fracturante e os senhores deputados também não têm este problema das reformas.
Os cidadãos com mais idade podem continuar a fazer as contas...

07/01/10

Líderes servidores

A “Fundação europeia para a melhoria das condições de trabalho e de vida” revelou em estudo efectuado em 2007, que Portugal se situava na cauda da Europa no que diz respeito à satisfação com a chefia.[1].
Hoje há ainda políticos, militares, executivos, catedráticos empresários, banqueiros que são (ou foram) lideres que se baseiam na arrogância, autoritarismo e individualismo que são aspectos que conduzem à insatisfação nas organizações.
Utilizam cargos, dinheiro, títulos e influência para demonstrar a sua força e ditar as regras, eliminando qualquer possibilidade de diálogo.
Estes lideres ocupam uma posição privilegiada dentro da organização e o seu poder vem muitas vezes de nomeações político-partidárias. Não é um poder que lhes vem da cidadania ou da sua competência técnica e profissional.
Mas há outra forma de liderança: a liderança servidora é justamente o oposto desta liderança arrogante.
Mas o que é a liderança servidora ?
O termo foi introduzido, em 1970, por Robert K. Greenleaf no ensaio The Servant as Leader (“O servidor como líder”).
Não é, portanto, um conceito novo.
Na liderança servidora não existe o culto da personalidade, o salvador da pátria, mas gente comum, com um forte desejo de servir os seus concidadãos.
Liderar não é ser 'chefe'. Liderar é servir. E ao contrário do que se possa pensar, as lideranças servidoras não são lideranças fracas nem frágeis.
O que é que as pessoas esperam e admiram nos seus líderes ?
Que sejam honestos, competentes, inspiradores e visionários (inquérito efectuado a 75.000 pessoas, J. Kouzes e B. Posner, citado por Roberto Carneiro. Ver aqui o PowerPoint Liderança e gestão na direcção das escolas)
A nossa organização sócio-política ou a nível da liderança das empresas e das chefias intermédias não necessitará de lideres servidores ?
Provavelmente se tivéssemos lideres servidores a actual crise nunca teria existido e teríamos poupado grande sofrimento às pessoas que entretanto ficaram no desemprego e entraram no campo da pobreza e do desespero.
O que é interessante é podermos verificar que de vez em quando surgem lideres que provam que essas características são as realmente importantes para a liderança.
Afinal havia uma ministra da saúde que tem mostrado que se pode ter uma liderança diferente do ministro anterior. O mesmo, espero, se está a passar no sector de educação. Há agora uma ministra que sorri, que dialoga, que acredita nas pessoas. Felizmente para os alunos e professores.. E estas qualidades não pesam um cêntimo no orçamento.

Segundo Greenleaf, o líder servidor deve ter em conta 10 princípios: [2]
1. Escuta - Os lideres são valorizados pela sua capacidade comunicacional. O Líder Servidor escuta intensamente o outro… e esforça-se continuamente por ouvir a sua voz interior: o que o seu corpo, a sua mente a sua consciência lhe dizem.
2. Empatia - Procura sempre aceitar o que há de específico único na outra pessoa, colocar-se no lugar do outro para ver a realidade de outro modo.
3. Cura - O poder da cura é uma força enorme de transformação e integração. O Líder Servidor tem o grande potencial de curar-se a si e ao outro, na permanência , na procura da integridade e do todo
4. Consciência do outro - O líder servidor não teme os desafios, o desassossego da busca interior que leva à auto consciência das fraquezas e fragilidades pessoais. A consciência da sua pequenez fá-lo mais atento ao outro.
5. Persuasão - Persuasão e inspiração mais do que exercício de autoridade é a forma como o Líder Servidor convence os outros
6. Conceptualização - O Líder Servidor desenvolve a capacidade de “sonhar grandes sonhos” de olhar para o problema de forma a transcender a sua realidade limitativa.
7. Antecipação - O Líder Servidor compreende as lições do passado as realidades do presente para pensar a construção do futuro. O Líder Servidor cultiva sem descanso a mente intuitiva.
8. Direcção e orientação - Uma boa orientação a todos mobiliza: líder, liderados, directores e colaboradores, para a realização do bem da sociedade.
9. Compromisso - com o crescimento das pessoas que estão à sua volta; dimensão pessoal, profissional, espiritual.
10.Comunidade - Sem integração na comunidade o indivíduo está perdido O Líder Servidor é um empreendedor social. Um produtor de capital social em todas as instâncias em que está empenhado.


