É um dos episódios mais pitorescos da rivalidade, no campo da música, descrito por F. Lopes-Graça (Disto e Daquilo, Ed Cosmos, Lisboa,1973, cap. "Recodações em dó maior").
Termina com a tradicional rivalidade clubística benfiquista-sportinguista que, nos dias de hoje, é mais portista-benfiquista... De resto, não mudou nada.
"Quanto aos restantes dois organismos musicais tomarenses, esses não dividiam os espíritos: rachavam as cabeças dos seus respectivos prosélitos.
Eram eles a Banda Republicana Marcial Nabantina, com sede no bairro de Aquém-da-Ponte; e a Sociedade Filarmónica Gualdim Pais, que se agremiava no bairro de Além-da-Ponte, também chamado «Espanha». À rivalidade politico-económica existente entre os dois bairros da cidade correspondia, naturalmente, a rivalidade artística das suas respectivas filarmónicas. Esta rivalidade traduzia-se magnìficamente nas apelações populares de cada uma das filarmónicas, apelações derivadas de certa particularidade dos seus uniformes, e que vale a pena registar, apesar do seu picaresco algo despejado.
Os filarmónicos da Gualdim Pais encimavam os seus bonés por uma pluma enristada; ao passo que os barretes dos da Nabantina se distinguiam por um estranho orifício praticado logo acima da pala. Daí advinha o chamarem à Gualdim Pais a «Música do pau teso» e à Nabantina a «Música do cu aberto». Está-se a ver que com tão frescas e irreverentes alcunhas aquilo devia ser mesmo um sarilho... E era. Sempre que as duas bandas se enfrentavam, tínhamos a música desafinada. Festa ou romaria abrilhantada por ambas elas desandava ordinàriamente em heróica e homérica refrega, da qual saíam os trombones amachucados, as flautas rachadas, os bombos estoirados, à força de serem utilizados como armas agressivas ou pararem os golpes do adversário. E é bem de ver que nem só os pobres dos instrumentos pagavam as custas da rivalidade entre as duas bandas, transforrnadas em dois autênticos bandos, com os seus competentes partidários, que, em geral, são os mais assanhados nestas contendas clubistas. Aquilo era mesmo como as actuais e por vezes sangrentas lutas entre «benfiquistas» e «sportinguistas»..."
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