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Estou a ler o Relatório Final da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais na Igreja Católica Portuguesa, divulgado a 13 de Fevereiro, em conferência de imprensa.
Merece ser lido com todo o cuidado tendo presente a complexa realidade que o problema da violência sexual representa.
Segundo o Relatório, foram validados 512 testemunhos, num total de 564 recebidos, entre Janeiro e Outubro do último ano, relativos a casos ocorridos nos últimos 72 anos (1950-2022). Estes testemunhos, apontam a uma rede de 4815 vítimas. 25 casos foram enviados ao Ministério Público.
Por reduzidos que fossem, os resultados do estudo seriam sempre uma “monstruosidade”, para usar o termo do Papa Francisco. Estes resultados são preocupantes tal como as enormes consequências/tarefas que resultam deste processo porque como diz o Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. José Ornelas, a Igreja não quis fazer “um teatrinho” com este procedimento. Se bem entendo, o que se pretendeu foi, certamente, saber a dimensão do fenómeno da violência sexual na Igreja e querer assumir todas as consequências que daí resultam.
De facto, as "Notas finais e recomendações", apresentadas no Relatório, são todo um extenso programa de reflexão, análise e de propostas de intervenção para os vários anos que se seguem.
Algumas tarefas são urgentes como as que dizem respeito à reparação devida às vítimas, fazendo justiça reparativa e proporcionando os apoios psicológicos de que necessitam. Mas também, adoptar todas as medidas de prevenção para que não haja possibilidade de continuação dos abusos.
O Relatório indica uma grande diversidade de medidas preventivas e formativas. São em meu entender medidas que também se devem aplicar a outros espaços e instituições frequentadas por crianças, como escolas, instituições desportivas, de lazer e de férias... Dá como exemplo: a necessidade de controlar os antecedentes criminais de quem vai trabalhar com crianças e adolescentes, impedir que quem seja suspeito nesta matéria possa actuar na proximidade das crianças...
Há que continuar a fazer mudanças no relacionamento educativo que temos com as crianças e jovens desde logo a mudança de cultura que coloque a criança no lugar central onde sempre devia ter estado, principalmente a partir Declaração e da Convenção dos Direitos da Criança.
Destaco algumas medidas de grande relevância para esta perspectiva de mudança:
- A formação específica nesta área da violência sexual.
- O desenvolvimento de competências parentais relacionadas com o tema.
- O "reforço do papel da Escola e da «educação para a sexualidade», em articulação e respeito com as diversas singularidades das famílias e seus contextos socioculturais." (Lei 60/2009, de 6 de Agosto).
- Uma proposta particularmente relevante sugerida no Relatório, é a da realização de um Estudo sobre os abusos sexuais na sociedade portuguesa. *
No fim de contas, foi positivo que a Igreja portuguesa, através da Conferência Episcopal, se tivesse aventurado nesta floresta fechada dos abusos sexuais. O trabalho da Comissão Independente, assim como o trabalho que está a ser desenvolvido pelas Comissões Diocesanas de Prevenção e Protecção, a nível nacional, estimula à lucidez, à bondade e ao perdão, num assunto que tem sido tão ocultado, silencioso e perturbador.
Até para a semana.
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"Meu bem-amado disse-me:
"Levanta-te, minha amiga,
vem , formosa minha!
Eis que o inverno passou,
cessaram e desapareceram as chuvas.
Apareceram as flores em nossa terra,
voltou o tempo das canções.
Em nossas terras já se ouve
a voz da rôla.
A figueira começa agora a dar seus figos
e a vinha em flor exala o seu perfume.
Levanta-te, minha amada amiga,
e vem comigo, formosa minha!
Minha pomba, oculta nas fendas do rochedo,
e nos abrigos das rochas escarpadas,
mostra-me o teu rosto,
faze-me ouvir a tua voz.
Tua voz é tão doce,
Tão delicado o teu rosto!"
(Cant 2, 10-14)
O Novo Catecismo - A Fé para adultos, Herder, p. 446. Também conhecido como Catecismo Holandês)
Depois de um terrível século XX, como entender o que se passa no início deste século em que o Caos parece reinar em relação à Ordem, com as várias catástrofes que têm vindo a acontecer: as guerras, como na Ucrânia, a pandemia e agora o terramoto na Turquia e Síria?