[1] Patrícia Jardim da Palma, "Liderança servidora", Sol , 18.12.2009

[2] Com base no PowerPoint referido.

  
                   

31/12/09

Paz: a obediência voluntária

Desde 1968 que se celebra o dia mundial da paz no dia 1 de Janeiro. Celebramos geralmente o que não temos. Mas temos boas intenções. E é necessário “dar uma hipótese à paz”.
Continuamos a celebrar a paz porque, no tempo presente, há muita gente interessada na guerra.
Os acontecimentos belicistas e anti-democráticos em todo o mundo, mostram aquilo que se repete permanentemente.
A manutenção no poder dos regimes, sejam eles quais forem, de esquerda, de direita, religiosos ou ateus, parece repetir-se utilizando sempre a mesma forma de se fazer obedecer: a força.
Da antiguidade, um bom exemplo vem da Pérsia, actual Irão. O que aprendemos depois de Ciro ? O que há de novo que não esteja já na educação de Ciro ? [1]
Xenofonte, escreve o seguinte diálogo entre Ciro e Cambises, pai de Ciro e rei da Pérsia, sobre a obediência voluntária e sobre a obediência forçada.
“— Não há dúvida, o meio de fazer aceitar essa doutrina (da obediência) é honrar e fazer honrar o homem dócil e castigar rigorosamente o rebelde.
— A obediência à força pode obter-se por esses meios, meu filho. Mas o que se pretende é a obediência voluntária. De modo geral, os homens obedecem sempre de boa vontade àqueles que de qualquer modo se mostram prontos a atender aos seus interesses, conhecendo as suas necessidades bem ou ainda melhor que eles próprios…
…se os homens chegam a desconfiar que da obediência lhes vem macaca, não há castigos nem promessas que os tragam ao relho. Ninguém se deixa tentar por uma receita que se sabe ser funesta ou falaciosa”. (pag. 99).
Sempre foi assim: o poder instalado, pensa que é através da obediência forçada que consegue povos submissos.
Se no tempo de Ciro isso não acontecia, muito menos agora. Proíbem a net, há telemóveis, proíbem os telemóveis há sempre um filme, uma fotografia, uma testemunha, alguém que escapa… há sempre alguém que diz não ao poder da força.
Vivemos no tempo das mil e uma guerras.
Mas tal como na história das mil e uma noites, a história é interminável talvez porque assim nos parece que podemos sobreviver.
E nós havemos de contar a história, mesmo que seja apenas uma forma dilatória, como para Xerazade, porque enquanto há vida há esperança de que os humanos percebam que devem dar uma hipótese à paz.
Talvez que por força de se contar a história, como nas mil e uma noites, o rei tirano desista de atormentar o povo.
Mas atenção! O rei tirano pode estar escondido dentro de cada um de nós. E é por nós que a pacificação deve começar.
Um bom ano, com muita paz!

[1] Tradução de Aquilino Ribeiro, (1952), O Príncipe Perfeito, de Xenofonte, Lisboa: Livraria Bertrand, que tem um interessante prefácio ,“ao pio leitor”, sobre a educação.



24/12/09

«Porque é que que as pessoas gostam (ou não) da história do Menino Jesus»


