02/01/13

Impostores


Tartufo ou o impostor é uma comédia de Molière (primeira encenação de 1664). Tartufo vai a pouco e pouco convencendo o seu anfitrião da sua pureza de sentimentos e boas intenções. Orgon, o dono da casa, fascinado pelas suas aparentes virtudes, oferece-lhe a filha em casamento e outorga-lhe todos os seus bens.
Mas o comportamento de Tartufo faz com que atraia sobre si a desconfiança e reacção dos vários elementos da família: é detestado, desprezado e considerado oportunista e impostor.

Ao longo da história têm aparecido muitos impostores que se fazem passar por quem não são. Alguns deles correspondem a desejos das próprias populações em determinados momentos históricos.
Foi assim no caso de D. Sebastião, o desejado, que de vez em quando aparecia, durante a ocupação espanhola, para tentar apoderar-se do trono. Os espanhóis não gostavam da “brincadeira” e os impostores sofriam pesadas consequências.
A história dá conta de quatro falsos D. Sebastião. O primeiro apareceu em Penamacor, em 1584, dizendo que tinha participado na batalha de Alcácer Quibir. Mas a fama  durou pouco e acabou condenado às galés.
O segundo falso desejado, Mateus Álvares, surgiu no ano seguinte e ficou conhecido como o Rei da Ericeira.  Este chegou a tentar entrar em Lisboa. Mas acabou enforcado. 
Há impostores com fama mundial como foi o caso de Frank William Abagnale Jr, (1948). Sobre ele foi realizado o filme “Apanha-me se puderes”.
Começou a “carreira” nos anos 60, depositando cheques da sua própria conta, que foram aceites pelo banco. Emitiu cheques sem fundos de mais de dois milhões e meio de dólares em 26 países.
Em 5 anos teve oito identidades, entre elas, fingiu ser piloto da Pan Am, pediatra num hospital na Geórgia, arranjou diploma falso de advogado de Harvard e assim passou no exame para ser o desembargador geral do estado da Louisiana.

Temos, no nosso quotidiano, quem se faça passar por médico, por padre, etc. e, recentemente, tivemos um comentador que se dizia funcionário da ONU.

Patrick Avrane, psicanalista, autor do livro “Les imposteurs, tromper son monde, se tromper soi-même (Seuil, 2009), em entrevista à revista “le cercle psy” (nº 6), distingue os tartufos, os mistificadores, os usurpadores e acrescenta ainda os mitómanos e os falsos “self”.
O tartufo ou hipócrita representa a impostura mais frequente do mundo. Há sempre, em qualquer momento da nossa vida, alguma hipocrisia.
O tartufo não se faz passar pelo outro mas quer fazer crer que tem sentimentos que não são os seus, não muda de identidade mas dá falsas aparências.
O mistificador, não muda de identidade, não esconde os sentimentos mas engana sobre o que faz.
O usurpador toma a identidade e as qualidades do outro.
Distingue ainda o mitómano e o falso "self" que se engana em primeiro lugar a si próprio.
Uma característica do impostor, mesmo desmascarado, é continuar a sua trajectória. A impostura mantém-se porque o impostor não é capaz de lhe pôr termo.
A impostura é um problema de identidade. O impostor tenta reparar uma falha profunda dessa identidade... Tem necessidade de assumir a identidade de outro, de fazer prova de sentimentos que não são os seus mas que ele sabe que esperam dele.

A impostura é também um assunto de actualidade. O impostor aparece quando há um assunto da actualidade na sociedade como é o caso das dificuldades que o país atravessa.
Se aparece alguém com uma "versão fundamentada" na própria autoridade das nações unidas, que melhor música para os nossos ouvidos do que essa, principalmente se se for comentador de televisão ?

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