20/01/11

Reforma, medo e cultura de escola

 Folheto do SNR (design e ilustrações de Carlos Gargaté)

Assistimos a alterações profundas nas relações de trabalho, em particular na função pública. Quando se modificam as condições laborais é preciso não esquecer que elas fazem parte de um sistema económico, social e jurídico que vai ter implicações em toda a organização social.
Quando se legisla sobre a reforma das pessoas é necessário saber o que vai acontecer nos vários níveis do sistema, à entrada e à saída e também o que vai acontecer às pessoas que durante a vida de trabalho o integram.
O que se verifica desde logo é que está mais difícil a entrada dos jovens na vida activa e, por outro lado, vamos ter muitos serviços onde haverá uma percentagem relevante de trabalhadores com mais de 60 anos.
Muitos trabalhadores manifestam grande ansiedade com esta situação quer quando escolhem o caminho da reforma quer quando optam por continuar a trabalhar até mais tarde. Dito de outro modo, alguns estão a ir para a reforma por medo. E outros continuam a trabalhar, com alguma dificuldade, pelo mesmo motivo devido às fracas condições de reforma.
Vamo-nos habituando à ideia de que a reforma será cada vez mais para pessoas idosas.
Provavelmente vamos andar de bengala no serviço. A frágil saúde levará a maior absentismo e maiores dificuldades em poderem assegurar com qualidade e a tempo inteiro as funções que lhes competem.
A possibilidade de passar à reforma mais cedo com as reduções das pensões é também uma decisão tomada por medo.
Medo como prova a corrida de professores à aposentação para salvaguardar alguns direitos adquiridos (contratados) a uma reforma que se for hoje vale mais do que no futuro e porque a legislação que há-de vir (tem sido assim) vai prejudicar ainda mais o valor da pensão.
Medo de adaptação aos novos tempos da educação em que ficou mais difícil educar alunos na sala de aula (“difícil é sentá-los”, “dificil é educá-los”, como escrevem os ex-ministros da educação M. Grilo e D. Justino).
Perde-se, assim, um conhecimento precioso acumulado ao longo de 30 ou 40 anos de serviço.
Ninguém vai contar a história das organizações escolares, ninguém vai passar informações do saber de experiência feito, de muitos anos de trabalho.
Será que interessa a alguém, no início de carreira, este tipo de aprendizagem e de integração, seja ou não sob a forma de supervisão? 
Os trabalhadores passaram a ser como as secretárias, quando estão velhas vão para o lixo.
A nossa cultura parece estar cega com o que se passa com os idosos, em geral, e com os reformados em particular.
O outsourcing substitui, mais ou menos rapidamente, os que fazem falta ou que parece que fazem. Os outros, os descartáveis, passam rapidamente a ser inactivos.
Nestes tempos de fogos-fátuos não consta que haja qualquer programa de prevenção mínimo para os trabalhadores que se aposentam ou qualquer tipo de ajuda para que a sua adaptação se possa fazer sem grandes receios.

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