11/01/18

“Reinventar o futuro”

O Presidente da República, na habitual mensagem de Ano Novo, trouxe para o discurso político e também social e cultural, um tema inusitado: a segurança e a “coragem de reinventar o futuro”. O Presidente referiu que 2018 tem de ser “o ano dessa reinvenção mais do que mera reconstrução. Reinvenção pela descoberta desses vários Portugais, esquecidos. E da confiança dos portugueses nessa segurança”. “Reinvenção da confiança dos portugueses na sua segurança, que é mais do que estabilidade governativa, finanças sãs, crescente emprego, rendimentos. É ter a certeza de que, nos momentos críticos, as missões essenciais do Estado não falham nem se isentam de responsabilidades“. (Mariana de Araújo Barbosa, "Discurso de Ano Novo: Marcelo apela à coragem de reinventar o futuro", ECO)
Como será isso feito? Creio que uma das condições para que isso aconteça (a reinvenção da confiança nos momentos críticos) deverá ser a mudança a nível da vida pessoal.
Como escrevia Cecília Meireles na poesia  “ Reinvenção”: “A vida só é possível/reinventada.”
Reinventar a vida  é  reencontrar-se consigo próprio. Cada ser humano tem as suas características próprias e por isso deverá encontrar as suas próprias formas de se reencontrar.
Ao longo da vida do indivíduo, algumas destas formas podem ser mais  ou menos inconscientes: Na infância, por exemplo, perante as perturbações graves a que muitas crianças ficam expostas, na adolescência, no difícil reencontro consigo próprio e na busca de uma identidade,  no sofrimento de um divórcio, no falecimento do pai, da mãe ou de um filho. Tudo tem que ser sistematicamente reinventado,  e para isso o indivíduo tem que se reencontrar consigo próprio.

Alguns aspectos importantes para essa reinvenção. 
Antes de mais, encontrar um sentido para a vida é da maior importância (Victor Frankl). O traço que define a humanidade é a capacidade de encontrar um sentido na vida”. Para o controverso Erich Fromm, “isso define também o facto de que sigamos um caminho de alegria e plenitude ou um caminho de insatisfação e conflito. Fromm acredita que apesar da dor ser inerente à vida, podemos torná-la suportável dotando-a de significado na procura e na construção de um eu verdadeiro. O fim último da vida humana seria desenvolver a qualidade mais preciosa de que o homem está dotado: o amor à vida". (“A principal tarefa do homem é dar à luz a si mesmo”, O livro da psicologia, p. 126)

O homem tem  capacidade de amar. “A capacidade de amar é uma capacidade criativa interpessoal que deve desenvolver-se activamente como parte da própria personalidade” sendo que "o único modo de amar é amar livremente reconhecendo a plena individualidade do outro respeitando as suas opiniões, preferências e crenças" (p. 128)

Finalmente, quando se sofre uma perda brutal, as pessoas ficam agarradas àquele momento, então é importante a capacidade de reinventar uma vida que parecia estar parada.
Se retrouverAs perdas, as feridas profundas  sofridas por algumas pessoas, com consequências traumáticas para a sua vida, não se transformam de um dia para o outro mas levam tempo a sarar, é um processo feito pouco a pouco,  passo a passo.
Uma pseudo-resiliência pode acontecer: "uma aparência de resiliência que esconde de facto uma rigidez anormal dos mecanismos psíquicos e um grande sofrimento” (Anne-Claire Thérizols, "Revivre après une épreuve : avec le temps, va, tout s'en va ?", le cercle psy, p. 23)
Marcelo usa a palavra certa: coragem. É, de facto,  necessária coragem para reinventar o futuro, através da transformação do quotidiano e do reencontrar-se.
Reencontrar-se é, sem dúvida, o caminho a seguir para reinventar o futuro. Há muitas maneiras de o fazer e cada um descobrirá a sua.
Pode ser através da meditação para despertar a consciência e atenção plena, pode ser a dedicação a um desporto, ou a prática de  actividades de uma universidade sénior, ou aprender com a natureza,  cuidar da biodiversidade, despertar os sentidos com a agricultura biológica e a vida em meio natural, viajar, fazer Erasmus ou um ano sabático, encontrar uma vocação artística ou espiritual, ou descobrir as virtudes da solidão... (J-F Marmion, “Les vertus de la solitude”, Entretien avec Alain Delourme, le cercle psy, p.46)
                                                   

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