Somos motivados com frequência, pela publicidade, pelos livros de auto-ajuda, etc., nas mais diversas circunstâncias da vida a buscar a nossa própria felicidade. Ora mesmo nas coisas mais simples da vida sabemos que assim não é. Como diz a canção de Madalena Iglésias: “Onde estás felicidade que não te encontrei?”
Então de que felicidade se trata ?
Jordan Peterson (12 regras para a vida - Um antídoto para o caos) questiona que a felicidade seja o objetivo mais ideal para a nossa vida, pois sabemos que o sofrimento faz parte dela, e propõe entender a felicidade num sentido mais profundo.
Constatou que as grandes histórias do passado tinham mais a ver com o desenvolvimento do carácter face ao sofrimento do que com a felicidade.
A vida tem os dois lados: Ordem e Caos. Ordem “quando as pessoas ao nosso redor agem de acordo com normas sociais bem definidas, comportando-se de forma previsível e cooperante”; Caos é onde – ou quando - acontece algo inesperado” como a guerra ou perder o emprego...
Como organizar-se mentalmente do ponto de vista individual, familiar e social? De facto, “as pessoas necessitam de princípios ordenadores, caso contrário, surge o caos. Precisamos de regras, padrões, valores - individualmente e em conjunto.” (p.17)
O ser humano procura a felicidade mas neste sentido mais profundo que envolve os momentos difíceis da vida, que existem, e sabemos que podem ser superados. Quando parece que tudo está perdido uma nova ordem pode surgir da catástrofe e do caos, sem nos deixarmos submergir no niilismo ou na ordem excessiva e rotineira da normose.
Aprendemos com as experiências vividas por nós, observadas nos outros, de que a vida é constituída por ordem e caos.
Para Jordan Peterson podemos criar a ordem a partir do caos e vice-versa. E escreve: “Nos meus momentos de maior escuridão, no submundo da alma, dou por mim frequentemente assombrado e maravilhado pela capacidade das pessoas para fazerem amizades, para amar o seus parceiros e pais e filhos, e de fazerem o que devem para manter a maquinaria do mundo a funcionar.
Acredito que este tipo de heroísmo quotidiano é a regra e não a exceção. A maioria dos indivíduos tem de lidar com algum problema de saúde enquanto continua a ser produtivo sem se queixar. Se alguém tem felicidade de desfrutar de um raro período de graça e saúde impecável, então, é provável que haja algum membro da família que atravesse uma crise. No entanto, as pessoas prevalecem e continuam a fazer tarefas difíceis, que exigem esforço, para se manterem unidas à família e à sociedade ... Merecem por isso uma admiração genuína e sentida...” (p. 92)
É esta Ordem que temos visto, e esperamos continuar a ver, no Caos do início deste século.
Até para a semana.
1. O Evangelho do passado Domingo falava das bem-aventuranças. Em 2014, disse aqui que as bem-aventuranças eram as Regras para uma vida feliz.
Esta perspectiva remete-nos para a Exortação Apostólica Gaudete et Exsultate, de 19 de Março de 2018, do Papa Francisco, sobre a chamada à santidade no mundo actual e onde apresenta cada uma das bem-aventuranças como um caminho de felicidade para qualquer pessoa.
2. Martin Seligman é um dos meus psicólogos inspiradores e tenho aqui dedicado muito tempo a espalhar as ideias sobre "felicidade autêntica" e "bem-estar" que podemos resumir nas seis virtudes e nas vinte e quatro forças de carácter que integram a nossa personalidade.
Permitam-me que vá buscar a ideia de forças de assinatura e integre no inventário de Seligman esta ideia de bem-aventuranças.
Como refere Francisco: “64. A palavra «feliz» ou «bem-aventurado» torna-se sinónimo de «santo», porque expressa que a pessoa fiel a Deus e que vive a sua Palavra alcança, na doação de si mesma, a verdadeira felicidade.”
Ou seja, não se é feliz por se ser pobre ou por chorar ou se sentir injustiçado... a última palavra não é da pobreza, nem da tristeza, nem da injustiça mas da possibilidade que temos de ser felizes no desapego, na mansidão, na compaixão, na justiça, na misericórdia, na pureza do coração e na paz:
- a felicidade da pobreza em espírito e do desapego...
