26/01/20

Psicologia da corrupção







Todos sabem o que é a corrupção. Todos, de alguma forma, sofrem as consequências que dela resulta. Quase não há dia nenhum em que não somos surpreendidos com mais um caso de corrupção. É, portanto, um tema que, infelizmente, pelos piores motivos, está na moda.
A corrupção tornou-se um fenómeno global que atinge todos os países. Mesmo aqueles em que por falta de liberdade de expressão e de transparência não são notícia nos media.
A corrupção atinge os sistemas políticos e as democracias como Portugal, e é causador de grandes prejuízos na economia dos países, na sua reputação externa e no descrédito dos cidadãos no estado e nos políticos.
A corrupção "compreende uma variedade de comportamentos que têm como princípio a apropriação indevida de uma autoridade pública para fins privados, causando prejuízos materiais e morais a uma sociedade por operar contra a lei ." *
"Este comportamento é bastante complexo e possui múltiplas causas, e é necessário que se compreenda os mecanismos inerentes ao mesmo para elaborar estratégias mais eficientes para combatê-lo"*.
Além disso, atinge também todos os sectores da vida, vai desde as golas antifumo, como no caso dos incêndios, até às falências de bancos ou à insolvência dos países.
Ela afecta todos os níveis em que nos movemos, enquanto indivíduos, na sociedade e na cultura.
Os comportamentos de corrupção têm vindo a interessar, cada vez mais, os estudos psicológicos.
Nesse sentido, os modelos da psicologia cognitiva, comportamental e analítica podem ser de grande utilidade para compreender os comportamentos e a personalidade do corrupto e da corrupção na sociedade.

Hoje vamos falar da perspectiva da Psicologia cognitiva em relação à corrupção.
A psicologia cognitiva (Piaget e Kohlberg) define vários estádios de desenvolvimento moral: inicialmente temos uma moral heterónoma que se vai desenvolvendo até uma moral autónoma. Este processo de desenvolvimento cognitivo e moral acontece na maioria das pessoas.
Para Kohlberg há 3 níveis de desenvolvimento moral: Pré-convencional, convencional e pós-convencional, cada nível com dois estádios.
Digamos que alguns destes corruptos se situam entre o estádio do auto-interesse (ou "hedonismo instrumental") ou de “o que eu ganho com isso?”, do nível 1, e o estádio do acordo interpessoal e conformidade, do nível 2.
A psicologia cognitiva apresenta alguns mecanismos que conduzem a esta alteração no desenvolvimento do juízo moral *:
- o “desengajamento moral” (moral disengajement) que leva o indivíduo a reinterpretar os seus conceitos morais de forma a poder modificar ou bloquear o seu julgamento moral. Estes indivíduos corruptos podem cometer actos desumanos, sem sofrer grande stress ou culpa. Estes actos não lhes tiram o sono, como costumamos dizer.
O "desengajamento moral" ocorre por meio de subprocessos cognitivos como: Simplificar um dilema por meio de racionalizações e eufemismos (deturpação cognitiva); minimizar o próprio papel na conduta ilícita ou admitir que a mesma é inevitável, deslocando a responsabilidade para as circunstâncias; reduzir a dissonância cognitiva desumanizando as vítimas ou culpando as mesmas pela ocorrência do acto corrupto.
- O processo de decisão pode levar um indivíduo a pensar em termos de custos-benefícios resultantes do seu comportamento.
Neste caso, a tomada decisão pelo comportamento de corrupção ocorre com maior frequência em indivíduos que sentem mais emoções positivas advindas da antecipação de cenários favoráveis, como os lucros financeiros resultantes da acção criminosa.
- Ter poder pode levar a modificações cognitivas acerca do julgamento moral de um indivíduo, permitindo que o mesmo tenha uma maior inclinação para cometer actos ilícitos.
O poder e o sentimento de superioridade podem evidenciar e exagerar traços comportamentais narcisistas. Como tal acredita que merece algum tipo de tratamento especial e que não precisa respeitar certas regras… *

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Baseado e condensado de Henrique Britto de Melo, "Psicologia da corrupção: uma abordagem cognitiva".




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