28/02/25

Verdade


Vivemos num mundo onde mentiras, propaganda, manipulação... tomaram conta da nossa vida.
Há mentiras que destroem pessoas e há mentiras que destroem povos. Ou que são a base para se travarem razões que levam à guerra.
A propaganda, que é a arte de vender mentiras, esforça-se por formar a opinião das pessoas e somos enganados pelas imagens censuradas e pelas palavras distorcidas e fora de contexto.
Vivemos na era da pós-verdade em que as notícias apelam às emoções e às crenças pessoais, em detrimento de factos apurados ou da verdade objectiva.
Vivemos no tempo do cancelamento e da censura de quem não concorda com o politicamente correcto ou com a ideia dominante ou a verdade oficial. *

Jordan Peterson - 12 Regras para a Vida – um antídoto para o caos, na Regra 8 - "Diga a verdade ou pelo menos não minta" - diz-nos:
“Pode usar as palavras para manipular o mundo de forma a que receba aquilo que quer. Isso é o que significa “agir politicamente”. É a especialidade dos publicitários sem escrúpulos, dos vendedores, dos anunciantes, dos burlões, dos utopistas encantados com slogans e dos psicopatas. É o tipo de discurso que as pessoas escolhem quando tentam influenciar e manipular os outros.” 
“Alguém que vive uma vida de mentiras tenta manipular a realidade através da percepção, do pensamento e da acção, de modo a que apenas o resultado desejado, e pré-definido, possa existir” (p. 270)
“Quando as mentiras crescem o suficiente, o mundo inteiro estraga-se... Mentiras corrompem o mundo. Pior, essa é a sua intenção” (p. 292)

Segundo Peterson, o processo é o seguinte: Primeiro uma pequena mentira... depois, várias pequenas mentiras para sustentar a inicial. Em seguida um pensamento distorcido... Então, de uma forma terrível, dá-se a transformação das mentiras, através de uma prática automatizada, especializada, estrutural e neurológica, no conjunto de crenças e ações inconscientes.
Depois, vem arrogância e o sentimento de superioridade ...
E, finalmente, um inferno vem depois quando as mentiras destruíram a relação entre o indivíduo, ou o Estado, e a própria realidade. As coisas desmoronam. A vida degenera. Tudo se torna frustração e desilusão. A esperança desvanece. O indivíduo enganador tenta desesperadamente o sacrifício, como Caim, mas não consegue agradar a Deus. Então o drama entra no seu ato final.
Ressentimento e vingança é o que se segue. (p. 293-294)

Fez três anos de guerra, mentiras e ódio sobre a Ucrânia ou seja de manipulação para justificar que em 24 de Fevereiro houve um país que invadiu outro e em que foram, em grande parte, arrasadas as estruturas físicas mas também a vida das pessoas. Esta invasão é "desculpada" pelas crenças territoriais, ideológicas (desnazificação); em vez de guerra, "operação militar especial", em vez de ditador, "líder"...
J. Peterson refere: “É nossa responsabilidade ver o que está diante dos olhos, com coragem e aprender com o que vemos mesmo que seja algo horrível - mesmo que esse horror prejudique a nossa consciência e nos cegue parcialmente.”

Ao invés de guerras, mentiras e ódio... “A verdade é luz na escuridão. Veja a verdade. Diga a verdade. Ou, pelo menos, não minta.” (p.295)


Até para a semana.

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* Nunca houve tanta informação como actualmente o que significa que também nunca houve tanta falta de verdade... Pouco consola que haja programas de verificação de factos (fackt- cheking) para repor a verdade porque o problema é de quem controla esses programas, eles próprios podem mentir (Quem polígrafo o polígrafo; Quem poligrafa o polígrafo-2). Não deixa de ser curioso que a rede social de D. Trump se chame "Truth", tal como um jornal famoso se  chame "Пра́вда".
Tudo, mesmo assim, é preferível a um "MInistério da Verdade" (1984, G. Orwell). Ao invés, os esforços devem incidir no desenvolvimento do sentido crítico que se faz com uma vida intelectual amadurecida, pela curiosidade e pela educação, toda a educação, formal, académica mas também informal e familiar, ou seja pela cultura.


