09/12/15

Sobriedade

Há várias sugestões na comunicação social, nos livros de auto-ajuda… para se conseguir a felicidade e o bem estar. Porém, a nossa vida é baseada em características morais que lhe dão sentido, valores universais que não cabem em receitas apressadas.

Seligman* estudou os princípios que são comuns em todo o mundo (ubíquos), e resumiu-os em seis virtudes e vinte e quatro forças.
A temperança, também traduzida por moderação, é uma dessas virtudes. E dela fazem parte as forças de autocontrolo, prudência, discrição e cautela, humildade e modéstia.
A temperança é a virtude que protege dos excessos, refere-se à expressão apropriada e moderada dos apetites e vontades. Uma pessoa temperada não suprime as suas vontades, mas espera por oportunidades para as satisfazer de modo que não recaia qualquer mal sobre ela ou sobre os outros.(Seligman)
O autocontrolo permite controlar os nossos desejos, necessidades e impulsos quando é apropriado que o façamos. Não é suficiente saber o que está correcto mas também colocar esse conhecimento em acção. Sabemos, por ex, da importância de fazer dieta para o nosso bem estar, no entanto, temos muitas dificuldades em manter essa dieta. 
Outra força de carácter é a humildade e modéstia. As pessoas humildes e modestas não procuram ser o centro das atenções, reconhecem erros e imperfeições. têm um estilo de comportamento discreto e humildade para não se sentirem o centro do universo. 
A terceira força é a prudência, discrição e cautela, isto é, devemos dizer ou fazer aquilo de que não nos possamos vir a arrepender mais tarde. A pessoa prudente vê mais longe e resiste mais aos objectivos de curto prazo.
A primeira vítima da falta de temperança é a própria liberdade. (Sêneca)Portanto, temperança é sinónimo de moderação e sobriedade, de discrição no comportamento, de discrição na forma de demonstrar os sentimentos, de equilíbrio.

Os comportamentos dos governantes e os nossos próprios comportamentos sociais e políticos têm vindo a ignorar estas forças de carácter.
A chamada esquerda não quer ouvir falar de temperança, de sobriedade e, de todo, de austeridade. Toma a austeridade como sendo a origem de todos os problemas da sociedade.
Ninguém, dentro do seu juízo, deseja a austeridade pela austeridade. Mas ela faz sentido quando é uma forma de sobriedade e de modéstia. 
A austeridade é uma forma de moderar consumos supérfluos, imprudentes, ostentatórios e anti-ecológicos que põem em risco o futuro pessoal, familiar e colectivo.
Vivemos num tempo em que o crescimento deve ser enquadrado num contexto ecológico e isso diz respeito a todas as políticas da dita esquerda e da dita direita.

Foi isso que o ex-presidente do Uruguai, José Mujica **, da dita esquerda, percebeu quando decidiu viver de forma modesta e sóbria. Vem, aliás, defendendo a sobriedade para a sociedade, isto é, aprender a viver com o que é necessário, o que é justo, sem supérfluo, para salvaguardar um futuro sustentável.
Para quem não quer ouvir falar de austeridade e para os simpáticos crescimentistas da (dita) esquerda instalada em Atenas ou em Lisboa, talvez, a palavra sobriedade possa ser aceitável. A realidade não tem estes problemas semânticos.

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* Martin Seligman, Felicidade autêntica, os princípios da psicologia positiva, Pergaminho; A vida que floresce, estrelapolar.
** "José Mujica, foi presidente do Uruguai de 2010 a 2015. Ex-guerrilheiro dos Tupamaros, entre os anos 60-70, foi preso como refém pela ditadura entre 1973 e 1985. Ele prega uma filosofia de vida em torno da sobriedade: aprender a viver com o que é necessário e o que é justo".
Embora longe da sua visão e prática social e política, não deixo de ver uma curiosa maneira de nos contar a sua experiência de vida que o fez compreender que algo tem que mudar nos tempos que correm. Não deixa de ser interessante falar em sobriedade, contra os "simpáticos crescimentistas" das várias políticas (ditas) de esquerda .
Mujica não fala de austeridade mas percebeu muito bem como não se fazem omeletes: não é certamente com mais e mais crescimento de todos os países que querem crescer e vender...

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