18/08/10

Para além da CIF

Algumas reflexões breves sobre o assunto:

1. “Diagnosis remains static”. Será ? Um dos erros de que enferma a metodologia de utilização da CIF é esta perspectiva que R. Simeonsson tem sobre o diagnóstico.
A CIF seria mais dinâmica uma vez que caracteriza a situação da pessoa não só relativamente às funções do corpo mas também em relação ao ambiente.
Desde os anos 70 que aprendi coisa diferente em psicopedagogia especial e em avaliação e diagnóstico psicológico, com Bairrão Ruivo. Falava ele, e nós a partir dos seus ensinamentos, em diagnóstico psicológico progressivo, em que eram tidas em conta não apenas a avaliação psicológica mas todos os outros aspectos médicos, pedagógicos, mesológicos, etc.
Aliás, subjacente a qualquer avaliação diagnóstica está uma perspectiva desenvolvimentista, o que significa mudança sistemática no diagnóstico dado o processo de desenvolvimento da criança. Diagnóstico estático nega o desenvolvimento. Diagnóstico é sistémico no espaço e no tempo (Bronfenbrenner) e por isso não pode ser estático.
Por isso, não se compreende como se é peremptório na afirmação de que o diagnóstico é estático.
A própria CIF deve estar em actualização permanente (como acontece, aliás, com outros instrumentos de classificação, como o DSM) e não dispensa nem funciona sem os diversos diagnósticos: psicológico, médico, pedagógico, social…
Optar pela CIF porque supostamente é dinâmica e o diagnóstico é estático é viciar toda a análise.

2. A “avaliação externa”, como qualquer avaliação deveria ser autónoma e independente. Não haverá vício pelo próprio facto do criador da CIF ser também seu avaliador ?
O voluntarismo tendo como ponto de partida a bondade do instrumento não é suficiente para que a avaliação externa não navegue nas águas instáveis da subjectividade.
Como disse David Rodrigues na sessão reconhece-se o esforço que os avaliadores devem ter feito para serem objectivos mas, provavelmente, isso será sempre insuficiente, dado que o vício é de base.

Esta avaliação nunca poderia chegar à conclusão a que chegou L. M. Correia sobre a CIF:
E: No estudo "A Utilidade da CIF em Educação" concluiu precisamente sobre a inutilidade deste instrumento. Como chegou a essa conclusão?
LMC: Considerei uma amostra composta por sete grupos de participantes que se estendia por sete agrupamentos, sendo cada grupo constituído por um professor do ensino regular, um professor de educação especial especializado e um psicólogo. Pedi aos 21 participantes que respondessem a um questionário sobre a utilização da Classificação Internacional de Funcionalidade (CIF) em educação e aos sete grupos de participantes que analisassem um estudo de caso (o mesmo que o Ministério da Educação usou na formação que fez sobre a CIF), tendo por base, ipsis-verbis, as instruções e recomendações formuladas nos documentos emanados do ministério.
No que respeita aos resultados, as respostas dos participantes ao questionário foram totalmente contraditórias, revelando uma profunda falta de conhecimento sobre a utilidade da CIF em educação. Quanto ao tratamento do caso propriamente dito, tendo em conta a necessidade do uso da Checklist contida no manual Educação Especial: Manual de Apoio à Prática, os resultados foram os mais díspares, consubstanciando uma heterogeneidade de posições que aparentam um comportamento aleatório quanto à escolha das opções.

3. Verdadeiramente, não há CIF para Crianças e Jovens. E isso é um problema importante. A CIF (funções do corpo) que está traduzida em português é a dos adultos e outra não existe. Mas isto pelos vistos não constitui qualquer problema para os “convertidos” da CIF.
Parece que vai sair uma versão final. Esperemos que completa.

4. O mundo da educação especial já existia antes do DL 3/2008. Parece que a educação especial se iniciou em Janeiro de 2008 e um manto de silêncio caiu sobre o que se fez até então, principalmente a partir do 319.

5. Sobre as Equipas multidisciplinares não vale a pena tapar o sol com a peneira. Se há alguns casos em que existem e funcionam, a realidade afasta a ficção na maior parte dos agrupamentos.
As equipas que existem são, quase sempre, constituídas pelos técnicos e docentes do agrupamento e o roteiro de avaliação, CIF e PEI resultantes do seu trabalho. Obviamente que utilizam os elementos de avaliação internos ou externos que existem.

6. Que implicações podem ter os relatórios externos ? Imaginemos a situação em que os médicos ou psicólogos dizem que a criança deve ter EE ou se deve sentar na fila da frente, ou deve ficar perto do professor…
Ignoram quantos alunos já se sentam na fila da frente, quantos alunos com NEE já existem naquela turma e os pareceres, contraditórios ou não, que há sobre o mesmo aluno.
Se juntarmos casos de hiperactividade, problemas sensoriais visuais ou auditivos para serem mais facilmente controláveis, verem melhor ou ouvirem melhor… toda a turma fica na fila da frente !
E quando há relatórios psicológicos, ou outros, contraditórios ? E quando a turma tem mais de 20 alunos ?    

7. Ao definir-se, previamente, uma taxa de 1,8% para os alunos com NEE, a CIF pode ter utilidade? O mesmo acontece em relação ao número de alunos por turma. Os resultados da CIF podem alterar o ratio previsto? Em abono da verdade este problema não tem a ver apenas com a CIF mas com os resultados de qualquer outro instrumento de trabalho.

8. Já aqui referi as vantagens da CIF. Elas são reais. Mas há mais educação ou educação especial para além dela. É da prática e da reflexão sobre a prática que pode resultar a inclusão. A CIF pode ajudar.

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