21/03/12

Pais suficientemente bons *

                          
Passou esta semana mais um dia do pai. Felizmente, ainda há quem comemore o dia do pai, embora o importante aqui é o pai e não a comemoração do dia. Quanto ao dia do pai não ignoro as complicações que isso costuma gerar na escola e na turma para alguns alunos e professores. De facto, se é verdade que todos têm um pai e uma mãe, isso, às vezes, não é verdade do ponto de vista formal, digamos assim. Além disso, os pais muitas vezes estão ausentes geograficamente e frequentemente estão ausentes afectivamente. Muitas situações destas não são evitáveis, no mundo em que vivemos. Continua a ser um mundo de violência em que as perdas devido a guerras, a acidentes de viação e de trabalho, de emigração ou, simplesmente, da vida moderna e de estilos de vida que as pessoas escolhem, fazem com que muitas crianças não tenham pai.
Por estranho que pareça e que pensávamos ter acabado depois do 25 de Abril, ainda temos filhos de pai incógnito. Será que um filho não tem o direito de saber quem é o pai ? Já não digo conviver com o pai. A Convenção dos direitos da criança diz que a criança tem direito a conhecer os seus pais.
Mas parece que há pessoas que podem desrespeitar este artigo da Convenção.
E se um filho quiser conhecer quem é o seu pai, o que vai fazer o estado, a justiça ? Esta será uma situação cada vez mais questionada no futuro.
Certamente que a escola pode sempre ser sensível as estas situações. E deverá lidar com elas com muito bom senso porque há crianças para quem há lutos a fazer, e sofrimentos pelas perdas reais e simbólicas que acontecem nas suas vidas.
Também me parece muito exagerada a atitude de querer tirar o pai da família.
Tanto quando se sabe, o pai é muito importante para o desenvolvimento de uma criança.
A palavra bebé estava ligada à mãe mas compreendeu-se (estudos a partir de 1976) que havia interacções muito importantes entre o pai e o bebé. Os pais descrevem mesmo o nascimento do filho como um acontecimento extraordinário e maravilhoso…
O pai pode juntamente com a mãe prestar cuidados maternais ao bebé.
Alguns jogos são tipicamente do pai com a criança, principalmente os jogos corpo a corpo, como atirar o bebé ao ar.
O pai é mais activo, mais brusco, mais audacioso, favorece a independência e a autonomia…
Por volta do sexto mês a mãe introduz este estranho na relação com o bebé. O pai passa assim a fazer parte da interacção como um rosto familiar.
Por isso uma ausência real pode ser uma presença simbólica: O pai pode estar presente, o pai da fotografia que a mãe mostra ao filho, os objectos que lhe dão significado e as palavras que o descrevem.
A patologia surge quando há uma ausência de ausência. A negação deste ser que é o pai.
O pai marinheiro ou o pai emigrante é um ausente falado: o papá não está, o papá vai chegar, o papá vem de férias… é um pai significado através de objectos que lhe pertencem, a fotografia, a roupa, etc.
Por isso, temos saudades. O que nos faz ter saudades? A ausência que, como diz o povo, tem uma filha que se chama saudade. Só pode ter saudade quem tem uma boa relação com o companheiro que o significa junto da criança.
Por isso, saudade é uma palavra tão presente na poesia de amor e na música popular. Saudade é um sentimento de perda, de ausência mas também de amor.
Por isso, temos saudades da mãe mas também do pai.
Um abraço a todos os pais.

* Expressão de Winnicot, no livro em epígrafe, "razoavelmente", que em  B. Betelheim, Bons Pais, é "suficientemente".

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