09/05/18

Fazer e avaliar em vez de desfazer e apagar (2)

A qualidade da educação e do ensino é um dos principais objectivos da sociedade. Qualquer governo decente deve criar ou assegurar os instrumentos necessários para atingir esse objectivo tendo em conta que, numa democracia, não tem sentido impor ideias de forma autocrática.
Nem sempre tem sido assim. De facto, vamos tendo um pouco de tudo: "paixão pela educação", "escola na sociedade de classes",  educação "cívica" do "homem novo", metas que viram competências e competências que viram metas, currículos grandes, currículos pequenos, avaliação de desempenho burocrática, feita pelos pares, uma das maiores fontes de conflito nas escolas, colocação de professores, centralizada, com critérios diferentes todos os anos, contagem de tempo de serviço, que ninguém entende que raio de contagem é...
Apesar de tudo, e isso é o mais importante, o ensino tem vindo a obter resultados que, graças ao trabalho de alunos, professores, explicadores e pais, são muito encorajadores.

Nuno Crato dá conta ("Contra argumentos não há factos" - O Observador ) de como algumas alterações na exigência, isto é, na qualidade da educação, levaram a resultados que começaram a ter expressão em provas internacionais como o  PISA E TIMSS:
"Relembremos alguns factos. Qual era a situação relativa do nosso país? No TIMSS, em matemática do 4.º ano, de entre os países participantes, estávamos no antepenúltimo lugar com 475 pontos. Atrás de nós, havia apenas a Islândia e o Irão.
No PISA, em 2000, de entre os países participantes que pertenciam então à OCDE, Portugal ocupava a antepenúltima posição em ciências e a leitura. Em matemática, só tinha três países atrás.
A taxa de abandono escolar precoce era 43,6% em 2000. Quer isto dizer que apenas 56,4% dos jovens entre os 18 e os 24 estavam a estudar ou tinham completado o Secundário. Na União Europeia apenas Malta tinha um resultado pior.
Em 2000, as taxas de reprovação eram escandalosamente altas. Atingiam cerca de 10% no 4.º ano, 16% no 9.º e 50% no 12.º.

Entretanto, tudo ou quase tudo melhorou. Fruto de um esforço persistente das escolas, dos professores, dos pais e de vários governos, chegámos a 2015 com um panorama totalmente diferente.
No TIMSS, em matemática do 4.º ano, passámos do antepenúltimo lugar para um lugar cimeiro, acima da média, com 36 países atrás de nós. Passámos de 475 para 541 pontos. Passámos à frente da mítica Finlândia!
No PISA, das últimas posições ocupadas em 2000, passámos em 2015 para cima da média da OCDE. Em leitura, subimos de 470 para 498 pontos. Em matemática, progredimos de 454 para 492 pontos. E em ciências, passámos de 459 para 501 pontos.
A taxa de abandono escolar precoce melhorou, descendo dos 43,6% em 2000 para os 28,3% em 2010 e 13,7% em 2015. Passámos à frente da Espanha e da Itália.
As taxas de reprovação também melhoraram. Em 2015, no 4.º, 9.º e 12.º anos, desceram para 2%, 10% e 30%. Ou seja, no 4.º ano, e com a Prova Final da altura, reduziu-se a retenção para quase um quarto do que era; no 9.º e no 12.º, reduziu-se para dois terços do que era."

Crato tinha a sua ideia do que era o sector da educação, desde o tempo do programa televisivo "Plano Inclinado", e apesar de críticas justas de muitos profissionais  como, em algumas questões, as de Santana Castilho, teve o mérito de contribuir para a qualidade do ensino.
Mas o que dizer dos actuais "funcionários" deste ministério e de alguns dedicados “ajudantes progressistas", na assembleia da república? Não fazem ideia nem parece que venham a fazer sobre o futuro da educação, sobre a qualidade da educação, nem que tenham a percepção do alcance pernicioso que costuma vir da demagogia das medidas que tomam.

A Sociedade Portuguesa de Matemática já veio dar conta dos estragos que estão a ser feitos: "SPM considera, o projeto de decreto-lei Currículo dos Ensinos Básico e Secundário, um passo atrás.
Em suma, a SPM não pode deixar de lamentar veementemente e de forma pública este intempestivo e progressivo desmantelamento dos pilares em que se apoia a Escola portuguesa e dos progressos tão duramente conquistados pelos nossos alunos e respetivas famílias e escolas – num processo que, se não cessar com brevidade, trará consequências que levarão décadas a corrigir." ( Rui Cardoso)
Não concordei com muitas medidas de Nuno Crato. Discordei, por exemplo, quanto à questão do eduquês, cliché que só serve para mistificar (o falhanço de pedagogias erradas, a desorganização de recursos humanos, mudanças sistemáticas nos currículos), discordei de Crato quanto à questão do construtivismo, quanto à questão de falta de relevo dada às artes, e ainda por insistir nas medidas erradas que vinham do governo anterior, como a avaliação de desempenho, a prova de acesso à carreira profissional...
Críticas mas também elogios mereceu essa política educativa e sobre o assunto escrevi, por exemplo, nestes textos:

O que não se esperava era que sob o manto diáfano da fantasia da "escola na sociedade de classes", a confusão se instalasse na 5 de Outubro, dando espaço ao apagamento do que de positivo tinha sido feito, já que na sede da fenprof e para a maioria conveniente da assembleia da república, não há confusão nenhuma, é tudo "muito simples e muito claro!", como diria António Guterres.

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