11/12/24

Um hino à alegria


Gostava de terminar este ano a falar da alegria. Essa emoção extraordinária que nos enche de satisfação, plenitude e confiança, com vontade de seguir em frente, de realizar novos projectos e, se necessário, de mudarmos para sermos melhores pessoas. 
Mesmo quando os motivos que vêm da sociedade e as desavenças exteriores magoam e deixam sobressair a tristeza em que tantas pessoas vivem actualmente. 
Ainda assim, é tempo de Hino à alegria, o 4° andamento da 9ª Sinfonia de Beethoven que foi inspirado num poema de Friedrich Schiller (1785). (1)
De facto, a poesia e a música são a melhor forma de expressão das nossas emoções em especial a emoção da alegria que para Schiller é de origem divina, a alegria é o abraço do amigo que encontra o amigo.

É natural e normal sentir emoções. Elas tornam-nos verdadeiramente humanos e o seu reconhecimento pode ajudar-nos a saber lidar com os acontecimentos da nossa vida e com os pensamentos, agradáveis ou desagradáveis, sobre esses acontecimentos. Elas permitem adaptar-nos aos acontecimentos desestabilizadores expressando-os através do corpo...

Podemos dizer que existem três tipos de emoções: as primárias, as secundárias e as de fundo.
As primárias facilmente perceptíveis pelas pessoas, como: a alegria, expressão do êxito e da partilha; a tristeza, suscitada pela perda de alguém ou de alguma coisa; o medo, reacção face a um perigo; cólera, como resposta muitas vezes a uma injustiça; nojo, que provoca repugnância.
As emoções primárias são completadas por diversas emoções secundárias, mais complexas, implicando outras pessoas, e por isso são chamadas emoções sociais, como a vergonha ,o orgulho, a culpa, o ciúme, a inveja, a gratidão, a compaixão, o embaraço... (A. Damásio, Ao encontro de Espinosa - As Emoções Sociais e a Neurologia do Sentir, Círculo de Leitores, p. 47)
As emoções de fundo: são as não perceptíveis, como a calma ou fadiga. Elas são difíceis de serem percebidas porque são emoções que resultam de processos regulatórios do mundo interno do indivíduo. “O nosso bem-estar ou mal-estar resulta desta calda imensa de interações regulatórias” (A. Damásio, idem, p. 46) 

A alegria é considerada como a emoção mais positiva, funciona como uma recompensa, uma satisfação. Ficamos alegres quando lutamos por algo que acabamos por conseguir ou quando temos um projecto que nos permite ser mais criativos, fortemente motivados e autoconfiantes...

Uma maneira interessante de perceber as emoções será ver, talvez mais uma vez, o filme Inside-Out. Partindo da sua experiência pessoal e da vivência de sua filha de 11 anos, Pete Docter, imaginou o que acontece na complexa mente humana, quando as emoções falam mais alto e, de acordo com as emoções principais identificadas pelo psicólogo Paul Ekman (raiva, medo, tristeza, nojo, alegria) (2), Docter criou Inside-out ou, em português, Divertida-mente. (3)

Neste final de ano, “mudemos então de tom”. Celebremos a alegria, que está na verdadeira amizade, no amor entre as pessoas. É minha sugestão para as festas deste ano, à semelhança do que acontece noutras culturas, como na Alemanha ou no Japão, ouvir o Hino à Alegria de Beethoven.


Bom Natal e bom Ano Novo.

 



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Alegria, sois Divina
filha de Elísio
tornais ébria a Poesia
inspirais Dionísio

Nem costumes ou tradição
Vos reduzem o Encanto
criais-nos um mundo irmão
insuflais nosso Canto

Feliz de quem alcançou
ser-se amigo dum amigo
Quem doce dama ganhou
jubile-se comigo

Quem um só ente conquistou
seja citado no mundo
mas se na Alegria falhou
ficai só moribundo!

(2) Optou por cinco emoções uma vez que considerou a surpresa e medo muito semelhantes.

