25/05/16

Liberdade de escol(h)a

1. O mais possível. Na administração pública, na educação, na saúde, na TV ou no supermercado. Poder escolher o notário onde quero fazer uma escritura, tratar da documentação na loja do cidadão que me interessa, pagar facturas da forma que me convém ... são indícios de uma administração avançada e do bom funcionamento da democracia.
A liberdade de escolha deve poder ser feita, desde logo, entre os vários serviços dos estado.
O recente despacho sobre a liberdade de escolha na saúde, de poder ir ao Hospital que acho que responde melhor ao que eu pretendo, felizmente, mostra um grande progresso no acesso à saúde e mostra que é possível a liberdade de escolha entre serviços de saúde.
Mostra também que há um país e dois sistemas administrativos: um centralizado e burocrático, como a educação e outro que respeita a liberdade de escolha do cidadão. Vale a pena ver a diferença de linguagem dos fundamentos do despacho que permite a liberdade de opção na saúde:
"...O poder do cidadão só será efetivo se este tiver acesso a informação relevante para a sua tomada de decisão e se o Livre Acesso e Circulação (LAC), nos diversos níveis do sistema, ocorrer de forma transparente e responsável, com a efetiva possibilidade de o utente poder optar pela instituição do SNS onde pretende ser assistido, com respeito pela hierarquia técnica, pelas regras de referenciação em vigor e pelas preferências dos utentes, baseadas em critérios de conveniência pessoal e da natureza da resposta das instituições. (Despacho n.º 5911-B/2016)
2. No campo da educação estamos noutro país. A educação é o sector mais centralizado do estado. É o único sector onde os profissionais são colocados em concurso nacional pelos serviços centrais. As tímidas tentativas da contratação a nível de escola, são postas em questão.

3. A liberdade de escolha é um critério que dá qualidade aos serviços. As escolas do estado vão perdendo alunos porque pais e alunos, quando podem, preferem outras escolas, como, e é apenas um exemplo, as escolas com contrato de associação.
A questão da liberdade de escolha coloca-se entre escolas estatais: Por que motivo, os pais e os alunos não podem escolher uma escola fora da sua área de residência ou, então, têm que utilizar subterfúgios para poderem fazer essa escolha ? O que se passa para haver escolas estatais lotadas e outras que perdem alunos ?

4. Todas as escolas são públicas. A diferença está na gestão estatal ou particular e cooperativa. É mesmo dificil saber onde acaba o estatal e onde começa o privado. Por exemplo, essa "instituição" nacional chamada explicações é privada mas faz um grande trabalho para o estado, sem a qual os níveis de insucesso seriam bem mais elevados. De facto os pais pagam duas vezes a escola dos filhos: quando pagam os impostos e quando pagam as explicações. Esta é que é a dupla tributação. Apesar disso, os pais fazem esta opção porque a escola do estado deixa muito a desejar. O estado gosta de apresentar bons resultados mas em troca ajuda pouco os alunos.

5. Entretanto, o ministério descobriu a pólvora. Vai criar tutorias. Criar? Como muito bem aqui se diz («novidades» ressequidas?, 20 MAIO, 2016, Gabriel Silva)
«Governo cria figura de professor-tutor para ajudar alunos com dois chumbos
O projecto, orçado em 15 milhões de euros, começa a ser aplicado no próximo ano lectivo.»*

A sério que «cria»? Eu diria que está em vigor ainda uma série de decretos-lei e portarias que regulam precisamente a tarefa e papel do professor-tutor. Mas pode ter sucedido que o novo ministro, no seu afã de tudo mudar, tenha extinto tal figura e agora a torne a criar., anunciando-a como uma «novidade». E assim se entretém na arte da propaganda.
De facto é o Dec.lei nº115 A/98: artigo nº36, ponto 4, que cria a possibilidade das escolas designarem professores tutores.
O Dec. Regulamentar nº10/99, no artº 10º, prevê a designação de professores tutores responsáveis pelo acompanhamento, de forma individualizada, do processo educativo de um grupo de alunos, de preferência ao longo do seu percurso escolar.
O Despacho Normativo n.º 50/2005, 9 Novembro: Artigo 2.º – Plano de recuperação, Ponto 3 – O plano de recuperação pode integrar, entre outras, as seguintes modalidades: b) Programas de tutoria para apoio a estratégias de estudo, orientação e aconselhamento do aluno.
O Decreto-Lei n.º 75/2008, 22 de Abril, (que revoga os dois primeiros diplomas), Artigo 44.º – Organização das actividades de turma, Ponto 4 – No desenvolvimento da sua autonomia, o agrupamento de escolas ou escola não agrupada pode ainda designar professores tutores para acompanhamento em particular do processo educativo de um grupo de alunos.

6. E a seguir vai cometer um grave erro : termina com o chamado "ensino vocacional".
O problema da retenção dos alunos e, mais do que isso, o problema da desmotivação dos alunos e do desinteresse pela (e da) escola, não se resolve, com excepções, com tutorias ...
Foram dadas algumas respostas: CEF, PCA... que "safaram" alguns alunos da desmotivação, do insucesso escolar e não só...
A resposta "ensino vocacional" ia nesse caminho, como uma forma mais estruturada de responder às aspirações dos alunos e à liberdade de escolha. 
Com as respectivas diferenças, já tinha acontecido depois do 25 de Abril com a extinção do ensino industrial e comercial. Aí estamos de novo.

7. Já agora, o ME não seria mais coerente se acabasse com os contratos de autonomia e revertesse os existentes?

8. De facto, também foram socialistas que fizeram o Dec.lei nº115 A/98 (Regime de autonomia das escolas). Mas não era a mesma coisa: Ou eram outros tempos e "mudam-se os tempos mudam-se as vontades" ou era outra gente.

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