01/11/17

Para um sistema de saúde (2)


Alguns subsistemas de  saúde

O sistema de saúde em Portugal é constituído por uma rede de equipamentos e serviços de saúde, composta de vários subsistemas de saúde que concorrem para a protecção da saúde de todos os cidadãos.
Em 1979, "foi instituída uma rede de instituições e serviços prestadores de cuidados globais de saúde a toda a população, financiada através de impostos, em que o Estado salvaguarda o direito à proteção da saúde." Foi, assim, criado o Serviço Nacional de Saúde (SNS). (Lei n.º 56/79, de 15 de Setembro)
No entanto, em paralelo, existem outros subsistemas privados de saúde que têm acordos e convenções com hospitais, clínicas e médicos privados, tais como: subsistema dos seguros de saúde; subsistemas complementares de saúde, como a ADSE; subsistemas de seguradoras - acidentes de trabalho, viação/pessoas e vida; convenções com empresas, associações e outras entidades.
Alguns destes equipamentos e serviços são parcerias público-privadas (PPP), isto é, equipamentos e serviços de saúde concessionados pelo estado à gestão privada.
Inclui ainda acordos com IPSS que desenvolvem actividades no âmbito da saúde, como é o caso das misericórdias que respondem por actividades hospitalares, de cuidados continuados, de cuidados paliativos...
Há áreas que são praticamente asseguradas por privados como é o caso da medicina dentária. ("Os Seguros de saúde privados no contexto do sistema de saúde português", p.7)
E deve-se ainda referir o importante contributo dado pelas farmácias ao sistema de saúde.

Toda esta rede de cuidados de saúde significa que a assistência na saúde de muitos cidadãos é efectuada pelo SNS e/ou por outro subsistema de saúde. "A coexistência no sistema de saúde de serviços públicos com serviços e entidades privadas justifica que o SNS não preste a totalidade dos cuidados… 76% da população tem como único pagador o SNS, os restantes 24% utilizam outros sistemas… (14% da população está abrangida pela ADSE, 5% pelo SAMS (trabalhadores bancários). Com excepção da ADSE, nenhum outro sistema é auto-sustentável, confinando o SNS aos maiores níveis de cuidados." ("O sector da saúde em Portugal: funcionamento do sistema e caracterização sócio-profissional", p.8)
Quando pelo menos um quarto da população tem outro subsistema de saúde que não o SNS, não deixa de ser curioso que todos os cidadãos sejam obrigados a ter médico de família  do SNS, mesmo que não queiram ou que nunca tenham necessidade de ter outro médico de família para além daquele que sempre foi o seu médico.Tudo isto é contraditório e chocante quando sabemos que faltam mais de mil médicos de família para suprir as necessidades que existem, ou seja cerca de um milhão de cidadãos não têm médico de família.

O que podemos concluir é que temos governos que não confiam nos médicos, que gostam de sobreposições e redundâncias de serviços e não sabem articular serviços.
Dois exemplos ajudam a perceber o que se passa: as baixas por doença e as listas de espera para consultas e exames clínicos.
Se uma pessoa faz uma intervenção cirúrgica num hospital particular, porque tem um seguro de saúde, apenas no centro de saúde, em consulta com o/um médico de família, mesmo que não lhe tenha sido atribuído, pode validar a baixa por doença.

Há milhares de situações como esta em que os doentes estão sujeitos à burocracia do SNS, via centro de saúde. Não seria mais fácil se a baixa fosse declarada pelo próprio médico do doente ou pelo médico que fez a cirurgia, fosse de que subsistema fosse?
Só encontro uma explicação para não ser assim: a desconfiança dos médicos que não são considerados responsáveis pelo estado e passam baixas fraudulentas. Ora acontece que... com a burocracia do actual SNS "um quinto das baixas médicas controladas estava apto para o trabalho".(Público)

Algumas populações continuam com dificuldade de acesso ao centro de saúde e a consultas externas especializadas ou exames de diagnóstico nos centros hospitalares. Marcar uma consulta no SNS, centro de saúde ou hospital, é um verdadeiro tormento.
Como é possível ainda acontecer que haja cidadãos que têm que aguardar à porta do centro de saúde pela marcação de uma consulta ?
Incapacidade, atraso, ou apenas por maldade se pode fazer isto aos cidadãos mais desprotegidos.
Qualquer funcionário com um mínimo de capacidade saberia resolver esta situação.
Infelizmente continuamos a ouvir notícias destas (p.ex. "Chegar "às quatro da manhã" ao centro de saúde para ter consulta") sobre o pior de nós mesmos.

Desde o início, o problema do SNS foi o despesismo (A história secreta do SNS). Mas também o mau funcionamento que cria dificuldades injustificadas aos doentes, pela
- desconfiança na deontologia profissional dos médicos pois tem necessidade de confirmar por outro profissional o acesso a baixas por doença. Preferência pela burocracia, duplicações e redundâncias quando os médicos dos subsistemas particulares e privados podiam ser os médicos de família de muitos cidadãos que o não têm, podiam comprovar o que se passa com os seus doentes;
- incapacidade de gerir um simples acesso a consultas e exames clínicos obrigando os doentes a intermináveis listas de espera ou a estarem em bicha a horas impróprias, em condições climáticas igualmente impróprias para marcação de consulta.
Assim, os centros de saúde/estado não sabem gerir, articular, poupar... de forma a que a assistência na saúde se traduza num funcionamento eficiente e eficaz.
Com o actual governo foi-se ainda mais longe: a cativação de verbas do sector da saúde torna o SNS, cada dia que passa, mais disfuncional para quem nele trabalha ou dele necessita.


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