- a felicidade da mansidão num mundo de discussões, agressões, violências...
- a felicidade que vem da compaixão, de sermos solidários com os que sofrem e de partilhar as suas dificuldades e as suas dores.
- «Fome e sede» de justiça que correspondem a necessidades primárias, de sobrevivência. A justiça é, assim, uma necessidade básica nas relações sociais e políticas.
- A felicidade da misericórdia é o caminho da ajuda, do serviço dos outros, da compreensão e do perdão.
- A pureza de um coração que sabe amar.
- A felicidade que vem do caminho da paz.
- Os bem-aventurados, as pessoas felizes, vivem com autenticidade, questionam e incomodam a sociedade com a sua vida.
3. Ao mesmo tempo, nesta semana, discute-se o palco da Jornada Mundial da Juventude, a pala, o happening, a requalificação, revalorização de uma zona degradada de Lisboa e Loures, as coisas básicas da vida, como a limpeza, os wc, a água, a comida... e os milhões envolvidos.
Mais uma vez apareceu a falha na organização de um evento desta magnitude. Nada de novo. Simplesmente o espelho da nossa desorganização caseira, dos interesses mesquinhos, político-partidários, de aproveitamento para justificar as próprias posições... Penso no que esconde a máscara de cada um, desde os responsáveis directos pelas decisões que têm sido tomadas até ao último dos jovens que estão a dar o seu melhor para participarem nesta Jornada. **
O que será que interessa nesta Jornada? Tudo, portanto. Mas o sentido tem de ser o do caminho que se abre à juventude, do acesso à sua felicidade e bem-estar, numa vida com sentido como o traçado pelas bem-aventuranças.
Até para a semana.
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* "Ao ver a multidão, subiu a um monte, e, depois de Se ter sentado, aproximaram-se d'Ele os discípulos. Tomando então a palavra, começou a ensiná-los, dizendo..." (Mt, 5)
** Que modelagem temos para apresentar a estes jovens ?
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Vivemos numa permanente crise das instituições de saúde (1) a par da nossa própria fragilidade resultante da idade, da doença, das preocupações próprias das várias etapas da vida.
Esta incerteza acrescenta ansiedade às nossas actividades, emoções, sentimentos... Adoecer é, verdadeiramente, ansiogénico. E não me refiro à nosofobia ou à hipocondria.
Obter um diagnóstico reduz a ansiedade a menos que o prognóstico seja pessimista. A tranquilidade que pode vir de um diagnóstico ou da compreensão dos nossos sintomas, do nosso sofrimento, pode ser libertadora e tranquilizadora. (2)
A dor no peito é das mais ansiogénicas por ter origens muito diversas e ser um sinal de maior ou menor perigo para a saúde e para a vida. Pode ser, por exemplo, de causa cardíaca, resultar de refluxo gastroesofágico... ou resultar de ansiedade. Pode acontecer que ao fim de muito tempo e de muitas dores, consiga perceber o que se passa consigo e obter um diagnóstico correcto.
Entretanto, viverá em grande ansiedade, passará, eventualmente, por situações de pânico (DSM), até que seja feita a compreensão do seu problema e a origem do seu sofrimento.
Tal como acontece com o rendimento escolar, a ansiedade afecta o rendimento escolar e, por sua vez, a falta de rendimento provoca ansiedade. (Ansiosa-mente, Pilar Varela)
Sabermos lidar com a nossa dor depende muito da compreensão do que lhe dá origem, do diagnóstico clínico e, se necessário, de uma segunda opinião. (3) É isso que os doentes procuram nos serviços de saúde: uma explicação para o que se passa com a sua saúde/doença. Muitas vezes não obtêm resposta. Mas, como disse Galileu, "E pur si muove". Ou seja, a dor está lá.
Às vezes, os comentários de pessoas, familiares e de profissionais de saúde não são razoáveis: “Pois você nao tem nada”, “isso é psicológico” ou, traduzido em termos populares, "isso são manias"... que são outras tantas maneiras de ser insensível a quem sofre.
