26/11/25

A temperança do 25 de Novembro

 

Foi há 50 anos. Como disse M. João Avillez no Expresso da meia noite (SIC), com o general Tomé Pinto, o 25 de Novembro foi uma guinada para meter o carro, novamente, na auto-estrada da democracia. Quem é pelo 25 de Abril é pelo 25 de Novembro. E quem é pelo 25 de Novembro é pelo 25 de Abril. São dias "inteiros e limpos", por mais que inventemos divergências inultrapassáveis.

A democracia é o regime que permite análises e interpretações diferentes da realidade social, política, etc. Porém, até onde pode a realidade ser vista com tantas diferenças?
O Presidente da Assembleia da República José Pedro Aguiar-Branco refere que, cinco décadas volvidas, ainda "é estranho ouvir dizer que o 25 de Novembro é uma data que "divide" em vez de "agregar”. E acrescenta: "Sou de Abril, sou de Novembro. Sou hoje e sempre pela democracia representativa, porque Abril abriu a porta da liberdade e Novembro permitiu que houvesse chão firme para continuar".

As tentativas para alguém impor a sua visão dos acontecimentos é uma forma de manipulação.
“Alguém que vive uma vida de mentiras tenta manipular a realidade através da percepção, do pensamento e da acção de modo a que apenas um resultado desejado, e predefinido, possa existir.” (J. Peterson, 12 Regras para a vida, "Regra 8 - "Diga a verdade - ou pelo menos não minta", p. 270)
Querem que exista apenas uma verdade: a sua. Como refere J Peterson “Já vi pessoas definirem a sua utopia e depois transformarem a realidade”. (p. 271)
Ser jovem, e sonhar com radicalismo, não era, e pelos vistos não é, tão inusual, porém não faz muito sentido ouvir pessoas da dita esquerda usando a velha versão do tempo em que eram jovens na faculdade e, cheios de ressentimento, não são capazes de ver o que foi o PREC, o COPCON, a 5ª Divisão... ou uma sociedade totalitária e com liberdade condicionada.

Há duas maneiras de ver a realidade. “Aquilo que queria, aconteceu? Não. Então o meu objetivo, os meus métodos estavam errados. Ainda tenho algo para aprender. Essa é a voz da autenticidade.
Aquilo que queria aconteceu? Não. O mundo é injusto. As pessoas têm inveja e são demasiado estúpidas para entender. A culpa é dos outros. Essa é a voz da inautenticidade, que não se diferencia muito de “os outros devem ser detidos”, ou “os outros devem ser castigados, ou, “os outros devem ser destruídos”. Sempre que houve algo incompreensivelmente brutal, é esse tipo de ideias que se manifesta” (p. 276)

Foi particularmente interessante o que disse o Presidente Marcelo na Assembleia da República, em relação a uma visão de sociedade aberta, democrática e livre onde prevalece a temperança.
Para o psicólogo M. Seligman, a temperança manifesta-se através de forças de caráter como perdão, humildade, prudência e autorregulação, ajudando as pessoas a gerir paixões, desejos e impulsos para tomar decisões conscientes e construir um bem-estar duradouro. 
A temperança é o equilíbrio, moderação e autocontrole que nos permite ver o que está ou esteve errado, o que não deu certo, o que é voltar aos tempos indesejados, de antes do 25 de abril, de ditadura, de pobreza e de falta de liberdade, ou voltar aos tempos igualmente indesejados que sucederam ao 25 de Abril.



Até para a semana.





20/11/25

Os idosos e o futuro

 

No meio da confusão geral em que vai o mundo (1) é necessário continuar a procurar o equilíbrio pessoal e familiar. É difícil, no meio dos vendavais naturais e sociais, continuar a manter esse equilíbrio e com isso podermos ter alguma esperança no futuro. 
Somos confrontados na nossa família com a vida diária em situações de doença ou de velhice. Por isso servir e cuidar dos mais frágeis devem ser os grandes objectivos da família, das instituições sociais, de saúde e policiais...

Para a minha geração o cenário não é agradável. Podemos rever-nos e rever a nossa vida nos mais velhos, com todas as suas fragilidades, e pensar o que significa envelhecer bem... Será que vou ter alguém que cuide de mim ? Não devo preocupar-me com isso? Não quero ir para um lar, ok, mas se for, será que, ao menos, consigo uma vaga num lar? E que humanização vou encontrar ? 