P.S. (6-3-2025) A realidade ultrapassa a ficção e o que escrevi. Estava longe de imaginar  que, da Sala Oval, assistiríamos, em directo, ao vivo e de forma transparente, à tentativa de destruição pessoal e de um país. Falou-se de “cilada”, “tristeza”, “vergonha”, “traição”, “confronto”, “humilhação”... ou “estratégia” negocial. O que quiserem. Que  os fins nunca justificam os meios.


 


Rádio Castelo Branco





20/02/25

Chorar




Quando as palavras não são suficientes, podemos manifestar as nossas emoções através do choro. Chorar é um instrumento de comunicação universal, é um sinal social que envia uma mensagem: “preciso de ajuda”, e provoca a empatia dos outros.
Chorar é uma experiência que envolve sons, postura corporal, lágrimas, emoções, contexto social e cultura. 
É um comportamento inato, uma forma de o bebé comunicar as suas necessidades: quando tem fome, quando necessita de colo ou interação, quando está desconfortável devido ao frio, calor, fralda suja, roupa incómoda, dor (cólicas) , doença. 
No início, o bebé não tem lágrimas. Posteriormente, vai desenvolver as lágrimas emocionais (1) que lhe vão permitir comunicar que está em perigo ou que precisa de ajuda. 
Na idade adulta, chorar serve para demonstrar tristeza, como quando morre um familiar, numa situação de luto. Mas também felicidade, numa festa ou na conquista de um prémio. O choro funciona como uma libertação (catarse), uma descarga das tensões internas e uma forma de restaurar o equilíbrio emocional.
Chorar é um comportamento individual. Aquilo que me faz chorar a mim não é exactamente o que faz chorar outras pessoas. Há diferenças Individuais na expressão emocional, mais aberta ou mais contida, dependendo da personalidade, da forma como se processou o desenvolvimento, da cultura familiar ou social.

Mas chorar às vezes é difícil. Pode acontecer que já não há lágrimas para expressar o sofrimento (2), como na conhecida a canção de Nat King Cole “Não tenho lágrimas”.

Quero chorar,
Não tenho lágrimas
Que me rolem nas faces
Pra me socorrer

Se eu chorasse,
Talvez desabafasse
O que sinto no peito
E não posso dizer
Só porque não sei chorar
Eu vivo triste a sofrer

Estou certo que o riso
Não tem nenhum valor
A lágrima sentida
É o retrato de uma dor

O destino assim quis
De mim se separar
Eu quero chorar não posso
Vivo a implorar

Vemos então que chorar tem benefícios (3): Como na canção, poder desabafar a dor que nos vai no peito.

Perante uma pessoa que chora é tão importante saber o que fazer como saber o que não fazer. Assim, devemos mostrar que nos importamos e oferecer a nossa ajuda. 
No entanto, não interessa dizer: “Não chores”. Ou avaliar o comportamento...
No caso das crianças, não fazer comparações com os outros meninos ou outras pessoas que são fortes e não choram ou chamar “choramingas”...
Não dizer: “pára de chorar“ com voz agressiva e autoritária ou até: “pára de chorar se não apanhas”, ou mesmo:  "tu não tens culpa, portanto, pára de chorar".

Chorar comunica a nossa fragilidade e a necessidade de apoio e é suficientemente eloquente para levar a uma resposta dos outros.
Mas os tempos que correm não são propícios a essa empatia. Apesar das distrações que nos são servidas todos os dias pela "civilização do espectáculo", o narcisismo mostra a sua arrogância ainda mais tocante nos momentos de infelicidade e de dor dos outros... como nas actuais situações de guerra. 

Se estamos a lidar com situações de tristeza, podemos sempre recorrer a terapias de auto-ajuda. Mas se não estamos a conseguir ultrapassar a situação, pedir ajuda especializada é o caminho mais indicado para poder encontrar o equilíbrio emocional. (4)



Até para a semana.



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(1) Há vários tipos de lágrimas ou de choro: Lágrimas basais: lubrificam os olhos; Lágrimas reflexas: quando os olhos ficam irritados por corpos estranhos; Lágrimas emocionais: quando nos deparamos com situações difíceis como solidão, desamparo ou stress.

(2) Quando as crianças já nem sequer choram como a investigação de R. Spitz já nos tinha ensinado. 

(3) Se o meio em que estou é favorável, compreensivo e seguro, as lágrimes permitem exteriorizar a dor, o sofrimento interior... Porém se o meio é inseguro chorar pode aumentar o sentimento de vulnerabilidade.

