05/04/22

As crianças da Ucrânia

Menino ucraniano ferido pergunta pelo pai


As crianças da Ucrânia já não vão ao jardim de infância
nem encontram a sua escola, desaparecida sob as bombas
e no lugar do parque infantil há apenas devastação.
A alegria arrasada, as brincadeiras destroçadas.
As crianças da Ucrânia, à tarde, já não regressam a casa
pela mão do pai ou ao colo da mãe.

As crianças da Ucrânia já nem sequer precisam da escola
porque estão no hospital e vivem no bunker
nem dos pais porque, sozinhas, vagueiam pela rua,
ou fogem com a mãe, levadas por estranhos
para lugares desconhecidos.

Dima é uma criança da Ucrânia, menino de 8 anos,
que, num hospital de Zaporizhzhia, chora de dor.
Dima não sabe que seu pai,
como ele, também foi ferido, em Mariupol.
Dima não sabe dos cinco mil civis mortos em Mariupol.
Nem das duzentas e dez crianças mortas em Mariupol.
Dima chora e implora: "Onde está o meu pai ?"
"Quando chega o meu pai?"
“Ele vai chegar, como ele disse à mãe”, diz a enfermeira.
Uma criança num hospital de Mariupol chama pelo pai.
O desespero em cada hora, minuto, segundo,
e o pai não chega, a protecção não chega...
no rosto de Dima as lágrimas porque o pai não chega.

Dima grita, como outro Filho, há dois mil anos:
"Pai, por que me abandonaste ?"
Eu sei que Jesus gritou: "meu Deus,
meu Deus por que me abandonaste?"
Talvez Deus, o Pai, escute Dima.

Dima não sabe por que o pai não vem
porque Dima também não sabe 
que 
em vinte e quatro de Fevereiro de dois mil e vinte e dois,
as crianças da Ucrânia encontraram o seu Herodes.

Há pessoas no mundo que não gostam de crianças
Nem sequer parecem pessoas.
Que mal fazem as crianças que apenas querem ir à escola
e brincar com os amigos?
Que mal têm as crianças quando esperam pelos seus pais?

Na Ucrânia, a alegria das crianças
deu lugar ao som das bombas,
às noites e aos dias acordados, há tantos dias.
E, nos próximos anos, virão outros dias
sem conseguir dormir.
Aquilo que os olhos viram e não deviam ter visto
aquilo que os ouvidos ouviram e não deviam ter ouvido
vai ficar delas para sempre.
As marcas que lhes fizeram vão ser delas para sempre.
As falhas, os traumas vão ficar abertos por muitos anos.
Nesse lugar onde devia estar o colo da mãe,
a segurança do pai, o carinho dos avós...
vão encontrar apenas o vazio, a injustiça, a miséria,
de um tempo que devia ser de bondade, de felicidade, 
duma infância que não tiveram
porque a roubaram os sem vergonha.

Aprenderam, no sofrimento, que há canalhas
que fazem sofrer os outros 
Que o mundo não é uma escola
onde ensinam a respeitar os outros:
as crianças, os mais velhos, os mais frágeis.
Onde ensinam a pedir desculpa 
pelo mal que fazemos,
pelos erros que cometemos.
Ficaram a saber, da pior maneira,
que há pessoas que 
as forçaram a fugir 
da sua escola, da sua casa e da sua terra.
E lhes roubaram o sorriso.








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