Tudo questões de difícil resposta principalmente quando sabemos que a dependência dos idosos se deve sobretudo à demência.
Sabemos as estatísticas da demência: Há 55 milhões de pessoas com demência no mundo. (Margarida Cordo, "Os mais velhos na família e no mundo", in Identidade e Família, p.166)
Quando na nossa família há idosos em idades avançadas, começamos a aperceber-nos dos sintomas, dos défices, em varias áreas:
A perda de memória é talvez o mais conhecido: Esquecer compromissos, dificuldade em reter memórias recentes ou repetir o mesmo assunto. 
Dificuldades de raciocínio: Problemas com números, com as finanças ou tratar de assuntos com o banco.
Desorientação: Perder-se em locais familiares, não saber onde é o quarto ou a cozinha ou ter dificuldade em entender onde se está.
Dificuldade com tarefas diárias: Esquecer-se de como realizar ações habituais, como cozinhar ou vestir-se ou tomar a medicação...
Começamos a aperceber-nos destas dificuldades, que por vezes já acontecem connosco, e por aí podemos ver o filme da nossa vida num futuro não muito distante.
Não existe cura para a demência, mas é possível combatê-la com uma combinação de tratamento médico, hábitos de vida saudáveis e intervenções comportamentais: manter-se fisicamente activo, procurar estímulos cognitivos, participar nas atividades sociais e manter rotinas diárias. 
É aqui que a família desempenha um papel decisivo. A família tem muitos papéis a desempenhar relativamente aos idosos. Espera-se dela apoio na doença mesmo em fases avançadas e irreversíveis.
É também necessário tomar medidas que possam melhorar a vida quando chegamos a velhos.

Sabemos que 70% dos mais de 200 mil portugueses que carecem de cuidados paliativos continuam sem acesso (I. Galriça Neto, "O apoio à família nas situações de doença crónica e avançada", in Identidade e Família, p. 174) 
Entretanto, há intervenções que merecem ser elogiadas. Em 2025, foram sinalizados pela GNR mais de 43.000 idosos que vivem sozinhos ou em situação de vulnerabilidade. No distrito de Castelo Branco foram detectados 2.316 idosos que vivem sozinhos.
A GNR está a fazer contacto direto com estas pessoas para as alertar para a necessidade de adotarem comportamentos de segurança, minimizando o risco de se tornarem vítimas de crimes. (Lusa, 18-11-2025Que por incrível que possa parecer, existem com alguma frequência.  (APAV)
Era desejável criar Serviços e Equipas de Apoio Social e Comunitário a partir das autarquias (2)  de forma a que todas as pessoas pudessem sentir menos a solidão e, assim, haver futuro para os idosos.


Até para a semana.

___________________________
(1) Como escreve João Távora no "corta-fitas", "tempos de turbulênicia".

Mas seria importante trabalhar em rede envolvendo Serviços do Município, da Segurança Social, da Saúde, da Segurança, etc. para, assim, melhorar o futuro dos idosos ou a vida das pessoas em situação vulnerável.


Rádio Castelo Branco



13/11/25

O amor não é frágil... mas pode ser mágico



Expensive Soul - O amor é mágico


Como costumamos dizer, passamos a vida toda a aprender e, obviamente, a aprender a amar também. Mesmo quando chegamos aos cinquenta anos de casados? Talvez ainda com mais premência depois de passadas tantas experiências em contextos diferentes, simpáticos ou adversos, é, no entanto, sempre  nesta capacidade de nos ligarmos ao outro que se baseia toda a nossa vida afectiva e relacional da qual depende  a nossa saúde mental.

Acontece também que "as relações modernas têm inscritas no seu cerne, um paradoxo  da melancolia: sabemos que o crescimento afetivo requer amor, mas no terreno, encontramos cada vez menos relacionamentos felizes. “ (Alain de Botton . Uma viagem terapêutica, p. 133)


Num relacionamento, o fracasso ou sucesso resume-se  na essência à presença ou ausência de vários factores, cinco âncoras, como lhes chama Alain de Botton.

Estas cinco âncoras permitem manter a embarcação da vida relacional em equilíbrio. São as seguintes: não defensividade, vulnerabilidade, ternura, atitude terapêutica e  entusiasmo.


A nossa postura defensiva é compreensiva e até necessária (defesas do ego)  mas também pode ser parte do fracasso das nossas relações.

Por experiência ou não, a frase " “ama-me por quem eu sou” é o inevitável grito de guerra de todos os amantes que se encaminham para o desastre". Seria injusto "exigirmos ser amados tal como somos, com a nossa panóplia de falhas, obsessões, neuroses e imaturidades... só devemos esperar ser amados por quem desejamos ser, por quem somos nos nossos melhores momentos..." (p.134-135)

"O amor não é frágil, "pode haver ruturas - e reparações. O amor verdadeiro é resistente. Não será destruído por um pormenor... A defensividade pode ser ultrapassada. Podemos aprender a medir no nosso coração a difrerença entre uma queixa e uma rejeição existencial” (p.137)

Os parceiros devem ter a capacidade de ultrapassar a defensividade, podemos chegar a entender o que podemos reconhecer e superar os pequenos defeitos que todos temos, como por exemplo, na forma como deixamos a casa de banho, podemos comentar que temos mau hálito ou que estamos mal vestidos...(p. 138)


Ser vulnerável é descobrir "um lado em nós que remonta à infância..." (p. 140) e podemos e somos capazes de pedir ajuda.