(3) Sinopse: Riley é uma menina divertida de 11 anos de idade, que deve enfrentar mudanças importantes na sua vida. Dentro do cérebro de Riley, convivem várias emoções diferentes, como a Alegria, o Medo, a Raiva, o Nojo e a Tristeza. A líder delas é Alegria, que se esforça bastante para fazer com que a vida de Riley seja sempre feliz. Entretanto, uma confusão na sala de controle faz com que ela e Tristeza sejam expelidas para fora do local. Agora, elas precisam percorrer as várias ilhas existentes nos pensamentos de Riley para que possam retornar à sala de controle - e, enquanto isto não acontece, a vida da menina muda radicalmente.



Rádio Castelo Branco





07/12/24

Natal – tempo de afectos


Vivemos mais um tempo de Natal, tempo mágico em que a luz, a árvore, a música e tantos outros símbolos, que estão um pouco por todo o lado, nos apelam para  a renovação e transformação da nossa vida  e nos reconfortam com expectativas de emoções e sentimentos mais conformes às necessidades de equilíbrio e homeostasia na nossa vida.


Os nossos sentimentos estão associados às vivências sociais e à cultura deste tempo: Paz, união, amor, saúde, perdão, gratidão, felicidade, prosperidade, solidariedade e fé, são algumas palavras que usamos para os expressar.

A nossa vida seria impensável sem estes sentimentos. Como refere António Damásio: sem sentimentos “seria impossível classificar quaisquer imagens como belas ou feias, agradáveis ou dolorosas, de bom gosto ou vulgares, espirituais ou terrenas.” Diz ainda A. Damásio que “são os sentimentos que nos guiam, que servem de bússola ao nosso comportamento.” (Entrevista de J-F Marmion a A. Damásio "Les raciones biologiques de la Culture", Le cercle psi, p.67)

A nossa vida tem na base um funcionamento homeostático de cujo mecanismo fazem parte os sentimentos que nos ajudam a compreender a nossa vida social e cultural.

Se a nossa vida for comparada a uma árvore temos na parte inferior a regulação metabólica, os reflexos básicos,  as respostas imunitárias.

Nos ramos maiores, os comportamentos de dor e prazer  e, nos ramos mais finos, as pulsões, motivações e emoções e, finalmente, os sentimentos.

Para A. Damásio, “a homeostasia (esse conceito da biologia definido como um processo de regulação pelo qual um organismo consegue a constância do seu equilíbrio) aplica-se à expressão do nosso sentimento pessoal, e estende-se facilmente à família e à tribo mais próxima. O problema é quando esse estado tem de se alargar a milhares de pessoas.  Aí conseguir o equilíbrio é muito mais difícil. Isso explica por exemplo o recrudescimento dos extremismos na Europa. A única solução, insisto, é educar. Para que o nosso sentimento seja o de aceitar o outro.” (Teresa Campos, Uma aula com António Damásio, Visão, 31.10.2017)


Apenas um pequeno grupo dos sentimentos funcionam negativamente. É, por isso,  chocante  que vivências negativas como é o caso da guerra, da violência, da dor e do sofrimento, em especial daquele que atinge os mais desprotegidos, como as crianças, estejam tão presentes na nossa historia recente. 

Os desequilíbrios não têm fim, e há quem continue  apostado num caminho desequilibrado, em que os sentimentos negativos se vão prolongar nefastamente por  várias gerações, dificultando, não só a nível físico, a reparação das infraestruturas destruídas mas, mais profundamente, a reparação das estruturas mentais como os sentimentos de cada vítima da guerra...


O problema é, então, como ultrapassar os sentimentos negativos: a raiva, a vingança, a desconfiança: quando volta a acontecer, quando surge outro ditador, quando teremos, finalmente, Paz.

Dito de outra maneira, como e quando será reposta a homeostasia, essa capacidade de a vida se manter  e  se desenvolver porque o nosso fito é continuar vivos e pensar no futuro (TC, idem)

Os sentimentos que nos vêm da luz, do brilho, da presença, dos abraços deste tempo são o desejo de felicidade para o Natal e de prosperidade para o próximo Ano!




Até para a semana.




Rádio Castelo Branco