O Natal remete-nos para a infância e para as memórias da infância.
Faz parte do nosso inconsciente colectivo vivido principalmente no seio da família ou das pessoas mais próximas da nossa família
Contra uma ideia que corre de que as pessoas são consumistas e, normalmente, quando fazemos esta afirmação ela é também uma atribuição porque consumistas são os outros, eu defendo que no Natal faz sentido que se consuma mais do que é habitual, obviamente dentro das possibilidades de cada um.
A essência do Natal passa pelos seus símbolos e o Natal está carregado de simbologia.
O símbolo é um processo mental que representa uma realidade externa por uma imagem.
O Natal é representado por vários símbolos, de que destaco, neste contexto de festa e felicidade: os presentes, a árvore de Natal e a culinária.
Não é possível pensar o Pai Natal ou o Menino Jesus sem pensar nos presentes.
E esta é a única maneira de compreender a situação de festa para as crianças.
Um presente é uma recompensa pelo bom comportamento da criança. Mas ela sabe que o Pai Natal não espera qualquer sentimento de gratidão ao contrário do que acontece com as outras pessoas.
Na árvore de Natal, é também o maravilhoso que está presente. A criança sabe que se trata de uma árvore real mas nenhuma árvore é semelhante àquela. A árvore que vê todos os dias no jardim de repente transforma-se numa árvore vinda do país das maravilhas.
A culinária: O jantar, a ceia de Natal, tem uma dupla componente de abundância e de comida e de reunião familiar em espírito de alegria e felicidade.
Sabemos que o medo das privações físicas e emocionais é algo que de forma inconsciente, corresponde às maiores ansiedades do homem.
A fome é a forma básica do abandono físico e a morte, e também, do abandono emocional.
A criança pequena não compreende a morte e não tem medo da sua morte, mas tem medo da morte dos pais, porque isso corresponde a um abandono permanente.
Um mesa farta combate a ansiedade da criança, tranquiliza-a, porque para além dos pais há muitos outros parentes que o podem cuidar.
O Natal é, assim, o tempo de recordações de felicidade.
João dos Santos fala-nos da recordação encobridora: “Um acontecimento cristalizado num bonito quadro. A árvore de Natal é prenhe de frutos radiosos, apetecíveis e em geral intocáveis, porque apenas celebram um nascimento e anunciam os presentes”
A ideia de recordação encobridora remonta às memórias esquecidas, que se originaram com o objectivo de deslocar ou substituir uma lembrança dolorosa por outra mais tolerável e feliz.
É esse o quadro captado pelos poetas, cheio de nostalgia de uma infância feliz ou talvez não, como nos relata Fernando Pessoa.


Natal

Natal…na província neva
Nos lares aconchegados,
Um sentimento conserva
Os sentimentos passados

Coração oposto ao mundo,
Como a família é verdade!
Meu pensamento é profundo,
Estou só e sonho saudade

E como é branca de graça
A paisagem que não sei,
Vista de trás da vidraça
Do lar que nunca terei !

Fernando Pessoa (Cancioneiro)


_____________________________
(Bettelheim, B. (1994), Bons Pais - o sucesso na educação dos filhos, 2ª Ed. Venda Nova: Bertrand Editora ; Piaget, J. (1975), A formação do símbolo na criança, 2ª Ed, Rio de Janeiro: Zahar Editores; Santos, J. «Porque é que as pessoas gostam (ou não) da história do Menino Jesus», Jornal da Educação).

16/12/09

O Zé perpétuo


A lei nº 46/2005, limitou os mandatos dos autarcas a três mandatos .
O diploma foi apresentado pelo PS e foi aprovado por uma maioria de dois terços, em Julho de 2005 pelo Parlamento. O PCP foi o único partido que votou contra, O CDS/PP e o Partido Ecologista «Os Verdes» abstiveram-se.
O presidente da República de então, Jorge Sampaio, promulgou a lei em Agosto de 2005, tendo a mesma entrado em vigor a 1 de Janeiro de 2006.
As consequências práticas vão ter efeito nas eleições autárquicas de 2013, isto é, os presidentes de Câmara Municipal e da Junta de Freguesia só podem ser eleitos para três mandatos consecutivos, «salvo se no momento da entrada em vigor da presente lei tiverem cumprido ou estiverem a cumprir, pelo menos, o terceiro mandato consecutivo», pelo que poderão ser eleitos para mais um mandato.
Foi o que aconteceu nas eleições deste ano.
Na prática significa que são 12 anos de permanência no poder autárquico, em 2013, com a excepção referida.
Poderíamos pensar e esperar que a transição se faria com alguma turbulência mesmo que com a indicação dos delfins para preencherem os lugares.
Para alguns politólogos os aparelhos políticos irão «antecipar» a saída de cena de diversos candidatos autárquicas nas eleições de 2013. «O poder a nível autárquico aponta muitas vezes para mecanismos de sucessão dos presidentes, e as forças políticas procurarão encontrar novos candidatos próximos daqueles que sairão do poder».[1]
Por outro lado, o sistema político português está «muito envelhecido», motivo pelo qual diversos presidentes da Câmara, «verdadeiros caciques locais», contestam a aplicação do diploma que restringe o número de mandatos. [2]
O jornal “Sol” desta semana traz uma notícia que, a concretizar-se, mostra bem o país que alguns querem: os autarcas movimentam-se contra a limitação dos mandatos, insurgindo-se contra a lei e propondo um referendo.
Eu já desconfiava e comentava com os amigos: vais ver se não alteram a lei antes das eleições de 2013...
Bem dito, bem feito… Aí estão eles a caminho da manutenção no poder para sempre. Para sempre ou até caírem da tripeça.
Na cidade onde estudava, antes do 25 de Abril, no tempo do fascismo, ou da outra senhora, o sr. presidente da câmara era conhecido pelo "Zé perpétuo".
Mas isso era antes do 25 de Abril.
Agora, que vivemos em democracia, estamos cansados de ouvir dizer que já não há empregos para sempre. Isto é verdade para qualquer mortal, excepto para os autarcas, a confirmar-se que conseguem alterar a lei, que esses, sim, vão ter emprego para sempre.