A ternura está, por exemplo, no comportamento de um pai quando vê uma birra do seu filho que empurra  o prato do jantar para o chão e mesmo assim não o castiga nem o considera “mau” 


Ter uma atitude terapêutica depende essencialmente da capacidade de ambos os parceiros adoptarem em momentos críticos uma atitude terapêutica em relação às compulsões, falhas, fúrias e e excentricidades um do outro...


Finalmente, o entusiasmo. Claro que no principio da relação é fácil viver com entusiasmo. Porém a pouco e pouco "deixamos de nos maravilhar porque nos enredamos inconscientemente em várias formas de irritação não assimilada (p. 148): porque nunca pede desculpa; porque decidiu sem nos consultar; porque... porque...

 

Devemos deixar um tempo para falar daquilo que não correu bem,  não para fazer queixas, não para voltar ao “histórico” que sempre é relevado quando nos irritamos  e vamos buscar pormenores da relação de muitos anos atrás...

Mas em vez disso devemos verbalizar os nossas irritações com regularidade. Tentando compreender o que esteve na atitude do outro.

 

Até para a semana. 

 

 


 

Rádio Castelo Branco







05/11/25

Relação presencial e "efeito aldeia"

 

A vida actual, em que estamos sempre online, leva as pessoas ao isolamento social e afectivo, por mais paradoxal que isso seja. As novas tecnologias, designadamente o telemóvel, a possibilidade de fazer quase tudo online: encomendar o almoço no restaurante, as compras no supermercado, fazer pagamentos, meter combustível ou levantar dinheiro... As reuniões e o trabalho online, a automação e o crescimento do número de pessoas que vivem sós, leva a que os contactos pessoais sejam cada vez mais reduzidos. 


Ora sabemos, há muito tempo,  que a criação de vínculos sociais e afectivos e o relacionamento face a face são importantes para a saúde mental e para uma vida  mais feliz.

Num estudo (1) que é feito desde 1938, época da Grande Depressão, até à actualidade, procurou-se compreender as relações entre saúde física e mental, entre saúde e felicidade. 

As conclusões  têm mostrado que os relacionamentos íntimos, mais do que a fama ou dinheiro, são a fonte da felicidade ao longo da vida. Estes laços protegem as pessoas das frustrações, ajudam a retardar doenças físicas e mentais e são parâmetros mais eficientes na análise da longevidade – mais do que classe social, QI ou até mesmo a genética.

Para o psiquiatra Robert Waldinger, o nível de satisfação com os relacionamentos, na idade de 50 anos, foi mais importante para avaliar a saúde física do que níveis de colesterol por exemplo... As pessoas mais satisfeitas aos 50 anos eram os mais saudáveis aos 80.

As pessoas que mantêm relacionamentos calorosos vivem mais e com mais felicidade e aquelas que se sentem solitárias morrem mais cedo. 


Por tudo isto, os amigos são muito importantes.

Podemos falar de três níveis de amizade (2) (Arthur Brooks): O primeiro é o dos amigos com base na utilidade, que nos ajudam a conseguir determinadas coisas, com os quais trocamos favores, que estão sempre disponíveis e para quem o estamos também.

O segundo  é o dos amigos com base no prazer, que nos ajudam a descansar, porque partilhamos gostos, saídas, distrações;  são amigos com quem não temos conversas demasiado profundas e, como os nossos gostos e entretenimentos vão variando,  pessoas que entram e saem com facilidade da nossa vida.

Por último, há os amigos “inúteis”, que  são aqueles dos quais não queremos nada de especial: queremo-los a eles; trocamos favores com eles, evidentemente, e talvez partilhemos gostos e interesses, mas a amizade está radicada a um nível mais profundo...

São  estes amigos a quem podemos telefonar a meio da noite quando estamos  doentes ou assustados...


E também é importante a relação face a face. 

A psicóloga Susan Pinker (3) mostrou que o contacto e a integração sociais são muito mais importantes para a longevidade e o bem-estar do que fatores como dietas e exercícios físicos.

Fala do “efeito aldeia”  ou seja da necessidade de contactos pessoais  e presenciais que  superam, sem dúvida, os contactos online


Até para a semana

_____________________________

(2) Classificação de Arthur Brooks, referida por Isabel Sánchez, Cultura do Cuidado, p.141-142.

(3) "Susan Pinker destaca o valor das relações presenciais para a longevidade"; "Susan Pinker tem o segredo da vida"



Rádio Castelo Branco