Mesmo que o problema seja psicológico, o sofrimento psicológico é real e as pessoas têm que ser compreendidas e respeitadas no seu sofrimento.
Se a pessoa toma a decisão de arriscar ir às urgências, ainda menos razoável é a culpabilização de estar a atrapalhar o serviço com uma “falsa urgência”. (4)
Haverá alguém que tenha prazer em ir à urgência, passar uma tarde, uma noite, uma manhã no hospital, ser picado para análises, colocar um catéter... ver o sofrimento, o choro, os gritos, os gemidos dos outros doentes... no fundo o ser humano em sofrimento que é o que para mim se passa numa urgência ?
Na realidade, estas pessoas não têm alternativa, não têm médico de família, não têm consulta nos Centros de Saúde ou USF, ou nos médicos particulares, vivem momentos de dúvida sobre o que fazer... não têm quem as ajude a suportar a sua dor física ou psíquica... (5)
A dor é uma experiência sensorial e emocional extremamente desagradável e perturbadora do equilíbrio pessoal e social. (6)
Pode ser evitada e ultrapassada em muitas situações e, por isso, Já era tempo de criar as condições técnicas, financeiras e humanas para cumprir o direito à saúde previsto na Constituição. (Artº 64.º )
Até para a semana.
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(1) Todos os dias há notícias (por ex.) sobre o encerramento de maternidades, a falta de médicos ginecologistas, as listas de espera para exames e cirurgias, a falta de profissionais nas equipas, das imensas horas de espera para marcação de consultas nos Centros de Saúde...
(2) Um exemplo pessoal. Eu não sabia o que é uma aura visual. Foi assustador até ao dia em que percebi que havia enxaquecas sem dor. Como é o caso da aura visual que de vez em quando, nos momentos mais díspares, me assustava e assusta, não me deixa ver com nitidez e ler fica difícil, durante 15-30 minutos.
(3) Este direito está descrito no Código Deontológico dos Médicos assim como na Carta dos Direitos e Deveres dos Doentes. Contudo, um circuito de segundas opiniões não está ainda totalmente definido, como tem vindo a tentar fazer o Ministério da Saúde.
(4) O sistema de triagem de Manchester nao poderá ser alterado e ou melhorado? É o que parece indicar a investigação do Hospital de S. João que desenvolve protótipo de monitorização de dados vitais dos utentes em espera na Urgência.
Ou não será possível melhorar a organização do sistema de saúde ? Pelos vistos é: O Diretor da urgência do Santa Maria alerta para falhas no encaminhamento de doentes. Claro que a montante o funcionamento deveria ter outra eficiência...(5) Um Centro de Saúde que obriga um doente a deslocar-se para a bicha, às 5 ou 6 horas da manhã, para marcação de uma consulta não é concebível nos dias de hoje. Para além de desumano é o cúmulo da incompetência... Até para fazer a inspecção de um carro se é mais bem atendido. Para marcar uma inspecção de um carro basta telefonar ou com dois ou três cliques fazer a marcação pela internet. Tenham dó!
(6) A Organização Mundial de Saúde (OMS) define saúde emocional como “um estado de bem-estar onde o indivíduo realiza suas próprias habilidades, lida com os fatores estressantes normais da vida, trabalha produtivamente e é capaz de contribuir com a sociedade”.