[1] António Costa Pinto(Lusa/Sol)[2] José Adelino Maltez (Lusa/Sol)

11/12/09

NEE - 1,8%

(L. Capucha - Encontro temático Educação Especial - Escola Inclusiva e Educação Especial, DGIDC - 7 /Junho/2008)

Luís de Miranda Correia (Revista "2 Pontos", n.º 10, Outubro 2009, p. 41 - ver Incluso) refere os erros do anterior ME no que diz respeito à Educação Especial.
1º erro: O ME afirma que o número de alunos com NEE é de 1,8% da população estundantil total. Por pura ignorância ou, quem sabe, por razões economicistas, desconsiderou a maioria desses alunos. Este é um facto irrefutável, embora só se possa comprovar quando o ME resolver fazer estudos de prevalência fidedignos ou os encomende às universidades.

Já fizemos várias referências a esse aspecto. Vejamos como o ME respondia (Ver http://www.min-edu.pt/outerFrame.jsp?link=http%3A//www.dgidc.min-edu.pt/)

Questão 15
Para que fins deve ser tida em conta a taxa 1,8% de prevalência das necessidades educativas especiais de carácter permanente?
Resposta 15
O valor de 1,8% para a taxa de prevalência não resulta de uma verificação empírica, mas de uma projecção de variáveis destinada a construir uma referência cientificamente sustentada da proporção esperada de alunos, relativamente à população escolar na faixa etária que abrange o pré-escolar e os ensinos básico e secundário, que apresenta necessidades educativas especiais de carácter permanente requerendo, por isso, apoios especializados previstos no DL 3/2008.
O valor 1,8% a utilizar para efeitos de organização do sistema não se refere à incidência do fenómeno. Neste sentido, a utilização deste valor de referência verifica-se em “situações tipo”, e não em situações de concentração de alunos, como acontece nos casos de escolas de referência ou com unidades especializadas. Por outro lado, não é a taxa em si mesma, mas a adopção dos procedimentos de diagnóstico que estão disponíveis, que realmente importa. Por outras palavras, não se pretende usar aquele valor como nenhuma espécie de “tecto”, sendo dever do sistema olhar os alunos caso a caso. O valor de referência apenas deverá permitir análises mais finas quando as prevalências se afastem desse valor.
A elegibilidade para medidas de educação especial pressupõe, sempre, um processo de índole pedagógica e não estatística, assente numa avaliação rigorosa do perfil de funcionalidade do aluno que permita identificar as respostas educativas que melhor se adequam às necessidades educativas especiais evidenciadas.

Afinal, o processo é de índole pedagógica ou estatística ?




09/12/09

Verdade

Aquecimento global ? Hoje ouvi outra versão na RTP, finalmente. Não sei se foi a primeira vez que isso aconteceu. Mas cada dia se torna mais audível o silêncio de outras opiniões.
Ver, p.ex. , aqui, aqui ou aqui.
A opinião plural também dá um bom ambiente.