Há uma frase de Chesterton que diz: "Chegará o dia em que temos que provar ao mundo que a grama é verde". Creio que ultrapassámos esse dia há muito: Há quem não saiba
o que é uma mulher. E quem não queira saber
que há dois sexos.
Há também quem ache que a cultura portuguesa não interessa. (1)
Em relação à cultura, fiquei sem saber se se trata de uma questão honesta sobre a complexidade do que é a cultura, que reflecte o que significa a cultura nos dias de hoje, se é uma dúvida sobre a cultura portuguesa ou se é, apenas, mais um absurdo do wokismo, mais uma forma de negacionismo da cultura portuguesa e, no fundo, da cultura.
Se, ao contrário, se pretende compreender e questionar o que é a cultura, temos aqui uma oportunidade para debater o tratamento que, nos últimos tempos, temos dado à cultura.
Para Mario Vargas Llosa (A civilização do espetáculo) “Ao longo da história a noção de cultura teve diferentes significados e matizes... Mas apesar dessas variantes e até à nossa época, cultura sempre significou um conjunto de factores e disciplinas que, segundo amplo consenso social, a constituíam e ela implicava: a reivindicação de um património de ideias, valores e obras de arte, de conhecimentos históricos, religiosos, filosóficos e científicos em constante evolução, o fomento da exploração de novas formas artísticas e literárias e da investigação em todos os campos do saber.” (p. 61) (2)
O antropólogo Jorge Dias, em O essencial sobre os elementos fundamentais da cultura portuguesa, (Imprensa Nacional-Casa da Moeda), explicou que as várias maneiras de ver o português, mais cultas ou mais populares, são o exemplo da cultura do povo português. (3)
Jorge Dias chama-lhe “as constantes culturais deste povo já velho de tantos séculos.... ou a sua personalidade de base". Assim:
- O Português é um misto de sonhador e de homem de acção, ou, melhor, é um sonhador activo...
- Há no Português uma enorme capacidade de adaptação a todas as coisas, ideias e seres sem que isso implique perda de carácter...
- A saudade do português é um estranho sentimento de ansiedade...
- A saudade toma uma forma especial, em que o espírito se alimenta morbidamente das glórias passadas e cai no fatalismo do tipo oriental, que tem como expressão magnífica o fado...
- Uma das características mais importantes da saudade é precisamente essa fixidez da imaginação, que, por intensidade se pode tornar em ideia motora e conduzir à acção. É esta
obstinação que encontramos na arte, na musica, nas canções corais alentejanas e minhotas...
- O Português é sobretudo profundamente humano, sensível, amoroso e bondoso, sem ser fraco. Não gosta de fazer sofrer e evita conflitos, mas, ferido no seu orgulho pode ser violento e cruel.
- A capacidade de adaptação é uma das constantes de alguma portuguesa. “o português adapta-se a climas, profissões, a culturas, idiomas e a gente de maneira verdadeiramente excecional”...
- “Outra constante da cultura portuguesa é o profundo sentimento humano, que assenta no temperamento afectivo, amoroso e bondoso. Para o português o coração é a medida de todas as coisas.”
Também Eduardo Lourenço escreve sobre a saudade em O labirinto da saudade - Psicanálise mítica do destino Português (Publicações D. Quixote)
Somos irrealistas, vivemos de sonhos? “Somos um povo de pobres com mentalidade de ricos” ?
Há muito para repensar. Mas também era tempo de conhecer melhor a nossa terra, a nossa gente, a nossa cultura e também de apreciar a arquitectura, a literatura, a música, a arte... e de ter orgulho da cultura portuguesa.
Até para a semana.
________________________________
(1) Reacção de uma eurodeputada, Ana Catarina Mendes (do PS), à posição do líder do seu partido, Pedro Nuno Santos, que, num momento de lucidez, referiu que deve haver adaptação dos imigrantes à cultura do país que os acolhe (aculturação).
(2) Para Vargas Llosa, a cultura estabeleceu sempre categorias sociais entre aqueles que a cultivavam e aqueles que a desprezavam ou ignoravam ou dela eram excluídas por razões sociais e económicas. Em todas as épocas havia pessoas cultas e incultas e entre os dois extremos pessoas mais ou menos cultas ou pessoas mais ou menos incultas. Mas no nosso tempo tudo isso mudou, toda a gente é culta, e há uma cultura para todos os disparates...
E isto já é outra coisa!
(3) Alguns trabalhos, mais eruditos ou mais populares, sobre a cultura portuguesa que têm passado nos media, como, por exemplo: "O Tempo e a Alma", com José Hermano Saraiva; "Visita Guiada", com Paula Moura Pinheiro; "Primeira Pessoa", com Fátima Campos Ferreira; "Terra Nossa", com César Mourão, "A nossa cultura" - Observador; "Portugal fenomenal", com Tiago Góes Ferreira... mostram algumas das várias vertentes de abordagem da cultura portuguesa.
Sem comentários:
Enviar um comentário