18/12/13

Violências familiares


A exposição a modelos de aprendizagem perigosos para o desenvolvimento das crianças tem vindo a merecer o interesse dos educadores.
O número de crianças que sofrem maus tratos deste tipo, isto é, estão sujeitas a modelos de comportamento que podem comprometer a saúde, segurança, desenvolvimento e bem-estar e que são sinalizadas às comissões de protecção de crianças e jovens, tem vindo a aumentar.
Os maus tratos no sistema familiar nem sempre são visíveis e as suas possíveis facetas nunca são avaliadas simultaneamente nem a longo prazo. (J.F. Marmion). Os números muitas vezes não dão a dimensão do fenómeno dado que as violências familiares, exactamente porque são familiares, são menos visíveis. É, por isso, necessário ver para além dos números.
São também menos visíveis quando os comportamentos violentos se tornam banalizados através da sociedade da informação em que vivemos: no cinema, na televisão, nos jogos electrónicos e na internet.
Ou ainda porque se considera que a violência familiar é assunto interno da família e por isso para alguns pais faz todo o sentido que os filhos sejam punidos física ou psicologicamente através da humilhação, da desvalorização, da destruição da autoestima, do insulto, da falta de cuidados de alimentação, higiene, de afecto, o excesso de exigência nos estudos, e nas actividades das crianças...
Ou que assistam a comportamentos de violência doméstica de um dos progenitores em relação a outro ou dos dois, com discussões quotidianas que assustam as crianças e as enchem de medos. Medo de perder os progenitores, medo de estar em casa ou de voltar para casa.

Além disso, a investigação tem demonstrado que muitos comportamentos são adquiridos através da observação e imitação. A aprendizagem pode ocorrer por modelação, isto é, por observação de um modelo. Permite aprender rapidamente comportamentos complexos, que seriam adquiridos de forma mais lenta por outros processos.
A investigação de Bandura veio relevar que as práticas de modelação pelos pais influenciam o desenvolvimento das crianças, como se adquirem e desenvolvem os processos de linguagem e pensamento mas também como os princípios do auto-reforço podem ser usados para tratar vários problemas psicológicos.

Em entrevista, Karen Sadlier diz que "a violência conjugal é um mau-trato para a criança...
... diferencia-se violência conjugal e mau trato da criança, com a ideia de que se pode ser um bom pai mesmo sendo um cônjuge violento. No entanto, estudos norteamericanos mostram que as crianças testemunhas de violências conjugais estão em sofrimento. Pode ser psicológico mas também físico porque metade das crianças cuja mãe sofre violências são igualmente vítimas de castigo físico pelo pai ou companheiro da mãe.
Estas crianças  falam disso tanto menos quanto, em toda a violência familiar, se impõe a lei do silêncio"...

Por outro lado, parece que têm sido pouco eficazes as penalizações legais que são aplicadas também neste caso, dado o crescente número de situações, a sua invisibilidade e o facto de serem "familiares".
É por isso que a grande esperança na mudança passa sempre pela educação através de programas dirigidos à criança e aos pais. 

Decorreu no IPJ de Castelo Branco um colóquio sobre as realidades invisíveis, isto é, sobre a violência doméstica e as suas consequências.
Foi apresentada uma peça de teatro “ Não chove de baixo para cimaem que é retratada a vida de uma mulher que vive obcecada pelos traumas vividos na infância causados por uma mãe esquizofrénica. 
A peça mostra até que ponto esta mãe doente pode influenciar os comportamentos da filha.
Mas também de como é possível recuperar a saúde mental através do trabalho psicológico e dos contextos de vida que é possível encontrar quando estamos disponíveis para os procurarmos.
Felizmente, nem sempre estes modelos geram comportamentos irreversíveis e também nem sempre uma criança vítima se torna agressor.

Um país vale o que vale a qualidade de vida das suas crianças e jovens (Armando Leandro).
Para se construir um país com qualidade, com valores éticos, morais e harmoniosos é necessário que os modelos comportamentais parentais sejam transmissores desses valores e não da violência conjugal, suficientemente grave em si, mas que acrescenta  mais violência porque não se trata apenas de um problema do casal mas de um problema que envolve toda a família.

Sem comentários:

Enviar um comentário