11/09/08

Filhos preferidos, leis iníquas e comportamentos imorais

1. A igualdade dos filhos face à lei, decorre de Declarações e Convenções internacionais e da Constituição: “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”. [1]
Assim, as pessoas são iguais face à lei e, nas mesmas circunstâncias, têm os mesmos direitos. No entanto, assim não acontece no que diz respeito a heranças. [2]
Os pais podem dispor de uma parte da herança (parte disponível) e fazer dela doação a um filho preferido. Na prática, se existirem dois filhos um pode herdar 2/3 e o outro 1/3.
Portanto, de facto, os filhos não são iguais face à lei quando os pais se comportam como verdadeiros discriminadores dos direitos fundamentais dos filhos.
Mas, dir-me-ão, que a lei está bem quando prevê a possibilidade de, por exemplo, num gesto filantrópico, uma pessoa poder deixar os seus bens a uma instituição de caridade ou outra que beneficie igualmente a sociedade…. Neste caso estamos de acordo.
O que se passa é que a lei também pode ser usada pelos pais para esbulharem os filhos de que não gostam, influenciados ou não pelos filhos preferidos.
2. Não se exige a ninguém que tenha padrões elevados de desenvolvimento e comportamento moral.
E, de facto, no dia a dia da nossa vida, não é o que acontece com uma grande maioria de pessoas que se situa, moralmente, pelo menos ao nível do contrato social.
O problema é que há muita gente que se coloca num nível bastante baixo da moralidade.
Essa gente pode até exercer profissões de destaque na sociedade e pensaríamos nós que elas próprios se orientariam por esses padrões elevados de moralidade. Mero engano. Pautam a sua vida pela dimensão dos seus interesses.
3. São, por isso, os primeiros a dar a “facada nas costas” dos irmãos e dos amigos, quando os seus interesses estão em jogo.
A história de Jacob e Esaú que conhecemos da Bíblia, devia estar sempre presente na compreensão do ser humano e das suas velhas manhas.
Jacob enganou duas vezes o irmão mais velho, Esaú. Numa das vezes incentivado pela própria mãe que sugeriu a melhor forma de enganar o pai, Isaac, que se encontrava cego. E assim aconteceu. Obteve a benção (e a fortuna) do pai com a artimanha de se fazer passar pelo irmão.
4. A família devia ser o melhor meio para cada um de nós. Mas esta visão é enganosa e paradoxal.
É paradoxal porque é aí que deveria residir a ideia de igualdade dos próprios filhos. E onde devíamos esperar amor encontramos discriminação, interesses, ódio…
Podemos ter a melhor impressão dos nossos progenitores. Mesmo quando algum é assassino, ladrão, etc. Mas como compreender que aqueles que nos devem proteger e promover a igualdade entre os filhos têm as mãos livres para os discriminarem ?
Esta situação é também um problema de maus tratos e de abuso: aqueles de quem se espera protecção, tratamento igual, são os abusadores, os que roubam os direitos dos filhos a um tratamento igual, os mentirosos que dizem que são iguais aqueles que, na prática, discriminam.
Por isso, a família pode ser o pior micro-meio que podemos ter na nossa vida. Que o digam os filhos abusados, violados, roubados, discriminados…
5. A discriminação dos filhos apenas serve aos seres moralmente rasteiros, invejosos, gananciosos, ladrões de secretaria, ascensoristas sociais, entre outros…
Quando a leis iníquas se somam comportamentos imorais, temos a fórmula para estilhaçar qualquer relação afectiva que possa existir numa família. Os afectos terminam onde começam os seus interesses. E a família é apenas o meio onde esperam poder meter a mão manipuladora que concretize os seus interesses.
6. Mas, pelo menos, por fim, e é aqui que a história de Esaú e Jacob é diferente, Jacob pediu perdão ao irmão que ele próprio tinha enganado e roubado.
Se queremos que a afectividade esteja no centro das relações familiares, podemos começar por acabar com os filhos preferidos, acabar com as leis iníquas e subirmos um pouco os nossos padrões de comportamento moral.

Carlos Teixeira

[1] Artº 13º Constituição da República Portuguesa.[2] Código Civil, Artº 2156 e seguintes.

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