(4) Sítios da internet com interesse para este texto: 




Rádio Castelo Branco






12/02/25

A cultura portuguesa - Os melhores dos melhores


O processo de desenvolvimento humano, independentemente da nossa vontade, depende também de determinantes culturais e cada um de nós é o resultado do ambiente cultural onde se processou a sua socialização.
Numa comunidade, o processo de socialização, ou de aprendizagem das normas socio-culturais, necessita de adequada socialização dos seus membros, que tenha como resultado a integração da maior parte deles na sociedade. Ou, caso contrário,  haverá o desvio e a anomia.
Trata-se de um processo circular e dinâmico no qual a cultura que recebemos através dos agentes sociais como a família, escola, igreja, empresa, grupo de pertença, etc. levam a criar em cada um de nós motivações, forças e atitudes, autoestima e resiliência, sentimento de segurança ou de abandono, que farão parte da personalidade e que por sua vez vão constituir a base em que se fará a futura socialização dos jovens.

Continuo a ter uma percepção muito positiva do mandato do Presidente Marcelo, contra a opinião generalizada do contrário. Nesse sentido, concordo que: "Nós somos bons, muito bons. Somos os melhores dos melhores"
O papel que cabe a um Presidente sobre a  autoestima e a (re)motivação dos cidadãos é inestimável para o bem-estar de cada um e para a cultura da comunidade. 
Somos os melhores por aquilo que fazemos, pelos resultados que obtemos, e também pela capacidade crítica dos defeitos e do que, podendo, não fazemos. 

 

Crítica feita sobretudo de humor. Rir das nossas virtudes e defeitos é um bom princípio para sabermos situar-nos no mundo em que vivemos, e não nos tornarmos insuportáveis para os que nos estão próximos...

Ser melhor significa também que se pode ser crítico com total liberdade, sem medo de ser incomodado pelos censores estatais ou informais ou pelos agentes do cancelamento...

Algumas das nossas “elites” não têm esta capacidade. Como, p.ex.,  o despautério de uma esquerda globalista que diz os maiores disparates, sem se rir, da cultura portuguesa.


Felizmente, temos outras vanguardas em que só os melhores têm esta capacidade crítica. De Gil Vicente a Eça de Queirós, de Eduardo Lourenço a Miguel Esteves Cardoso. 

Um Alípio Abranhos do séc. XX pode passar pela Câmara Municipal, Governo ou Parlamento. Temos vindo a divertir-nos com episódios dos passantes por esses sítios de poder sem qualquer noção do sentido de estado ou do ridículo... 

 

As “Aventuras” de Miguel Esteves Cardoso – (1ª parte - As minhas aventuras na República Portuguesa", Independente Demente) mostram como os portugueses têm humor suficiente para se verem ao espelho e serem capazes de sorrir de si próprios e em especial dos políticos que os governam. 

Por exemplo, a “Aventura do sofrer” (p. 42): “Em Portugal  sofre-se muito. Eu sofri muito. Tu já sofreste muito. Só  Deus sabe o que ele já sofreu. De  resto, sofre-se muito neste país. O  próprio país sofre. Sofre só por si com ponto final. E sofre coisas exteriores a si. Sofre  de dúvidas. Sofre quedas. De  escadotes. De  cabelos. Sofre alterações. Sofre cataclismo. Sofre  de sucessivas. Sofre  de chofre. 

Esta afirmação sofre de contra-argumentação.”...

 

 

Até para a semana.

 

 

Rádio Castelo Branco



 



08/02/25

A cultura portuguesa


Há uma frase de Chesterton que diz: "Chegará o dia em que temos que provar ao mundo que a grama é verde".  Creio que ultrapassámos esse dia há muito: Há quem não saiba o que é uma mulher. E quem não queira saber que há dois sexos
Há também quem ache que a cultura portuguesa não interessa. (1)
Em relação à cultura, fiquei sem saber se se trata de uma questão honesta sobre a complexidade do que é a cultura, que reflecte o que significa a cultura nos dias de hoje, se é uma dúvida sobre a cultura portuguesa  ou se é, apenas, mais um absurdo do wokismo, mais uma forma de negacionismo da cultura portuguesa e, no fundo, da cultura. 
Se se tratar desta última possibilidade, ficamos a entender melhor o que se tem andado a (des)conversar sobre os brasões do Jardim da Praça do Império, sobre o Padrão dos descobrimentos, sobre Camões, ou o P. António Vieira...
Se, ao contrário, se pretende compreender e questionar o que é a cultura, temos aqui uma oportunidade para debater o tratamento que, nos últimos tempos, temos dado à cultura.

