17/09/14

Regresso à escola: a comunicação na educação

Inês, 7 anos

Todos os anos por esta altura, a escola parece que se reduz aos problemas corporativos. Este reducionismo mostra-nos uma escola dependente da má vontade e incompetência do ministro e da boa vontade e competência de alguns sindicatos. 
De facto entre ministério e organizações sindicais aposta-se neste desentendimento. Ocupa-se papel e tempo. Principalmente tempo de antena nos canais de televisão e esta é, provavelmente, a única vitória deste diferendo anual. 
Não esperemos que seja diferente nos próximos anos. Vai continuar a ser assim. E nós cá estaremos para ver isso mesmo, qualquer que seja o António mortinho de paixão pela educação ...
É claro que ambos têm responsabilidades pelas deficiências de organização do sistema, a começar pelo processo da colocação de professores. Não é estranho que este seja o único sector do estado em que todos os anos assistimos a estes complexos procedimentos e não há maneira de encontrar uma forma de recrutamento e selecção que evite esta confrangedora situação? Por mais complexos que fossem os problemas havia de haver respostas organizativas simples e transparentes que servissem melhor os interesses dos alunos e das famílias.

Mas não se pode confundir este reducionismo com o sistema. A maioria das escolas funciona bem, ao contrário do que querem fazer crer alguns sindicatos.
Ao contrário do que também se ouve por aí, a maioria dos alunos gosta de regressar à escola e gosta de estar na escola, como sempre foi, como no meu tempo, como no tempo dos meus filhos e dos meus netos.
Claro que o tempo e o modo contam, as novas tecnologias, as novas relações familiares, as novas situações sociais... Mas o que sempre é essencial, a relação professor-aluno, mantém-se como assunto central da sala de aula.
Por isso, era a comunicação interpessoal que acontece no processo pedagógico que devia estar no centro das discussões no “regresso à escola” .
Tanto o estatuto como os papéis de professores e alunos mudaram. É claro que o professor continua a ser o responsável pela transmissão do saber… Mas não é aceitável que o professor utilize as mesmas formas de comunicação na sala de aula, como noutros tempos, tais como as formas de comunicação implícita, paradoxal, etc.
Esta formas de comunicação são é prejudiciais a qualquer tipo de interacção pedagógica mas elas continuam a existir, há mesmo quem ache que as crianças não são nenhumas flores de estufa e que nada do que se diz às crianças tem importância.
Hoje as interacções na escola são diferentes do passado, a punição física por professores autoritários, praticamente desapareceu da sala de aula mas não desapareceu o sofrimento dos alunos. Não o que resulta do esforço, do trabalho do estudo, ou das contrariedades do processo de socialização mas de palavras ou frases assassinas que fazem a diferença para as aprendizagens e para o futuro.
Já ninguém (?) chama burro a um aluno na sala de aula, mas vão-se utilizando outras expressões: “é uma catástrofe”, “zero”, “medíocre”…
As palavras ganham outra força pelo facto de ser um professor a dizê-las: o que diz o professor é o veredicto de um especialista na matéria, a criança está a a desenvolver a sua personalidade, até aos 6 anos nós somos o nosso próprio ideal mas, a partir dos 6/7 anos, a avaliação escolar é mais forte, a criança é mais sensível a um juízo exterior
No caso dos adolescentes coincide com a fragilidade própria da idade no que respeita a aspectos físicos, psicológicos e sociais.
Avaliar o trabalho do aluno é uma coisa, avaliar a personalidade do aluno ou as suas competências, outra (ex.: "este trabalho de matemática vale zero" é diferente de dizer "és um zero a matemática").

Hélène Fresnel (Psychologies) escreve sobre alguns comportamentos dos professores na sala de aula. E apresenta os testemunhos de adultos para quem estas palavras os acompanharam ao longo da vida.
Peggy Pircher, (Le cercle psy) escreve o artigo "o seu filho nunca fará nada". O tema é, basicamente, o mesmo. Grave é ainda quando se atribui palavras ou frases deste tipo sem se saber exactamente o que se passa. É, por isso, importante haver um diagnóstico tão cedo quanto possível para proteger a criança e ao mesmo tempo poder ter apoio especializado. Este apoio, muitas vezes, "não acaba com as dificuldades mas sim com o sofrimento."

Felizmente o I , 15-9-2014, (ser professor em tempos de cólera), traz meia dúzia de casos de professores que têm orgulho na sua profissão, que se esforçam por ajudar os alunos, criam projectos e desenvolvem actividades para os alunos "irem mais além", mesmo quando se é professor " em tempos de cólera".

Estamos no início do ano lectivo e seria talvez importante tomar consciência das formas de comunicação desajustadas na sala de aula e... ter a coragem de mudar.

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