01/05/20

Para ouvir... em tempos de covid-19

Jacques Brel - Lers vieux
Os velhos

Os velhos já não falam ou então somente por vezes pelo canto dos olhos
Mesmo ricos eles são pobres, já não têm ilusões e não têm senão um coração por dois
Com eles cheira a tomilho, a limpeza, a lavanda e ao verbo do passado
Mesmo vivendo em Paris, todos vivemos na província quando vivemos muito tempo
É de ter rido muito que a sua voz se quebra quando falam sobre ontem
E de ter chorado muito que as lágrimas ainda escorrem nas suas pálpebras
E se eles tremem um pouco é de ver envelhecer o pêndulo de prata
Que ronrona na sala, que diz sim que diz não, que diz: Eu espero-vos

Os velhos ja não sonham, os seus livros estão adormecendo, os seus pianos estão fechados
O gatinho está morto, o moscatel de domingo já não os faz cantar
Os velhos já não mexem os seus gestos têm muitas rugas, o seu mundo é muito pequeno
Da cama para a janela, depois da cama para o sofá e depois da cama para a cama
E se eles ainda saem de braços dados, todos vestidos de forma rígida
É para seguir ao sol o enterro de um mais velho, o enterro de uma mais horrível
E o tempo de um soluço, esqueçer por uma hora o pêndulo de prata
Que ronrona na sala, que diz sim, que diz não e depois que os espera

Os velhos não morrem, adormecem um dia e dormem muito tempo
Eles dão as mãos, têm medo de se perder e, no entanto, perdem-se
E o outro fica lá, o melhor ou o pior, o gentil ou o severo
Não importa, aquele que dos dois fica, reencontram-se no inferno
Pode vê-lo talvez, vê-lo-eis, às vezes à chuva e com tristeza
Atravessar o presente enquanto já pede desculpas por não estar mais longe
E fugir diante de ti uma última vez o pêndulo de prata
Que ronrona na sala, que diz sim que diz não, que lhes diz: estou à tua espera
Que ronrona na sala, que diz sim, que diz não e depois que nos espera

(Tradução: CT)







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