01/07/19

"Mitos climáticos" 9

Com a devida vénia ao Alberto Gonçalves, As crianças que lutam por um mundo pior

"Acima de tudo, ou exactamente abaixo, há a segunda “greve climática estudantil”. Não sei se a adesão foi maior ou menor do que a primeira, realizada em Março. Sei que desta vez as nossas crianças (salvo seja) não precisaram de seguir uma modelo sueca (salvo seja), a divertida “activista” Greta. Em dois meses, o empreendedorismo pátrio conseguiu produzir “activistas” próprios, e logo em dose dupla: Alice Gato e Gil Ubaldo. A menina Alice e o menino Gil concederam uma entrevista à Renascença e ao Público, e a entrevista é um primor.

Para começar, uma das jornalistas parece falar com a menina Alice e com o menino Gil como se falasse com a pequenita Maria Armanda à época em que “Eu Vi Um Sapo” venceu o Sequim D’Ouro. Para continuar, a menina Alice e o menino Gil falam com as jornalistas como se fossem a pequenita Maria Armanda – mas sob os efeitos de uma educação deficitária em juízo e pródiga em clichés.

Exemplos? Vamos a eles: “O 15 de Março foi o início de uma luta e o 24 de Maio é para demonstrar que não nos vamos embora até essa luta ter alguma resposta”; “Para sermos rebeldes e agirmos contra o sistema, temos de começar na juventude. Temos reivindicações sérias e vamos sair à rua para mostrar isso até ao fim”; “Nós até temos crianças da primária a irem às nossas manifestações. E há um grande envolvimento dos professores e dos pais”; “Sim, é verdade, nós faltamos às aulas. A greve estimula muita gente a ter uma acção diária. Faltar às aulas é o menor do nosso problema. Não vale a pena estarmos a ir a uma aula, quando o nosso sistema de ensino não nos incentiva a agir por aquilo que nós acreditamos”; “É como a Greta diz: Nós não conseguimos mudar o clima sem mudar o sistema”; “A nossa luta é transversal e, enquanto lutamos pelo clima, não podemos deixar para trás a luta laboral. Além disso, reivindicamos o melhoramento eficaz da rede de transportes públicos, de modo a reduzir o uso do transporte particular”. E a minha atoarda favorita, a propósito dos objectivos do “movimento”: “Termos 100% de energias renováveis até 2030 e a proibição da exploração de energias fósseis em Portugal”.

Só não é impossível compilar resma comparável de ignorância, criancice, ócio mental e sintomas da desgraça em que estão o ensino e a paternidade actuais na medida em que existe o esquerda.net. Suponho, aliás, que, para a menina Alice e o menino Gil, o site constitua leitura de referência e referência profissional: não faltam carreiras disponíveis para quem, munido de uma “visão” para o “futuro” e fé cega, decide enveredar pelo encantador caminho das “causas”.
Se eu soubesse, teria aproveitado a oportunidade. Na idade da menina Alice e do menino Gil, fiz diversas greves à escola a pretexto do clima: mal o sol aquecia, trocava as aulas pela praia. Faltou-me ser entrevistado pelos “media”. E faltaram-me as “redes sociais” para divulgar o que talvez passasse por uma “ideia”. E faltaram-me os telemóveis e os computadores para multiplicar os parceiros de “luta”. E faltaram-me a lembrança e a lata de transformar a preguiça num modo de vida. E faltaram-me familiares que acolhessem as gazetas, perdão, as greves com orgulho e não com uma sova. Hoje, falta-me a paciência para explicar à menina Alice e ao menino Gil que o “sistema” que “combatem” é justamente aquele que lhes tolera, aceita e, nos momentos de masoquismo, aplaude esse “combate”. Se calhar eles já sabem."

Sem comentários:

Enviar um comentário