Para Mario Vargas Llosa (A civilização do espetáculo)  “Ao longo da história a noção de cultura teve diferentes significados e matizes... Mas apesar dessas variantes e até à nossa época, cultura sempre significou um conjunto de factores e disciplinas que, segundo amplo consenso social, a constituíam e ela implicava: a reivindicação de um património de ideias, valores e obras de arte, de conhecimentos históricos, religiosos, filosóficos e científicos em constante evolução, o fomento da exploração de novas formas artísticas e literárias e da investigação em todos os campos do saber.” (p. 61) (2)

O antropólogo Jorge Dias, em O essencial sobre os elementos fundamentais da cultura portuguesa, (Imprensa Nacional-Casa da Moeda), explicou que as várias maneiras de ver o português, mais cultas ou mais populares, são o exemplo da cultura do povo português. (3)
Jorge Dias chama-lhe “as constantes culturais deste povo já velho de tantos séculos.... ou a sua personalidade de base". Assim:
- O Português é um misto de sonhador e de homem de acção, ou, melhor, é um sonhador activo...
- Há no Português uma enorme capacidade de adaptação a todas as coisas, ideias e seres sem que isso implique perda de carácter...
- A saudade do português é um estranho sentimento de ansiedade...
- A saudade toma uma forma especial, em que o espírito se alimenta morbidamente das glórias passadas e cai no fatalismo do tipo oriental, que tem como expressão magnífica o fado...
- Uma das características mais importantes da saudade é precisamente essa fixidez da imaginação, que, por intensidade se pode tornar em ideia motora e conduzir à acção. É esta obstinação que encontramos na arte, na musica, nas canções corais alentejanas e minhotas... 

- O Português é sobretudo profundamente humano, sensível, amoroso e bondoso, sem ser fraco. Não gosta de fazer sofrer e evita conflitos, mas, ferido no seu orgulho pode ser violento e cruel.

- A capacidade de adaptação é uma das constantes de alguma portuguesa. “o português adapta-se a climas, profissões, a culturas, idiomas e a gente de maneira verdadeiramente excecional”... 

- “Outra constante da cultura portuguesa é o profundo sentimento humano, que assenta no temperamento afectivo, amoroso e bondoso. Para  o português o coração é a medida de todas as coisas.”


Também Eduardo Lourenço escreve sobre a saudade em O labirinto da saudade - Psicanálise mítica do destino Português (Publicações D. Quixote) 
Somos irrealistas, vivemos de sonhos? “Somos um povo de pobres com mentalidade de ricos” ? 
Há muito para repensar. Mas também era tempo de conhecer melhor a nossa terra, a nossa gente, a nossa cultura e também de apreciar a arquitectura, a literatura, a música, a arte... e de ter orgulho da cultura portuguesa. 


Até para a semana.



Rádio Castelo Branco



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(1) Reacção de uma eurodeputada, Ana Catarina Mendes (do PS), à posição do líder do seu partido, Pedro Nuno Santos, que, num momento de lucidez, referiu que deve haver  adaptação dos imigrantes à cultura do país que os acolhe (aculturação). 


(2) Para Vargas Llosa, a cultura estabeleceu sempre categorias sociais entre aqueles que a cultivavam e aqueles que a desprezavam ou ignoravam ou dela eram excluídas por razões sociais e económicas. Em  todas as épocas havia pessoas cultas e incultas e entre os dois extremos pessoas mais ou menos cultas ou pessoas mais ou menos incultas. Mas no nosso tempo tudo isso mudou, toda a gente é culta, e há uma cultura para todos os disparates...

E isto já é outra coisa!

 

(3) Alguns trabalhos, mais eruditos ou mais populares, sobre a cultura portuguesa que têm  passado nos media, como, por exemplo: "O Tempo e a Alma", com José Hermano Saraiva; "Visita Guiada", com Paula Moura Pinheiro; "Primeira Pessoa", com Fátima Campos Ferreira; "Terra Nossa", com César Mourão, "A nossa cultura" - Observador; "Portugal fenomenal", com Tiago Góes Ferreira... mostram algumas das várias vertentes de abordagem da cultura portuguesa.