Fica comigo, cai rápido o entardecerAbide with me, fast falls the eventideA escuridão aprofunda-se Senhor, fica comigoThe darkness deepens Lord, with me abideQuando outros ajudantes falham e os confortos fogemWhen other helpers fail and comforts fleeAjuda dos desamparados, oh, fica comigoHelp of the helpless, oh, abide with meRápido ao seu fim diminui o pequeno dia da vidaSwift to its close ebbs out life's little dayAs alegrias da Terra diminuem, suas glórias passamEarth's joys grow dim, its glories pass awayMudança e decadência ao redor eu vejoChange and decay in all around I seeÓ Tu que não mudas, fica comigoO Thou who changest not, abide with meNão temo nenhum inimigo, contigo à mão para abençoarI fear no foe, with Thee at hand to blessOs males não têm peso e as lágrimas não têm amarguraIlls have no weight, and tears no bitternessOnde está o aguilhão da morte?Where is death's sting?Onde, sepultura, tua vitória?Where, grave, thy victory?Eu triunfo ainda, se tu permaneceres comigoI triumph still, if Thou abide with meSegura Tua cruz diante dos meus olhos fechadosHold Thou Thy cross before my closing eyesBrilha através da escuridão e aponta-me para os céusShine through the gloom and point me to the skiesA manhã do céu rompe e as vãs sombras da terra fogemHeaven's morning breaks, and earth's vain shadows fleeNa vida, na morte, ó Senhor, fica comigoIn life, in death, o Lord, abide with meFica comigo, fica comigoAbide with me, abide with me
Ética (do grego ethos) e moral (do latim mores), têm o significado de costume. Estão relacionadas e associadas mas também têm sentidos distintos: os seres humanos, enquanto seres sociais, regem-se pelos valores morais do grupo a que pertencem, valores transmitidos de geração em geração e impostos como uma obrigação; a ética como reflexão sobre a moral, pode aprovar ou contestar esses valores.
Na nossa vida, perante as várias dimensões da realidade, temos necessidade de tomar decisões e de praticar determinados actos, de forma livre e consciente, que estejam de acordo com valores morais e éticos que são o critério da acção.
Normalmente, ao longo da vida, passamos de uma moral heterónima para uma moral autónoma, como refere a psicologia do desenvolvimento humano. Ao desenvolver a capacidade de discernir os valores éticos e morais presentes na acção humama espera-se que o comportamento de um adulto seja diferente do de uma criança e se situe pelo menos num estádio de desenvolvimento moral característico do grupo etário a que pertence. Cada adulto pode posicionar-se em estádios de desenvolvimento inferiores ou superiores à sua idade. Há adultos que parecem crianças e crianças já demasiado adultas em relação aos valores morais.
O que é mais difícil de perceber é que haja pessoas que pelo facto de terem uma determinada posição sócio-política, possam definir-se, como os comunistas que se afirmam de um escol moralmente superior ao dos outros, ou os socialistas que sempre que é necessário puxar das credenciais da moralidade, se afirmem possuídos por uma ética republicana.
A realidade tem mostrado que não é pelo facto de perfilhar uma determinada ideologia ou de pertencer a uma associação politica que se é moralmente inferior ou superior. O comportamento moral e eticamente responsável depende mais de cada um de nós do que da pertença a um partido político, a um grupo social, a uma visão da sociedade. A parábola do bom samaritano ilustra de forma maravilhosa este ponto de vista...
O desenvolvimento moral (Piaget, Kohlberg) não é estático, faz-se lentamente ao longo do tempo, passando de um nível pré-convencional e convencional para um nível pós-convencional, ou seja, a ética e a moral de um indivíduo podem estar num estádio de desenvolvimento consentâneo com as normas e as leis da sociedade - Nivel convencional, estádio 4 - mas nem tudo o que é legal pode ser considerado dentro da ética, estando, por isso, fora do nível de desenvolvimento normal que se espera.
Também é difícil de perceber que quem se diz da ética republicana, também diga: “habituem-se” à actual governação. A ética republicana é compatível com o “habituem-se?”
A habituação é uma forma poderosa de aprendizagem, considerada como uma segunda natureza (Aristóteles); os hábitos das pequenas ou grandes coisas podem trazer mudanças na nossa vida para o bem ou para o mal, conforme se trata de bons ou maus hábitos.
Aquilo que é sugerido como “habituem-se” pode ser traduzido, mais ou menos como: ver-ouvir-comer-calar. Ora este não é um bom hábito. É um vício imoral e de falta de ética, é um processo de aprendizagem de comportamentos de submissão a uma doutrina política.
Ao contrário, os bons hábitos a aprender serão a autonomia, a independência, a crítica rigorosa, a solidariedade, a justiça... em resumo, os direitos humanos que devemos habituar-nos a respeitar.
Concluindo, a ética não é compatível com a habituação à obediência cega e irracional. Pelo contrário, a ética é a prática dos bons hábitos e costumes.
Agora entendam-se: se temos ética republicana não nos digam: "habituem-se". Ou se querem que a gente se habitue esqueçam a ética republicana e, de certeza, a ética, simplesmente.
Até para a semana.